Excerto da carta enviada pelo ex-capitão miliciano Armando Figueiras ao Albano Costa, em 7 de Maio de 2006 sobre os restos mortais do soldado Manuel Agostinho Mendonça Oliveira, da CCAÇ 4150 (Guidaje, 1973/74).
Imagem gentilmente cedida pelo Albano Costa (2006)
Guiné > Região de Cacheu > Guidage > CCAÇ 4150 (1973/74) > Vista panorâmica do quartel de Guidage. Dezembro de 1973
Foto: © Albano Costa (2005)
Texto Albano Costa (ex-1º cabo da CCAÇ 4150, Guidage, 1973/74):
Caro Luís Graça
Sobre a reportagem [da RTP1] dos mortos que ficaram na Guiné, eu sempre o soube... Aliás em Guidage, zona aonde eu cumpri parte do meu serviço militar, foi com uma certa tristeza que, quando viemos embora de Guidage, eu tinha a consciência que lá tinham ficado colegas nossos que foram obrigados a ir para a guerra e que o nosso Estado não se achou com a obrigação de os devolver às famílias. Isso, todos os governos antes e depois do 25 de Abril devem assumir que falharam e muito, porque não venham dizer agora que não têm dinheiro, ou que é muito difícil. Não, não era, porque nós ficámos sempre com muitas boas relações com o povo guineense.
Faço, pois, um alerta ao actual e futuros governos: tragam os nosso mortos para as suas terras, e entreguem às suas famílias.
Mas eu já nada me surpreende!... Fomos carne para canhão, e salve-se quem puder, foi o lema do regime da altura. E esta democracia, o lema foi e é sempre, não é nada com nós, eles (os familiares) que resolvam!...
Agora vou contar como foi o tratamento que o Estado deu ao colega da minha companhia [CCAÇ 4150] que morreu em Guidajge: fez-se o funeral, um funeral digno, de Guidage para Bissau, e julgando que ele iria continuar a ter um funeral digno até ser entregue aos seus familiares, para minha tristeza venho a saber, ao fim de quase trinta anos (!), que o enviaram para Portugal e aí sepultaram-no no cemitério do Lumiar, em Lisboa - Sepultura nº14, do Talhão do Ministério do Exército.
Eu aí contactei o ex-capitão da minha companhia, que ficou admirado, e entrou em contacto com a familia. Os familiares também ficaram admirados, já que na altura foram informados que o corpo tinha ficado sepultado em Bissau. Por sua vez, os pais faleceram com a mágoa de não ter o filho por perto... Por isso, hoje nada me surpreende.
Envio parte da carta (1) da conversa tida pelo meu ex-capitão com os familiares, para que fique resistado para a história. Realmente é preciso que não se deixe que os historiadores amanhã queiram fazer a história à maneira deles.
Um abraço,
Albano Costa
____________
Nota de L.G.:
(1) Transcrição do excerto da carta, reproduzida acima, da autoria de Armando Figueiras:
Faro, 07.05.06
Caro Albano:
Espero que esteja tudo bem contigo e teus familiares.
Pois bem, sobre aquela informação que me deste sobre o Manuel Agostinho Oliveira Mendonça, consegui por intermédio da C.M. de V. Pouca de Aguiar o nº de telemóvel do Presidente da Junta de Freguesia de Soutelo de Matos, de onde ele era natural. Foi muito simpático e receptivo. Falámos um pouco.
Escrevi depois a um dos irmãos dele que vive ainda na freguesia, e mais tarde a esposa telefonou. São pessoas muito humildes, trabalhadoras. Disse-me que os pais já faleceram, mas disseram-lhes na altura que os restos mortais tinham ficado em Bissau.
O Agostinho tem 2 irmãos que vivem no Porto e mais um irmão que está em França. Não manifestaram interesse em que os restos mortais fossem transladados para a freguesia, e eu compreendo, já passaram 32 anos, e os pais em vida não tinham meios nem conhecimentos para tratar do assunto. Os pais, pelo que a cunhada do Agostinho me disse, nunca recusaram o corpo, e sofreram muito por não poderem tê-lo perto deles.
(...)
Caro Albano:
Espero que esteja tudo bem contigo e teus familiares.
Pois bem, sobre aquela informação que me deste sobre o Manuel Agostinho Oliveira Mendonça, consegui por intermédio da C.M. de V. Pouca de Aguiar o nº de telemóvel do Presidente da Junta de Freguesia de Soutelo de Matos, de onde ele era natural. Foi muito simpático e receptivo. Falámos um pouco.
Escrevi depois a um dos irmãos dele que vive ainda na freguesia, e mais tarde a esposa telefonou. São pessoas muito humildes, trabalhadoras. Disse-me que os pais já faleceram, mas disseram-lhes na altura que os restos mortais tinham ficado em Bissau.
O Agostinho tem 2 irmãos que vivem no Porto e mais um irmão que está em França. Não manifestaram interesse em que os restos mortais fossem transladados para a freguesia, e eu compreendo, já passaram 32 anos, e os pais em vida não tinham meios nem conhecimentos para tratar do assunto. Os pais, pelo que a cunhada do Agostinho me disse, nunca recusaram o corpo, e sofreram muito por não poderem tê-lo perto deles.
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1 comentário:
Sou militar aposentado. Fui incorporado em 1955 - Abril, na EPAM. Desejo contactar camaradas de incorporação para futuro encontro.
O meu mail é mlpereira@sapo.pt
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