1. Comentário do nosso co-editor e administrador Virgínio Briote ao poste P3820 (*)
A guerra em que participei, insiste em não me largar. Já desisti de lutar contra isso, sei que vai andar comigo até ao fim do caminho. Ao longo destas quatro décadas andou atrás de mim, como uma sombra .
Já na metrópole, em 1974, em dias, vi escaqueirar-se todo o esforço que a minha geração tinha feito em anos. Bem feito, mal feito? Não vou falar disso agora, há bibliotecas sobre o assunto. Falo, sim, é sobre outras coisas a que fui assistindo ao longo destes anos todos.
Naqueles dias, a seguir a Maio de 1974, vi combatentes envergonhados de terem participado na guerra em África. A TV, tenho bem presente, lançava censuras sobre os que tinham combatido. Massacres do Pidjiguitti, de Wiriamu, na baixa do Cassange. Imagens e imagens de negros desfeitos a tiro e à faca eram passadas dia sim, dia não.
Eu via e ouvia, com músicas de fundo, magníficas, do Zeca Afonso, do Luís Cília, do Adriano e de outros, as vozes alteradas pela emoção dos locutores a enaltecerem os feitos heróicos dos combatentes pela liberdade e pela independência de Angola, Guiné e Moçambique. Com imagens alternadas de corpos nossos, do capitão Pinheiro Torres Meireles, e da interminável agonia do capitão (e amigo) pára Tinoco de Faria, os dois, por coincidência de famílias que bem conheci.
Naqueles meses, diariamente, via-me condenado. Afinal eu não passava de um vulgar criminoso de guerra. Na minha pequena família, naqueles meses, assistia a dois factos bem distintos: o regresso de Paris, em glória, de um familiar meu, desertor como tantos outros, enquanto corria para a Estrela, para o HMP e dias e meses depois para Alcoitão, para acompanhar o meu irmão na tentativa de o recuperar dos ferimentos em combate em Moçambique, das lesões na coluna que lhe afectaram a vida.
Confesso ter dito para mim: é bom que a guerra tenha acabado, mas não foi por este país que eu combati.
Ainda vivo com isto e não quero ser saudosista. O que lá vai, lá vai, vou dizendo para mim. Mas quem deu dois anos aos canos e às culatras nunca mais se vai esquecer do cheiro a pólvora e do gosto a sangue. De Camaradas e Amigos a Inimigos. vbriote (**)
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Notas de L.G.:
(*) Vd. poste de 30 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3820: Blogoterapia (87) : O nosso (às vezes, triste) fado... (Joaquim Mexia Alves)
(**) Vd. último poste da série (Ex)citações > 13 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3736: (Ex)citações (13): Às vezes, tão perto e tão longe das coisas... (João Coelho)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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5 comentários:
Quando um devoto anticolonialismo, era atirado à nossa cara por aqueles que entravam por Badajoz ou Vilar Formoso, enquanto nós entravamos pelo estuário do Tejo, mais não era que a justificação das deserções e das refrações com direito a muitas classificações.
Sendo que, passados estes anos, esses mesmos cidadãos, continuam na mesma autodefesa, dizendo que contam a história da guerra colonial.
Anº Rosinha
... ao Virgínio Briote e ao António Rosinha, e demais veteranos que percorreram matos africanos,
quanto aos conteúdos deste "post" e do seu primeiro comentário, assino por baixo.
E já agora, a propósito do precedente comentário, aqui fica um interessante endereço
http://ultramar.terraweb.biz/ContagemdoTempo_SM_Lei2097_OpiniaoBarrosodaFonte.htm
Saudações veteranas.
Que simples, directo e bem diz o Briote aquilo que em todos nós ex-Combatentes vai na alma, ao ver este nosso Portugal tão esmirrado e devassado por oportunistas, que infiltrados nos corredores da política e nas gestões de algumas das nossas maiores empresas e bancos, não têm qualquer tipo de escrúpulo nem contemplações.
Respondamos como podemos e sempre temos respondido, até ao momento, mantendo firmes a nossa dignidade e as nossas reivindicações.
Muitos dos nossos jovens, aos poucos, vão abrindo os olhos para estas tristes realidades e reconhecendo, quem afinal tem RAZÃO e VALOR nesta espiral de corrupção e vazio que se tem vindo a criar no nosso infeliz país.
Camaradas
Os filhos de muitos dirão: - O meu pai foi combatente no Ultramar... felizmente regressou são e salvo, ou, não o conheci, morreu quando eu era bebé, ou, veio estropiado, mas refez a sua vida como pôde. Para mim é um herói.
Os filhos de alguns dirão: - Não, o meu pai não fez a guerra. Como o meu avô era rico, arranjou com que o meu pai fosse clandestinamente para França (subentenda-se, ajudasse a fugir) para onde lhe mandava dinheiro para a sua subsistência. Felizmente alguém fez o 25 de Abril e ele pôde regressar vitorioso a Portugal, tendo até enfileirado no grupo dos antifascistas.
Carlos Vinhal
Graças a Deus que já se vai fazendo luz,sobtretudo na nova geração,que não tem os complexo do passado e vai vivendo e compreendendo a verdadeira História do que se passou em África.Não devemos esquecer massacres, de nenhuma parte.Tão dignos foram quem lutou com lealdade, de ambos os lados.Entre nós combatentes, todos fomos os bons e nenhum de nós foram os maus.Ambos fomos as vítimas dos horrores da Guerra e se a fizemos com lealdade, foi para salvarmos a pele e bem ou mal, pela Pátria.Vamos esquecer epísódios pessoais, para mim tento esquecer
15 de Março de 1961...
Estou solidário.
Para toda a Tertúlia, um grande abraço.
Jorge Fontinha
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