segunda-feira, 23 de outubro de 2006

Guiné 63/74 - P1205: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (5): uma noite, nas valas de Guidaje





Guiné >Região do Cacheu > Guidaje > Novembro de 2000 > Romagem de saudade, dos tugas...

Fotos: © Albano M. Costa (2005) . Direitos reservados.

Continuação da publicação de algumas notas do diário do camarada A. Mendes, ex-1º Cabo Cmd da 38ª CCmds (Os Leopardos) (Guiné, Brá, 1972/74).

Texto: © Amilcar Mendes (2006).


11 de Maio de 1973 (continuação) (1)

 
Chega a noite. Mais um ataque. Desta vez e canhão sem recuo e morteirada. O IN sabe que esta uma Companhia de Comandos na vala e vai tentar a todo o custo causar-nos baixas, o que infelizmente vai conseguir. Nas valas, em estado de alerta, é impossível dormir. De bom em Guidaje só o facto de não haver mosquitos.


12 de Maio de 1973

Cerca das três horas da manhã rebenta um violento ataque ao destacamento que é de meter medo. O IN deve ter as coordenadas das valas pois o fogo acerta todo dentro das valas. O barulho rebenta com os ouvidos. Dura cerca de 30 m. São centenas de projécteis. É de dar em doido!

A nossa artilharia responde ao fogo e lá se consegue parar o ataque. Terminado o ataque vamos fazer a contagem e duas vozes não respondem. Um, o Soldado Comando Raimundo, meu camarada de grupo, um moço da [Azambuja],  a quem nunca mais ouvirei a sua voz; outro, um soldado condutor que tinha vindo connosco. Ficaram os dois desfeitos na vala com morteirada 120 mm.

Ainda durante a noite iremos sofrer novo ataque mas mais ligeiro.

Com a chegada da manhã os rostos de tristeza vão-se descobrido mas é preciso reagir. Com um ano de Guerra, o factor morte já não nos afecta assim tanto, já aprendemos a conviver com ela de perto, só temos de arranjar maneira de a ir iludindo.

Recebemos ordens para sair para a mata.Vem outra coluna a caminho, escoltada pelo Fuzos e nós vamos ao seu encontro para lhes dar apoio ate Guidaje. Antes de sair, fui ao abrigo-enfermaria (?) ver o Filipe: continua inconsciente, a perna começa a gangrenar e tem que ser evacuado com urgência, mas isso está fora de questão pois os misséis Strella estão à espreita da nossa aviação.

Fomos ao encontro da coluna e assim que chegamos ao destacamento, novo ataque. Pelas minhas contas tera sido o 6º. Com a noite voltamos para as valas.

O nosso estado psicológico era tal que quando no silêncio se ouvia um barulho de alguma coisa a bater corríamos logo para a vala. No ataque à chegada dos fuzileiros, o furriel Marchão do meu grupo ficou crivado de estilhaços mas sobreviveu.

_________

Nota de L.G.

(1) Continuação do post anterior, P 1204

Sem comentários: