segunda-feira, 26 de agosto de 2024

Guiné 61/74 - P25882: Notas de leitura (1721): Breve história da evangelização da Guiné (2) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 3 de Abril de 2023:

Queridos amigos,
Da evangelização remota já se falou, aborda-se agora o papel do clero regular com destaque para dois padres guineenses de gabarito, Marcelino de Matos de Barros e Henrique Lopes Cardoso; os autores referem a importância do relatório preparado pelo sexto bispo que pisou a Guiné, D. José Alves Martins, documento que dirigiu ao governador em 1931, dele irá resultar a carta magna das missões católicas na Guiné que perdurará até à independência do país e à subsequente criação da diocese de Bissau, em 1977, não deixando fazer uma descrição pormenorizada da organização missionária. Lembram ainda que a Guiné não tem restos de igrejas dos séculos passados, com exceção da velha capelinha de Nossa Senhora da Natividade, em Cacheu, que vem do século XVII.

Um abraço do
Mário



Breve história da evangelização da Guiné (2)

Mário Beja Santos

Já aqui se deu amplo acolhimento à obra magna do Padre Henrique Pinto Rema, História das Missões Católicas na Guiné, dela até preparei um resumo para um livro que tenho em preparação sobre os textos fundamentais da presença portuguesa na Guiné. Mas também não se pode descurar outras iniciativas como esta Breve História da Evangelização da Guiné, da autoria de dois franciscanos devotados a estudos guineenses. Trata-se de uma edição do Secretariado Nacional das Comemorações dos 5 Séculos, datada de maio de 1997. Os autores explicam o significado daquele ano jubilar, tem a ver com a deslocação de D. Frei Victoriano Portuense, há precisamente 300 anos, saio da sua sede de diocese, na Cidade Velha, na ilha de Santiago, e foi visitar as comunidades cristãs da Guiné; o significado também abrange os 20 anos de existência da Diocese de Bissau.

Referiu-se no primeiro apontamento a história mais remota desta evangelização, não se iludindo a enormidade do insucesso até ao século XVII que foi na Guiné um século de expansão missionária. Cabe agora mencionar o papel do clero secular, tecer a sua apreciação até meados do século XX. Os sacerdotes do clero secular foram os primeiros a fixar-se em algumas praças da Guiné e foram também os mais regulares nessa estadia até aos inícios do século XX. Quando, por exemplo, os Franciscanos Portugueses se ausentaram da Guiné por um período de quase 100 anos (1834-1932) foram os padres seculares os únicos a aguentar o peso da missionação. Estes padres seculares visitavam temporariamente ou fixavam-se nas principais praças (Bissau, Geba, Farim, Ziguinchor, Bolama) e aí atendiam, sobretudo, os moradores das mesmas, ou a elas estritamente ligados: administradores, comerciantes, militares, grumetes. D. João V desejou expressamente deixar ao clero secular o trabalho religioso das praças (centros digamos urbanos) e entregar aos religiosos franciscanos o trabalho de missionação no interior da Guiné e nos rios distantes da Serra Leoa. Entre os séculos XVI a XVIII, os sacerdotes seculares vieram frequentemente à Guiné apenas como simples visitadores; nos séculos seguintes, embora em número sempre escasso, tiveram um caráter de permanência mais regular.

Para um envio de sacerdotes seculares teve real importância no século XIX a criação do seminário de Cernache do Bonjardim bem como no Seminário-Liceu de S. Nicolau, sem esquecer também o seminário na arquidiocese de Goa: o clero secular que missionou na Guiné ao longo dos séculos ou era português ou cabo-verdiano ou goês ou guineense.

Os autores irão destacar duas figuras eméritas de sacerdotes guineenses: os padres Marcelino Marques de Barros (1844-1929) e Henrique Lopes Cardoso (1863-1914). O padre Marcelino frequentou o Colégio das Missões de Cernache de 1855 a 1866, ano em que foi ordenado presbítero, tendo regressado à Guiné em dezembro desse ano. Paroquiou em Bissau, Ziguinchor, Farim, Bolor e Cacheu. Em 1873 foi feito Vigário-Geral da Guiné. Gozou férias em Portugal entre 1877 e 1878, frequentou a Academia de Belas Artes, aspirou a frequentar o curso de Ciências Naturais, mas não lhe deram tempo, teve que regressar à Guiné. Coube-lhe apresentar um trabalho de organização missionária (1880) que ficará mais ou menos letra morta. Em 1885 regressou definitivamente a Portugal onde passou a fazer investigações e a publicar textos do maior interesse. Deve-se-lhe, entre outras, o primeiro dicionário de português-crioulo, com 5.420 palavras.

O padre Henrique Lopes Cardoso nasceu em Bissau em 1863, filho de pai cabo-verdiano e mãe bijagó. Fez o curso do Seminário-Liceu de Cabo Verde, em 1889 foi presbítero e regressou logo à sua terra. Aqui fará a sua primeira estadia de 14 anos paroquiando em Bissau e Geba. Entrará em conflito com o Governador Vasconcelos e Sá que o desterrará para Geba nos finais de 1893, no ano seguinte foi deslocado para a paróquia de Cacheu, será aqui pároco durante 6 anos, acumulando com o cargo de Vigário-Geral. Entrega ao Governo da Guiné um importante parecer a respeito da administração eclesiástica da Guiné, propondo a fundação de uma Missão com Escola de Artes e Ofícios. Tudo letra morta. É na segunda estadia em Bissau que o padre Henrique escreve o seu pequeno, mas importante, “Vocabulário do dialeto Pepel”, seguramente o primeiro e único dicionário pepel até hoje publicado. Até à sua morte, paroquiou em Cabo Verde e Guiné, estando sepultado numa igreja em Santiago.

É significativo que ao longo de 407 anos (até à criação da Missão em 1940) apenas 7 bispos tenham visitado a “terra firme da Guiné”. O sexto bispo a passar pela Guiné foi D. José Alves Martins, foi ele que lançou as bases para uma nova missionação através de um relatório dirigido ao governador com data de abril de 1931, sugeriu uma congregação que se voltasse a fixar na Guiné, falou na necessidade de escolas catequísticas guineenses chefiadas por leigos guineenses. Estas escolas permanentes, a serem subsidiadas pelo Estado, ministrariam o ensino religioso e literário bem como a língua portuguesa. Daqui irá resultar a carta magna das missões católicas na Guiné que perdurará até à independência do país e à subsequente criação da diocese de Bissau, em 1977.

Seguidamente os autores fazem uma descrição muito pormenorizada dessa nova organização missionária, têm uma palavra sobre os hospícios e a evangelização permanente, não deixando de dizer que o número de missionários foi sempre diminuto (raramente ultrapassando a dezena) para um território que até 1886 se estendia desde o Senegal até à Serra Leoa. Até à vinda dos Franciscanos, em 1656, foi possível criar dois pequenos conventos, em Cacheu e Bissau. A Guiné não tem restos de igrejas dos séculos passados, com a única exceção da velha capelinha de Nossa Senhora da Natividade, em Cacheu, que veio do século XVII.

E vamos seguidamente ver o trabalho missionário até ao final do século XX.

Estas quatro imagens foram retiradas do livro em análise
Imagens a cores da viagem
Seminário das missões em Cernache do Bonjardim, na atualidade

(continua)
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Notas do editor

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