segunda-feira, 9 de dezembro de 2024

Guiné 61/74 - P26249: Notas de leitura (1753): A Guiné Que Conhecemos: as histórias sobre unidades do BCAV 2867 (3) (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Agosto de 2023:

Queridos amigos,
Reiterando a muita admiração por quem coordenou este impressionante repositório de testemunhos e acervo fotográfico, convém recordar que a presente obra vem na sequência de uma anterior intitulada História das "Boinas Negras", focada na comissão da CCAV 2482, edição de 2018, as restantes unidades do batalhão bateram o pé e apresentam-se agora em A Guiné Que Conhecemos, ficamos pois com a fotografia um tanto detalhada do setor 1 da região do Quínara ao tempo da presença do BCAV 2867, com falcões, cavaleiros e dragões, e os boinas negras voltam ao palco. Para todos aqueles que ainda não possuem história da sua unidade, está aqui uma boa matriz, é preciso encontrar um coordenador que saiba trombetear colaborações, testemunhos, imagens, lembranças espúrias, é dessa conjugação de esforços e trabalho de equipa que se põe mais um tijolo do nosso relicário do dever de memória.

Um abraço do
Mário



A Guiné Que Conhecemos: as histórias sobre unidades do BCAV 2867 (3)

Mário Beja Santos

O livro Histórias dos “Boinas Negras”, referente à comissão da CCAV 2482 foi o rastilho de pólvora para que as restantes unidades do BCAV 2867 se pusessem em movimento. Conforme refere o coordenador, Jorge Martins Barbosa, antigos combatentes dos “Falcões” da CCS, dos “Cavaleiros de Nova Sintra” da CCAV 2483 e dos “Dragões de Jabadá”, da CCAV 2484 aderiram com os seus testemunhos, assim surgiu este extenso documento que é um misto de história e de literatura memorial.

Não tenho qualquer rebuço em manifestar o meu profundo apreço pela lavra a que se entregou o coordenador Jorge Martins Barbosa, já impulsionador da História dos “Boinas Negras”, esta centrada na comissão da CCAV 2482, as outras unidades do BCAV 2867 não quiseram ficar de fora, e por isso aqui têm desfilado os “Falcões da CCS”, os “Cavaleiros de Nova Sintra”, demos seguidamente a palavra aos “Dragões de Jabadá” e vamos finalizar com os “Boinas Negras”, versão retocada e aumentada. Cuidadoso, Jorge Martins Barbosa entende contextualizar um pouco a história da Guiné. Aproveito a oportunidade para observar que com frequência fala-se da guerra da Guiné-Bissau, o que é um erro tremendo, a Guiné-Bissau é o nome de um Estado proclamado unilateralmente pelo PAIGC em setembro de 1973, logo reconhecido por largas centenas de países, mas a colónia ou província chamava-se Guiné portuguesa, foi aqui que combatemos, dela saímos em outubro de 1974 e na capital entraram dirigentes e militares do PAIGC, então na República da Guiné-Bissau.

É impressionante as colaborações que o autor agregou de todas estas unidades militares, bom seria que ele viesse aderir à nossa confraria e permitisse, bem como todos os seus camaradas de batalhão que um número impressionante de imagens aqui ficasse depositado.

Que significado têm as boinas negras? Este nome de guerra aparecia associado à cor negra do agasalho de cabeça reservado pelo regulamento para os militares de arma de cavalaria. Foram para a Guiné todos de boina castanha e por despacho do governador, de 28 de maio de 1970, foram autorizados a fardar com boina negra no teatro de operações da Guiné. De março a junho passaram em Tite (com exceção de um pelotão que foi para a intervenção em Nova Lamego), população predominantemente Balanta, mas não faltavam outras etnias, havia conivências inescapáveis entre gente à sombra da bandeira portuguesa e a guerrilha, e dá-se um exemplo: “Um dos chefes da base IN de Gã Formoso – de seu nome Vicente – era irmão da mulher de Djamil, comerciante na povoação de Tite, e recebia da irmão com alguma frequência uns macitos de tabaco Malboro e sabonetes Lux. Isto foi afiançado com orgulho, por Vicente, a António Júlio Rosa, quando este ex-alferes miliciano de artilharia (falecido em meados de 2020) passou, cativo, a norte de Fulacunda, de onde depois desceu, saindo pela fronteira junto a Guileje, a caminho de Kindia, na Guiné-Conacri, por ter sido aprisionado em Bissássema na madrugada de 3 de fevereiro de 1968.”

Também se conta o que o pelotão andou a fazer por Nova Lamego, com intervenções em Cabuca e Canjadude, é interessante como o autor põe em comparação relatórios portugueses com documentação subscrita por Amílcar Cabral, estabelecendo diretrizes para intensificar a guerrilha na região Leste. Não são esquecidas as edificações quer em Tite quer em Fulacunda, esta foi a segunda etapa dos “Boinas Negras”, o acervo de imagens é de um muitíssimo interesse, e de novo são invocados documentos do PAIGC referentes a esta região do Quínara, está aqui um bom suporte de trabalho para investigadores do futuro.

O relato acolhe episódio e testemunhos de militares, desde operações e segurança a aquartelamentos, situações passadas em patrulhamentos e escoltas, é lembrado que os “Boinas Negras” foram rendidos pelos “Capicuas” da CART 2772, também desta unidade se recolhe um depoimento de Armando Oliveira que tem voltado à Guiné para oferecer solidariedade. Aspeto curioso é o acervo fotográfico relacionado com Fulacunda das diferentes unidades que por ali passaram e imagens da povoação bem como de Tite até à atualidade.

E a obra finaliza com o elenco de convívios realizados com imensa regularidade desde 1996, o ponto culminante é o testemunho do coronel José Ferreira Durão sobre as atividades dos “Boinas Negras”, é uma peça tocante onde não se esquece o jornal publicado semanalmente, e sem falhar; bem como o testemunho do coronel Joaquim Correia Bernardo sobre os “Cavaleiros de Nova Sintra” e para encerrar o coronel Henrique de Carvalho Morais sobre os “Boinas Negras”.

Um belo trabalho, um acervo fotográfico com grande significado, um esforço coletivo que é um exemplo para muita gente.

Imagem de Tite do tempo do BART 1914 (1967-69), retirada do respetivo blogue, com a devida vénia
Fulacunda, imagem dos “Capicuas” (CART 2772), com a devida vénia
Tite, 19 de janeiro de 1973, o que restou da fuselagem do foguetão presentado pelo IN. Imagem de Joaquim Pereira da Silva do BART 6520/72, com a devida vénia
Chéché, Gabu, na atualidade, imagem retirada da página Society for the Promotion of Guinea Bissau, com a devida vénia
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Notas do editor

Vd. post anterior de 2 de dezembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26226: Notas de leitura (1751): A Guiné Que Conhecemos: as histórias sobre unidades do BCAV 2867 (2) (Mário Beja Santos)

Último post da série de 6 de dezembro de 2024 > Guiné 61/74 - P26240: Notas de leitura (1752): O Arquivo Histórico Ultramarino em contraponto ao Boletim Official, até ao virar do século (5) (Mário Beja Santos)

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