segunda-feira, 8 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19657: O nosso livro de estilo (12): Atingimos os 11 milhões de visualizações na passada sexta-feira, dia 5... E comentar continua a ser fácil e necessário!... E mais tabancas e tabanqueiros são precisos!


EM 15 ANOS, 11 MILHÕES DE VISUALIZAÇÕES (1,8 ATÉ MAIO 2010 + 9, 2 MILHÕES ATÉ SEXTA-FEIRA, DIA 5

9,203,204



I. E COMENTAR CONTINUA A SER FÁCIL... SOB O SAGRADO POILÃO DA TABANCA GRANDE...



1. As opiniões aqui expressas, sob a forma de postes ou de comentários, são da única e exclusiva responsabilidade dos seus autores, não podendo vincular o fundador, proprietário e editor do blogue, Luís Graça, bem como a sua equipa de co-editores e demais colaboradores permanentes.

2. Camarada, amigo, simples leitor: Podes escrever no final de cada poste um comentário, uma informação adicional, um reparo, uma crítica, uma pergunta, uma observação, uma sugestão... (De preferência sem erros nem abreviaturas; evitar também as frases em maiúsculas ou caixa alta).

Basta, para isso, apontares o ponteiro do rato para o link Comentários, que aparece no fim de cada texto (ou poste), a seguir à indicação de Postado por Fulano Tal [Editor] at [hora], e clicares...

3. Tens uma "caixa" para escrever o teu comentário que será publicado instantaneamente, sem edição prévia, sem moderação, sem "censura prévia"(leia-se: triagem, moderação)...

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1 – 1 de 1
Blogger Tabanca Grande disse...
Veteraníssimo Miranda Ribeiro: o que é feito de ti ? Não tens dado notícia. Espero que a vida e a saúde e tudo o mais estejam a correr bem. Daqui vai um abraço natalício do editor, amigo e camarada Luís Graça.
8 de abril de 2019 às 07:31
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Amigo ou camarada da Guiné: A tua opinião é muito importante para nós. Escreve aqui, com inteira liberdade e responsabilidade. Tal significa: respeitar as boas regras de convívio que estão em vigor entre nós; não há moderação dos comentários; limite máximo: cerca de 4 mil caracteres:



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Prove que não é um robô


No caso de teres uma conta no Google, deves usar essa identificação. Mas também podes entrar como "anónimo": põe no final da mensagem o teu nome, e facultativamente a localidade onde vives; sendo ex-combatente do ultramar, podes indicar o Teatro de Operações onde estiveste, local ou locais, posto e unidade a que pertenceste; e, se possível, evita as abreviaturas de nomes, siglas, acrónimos, pseudónimos...

Em suma, os camaradas da Guiné "dão a cara", não se escondem atrás do bagabaga...

Se voltares ao blogue, encontrarás logo a mensagem que lá deixaste. Repete as operações acima descritas para visualizar o teu comentário.

4. Escreve com total liberdade e inteira responsabilidade, o que significa respeitar as boas regras de convívio que estão em vigor entre nós: por exemplo,

(i) não nos insultamos uns aos outros;

(ii) não usamos, em público, a 'linguagem de caserna', o palavrão, etc. (a não ser textos mais literários, como um poema, um conto...);

(iii) somos capazes de conviver, civilizadamente, com as nossas diferenças (sociais, políticas, ideológicas, filosóficas, culturais, étnicas, religiosas, clubísticas,  etc., incluindo as fenotípicas - por exemplo, a cor da pele ou do cabelo);

(iv) somos capazes de lidar e de resolver conflitos... sem puxar da G3, da pistola Walther ou da catana;

(v) todos os camaradas têm direito ao bom nome e à privacidade;

(vi) não trazemos à baila (,ou seja, ao blogue) a "actualidade" (política, económica, social, ambiental, etc.)

5. Os editores reservam-se, naturalmente, o direito de eliminar, "a posteriori", rápida e decididamente, todo e qualquer comentário que violar as normas legais (incluindo as do nosso servidor, Blogger/Google), bem como as nossas regras de bom senso e bom gosto que devem vigorar entre pessoas adultas e responsáveis, a começar pelos comentários ANÓNIMOS (por favor, põe sempre o teu nome e apelido por baixo), incluindo mensagens com:

(i) conteúdo racista, xenófobo, homofóbico, pornográfico, etc.;

(ii) carácter difamatório;

(iii) tom intimidatório, provocatório ou persucotório ("ciberbullying", por exemplo);

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iv) acusações de natureza criminal;

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(vi) linguagem inapropriada;

(vii) publicidade comercial ou propaganda claramente político-ideológica;

(viii) comunicações do foro privado, sem autorização de uma das partes.

Ocasionalmemte, alguns comentários poderão transformar-se em postes se houver interesse mútuo (do autor e dos editores).

6. Além dos editores [Luís Graça (Lourinhã), Carlos Vinhal (Leça da Palmeira / Matosinhos),  Eduardo Magalhães Rodrigues (Maia), Virgínio Briote (jubilado) (Lisboa) e Jorge Araújo (Almada)], há os colaboradores permanentes, membros seniores do nosso blogue, que recebem, automaticamente, na sua caixa de correio (e apreciam depois o conteúdo de) todos os comentários: 

Cherno Baldé (Bissau);
Hélder Sousa (Setúbal);
Humberto Reis (Alfragide / Amadora);
Jorge Cabral (Lisboa);
José Martins (Odivelas);
Torcato Mendonça (Fundão);
Mário Beja Santos (Lisboa).



O seu papel é o de ajudar os editores a cumprir e a fazer cumprir as regras do nosso blogue. Alguns deles têm, aleatoriamente, poderes de administradores, podendo eliminar, de imediato, comentários que infrinjam as nossas regras editoriais, o que só muito raramemente acontece (ou aconteceu, em 15 anos de existência no nosso blogue).

II. COMENTAR É FÁCIL... E NECESSÁRIO!

Amigos e camaradas:

Originalmente (até julho de 2012) o sistema de triagem dos comentários era pouco amigável, era muito apertado... A intenção (boa) era a de prevenir e combater o SPAM automático (correio indesejado, publicidade, etc.)... 

Alertados para os problemas que estavam a causar aos leitores, desencorajando-os de participar, foram então feitas  as alterações que se impunham às nossas definições.

Assim, podem comentar com ou sem conta no Google, com ou sem foto... Como "anónimos", terão sempre que assinar (pôr o vosso nome) por baixo da mensagem...

O Blogger também simplificou a caixa de comentários,  tornando-a mais amigável e prático... Aos anónimos o sistema estava a exigir a cópia manual de um número e uma palavra, com letras pouco ou nada legíveis... Mas às vezes o teste anti-robô: identificação de imagens... Se entrares como anónimo, mas que dizer que és uma robô...

Amigos e camaradas: continuem a alimentar o blogue com os vossos comentários. É a "seiva" (vital) do poilão da Tabanca Grande. E "tragam mais cinco"!...



PS1 - Encontramo-nos em Monte Real, Leiria, dia 25 de maio de 2019, para o XIV Encontro Nacional da Tabanca Grande (, espero que não seja o último!...).

PS2 - O nosso coeditor, amigo e camarada Jorge Araújo (, que vive em Almada,)  deu-me, na sexta feira passada, uma boa e encorajante notícia, às 10h38: "Estou de partida para Almeirim, para um encontro de camaradas da Guiné. Iremos, durante/fim de almoço abordar o tema do nascimento (oficial) da TABANCA DE ALMADA."
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Guiné 61/74 - P19656: (De)Caras (127): Capitão de Infantaria Francisco Meireles, cmdt da CCAÇ 508, morto em Ponta Varela, Xime, em 3/6/1965 - Parte IV (Jorge Araújo)


Foto 5 - Amedalai (Abr1965) – Da esquerda para a direita: Amândio César, Administrador Augusto Cabrita, Cmdt Cyrne de Castro, Cap Francisco Meirelles (ao volante) e Alf Ferreira

[Fonte: Amãndio César  - Guiné, 1965: Contra-ataque», Braga, Editora Pax, Colecção: Metrópole e Ultramar,  1965,  p.38, com a devida vénia].


Foto 6 - Amedalai (13Set73) - Aldeamento de A/D de Amedalai (oito anos depois da foto acima), onde estava instalado o PMil 241, na sequência de um ataque com RPG e armas automáticas. Para além do estado em que ficou a Daimler do PRecD 8681, nada mais houve a registar. Nessa ocasião encontrava-me com a minha secção (+) no Destacamento da Ponte do Rio Udunduma, pelo que ainda guardo na memória esta ocorrência.




Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, CART 3494  (Xime-Mansambo, 1972/1974); coeditor do blogue desde março de 2018


A COMPANHIA DE CAÇADORES 508 [CCAÇ 508] - (1963-1965) E A MORTE DO SEU CMDT CAP INF FRANCISCO MEIRELLES EM 03JUN1965 NA PONTA VARELA: A ÚNICA BAIXA EM COMBATE DE UM CAPITÃO NO XIME (PARTE IV)

1. INTRODUÇÃO

A presente narrativa, a penúltima relacionada com tema em título, segue a mesma metodologia das anteriores – P19597, P19613 e P19640 – onde os diferentes elementos historiográficos, de hoje, se encontram divididos em dois pontos principais.(*)

No primeiro ponto, recuperaram-se mais algumas imagens da história colectiva da Companhia de Caçadores 508 [CCAÇ 508], com recurso ao álbum de Cândido Paredes, condutor auto rodas dessa Unidade, actualmente a residir em Ponte de Lima. No âmbito da actividade operacional, destacaremos, também, algumas missões desenvolvidas nos últimos cinco meses da sua presença no CTIG (1963-1965), na sequência da transferência, em Março de 1965, para o subsector de Bambadinca, para integrar o dispositivo e manobra do BCAÇ 697, então sediado em Fá Mandinga, sob o comando do Tenente-Coronel Mário Serra Dias da Costa Campos, região que passou a ser designada, a partir de 11 de Janeiro de 1965, por «Sector L1».

No segundo ponto, continuaremos a citar o que de mais relevante retirámos das páginas do livro elaborado em memória do capitão Francisco Xavier Pinheiro Torres Meirelles (1938-1965) pela sua família. Neste contexto, como alternativa às dificuldades (em entender a actual política de gestão do audiovisual da nossa "Estação Pública") no acesso às imagens captadas na Ponta Varela (Xime) pelos enviados especiais da RTP, Afonso Silva (operador) e Luís Miranda (realizador), naquela fatídica manhã de 03 de Junho de 1965, local da morte em combate do capitão Francisco Meirelles, e transmitidas por aquele canal televisivo em 16 de Setembro desse ano, optámos por recuperar uma entrevista radiofónica gravada umas semanas antes, em Bambadinca, pela Emissora Nacional, durante uma operação de patrulhamento sob o comando do Capitão Meirelles.


2. SUBSÍDIOS HISTÓRICOS DA COMPANHIA DE CAÇADORES 508 (BISSORÃ, BARRO, BIGENE, OLOSSATO, BISSAU, QUINHAMEL, BAMBADINCA, GALOMARO, PONTA DO INGLÊS E XIME, 1963-1965)



Foto 1 – Bissorã (1964) - Grupo de militares da CCAÇ 508. [Foto do álbum de Cândido Paredes, com a devida vénia]


2.1 – SÍNTESE DOS PRIMEIROS DEZOITO MESES

A CCAÇ 508 chegou a Bissau em 20 de Julho de 1963, sábado, a bordo do cargueiro "SOFALA", sob o comando, interino, do Alferes Augusto Teixeira Cardoso, onde se juntou o Cap Mil Inf João Henriques de Almeida (?-2007), aquele que seria o seu 1.º Cmdt.

Cinco meses após o início do conflito armado na região de Tite, a CCAÇ 508 assumiu a responsabilidade do subsector de Bissorã, então criado, com grupos de combate destacados em Barro, até 23Dez63, e Bigene, até 26Dez63, ficando integrada no dispositivo e manobra do BCAÇ 507, sob o comando do TCor Hélio Esteves Felgas, e, após remodelação daqueles sectores, no BCAÇ 512, sob o comando do TCor António Figueiredo Cardoso. Em 26Dez63, passou a ter um GrComb destacado em Olossato.

Em 11Ago63, dez dias após ter iniciado a sua actividade operacional, tem a sua primeira baixa, por acidente com arma de fogo. Em 12Fev64, com seis meses de comissão, a CCAÇ 508 regista mais duas baixas, estas em combate, em Maqué (Região do Óio), na sequência da sua intensa actividade operacional.

Entretanto, em Julho de 1964, chega a esta Unidade Independente, mobilizada pelo RI7, de Leiria, o Cap Francisco Xavier Pinheiro Torres de Meirelles [1938-02-21/1965-06-03], em rendição do anterior Cmdt, Cap João Almeida. Em 04Set64, já então na dependência do BART 645, sob o comando do TCor António Sobral. Depois da chegada da CART 566, a CCAÇ 508 foi substituída no subsector de Bissorã pela CART 643, do antecedente ali colocada em reforço, tendo seguido para o sector de Bissau, a fim de se integrar no dispositivo de segurança e protecção das instalações e das populações da área, com um GrComb destacado em Quinhamel, ficando na dependência do BCAÇ 600.


Foto 2 – Bissau (1964) - Grupo de militares da CCAÇ 508 junto ao monumento "esforço da raça". [Foto do álbum de Cândido Paredes, com a devida vénia]


Em 15Nov64, a CCAÇ 508 regista a quarta baixa, com a morte, por afogamento no Rio Geba, em Bafatá, de um soldado. Em 08Fev65, outra baixa, a quinta, desta vez provocada pelo levantamento de uma mina em Jabadá.

Porém, no início de Março de 1965, com dezoito meses já contabilizados na "fita do tempo" da sua comissão ultramarina, a Companhia do Capitão Meirelles é informada da sua transferência (a última) para uma zona operacional.


2.2. SÍNTESE OPERACIONAL DOS ÚLTIMOS CINCO MESES

Em 07 e 23Mar65, por troca com a CCAÇ 526, a CCAÇ 508 deslocou-se, por fracções para Bambadinca, onde ficou instalado o Comando da Companhia, assumindo a responsabilidade do respectivo subsector, com grupos de combate destacados em Xime e Galomaro e ficando integrada no dispositivo e manobra do BCAÇ 697, sediado em Fá Mandinga, sob o comando do TCor Mário Serra Dias da Costa Campos.

Antes da sua chegada ao Leste, cujo sector passou a designar-se por «Sector L1» a partir de 11Jan65, o BCAÇ 697, para desenvolver a intensa actividade operacional, corolário da planificação, comando e controlo das diversas acções, como eram as missões de patrulhamento de reconhecimento e de recuperação das populações da região, recorria às subunidades do sector e a outras que lhe eram atribuídas como reforço, pois era constituída somente por Comando e CCS.

Uma das primeiras acções planeadas pelo BCAÇ 697, do início de 1965, tinha por objectivo a ocupação seguida da instalação de um aquartelamento na Ponta do Inglês (Mata do Fiofioli). Essa missão, baptizada de «Operação Farol», foi agendada para os dias 19 e 20Jan, envolvendo forças da CCAÇ 526, CCAV 678 e Pel AMetr "Daimler" 809, onde, depois, ficou instalada a Companhia de Cavalaria para, a partir de 16Abr65, data em que foi criado o subsector do Xime, ficar reduzida a nível de grupo de combate.

Durante o decorrer desta operação, as NT foram emboscadas, no primeiro dia, pelos guerrilheiros do PAIGC, tendo este sofrido algumas baixas não estimadas e onde foi capturado algum material e guerra, nomeadamente granadas de mão e de RPG. No dia seguinte, forças da CCAÇ 526 e CCAV 678, durante a sua actividade de segurança à distância e por efeito de um reconhecimento na área da Ponta do Inglês-Buruntoni, destruíram um acampamento IN com 15 casas a cerca de 600 mts a sul da antiga tabanca da Ponta do Inglês, tendo capturado mais munições diversas, onde foram encontrados alguns abrigos no lado sul da Ponta do Inglês-Xime, no local da emboscada do dia anterior, onde foram destruídas mais duas casas, a leste da Ponta do Inglês.

Com a criação do novo subsector do Xime, a CCAÇ 508 seria substituída em Bambadinca pela CCAV 678 (que se encontrava na Ponta do Inglês), deslocando-se, então, para o Xime, onde assumiu a responsabilidade deste subsector, com grupos de combate destacados em Ponta do Inglês e Galomaro.

Em 20Abr65, quatro dias após a instalação do GrComb da CCAÇ 508 na Ponta do Inglês, um GrComb de Paraquedistas (CCP 121), durante a «Operação Coelho» na zona de Galo Corubal, destruiu 12 casas, abateu um guerrilheiro e fez dois prisioneiros. Forças da CCAÇ 510, vindas do Xitole, destruíram várias casas na região de Silibalde e apreenderam granadas de mão ofensivas e defensivas.

Em 27Mai65, a CCAÇ 508 regista a sexta baixa, com a morte em combate, no Xime, de um soldado condutor.

Uma semana depois, em 03Jun65, na estrada Xime-Ponta do Inglês, na região da Ponta Varela, a CCAÇ 508 tem mais quatro baixas em combate, sendo uma a do seu Cmdt, o Capitão Francisco Meirelles, por efeito do rebentamento de uma mina "bailarina" [P-III]. (*)


Foto 3 – Ponta Varela (Xime), 03JUN1965. Momentos após a explosão que vitimou o Cap Francisco Meirelles, o 1.º Cb José Corbacho, o Sold Domingos Cardoso e o Caç Nat Braima Turé, todos da CCAÇ 508 [foto gentilmente cedida pelo Cor Morais da Silva].


Foto 4 – Ponta Varela (Xime), 03JUN1965. Momentos após a explosão que vitimou quatro camaradas da CCAÇ 508, entre eles o Cap. Francisco Meirelles [foto gentilmente cedida pelo Cor Morais da Silva].

Em 06Ago65, após a chegada da CCAÇ 1439 para treino operacional, a CCAÇ 508 foi rendida no subsector do Xime por forças da CCAV 678, recolhendo imediatamente a Bissau, a fim de efectuar o embarque de regresso ao Continente, após dois anos de comissão, onde contabilizou uma dezena de baixas.

A viagem de regresso iniciou-se a 07Ago65, sábado, a bordo do vapor «Alfredo da Silva», com a chegada ao cais de Alcântara, Lisboa, a ter lugar sete dias depois.


3.  A ACTIVIDADE OPERACIONAL DO CAP FRANCISCO MEIRELLES E DA SUA UNIDADE ANTES DA SUA MORTE EM 03JUN1965

Fazendo parte do dispositivo e manobra do BCAÇ 697, estavam atribuídas à CCAÇ 508 todas as missões emanadas do comando do «Sector L1», nomeadamente: patrulhamentos de reconhecimento, contactos com as populações da região e o competente enquadramento dos grupos de milícias em regime de auto-defesa.

Neste âmbito, recupero um fragmento publicado no livro do Capitão Meirelles (pp 35-37), extraído de um artigo escrito por Amândio César (1921-1987), que fora lido, na íntegra, aos microfones da Emissora Nacional e que, posteriormente, foi publicado no «Diário do Norte» de 19 de Outubro de 1965.

Este texto está, ainda, plasmado no livro, «Guiné, 1965: Contra-ataque», Braga, Editora Pax, 1965, 229 pp., Colecção: Metrópole e Ultramar, de que é autor Amândio César, cuja capa se reproduz abaixo.

O texto tem por título: «Em Bambadinca – Uma tabanca em auto-defesa».

[…]

"Foi na companhia do Capitão Torres de Meirelles que visitei uma tabanca em auto-defesa, uma das muitas tabancas onde a população civil, devidamente preparada pela nossa tropa faz frente aos eventuais ataques dos salteadores, a soldo de potências estrangeiras inimigas. Segui no «jeep» do Capitão Torres de Meirelles e, desta nossa visita, ficou-me a recordação das fotografias que tirámos, uma das quais neste mesmo «jeep», exactamente quando saímos da Tabanca de Amedalai, a caminho de Bambadinca para o salto ao aeroporto [Bafatá].

A tabanca estava devidamente guardada e vigiada, sem que nós nos apercebêssemos do facto. Os seus moradores surgiam diante de nós, como por encanto, trazendo as suas espingardas, o seu armamento, nos seus trajos característicos. Era a autêntica guerra patriótica, sentida e vivida pela população pacífica que as eventualidades do destino tinham transformado em guerreiros valentes e intimoratos. Percorremos toda a tabanca, entrámos nas casas dos seus naturais, praticámos o seu viver do dia-a-dia. O Comandante Cyrne de Castro conseguiu uma bela tábua, onde, em marabu, se ministrava os ensinamentos do Corão. (…) As fotos chegaram-me às mãos, mandadas a 30 de Maio [de 1965], da Guiné. Dias depois o Capitão Torres de Meirelles encontrava a morte; foi a sua última recordação…".

Vd. Foto 5 e Foto 6 (acima reproduzidas]

Outro fragmento a merecer relevância neste contexto, reporta-se a uma entrevista dada em Bambadinca pelo Capitão Meirelles ao locutor Fernando Garcia (1926-2015) e transmitida pela Emissora Nacional, depois de ser pública a notícia da sua morte.

Assim, em 8 de Junho de 1965 [vai fazer cinquenta e quatro anos], a Emissora Nacional transmitiu essa reportagem radiofónica na qual se incluía a entrevista acima referida, obtida na Guiné com o Capitão Meirelles, onde aquele locutor [FG] a fez preceder de algumas palavras evocativas da sua memória.

Eis as primeiras palavras: "A Emissora Nacional vai transmitir hoje mais uma reportagem realizada na província ultramarina da Guiné, onde os soldados portugueses estão a levar a cabo uma obra a todos os títulos notável." (…)

Segue-se a transcrição da entrevista:

Introdução: - "De Bambadinca fala a reportagem da Emissora Nacional. Em Bambadinca está instalada uma unidade militar. Bambadinca quer dizer em mandinga – Cova do Lagarto – talvez até devido ao facto de neste lugar existirem bastantes lagartos. Neste momento vai partir uma operação de patrulha, operação de rotina que se regista frequentemente, cremos que diariamente, ou até mais do que uma vez por dia. Em qualquer caso nós vamos conversar com o Capitão Torres de Meirelles [CM], encarregado do comando desta coluna militar.

FG – Ora, quer falar-nos desta operação de patrulhamento e dizer-nos como é que ela se costuma processar?

CM – Esta operação de patrulhamento, como disse, é absolutamente de rotina. Executa-se várias vezes por dia, tanto com tropas de linha, caçadores europeus, como com tropa nativa, caçadores nativos. Todos os dias e várias vezes ao dia todo o terreno da nossa região é batido por patrulhamentos de reconhecimento, mantendo assim as populações debaixo de um estado de segurança e de alerta.

FG – Quer dizer, portanto, que para além do facto de procurar desfeitear o inimigo, onde quer que ele surja, compete também a esta unidade e a estas colunas de patrulhamento vigiar as populações e velar pela sua segurança?

CM – Exactamente, se bem que a população dentro desta área, que é muito grande, está em regime de auto-defesa. O pessoal das tabancas defende-se a si próprio, isto é, está armado e defende-se a si próprio.

FG – Quer dizer, portanto, que há muita confiança em toda a população?

CM – Absoluta, absoluta.

FG – Se assim não fosse não seriam entregues armas para eles se defenderem no caso de qualquer ataque inimigo.

CM – Exactamente.

FG – Agora, uma vez que vamos partir, agradecemos estes esclarecimentos e voltaremos a contactar consigo ou no meio desta operação ou até depois da missão terminada.

CM – De acordo.
……

FG - Terminou já esta operação de patrulha de uma coluna militar. De novo em Bambadinca vamos procurar registar agora a opinião final do Capitão Meirelles, que comandou esta coluna militar. Entretanto, nada de novo. Missão cumprida e nada de especial surgiu nesta operação de patrulha. Durante o caminho, conforme o Capitão Meirelles já nos havia confiado à partida, encontrámos vários elementos civis armados, pois eles próprios fazem a vigilância e patrulhamento desta região. Depois de termos visitado o lugar de Amedalai, saímos, tomámos de novo a estrada [de terra batida] e regressámos ao aquartelamento de Bambadinca. A coluna militar continua a entrar no aquartelamento. Mais alguns veículos dirigem-se para o local onde nos encontramos. Num desses veículos veio o Capitão Meirelles que comandou esta operação. Ele acaba de chegar. Vários outros carros seguem-no e nós vamos trocar impressões com ele.

FG – Capitão Meirelles: gostaríamos, agora, que depois de terminada esta operação de patrulha nos confiasse o que se passou, muito embora tivéssemos tomado parte dela.

CM – Ora bem, nós fomos daqui, como viram, a Amedalai. Esta estrada tem tabancas perto e portanto tem pessoal armado e está mais ou menos defendida. O único cuidado que há a ter é com o problema das minas que podem ser instaladas na estrada. Para isso levamos equipas de batedores bastante expeditos com aqueles utensílios que viram e que se parecem com os engaços da Metrópole. Vão picando a estrada toda e vão vendo se há alguma coisa. Aqui nesta zona já foram caçadas bastantes minas, bastantes, mesmo, e nunca rebentou nenhuma.

FG – Ah! Nunca rebentou nenhuma?

CM – Não. Nunca rebentou nenhuma. Foram todas detectadas.

FG – Hoje, porém, nesta operação não foi encontrada qualquer mina?

CM – Não. Não foi encontrada mina nenhuma. De resto é natural, pois logo de manhãzinha cedo veio um grupo de pesquisadores que percorreu estra estrada em que nós seguimos, em sentido inverso e fez a pesquisa das minas. Esse grupo é de nativos, caçadores nativos

FG – Quer dizer, portanto, que se tivesse havido minas já eles as tinham detectado?

CM – Sim, já as tinham detectado e nós íamos lá levantá-las.

FG – Não lhe parece que é um caso de certo modo singular o facto de haver várias minas espalhadas por uma estrada e todas elas serem detectadas até hoje?

CM – É. Revela uma eficácia bastante grande do grupo de pesquisadores e também bastante sorte, pois para isso nestes casos é preciso sorte. É preciso sorte para encontrar as minas, pois às vezes podem não se encontrar.

Também foram entrevistados na mesma reportagem: o Senhor Tenente-Coronel Mário Campos, Cmdt do BCAÇ 697; o regedor de Badorá, Mamadu Sanhá e o soldado fula Samba Valdé. (op.cit, pp. 27-29)

Termina, dizendo:

De Bambadinca falou a reportagem da Emissora Nacional em serviço na Província da Guiné com as Forças Armadas Portuguesas. Ouviram «Missão de Soberania», reportagem pelas Forças Armadas em serviço da Província Ultramarina da Guiné em colaboração com a Defesa Nacional – Serviço de Informação Pública".

Continua…
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Fontes consultadas:

Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 6.º Volume; Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro I; 1.ª edição, Lisboa (2014); p.195.

Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 7.º Volume; Fichas das Unidades; Tomo II; Guiné; 1.ª edição, Lisboa (2002); p.321.

Capitão Francisco Xavier Pinheiro Torres Meirelles (s/d). Braga. Editora Pax.

Outras: as referidas em cada caso.


Termino, agradecendo a atenção dispensada.

Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.

Jorge Araújo.

04ABR2019.
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Vd. postes anteriores:

23 de março de 2019 > Guiné 61/74 - P19613: (De)Caras (102): Capitão de Infantaria Francisco Meireles, cmdt da CCAÇ 508, morto em Ponta Varela, Xime, em 3/6/1965 - Parte II (Jorge Araújo)

18 de maro de 2019 > Guiné 61/74 - P19597: (De)Caras (101): Capitão de Infantaria Francisco Meireles, cmdt da CCAÇ 508, morto em Ponta Varela, Xime, em 3/6/1965 - Parte I (Jorge Araújo)

Guiné 61/74 - P19655: Parabéns a você (1600): José Augusto Miranda Ribeiro, ex-Fur Mil Art da CART 566 (Guiné, 1963/65)

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Nota do editor

Último poste da série de 7 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19653: Parabéns a você (1599): António Rocha Costa, ex-Alf Mil Op Esp da CCAV 2539 (Guiné, 1969/71); Fernando Manuel Belo, ex-Soldado Condutor Auto do BCAV 8323 (Guiné, 1973/74) e Mário de Azevedo, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 6 (Guiné, 1970/72)

domingo, 7 de abril de 2019

Guine 61/74 - P19654: (Ex)citações (352): O amendoim ('mancarra'), a semente do Diabo ('Iblissa', em fula) (Luís Graça / Cherno Baldé)


Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > BART 2917 (1970/72) > Tabanca fula em autodefesa do Regulado de Badora ou talvez do Regulado do Corubal, como Sansancuta... Crianças.

Foto: © Arlindo T. Roda (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Ano
Mil toneladas
Mil
contos
Contos por tonelada
1960
24,0
78,8
3,27
1961
40,0
126,3
3,17
1962
38,7
133,3
3,44
1963
36,6
124,7
3,41
1964
34,0
119,2
3,50
1965
15,2
64,3
4,23

Quadro  - Exportação do amendoim (1960-1965). Há uma evidente quebra das exportações com o início da guerra, e mais acentuadamente em 1965. O valor máximo das exportações, em milhões de escudos, foi em 1962, com um um total de 133,3 (o equivalente hoje a cerca de 54,2  milhões de euros. Em 1965, esse valor baixou para 64,3 milhões de escudos (o que equivaleria hoje a c. 25, 2 milhões de euros. 

Fonte: Adapt. de Dragomir Knapic - Geografia económica de Portugal: Guiné. Lisboa: Instituto Comercial de Lisboa, 1996, 44 pp., policopiado.

1. Comentários ao poste P19648 (*)

(i) Luís Graça:

Meu caro Mário: obrigado pro mais esta "pepita de ouro" para a historiografia da presença portuguesa na Guiné... Ao ler o excerto do documento que "descobriste" na Sociedade de Geografia, passo a perceber melhor o sentido da expressão, que ouvi aos fulas do regulado de Corubal, "Mancarra, semente do diabo"... Se o Cherno Baldé me ler, que me corrija... 

De qualquer modo há aqui um grande sabedoria africana, alicerçada na experiência (amarga) da imposição a África, pelo colonialismo europeu, no séc. XIX, da cultura das oleaginosas...

Vd. aqui um excerto de um poste que publiquei há 12 (!) anos, como o tempo passa!(**)


(...) É interessante notar que na mitologia fula a mancarra (amendoím) esteja associada ao Diabo em pessoa (Iblissa).

O cherno Umaru, que dirige uma pequena escola nesta tabanca de Sansancuta, do regulado do Corubal, e que se prepara, como bom muçulmano devoto (Tijanianké), para fazer no próximo ano a sua peregrinação a Meca (Iado Hadjo, em fula) e assim juntar ao seu nome o título venerando de Al-hadj, contou-me, por intermédio do José Carlos Suleimane Baldé (o meu braço direito, guarda-costa, intérprete, cozinheiro, secretário – é um dos nossos poucos soldados que sabe ler e escrever português, daí ser soldado arvorado e em breve 1º cabo (...) - contou- me ele a seguinte estória:

- Um dia Iblissa (o Diabo) quis desafiar a autoridade divina de Mohamadu (o Profeta Maomé). Tinha chovido muito e o Profeta dissera que então nasceriam todas as sementes que fossem lançadas à terra. O Diabo, em vez de uma semente de milho ou de arroz, deitou leite numa cova que ele próprio tinha feito no chão. Mohamadu, intrigado e inquieto com a provocação de Iblissa, foi falar com Alá, que lhe mandou guardar uma semente. E, ao fim desse tempo, não é que do leite nasceu mesmo a mancarra ? (...)


(ii) Cherno Baldé:

Caro amigo Luis,

Já conhecia a mitologia fula sobre a origem da mancarra, todavia, vivendo no meio social fula desde a nascença, não me suscitou especial curiosidade porque não há uma nem dez, são centenas de mitologias à volta dos mais diversos assuntos que, à partida, não faziam parte da vida social, económica e cultural dos fulas.

No caso particular da mancarra que os fulas descobriram primeiro no Senegal e depois na região do Rio Grande de Buba (Guinala) é, antes do mais, um produto associado ao homem branco e logo ao Diabo em pessoa. 


Se a este facto acrescentarmos o factor trabalho intensivo que a produção deste produto exige, não é de estranhar que os indígenas tivessem uma clara aversão à sua prática, o que justificaria a sua diabolização.

Já a partir dos anos 50 a sua produção estava tão vulgarizada e dispersa no território, devido à imposição dos impostos de capitação em parte, mas também pelo forte incremento e dinâmica que se assistia no vizinho Senegal, que este velho mito estava morto e enterrado. 


Antes do início da guerra, a principal actividade, na zona leste, estava associada ao seu cultivo e comercialização e, pelo meio, um salto até ao Senegal (durante a campanha sazonal da colheita da mancarra) para os jovens, para angariação de um pé de meia antes do primeiro casamento.

Com o início da guerra, a ida à tropa/milícia substituiu em parte esta prática iniciada desde o séc. XIX e diminuiu a produção deste produto, antes de desaparecer com a independência.

Certamente, o "Iblissa" (o diabo) dos fulas dos séc. XVIII/XIX e XX, está intimamente ligado ao desenvolvimento do capitalismo internacional na sua frenética voracidade de acumulação do capital e neste sentido emergimos da arcaica mitologia indígena para a realidade do mundo em rápida globalização a que nenhum povo do planeta escapou.

Um abraço amigo,

Cherno Baldé (***)

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(*) Vd. poste de 4 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19648: Historiografia da presença portuguesa em África (156): Um relato histórico guineense do maior interesse: O documento do capitão Caetano Filipe de Sousa, de 1883 (Mário Beja Santos)

(**) Vd. 14 de agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2048: Cusa di nos terra (4): Mancarra, semente do diabo (iblissa, em fula) (Luís Graça)

(***) Último poste da série > 6 de março de 2019 > Guiné 63/74 - P19557: (Ex)citações (351): Manel Pereira, amigo e camarada. Reencontro em Monte Real. (José Saúde)

Guiné 61/74 - P19653: Parabéns a você (1599): António Rocha Costa, ex-Alf Mil Op Esp da CCAV 2539 (Guiné, 1969/71); Fernando Manuel Belo, ex-Soldado Condutor Auto do BCAV 8323 (Guiné, 1973/74) e Mário de Azevedo, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 6 (Guiné, 1970/72)



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Nota do editor

Último poste da série de 6 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19651: Parabéns a você (1598): Joaquim Mexia Alves, ex-Alf Mil Op Esp da CART 3492, CCAÇ 5 e CMDT do Pel Caç Nat 52 (Guiné, 1971/73)

sábado, 6 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19652: Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (8): Bom bias, Roberto, Bom bias, seleçom.... Ou as misérias e grandezas do andebol na Guiné-Bissau!

1. Oitava  crónica do Luís Mourato Oliveira, nosso grã-tabanqueiro nº 730, que foi alf mil inf, de rendição individual, na açoriana CCAÇ 4740 (Cufar, 1973, até agosto) e, no resto da comissão, o último comandante do Pel Caç Nat 52 (Setor L1 , Bambadinca, Mato Cão e Missirá, 1973/74): é lisboeta,fezo Liceu Pedro Nunes, é bancário reformado, foi praticante e treinador de andebol, tem fortes ligações à minha terra natal, onde agora vivo, Lourinhã, Oeste, Estremadura...

Chegou a Bissau, a 2 de março de 2019, e aqui vai estar 3 meses como voluntário na Escola Privada Humberto Braima Sambu, no âmbito de um projeto da associação sem fins lucrativos ParaOnde, que promove o voluntariado em Portugal e no resto do Mundo.


Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (8): Andebol... Bon bias (boa viagem)

por Luís Oliveira


O andebol na Guiné-Bissau é um parente pobre do desporto tal como infelizmente acontece em Portugal, onde o futebol é rei e quase sempre pelos piores motivos, mas ser ignorado num país pobre e com muitas dificuldades é muito pior.

O projecto que me encaminhou para a Guiné-Bissau foi a criação de uma “oficina de andebol” na escola privada Humberto Braima Sambú. 


Dado não ter competências nas áreas de educação formal e mesmo no que se refere ao andebol, embora tenha sido praticante, treinador e dirigente, apenas fiz o curso de treinadores do segundo grau vocacionado para a formação de jovens andebolistas, foi esta a forma de dar o meu ínfimo contributo para este povo de quem tanto gosto.

Desde que a minha candidatura foi aceite, tentei actualizar conhecimentos, planeei sessões de treino, contei com a generosidade da D. Ana Maria Cabral, da Associação de Andebol de Lisboa com a doação de materiais que, embora usados, muita utilidade têm aqui, adquiri bolas e pinos destinados ao treino e tudo isto dirigido para escalões de formação Bambis e Iniciados.

Só que para planificar há que ter um conhecimento de todos os factores em análise e das suas variáveis e ignorei que a realidade da população escolar diverge do que estava habituado. Desde o primeiro ao sexto ano do ensino básico na Guiné-Bissau coexistem alunos dos 9 aos 18 anos ou por vezes até mais velhos.

Após quase duas semanas a aguardar o resgate dos materiais enviados de Lisboa, tive a feliz surpresa de ver um grupo a jogar à bola com a mão e dirigi-me de imediato para o campo onde estava a decorrer um jogo, sendo os participantes maioritariamente do sexo feminino.

Após o apito final interpelei os jovens que me pareciam dirigir aquele jogo e fiquei a saber pertencerem a um clube, Academia de Brá. Treinam num campo de reduzidas dimensões, parte integrante de instalações criadas por uma ONG no Bairro Militar .

Conversa de apaixonados pela modalidade levaram a que me convidassem de imediato a cooperar com eles e no dia seguinte às sete da manhã começo o primeiro dia de treinos na Guiné.

Planos de treino dirigidos para Bambis e Iniciados é para ignorar. Aparecem crianças e jovens adultos e há que ser flexível e adaptar à realidade do jogar a bola à mão!

Reorganizámos o horário dos treinos, dois diários das 7.30 às 10.30 e das 16.30 às 18.30, separámos o treino por escalões etários aceitáveis e começou a aventura.

O entusiasmo foi aumentando, a escola privada Humberto Braima Sambú finalmente resgatou os materiais que estavam nos correios e fez uma cerimónia simbólica da entrega destes ao Presidente da Associação de Alunos e passados três dias no treino da tarde aparecem mais de sessenta candidatos a andebolistas de todos os tamanhos e idades. 

Quase entrei em pânico, não podia excluir ninguém, porque o principal propósito do desporto de formação é a inclusão, não tinha materiais nem espaço útil para fazer andebol mas tinha que fazer qualquer coisa e as bolas 00 destinadas a iniciação tinham que acariciar as mão adultas de muitos candidatos.

Reuni com o Edmilsom e com o Yaiai e avançámos. Tivemos de abdicar de alguns candidatos a jogadores que se apresentavam ao treino de chinelos ou havaianas explicando os riscos que eles próprios corriam sem a utilização de calçado adequado, as senhoras foram convidadas a retirar fios e brincos e ainda de aparecerem de unhas cortadas no próximo treino e começamos o que eu comparo a uma viagem de dez pessoas no mesmo táxi.

Tudo devagarinho para ninguém se aleijar no campo cimentado e com barreiras laterais do mesmo material. Aqui ninguém tem seguro e os serviços de saúde são de evitar.

Lá se fez o treino, as bolas foram experimentadas por todos os participantes e toca a reorganizar.

Da Escola Humberto Braima Sambú, apareceram já sessenta e quatro inscrições de interessados que vão dos 10 aos 18 anos (idade que decidimos ser a limite para a actividade), os dois treinos diários passaram a quatro na próxima semana, de modo a não exceder os vinte jogadores por treino e cá vamos passo a passo com a bola na mão.


Andebol... Bon bias II

Roberto Sá, licenciado pela Escola Superior de Educação Física de Bissau com a especialização de Andebol, antigo praticante, treinador e actualmente secretário da direcção Técnica da Federação de Andebol da Guiné-Bissau e quem coordena todo o trabalho da Academia de Brá, pediu-me para no passado domingo, dia 24 de Março estivesse no campo de jogos pelas sete horas. 

Embora não estivesse programada qualquer actividade e sendo o Roberto homem de poucas palavras, anuí sem nada perguntar e lá nos encontrámos à hora marcada. Apanhámos o TocaToca e rumámos ao estádio Lino Correia no centro de Bissau. Tratava-se do treino da selecção feminina da Guiné-Bissau que irá participar num torneio na Mauritânia.

Fiquei muito honrado com o convite mas tive a noção da fragilidade daquela selecção resultante da total ausência de condições de treino e de um calendário competitivo que eleve o nível físico, técnico e táctico exigido a uma seleção representativa de um país.

Durante a semana fomos dialogando sobre o atraso na partida da selecção devido a imensa burocracia da entrega dos passaportes das atletas bem como da inscrição dos vistos, situação que ia preocupando cada vez mais o Roberto. 

A data limite prevista para a partida era hoje, sexta-feira 29 de Março ainda ontem, véspera da partida não estavam concluídos os processos burocráticos e surgiu um novo obstáculo. A selecção não dispunha de equipamentos suficientes para as atletas nem de um alternativo como é obrigatório. O equipamento existente tinha sido oferecido há dez anos à Federação pelo comité olímpico e a partir daí mais nenhum apoio foi concedido.

O Roberto já tinha pedido um equipamento de guarda redes ao Romário, Presidente da Associação de Alunos da Escola Humberto Braima Sambú, mas a única solução expedita para resolver o problema era a utilização de um dos muitos equipamentos doados pela A.A.L. e telefonámos ao Romário que se reuniu connosco no campo enquanto decorria o treino. O jovem que já tinha cedido um equipamento de guarda redes mostrou-se relutante e solicitou uma carta formal da Federação para reunir com os restantes membros da direcção e decidirem o empréstimo.

Eu não queria acreditar!

A Federação não tem secretaria, não tem computador nem impressora e só estas limitações inibiam a apresentação da carta exigida antes da data de partida.

Eu tinha criado uma folha de requisição para controle da utilização materiais e equipamentos e achava ser suficiente a utilização desse documento ficando a responsabilidade de entrega por parte da Federação...mas não! 

Pela primeira vez desde que cheguei à Guiné-Bissau utilizei o meu mais vernáculo vocabulário de caserna o que deixou os interlocutores surpreendidos. Os equipamentos tinham sido cedidos gratuitamente, o custo suportado na expedição corresponde a cerca 550.000 F (850,00 €) eu próprio contribuí com cerca de 40.000 F (65,00 €), a escola tem roupa para equipar dez equipas de andebol sem ter tido praticamente qualquer custo mas o vício da burocracia que contagia e atrasa este povo sobrepunha-se ao dever patriótico de apoiar a seleção do próprio País!

Sugeri uma carta a entregar posteriormente com os equipamentos requisitados, a agradecer a amabilidade da escola, mas a coisa mantinha-se num impasse e eu já sugeria que as miúdas jogassem em calcinhas e soutien com o número escrito a marcador nas costas para vergonha de todos os que amarraram a equipa a tal situação.

O Roberto entretanto fazia telefonemas com uma serenidade que admiro e invejo e passado quase uma hora apareceu o Mário Jorge, também técnico da Federação com a tal missiva. Sorte o Mário Jorge ser polícia e estar de serviço na esquadra do Bairro Militar e aí dispor do necessário para o efeito.

Os equipamentos, guardados num contentor comercial de um familiar do professor Humberto, dado a escola não reunir condições de segurança para o efeito, lá foram entregues e mais um obstáculo ultrapassado e o equipamento alternativo da seleção da Guiné-Bissau ostentará o emblema da Associação de Andebol de Lisboa.

O Roberto Sá é um herói, há onze anos que rema para manter vivo o Andebol na Guiné-Bissau. O seu amor pela modalidade arrastou vários jovens que com ele há sete anos trabalham no processo de formação de jogadores, alguns pagando 400 Fancos por dia em deslocações em TocToc para o Bairro Militar, são um exemplo de resiliência, de esforço pessoal com uma motivação que resulta apenas do seu grande amor pela modalidade.

Hoje pelas 11.00 horas tive um telefonema do Roberto, o homem de poucas palavras.

-Luís,  o stress está a passar, vamos agora partir para a Mauritânia.

Vão de autocarro! Chegar ao norte da Guiné-Bissau já é uma viagem penosa devido ao estado deplorável das estradas, depois Senegal, a seguir Gâmbia e por fim lá chegarão à Mauritânia.

Independentemente dos resultados, o esforço de participar é inimaginável para os Europeus. A burocracia, a ausência de materiais e a inacreditável viagem de autocarro já faz esta equipa campeã.


Bom bias, Roberto, Bom bias, seleçom.

A minha homenagem e todo o meu respeito e admiração para:

Roberto Sá
Mário Jorge
Edmilson
Virgito
Yáia
Dona

Bissau, 29 de Março de 2019

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Nota do editor:

Último poste da série > 25 DE MARÇO DE 2019 > Guiné 61/74 - P19620: Voluntário em Bissau, na Escola Privada Humberto Braima Sambu - Crónicas de Luís Oliveira (7): O futebol e não só... O futebol faz parar a cidade... E se as mulheres guineenses parassem ?... Mais de metade da população morreria de fome.

Guiné 61/74 - P19651: Parabéns a você (1598): Joaquim Mexia Alves, ex-Alf Mil Op Esp da CART 3492, CCAÇ 5 e CMDT do Pel Caç Nat 52 (Guiné, 1971/73)

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Nota do editor:

Último poste da série de 4 de abril de 2019 > Guiné 61/74 - P19646: Parabéns a você (1597): Agostinho Gaspar, ex-1.º Cabo Mec Auto do BCAÇ 4612/72 (Guiné, 1972/74); António Dias, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2406 (Guiné, 1968/70); Hernâni Acácio Figueiredo, ex-Alf Mil TRMS do BCAÇ 2851 (Guiné, 1968/70) e José Eduardo R. Oliveira, ex-Fur Mil Enf.º da CCAÇ 675 (Guiné, 1963/65)

sexta-feira, 5 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19650: Tabanca Grande (474): João Afonso Bento Soares, ex-Cap Eng TRMS, STM / QG / CTIG (1968/70), hoje Maj Gen ref. senta-se à sombra do nosso poilão, no lugar nº 785


Guiné > Bissau > STM - Serviço de Transmissões Militares  / QG / CTIG  (Fev 1968/fev 1970)  > O comandante, no seu gabinete, o então cap eng trms, João Afonso Bento Soares

Foto (e legenda): © João Afonso Bento Soares  (2019) Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. Mensagem do João Afonso Bento Soares, na sequência do convite do nosso editor Luís Graça para passar a integrar a Tabanca Grande sob o nº 785. [Uma detalhada nota biográfica do nosso novo grã-tabanqueiro já foi publicada anteriormente, no poste P19645 (*)]

Data - quinta, 4 abr 2019 00:01

Assunto . Admissão na Tabanca Grande

Caríssimo Amigo: Bem-haja pela atenção havida na publicação do assunto proposto (*).

Igualmente grato pelo honroso convite de me integrar na Tabanca Grande pelo que gostosamente aceito então o nº 785 logo a seguir a um camarada amigo do meu tempo! [, o cor art ref Morais da Silva] (**)

Digitalizei uma foto no meu gabinete de Comandante do Destacamento do STM/Guiné, função que desempenhei no período de fev 68 - fev 70, como Cap Eng de Transmissões. Se a digitalização anexa não ficou aproveitável, diga-me para tentar outra alternativa.

Também já deve ter recebido o mail onde o Carlos Pinheiro refere como se integrou no STM em que prestou um excelente serviço.

Também anotei com prazer o facto de o meu amigo referir a sua aptidão para compor umas rimas. Pela minha parte sou um modestíssimo bardo. Ainda assim fiz, por exemplo, uma série de sonetos que apresentava nos convívios da CCE 266 (para que era convidado posteriormente à conclusão do assunto que publicou). Anexo um desses poemas.

João Afonso Bento Soares.
________________

VELHOS SOLDADOS 

É sempre muito grata a missão
De estar junto aos INFANTES neste dia,
Em preito de homenagem aos que então
Pertenceram à nobre COMPANHIA.

São bravos e valentes CAÇADORES
Unidos por um mesmo sentimento:
Honrar a Lusa Pátria e seus Valores,
E dela recolher merecimento.


Perdure neste Encontro a Amizade
Comungando momentos de Verdade
Nos pedaços de vida recontados…

Uma História que vem desde o Sertão
Tocando, bem no fundo, o coração
De cada um de vós: “VELHOS SOLDADOS”!

Com o muito amigo abraço aos Familiares
e “Velhos Soldados” da CCaç 266

João Afonso Bento Soares
Major General

Figueira da Foz aos 7 de Junho de 2008

2. Mensagem do Carlos Pinheiro, já publicada como comentário ao poste P19645 (**)

Fico grato ao camarigo Luis Graça pelo acolhimento cordial, franco e sincero que fez a este novo Tabanqueiro que, por sinal e mero acaso (, fui para a Guiné mobilizado, erm rendição individual, para o BCac 1911 que veio logo após a minha chegada aquele território onde nem sequer me mandaram apresentar,) foi meu Comandante na Guiné.

Andei por ali uns dias aos papéis e,  como já tinha uma experiência de 6 meses do STM no QG da 2ª RM (Tomar) onde exerci as funções da minha especialidade, assim, solitário em Bissau só perguntei onde era o STM e, depois de me terem dado as coordenadas, lá me apresentei e me ofereci para trabalhar no Centro de Mensagens do STM do CTIG, tendo sido aceite de imediato. 

Foram 25 meses, a maior parte debaixo do Comando do Capitão Bento Soares. Foram tempos dificeis, com muitas tragédias pelo meio - o caso da jangada  de Madina do Boé, o caso da morte dos 3 Majores, o caso da queda do Heli com os deputados e com o Capitão Andrade, que tinha sido meu Comandante na EPC em Santarém, onde todos morreram, o caso da operação Conacri a terminar a minha comissão - e tanta coisa mais, pelo que não esperaria outra atitude do Luís Graça. 

Parabéns a todos,  e boas vindas a esta Tabanca Grande do Major General João Afonso Bento Soares. 
Um abraço colectivo.

quinta-feira, 4 de abril de 2019

Guiné 61/74 - P19649: Agenda cultural (677): Apresentação do livro do Paulo Salgado, "Milando ou Andanças por África": 9 de abril, 18h00, Fundação Portugal África, Porto



Novo convite para a apresentação do livro do Paulo Cordeiro Salgado, nosso grã-tabanqueiro, administrador hospitalar reformado, "Milando ou Andanças por África" (Torre de Moncorvo: Lema d'Origem, 2019). (*)

Desta vez no Porto, na Fundação Portugal África (**)..

Sinopse:

Trata-se de  um livro de ficção,  englobando quatro andanças. São narradas as aventuras e desventuras de personagens reais que passaram por África e que merecem o respeito do autor.

Paulo Salgado foi alf mil cav, op esp, CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72), e é autor do livro "Guiné - Crónicas de Guerra e Amor".
É transmontano de Torre de Moncorvo.



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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 5 de fevereiro de  2019 > Guiné 61/74 - P19470: Agenda cultural (671): Lançamento do livro "Milando ou Andanças por África", do Paulo Salgado, na Associação 25 de Abril, Lisboa, 21 do corrente, às 18h00. Apresentação: cor cav ref Mário Tomé, ex-cmdt da CCAV 2721 (Olossato e Nhacra, 1970/72)

Guiné 61/74 - P19648: Historiografia da presença portuguesa em África (157): Um relato histórico guineense do maior interesse: O documento do capitão Caetano Filipe de Sousa, de 1883 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 24 de Julho de 2018:

Queridos amigos,

O documento da autoria do antigo administrador de Buba dá-nos a conhecer um modo de ver a decadência da então parcela mais próspera da colónia: as feitorias e o comércio de Buba. Não cabe no documento a notícia do que se estava a passar no Casamansa, onde por esta época o comércio francês já destronara o português, temos agora uma interpretação do que faziam os franceses e os vexames praticados pelas autoridades portuguesas, não só pelos maus tratos aos trabalhadores como pelo manifesto desinteresse no bom relacionamento com os chefes do Forreá. Era esta a situação que se vivia no período que precede a definição de fronteiras e começa a tornar-se claro que não possuíamos na Guiné Portuguesa um verdadeiro conceito nem de Justiça nem uma prática de bom tratamento das autoridades gentílicas.

Um abraço do
Mário


Um relato histórico guineense do maior interesse: 
O documento do capitão Caetano Filipe de Sousa, de 1883

Beja Santos

Nos Reservados da Sociedade de Geografia de Lisboa consta um documento datado de Bolama (4 de maio de 1883) e intitula-se “Duas palavras acerca da Guiné Portuguesa”, é seu autor o Capitão Caetano Filipe de Sousa, o documento é manuscrito, vale a pena reproduzi-lo quase na íntegra, tal o seu interesse para ouvir um testemunho ao tempo em que nascia a Província da Guiné e era claro que a França cercava a colónia no Casamansa e no Rio Nunes:

“Queixam-se hoje que a Guiné vai em decadência, e que a causa é esta ou aquela, mas ainda não ouvi dizer aos mais conhecedores daqui a verdadeira razão porque a Guiné Portuguesa chegou ao estado de abatimento em que actualmente está. Eu já em um pequeno relatório que dirigi à Secretaria Geral do Governo, em 1 de Abril de 1882, data em que entregava a administração de Buba ao meu sucessor, expus parte da verdadeira razão (a meu ver) que dá causa a tal abatimento; tive, porém, a infelicidade de ver que, até esta data, medida alguma se tomou no sentido daquele meu relatório, apesar de eu ter sido, por Sua Excelência o Governador, louvado na ocasião da sua apresentação; não deixo, porém, de prosseguir no meu intento, dando conhecimento à Sociedade de Geografia de Lisboa do que penso a tal respeito.

Nos anos de 1875 a 1879 houve uma grande concorrência de negociantes franceses no mercado da Guiné: as casas disputavam entre si qual havia de apresentar melhores e mais variadas fazendas e qual havia de ter o maior número de delegações no interior ou no litoral dos pequenos rios. Ao passo que, por um lado, os negociantes franceses pensavam por esta forma que os trabalhadores Fulas, Mandingas e outras raças saíam dos seus lares e estabeleciam-se nas feitorias do Rio Grande e outras e se entregavam com afinco à cultura da mancarra. Havia feitorias que tinham acima de 400 trabalhadores. Os trabalhadores, logo que se apresentavam ao feitor, este lhes punha por condição, entre outras, a seguinte: a todos a mancarra que se cultiva na minha feitoria deve ser entregue a troco de fazendas, espingardas, pólvora e tabaco, tudo à sua escolha, e qualquer trabalhador que faltar a esta condição e tente levar, seja qual for a quantidade de mancarra para outra feitoria ou casa comercial, perdê-la-á. O trabalhador, convicto de que não teria necessidade de negociar com outro a sua mancarra, pois que seu patrão teria na sua loja a fazenda de que ele carecesse, aceitou. Impunha-se também por condição ao trabalhador: aquele que provocasse desordem, ou cometesse algum crime, na feitoria, ser-lhe-ia retirada uma certa porção de mancarra (Buxulas). Os preços das fazendas eram moderados, não havia especulação por parte do feitor. Os negociantes, quer portugueses, quer estrangeiros, especialmente o comércio francês, parecia prosperar de uma maneira espantosa. 

Em Buba, por exemplo, havia tal abundância de negociantes e tão florido estava o comércio dali, que levou o Governador de Cabo Verde, em 1878, a querer que ali é que devia ser a capital do distrito. Mas quem fazia todo este barulho eram duas ou três casas francesas, que eram as que forneciam os pequenos negociantes portugueses. Estes, coitados, nem sequer conheciam que tudo o que se estava praticando para com eles era mais uma especulação que outra coisa. Os franceses procuravam entregar aos portugueses, proprietários de terrenos, a maior quantidade possível de fazendas, de modo que estes, fracos administradores como são, comprometeram as suas propriedades, em resultado do que já não são poucas as que estão entregues aos franceses, lembra-me o procedimento do BNU em Angola com relação a certas fazendas.

O que deixo dito era o que se fazia em quase toda a Guiné Portuguesa até 1879. Hoje, as coisas mudaram.

Os negociantes franceses, vendo que se davam mal com os grandes fornecimentos de 1875 a 1879 limitaram-se ao comércio de Bolama, dispensando apenas algumas fazendas e outros enfeites porém de péssima qualidade e aquelas de patrões antigos que mandam para as casas estabelecidas na feitoria, obrigando assim os trabalhadores a receber fazendas de que não gostam.

Os vexames que se praticam para com os trabalhadores são de tal ordem que bastante repugna aos estranhos que deles têm conhecimento e o trabalhador descontente fica em casa e diz: “Ganho mais caçando do que cultivando mancarra para vender.”

O documento prossegue com uma longa exposição sobre as arbitrariedades conhecidas, e o autor continua nos seguintes termos:

“As desordens que em qualquer feitoria há entre feitores ou empregados e trabalhadores e depois daqueles apresentarem à autoridade respectiva a sua queixa, acabam sempre pela prisão do trabalhador, mas sem forma alguma de processo. O modo de proceder de uma parte das nossas autoridades para com aquelas vítimas do trabalho é muito irregular e, no nosso ver, a maior base da decadência do comércio da Guiné, visto que ele consta quase exclusivamente da maior ou menor quantidade da colheita da mancarra, em cujos serviços são empregados os homens desconsiderados pelas autoridades portuguesas.

Eu penso que a principal causa da decadência é a falta de Justiça para com os trabalhadores.

Buba, o coração da Guiné, hoje para nada presta – mas porquê? As queixas constantes entre o gentio Fula Preto e Fula Forro, a falta de presença ao gentio, o receio constante que estes têm de que nós lhes tiremos os seus escravos e finalmente o mau acolhimento que hoje se dá em Buba ao chefe de uma ou outra tribo, tudo concorre para a completa decadência de Buba. Uma outra razão também concorre, e não pouco, para o actual estado de Buba, e foi a prisão impensada do primeiro-ministro do chefe do Futa.

Veio para Bolama e a nossa gente, descuidada sempre, deixou que ele fosse visitado pelos franceses e destas constantes visitas resultou a sua fuga. Continua a ser encaminhado o comércio para as feitorias francesas estabelecidas no rio Nunes. Os chefes do Forreá, quando hoje vêm a Buba nem sequer têm quem lhes dê um copo de água! Eles também têm a seu modo de se julgarem ofendidos. Em 1879, dava-se-lhes além de 8 mil pesos anuais, um fardo de fazendo e bugigangas de fantasia nas suas visitas extraordinárias. As duas ou três casas francesas ali estabelecidas tinham entre si uma espécie de escala e, por essa forma, recebiam os chefes, hoje, porém, todos os põem fora de casa!!! O Governo, por sua parte, tem consignado um presente de 100 mil reis anuais para os chefes do Forreá e Futa! Agora veja-se: os 8 mil pesos e presentes extraordinários, acompanhados de melhor acolhimento aos chefes ou os 100 mil reis e o desprezo a esses mesmos chefes. A fartura de fazenda que então havia ou a consideração dispensada aos trabalhadores ou a miséria atual e os repetidíssimos vexames que hoje se praticam para com esses mesmos trabalhadores.

Como remate, o desprestígio por parte das nossas autoridades aos indivíduos que mais podem concorrer para o engrandecimento comercial da Guiné Portuguesa.”





Extrato do Planisfério de Alberto Cantino, datado de 1502, e enviado ao Duque de Ferrara, é uma das mais importantes cartas náuticas e um documento histórico de valor incalculável. O extrato fala da Costa de África que tem a ver com a região que irá ser conhecida por Senegâmbia Portuguesa. Reproduzido do exemplar da Biblioteca da Sociedade de Geografia de Lisboa, com a devida vénia.
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Nota do edior

Último poste da série de 27 de março de 2019 > Guiné 61/74 - P19625: Historiografia da presença portuguesa em África (155): Missão de Estudo dos Movimentos Associativos em África, Relatório da Campanha de 1958, por J. M. da Silva Cunha (Mário Beja Santos)