segunda-feira, 21 de outubro de 2024

Guiné 61/74 - P26066: Humor de caserna (79): O soldado que foge, apavorado, do bloco operatório ao ver "tantas tesouras e faquinhas"... (Maria Celeste Guerra, ex-alferes graduada enfermeira paraquedista, FAP, 1962/65)

 


Maria Celeste  [Guerra, ex-alferes graduada enfermeira paraquedista]:  é do 2º curso (1962). Esteve na FAP de 1962 a 1965. Cumpriu uma  missão de serviço em Moçambique e duas na Guiné. 

Fonte: "Nós, as enfermeiras paraquedistas" (2014), pág. 389/390.


Humor de caserna > O soldado que foge, apavorado, do bloco operatório ao ver "tantas tesouras e faquinhas"...

por Maria Celeste


(...) No Hospital Militar de Bissau [HM 241], aconteceu um dia uma cena muito cómica! 

Por algum motivo, fui ajudar no serviço de cirugia. Eu estava à vontade na técnica deste serviço, pois antes de ir para a Força Aérea tinha trabalhado no Hospital da Parede [Hospital Ortopédico Santa'Ana, HOSA] como instrumentista.

Estava então a preparar a mesa para a cirurgia que ia ser feita. Entretanto, tinham trazido para a sala, talvez cedo de mais, o soldado doente a quem ia ser feita uma apendicectomia,

Às tantas, no meio da nossa conversa, meio aturdido com as drogas que já lhe tinham sido administradas, ele perguntou-me:

 Diga lá, minha Alferes, essas tesouras e faquinhas,são para quê ?

Respondi:

— São para a sua operação!

— Valha-me  Deus, isso tudo?!...

 É tudo preciso  acrescentei eu.

Como não houve mais comentários e se seguiu um grande silêncio, alguns momentos depois voltei-me para trás (estava de costas para o soldado) e... qual doente ?!| 

Não o vi, ele tinha desaparecido!

Corri para a porta e, no final do enorme corredor, consegui ainda avistá-lo, fugindo apavorado, embrulhado num lençol!!! (...)


Fonte: Excertos de Maria Celeste - "Cenas do quotidiano, na guerra". In: "Nós, enfermeiras paraquedistas", 2ª ed., org. Rosa Serra, prefácio do Prof. Adriano Moreira (Porto: Fronteira do Caos, 2014), pág. 342 (com a devida vénia)

(Seleção, revisão / fixação de texto, título: LG)

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Nota do editor:

Último poste da série > 20 de outubro de 2024 > Guiné 61/74 - P26062: Humor de caserna (78): o velho, a "bajuda fugidona" e a justiça salomónica do alferes Mota (Carlos Fortunato, ex-fur mil, CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71)

2 comentários:

Valdemar Silva disse...

Não sei em que ano/mês é que essa hilariante situação aconteceu, mas nos finais de 1969 o 1º. Cabo Rocha do meu Pelotão foi para o Hospital de Bissau para, também, ser feita uma apendicectomia.
O Rocha, que era de baixa estatura, quando regressou mais baixo veio a andar bastante curvado. Contou que se tinham enganado no lado para a "abertura" e teve que ser aberto,
depois, no outro lado certo.

Valdemar Queiroz

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Atenção, houve menino que nunca tinha visto um médico (a não ser quando ia às "sortes"), muito menos um hospital (nasceram todos em casa), e muito menos ainda um bloco operatório... O meu primeiro dentista foi um... "arranca-dentes", e quem me dava injeções, quando estava doente, era um primo do meu pai, que tinha andado na marinha, e era barbeiro (na tradição do velho "barbeiro-sangrador"...).

Qual médicos, qual enfermeiras, quais hospitais, quais farmácias !... Havia até aos anos 60 os "catres" das velhas misericórdias onde iam morrer os velhos, sem eira nem beira, sem família...(Morria-se em casa, na província.)

... E a farmácia da terra era a velha... botica!