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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025

Guiné 61/74 - P26530: Historiografia da presença portuguesa em África (468): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1897 e 1898 (24) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 17 de Outubro de 2024:

Queridos amigos,
O Dr. Marques Perdigão, em nome da Junta de Saúde, faz o relatório alusivo a 1896, não esconde o quadro de ineficiências e faltas, deixa os seus apelos para haver mais médicos e enfermeiros, volta a apelar ao Governo da Província para ainda se continuar a estudar a flora da Guiné; o novo Governador é Álvaro Herculano da Cunha, pede pensões para dois heróis de guerra, um deles, em combates no Oio, foi mortalmente atingido e tudo fez para entregar a bandeira portuguesa, de que ele era portador e zelador; o régulo de Intim anuncia o seu preito e homenagem ao rei de Portugal, é mesmo batizado em Bolama, chama-se Tabanca Soares, promete obediência de todos os régulos da ilha de Bissau, o que não vai acontecer, suceder-se-ão as rebeliões que só conhecerão acalmia na campanha de Teixeira Pinto em 1915.

Um abraço do
Mário



A Província da Guiné Portuguesa
Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1897 e 1898 (24)

Mário Beja Santos

Fez-se a referência no texto anterior ao relatório do serviço de saúde da Guiné Portuguesa referente a 1896, é assinado por António Maria Marques Perdigão. À semelhança de outros relatores, o médico descreve o contexto histórico, a geografia, o quadro das condições hígiossanitárias nas principais povoações e não deixa de observar os problemas postos à classe médica, farmacêutica e de enfermagem, como escreve:
“Durante a minha gerência só houve três médicos do quadro em toda a província que são os que ainda hoje existem. É urgentíssima a necessidade de médicos para o serviço da província. Em Bolama devem estar, para comporem a Junta de Saúde, três médicos: o subchefe, um facultativo de 1.ª classe e um de 2.ª ou 3.ª, pronto sempre para seguir para qualquer ponto que demande socorros urgentes; em Bissau, um de 1.ª classe; e em cada uma das povoações acima indicadas (Geba, Farim, Cacheu e Buba) um de 2.ª ou 3.ª. Há falta também de pessoal farmacêutico. Se os três farmacêuticos que devem pertencer à Guiné estivessem sempre, o mal estava remediado, porque em Bolama são indispensáveis dois e em Bissau um. Ora, durante a minha gerência, nunca houve três farmacêuticos na província. É assim impossível dar-se cumprimento ao serviço, atendendo a que na Guiné não há farmácias particulares e, por isso, as do Estado têm que vender ao público. Os farmacêuticos em Bolama têm em seu cargo, além de toda a escrituração que é grande e complexa, o satisfazerem de todas as requisições na farmácia, o aviamento de todos os medicamentos para o hospital, remédios a indigentes, e venda ao público. Pois, repetidas vezes, tem estado um só farmacêutico com todos estes encargos, como agora sucede por motivo de doença de um deles.
É impossível cumprir-se convenientemente o serviço só com um farmacêutico, porque além do receituado do hospital tem a farmácia de Bolama de satisfazer todas as requisições para a farmácia de Bissau e para as sete ambulâncias da província.”


E continua a insistir para que se mande para a Guiné dois facultativos e um farmacêutico. Lembra que não há socorros médicos em Geba, Farim, Cacheu e Buba e mais pontos ocupados da Guiné. Recorda ao pessoal de enfermagem: em Bolama enfermeiro-mor, um enfermeiro de 2.ª classe e dois ajudantes; em Bissau, um enfermeiro de 2.ª classe e um ajudante; em cada uma das duas ambulâncias e delegações um enfermeiro de 2.ª classe. As irmãs hospitaleiras têm a seu cargo alguns serviços de enfermagem e tece-lhes louvor.

Lembra o mau estado em que se encontra a enfermaria militar e civil de Bissau e a respetiva farmácia: é um verdadeiro pardieiro, a enfermaria é uma casa velha sem condições de salubridade e higiene, soalho sujo, parecendo não ter sido lavado há muitos meses. E o seu relatório não deixa de acabar de modo surpreendente:
“A Junta de Saúde da Guiné torna bem patente o seu interesse pelas ciências naturais e em especial pela ciência que professa, propõe que desde já se proceda à exploração botânica da Guiné. A verba que para esse fim é destinada no orçamento da província é diminutíssima, e é por isso que a Junta de Saúde vem solicita toda a proteção. O estudo da flora da Guiné é em grande parte desconhecida, sendo certo poucas regiões haverá onde ela seja mais abundante, mais variada e mais útil sob o ponto de vista médico.”
Tudo isto é matéria constante do Boletim Oficial n.º 18 de 1897.

Estamos agora em 1898 e vejam-se algumas notícias curiosas publicadas no nº9, de 26 de fevereiro: “Tendo sido morto na última guerra do Oio o chefe Mandiga de nome Quecuta Mané, pela sua valentia, coragem e inexcedível dedicação pela bandeira portuguesa, e atendendo aos bons e irrelevantes serviços que prestou nas últimas guerras de Geba e Bissau, aonde se distinguiu sempre dos seus companheiros: hei por conveniente, com o intuito de galardoar tais serviços à nação, conceder a começar desta data uma pensão anual de 36$000 a Mané, filho do referido Quecuta Mané, ficando esta minha resolução pendente da aprovação do Governo de Sua Majestade.” E, mais adiante: “Tendo sido morto, em diligência o Mandiga de nome Lamini Injai, chefe de uma das tabancas do presídio de Farim, na ocasião em que foram atacados pela gente do Oio, defendendo enquanto pôde a bandeira nacional que lhe tinha sido confiada, entregando-a a um soldado que chamou depois de se sentir mortalmente ferido, o que demonstra muita dedicação e patriotismo: hei por conveniente, no intuito de galardoar os serviços que prestou à nação estabelecer a começar da presente data, uma pensão anual de 36$000 ao filho do referido Lamini Injai, de nome Jaime Falcão, ficando esta minha resolução dependente da aprovação do Governo de Sua Majestade.”

E terminamos com o auto de preito e homenagem prestada ao Governo português, pelo régulo de Intim, Tabanca Soares e seus grandes, vem publicado no Boletim n.º 21, de 27 de maio de 1899. O auto indica a data de 13 de maio, decorre no Palácio do Governo, estão presentes o Governador e altas individualidades e escreve-se o seguinte:
“Pelo régulo de Intim foi dito que vinha cumprimentar Sua Excelência o Governador, que nunca régulo algum da ilha de Bissau tinha vindo a Bolama com este fim, por a isso se oporem as suas leis, mas que, reconhecendo ele plenamente a soberania de Portugal, sobre o seu país, vinha espontaneamente dar preito e homenagem a Sua Majestade.
Para provar a sinceridade das suas declarações, pedia que o Governo colocasse um destacamento militar no seu território, o qual seria garantia segura da completa submissão dos povos de Intim mais que lhe estão subordinados. Disse que nenhum régulo da ilha de Bissau tinha mais poder do que ele. Punha à disposição do Governo português toda a sua influência para que a ordem na ilha de Bissau nunca fosse alterada.”

Respondeu o Governador que aceitava este preito de homenagem, que imediatamente ia dar conhecimento ao Governo da metrópole, e que o Governo português estava pronto a proteger todos aqueles que mostrassem submissos às suas ordens e que nada mais queria senão paz e trabalho, porque eram as únicas garantias do progresso do desenvolvimento da Guiné. Na sequência deste auto de preito e homenagem segue-se o auto da ocupação do território de Intim, na circunstância foi batizada em Bolama o rei de Intim, Tabanca Soares, com o nome de Carlos. Dava-se como confirmado que os povos da ilha de Bissau (Intim, Antula, Bandim, Biombo e Safim) têm se esmerado em demonstrar respeito e amizade pelo Governo. No ato de se assinar o auto de ocupação, o negociante Otto Schacht, como o mais antigo estrangeiro na Guiné, levantou um viva à bandeira portuguesa e a Sua Majestade, foi correspondido pelo Governador e todas as pessoas presentes, deram-se vivas aos chefes de Estado a Alemanha, Inglaterra, França, Itália e Bélgica.

Dezembro de 1897, vai chegar novo Governador, 1.º Tenente da Armada Real, Álvaro Herculano da Cunha
Morreu Pedro Ignacio de Gouveia, duas vezes Governador da Guiné
Provavelmente atividade tipográfica na Imprensa Nacional da Guiné. Imagem restaurada e que consta da Casa Comum/Fundação Mário Soares
Estaleiros da Casa Gouveia no Ilhéu do Rei. Imagem restaurada e que consta da Casa Comum/Fundação Mário Soares

(continua)

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Nota do editor

Último post da série de 19 de fevereiro de 2025 > Guiné 61/74 - P26510: Historiografia da presença portuguesa em África (467): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Official do Governo da Província da Guiné Portuguesa, 1896 e 1897 (23) (Mário Beja Santos)

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