segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Guiné 63/74 - P5785: Blogando e andando (José Eduardo Oliveira) (3): O PREC na Baía

1. Texo de José Eduardo Oliveira (JERO) (ex-Fur Mil da CCAÇ 675, Binta, 1964/66), enviado ao Blogue em mensagem de 4 de Fevereiro de 2010:


O PREC na Baía

Estava casado há cerca de 5 anos e passava as férias do mês de Agosto em São Martinho do Porto em pleno zona “aristocrática”.
Não por “casta” mas tão só e simplesmente por a minha mulher ter sido criada na vila e ter andado na escola primária com a banheira que alugava as barracas no sítio mais chique do “baía das marquesas”.



A minha barraca era na oitava fila a contar da entrada principal da praia e a primeira da fila dos “paus encarnados”.
Percebia nitidamente que os vizinhos estranhavam que eu tivesse “direito” a estar por ali e aturei muitas faltas de educação dos meninos chamados “ricos” mas “pobres”... no que respeita a educaço. É dos livros que... não se pode ter tudo.

Nas barracas vizinhas da minha discutiam-se longamente as “mãos” dos jogos de bridge da noite anterior.
Eram famílias da zonas do Ribatejo e do Alentejo.
Além do bridge começou-se a falar insistentemente nas ocupações das herdades do Alentejo e algumas famílias começaram a faltar aos banhos.

Regressavam dias depois e falavam em voz alta das ocupações selvagens das suas “coisas”.
Os tempos eram de incerteza e lembra-me da importância que tinha a chegada dos jornais à vila.

O “Jornal Novo”, fundado por Artur Portela Filho, era disputado até ao último exemplar.
A sua leitura transmitia alguma paz aos que sentiam a “onda vermelha” não parava de crescer. Que subia na maré alta... e não descia na maré baixa...
Escreviam no “Jornal Novo” nomes consagrados do jornalismo português, como José Sasportes, Mário Bettencourt Resendes, Luís Paixão Martins, Carlos Pinto Coelho, António Mega Ferreira, Teresa de Sousa, Alexandre Pais, e outros.
Era de facto o momento mais esperado do dia de praia.

Mais que tomar banho nas águas tépidas de São Martinho do Porto havia que “mergulhar” nas páginas do jornal de Artur Portela Filho.

Foi um longo mês de Agosto.

Lembro-me particularmente da noite do dia 18 de Agosto de 1975.
Nessa noite foi transmitido para todo o País o “Discurso de Almada”, de Vasco Gonçalves.
Ouvi uma parte em casa e, antes do seu final, saí para a rua.
Vim arejar ideias... mas os gritos do “Camarada Vasco” continuavam no ar... a perseguir-me.

Passei por alguns carros com pessoas lá dentro que ouviam pela rádio o “discurso de Almada”. Tinham um ar assustado.
A trinta cinco anos de distância não esqueço jamais o silêncio daquela noite de 18 de Agosto de 1975.
Quase que não se via ninguém nas ruas e o silêncio opressivo que se “ouvia” tinha um cheiro que não vinha do mar.
Vinha da terra e cheirava a medo...

Quem me havia de dizer que muitos anos mais tarde iria blogar sobre o PREC da Baía.

Enfim…modernices!
JERO
__________

(*) Vd. poste de 2 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5746: Convívios (178): 1.º Encontro da Tertúlia do Centro 2 (José Eduardo Oliveira/JERO)

Vd. último poste da série de 5 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5054: Blogando e andando (José Eduardo Oliveira) (2): Ponte para o regresso

4 comentários:

artur portela disse...

Abraço pela referência ao Jornal Novo.
Não é já o segundo?
Artur Portela

Anónimo disse...

Caro e amigo Jero,
Nessa altura já eu estava nos EUA. E é verdade...muitas pessoas foram metendo-se em casa como se a coisa não fosse com eles. O medo também deveria ser forte.
Nos Açores a FLA (Frente de Libertação dos Açores) batia o pé ao comunista Vasco Gonçlves. Quer concordemos ou não com os príncipios da FLA, esta força acabou por ter um papel bstante activo na queda do "regime Gonçlvista-comunista".
Um abraço,
José Câmara

Anónimo disse...

Att.Artur Portela
Muito honrado com o seu comentário.
Quando à interrogação que põe não é o segundo, mas a sim a primeira vez que "O PREC na Baía" aparece publicado.Lá mais para o fim do ano deverá aparecer num livro que está em preparação sobre o PREC na região de Alcobaça.Dado que não sou o autor fico-me por aqui.
Att.José Câmara
Então já andavas pelos STATES! Lembro-me bem da FLA que referes no teu comentário. O pior é já terem passado 35 anos e já sermos "old people"...
Um grande abraço,
JERO

manuel amaro disse...

Caro JERO,

Obrigado. Li e depois reli, substituindo S. Martinho do Porto (Olá Sue!) por Tavira. Era isso. Foi isso. Grande Verão. Grande Escola.
Ao longo dos anos tive oportunidade de manifestar aos jornalistas do Jornal Novo o meu obrigado por tudo o que nos deram nesse verão.
Gostei de ver aqui o comentário do Artur Portela.
A última vez que o vi foi num jantar do Clube Português de Imprensa, no Grémio Literário, com Ruela Ramos, Antunes Ferreira e Maria Antónia Palla, ainda Cavaco Silva era PM, numa noite em que o José Rodrigues dos Santos recebeu o Prémio de melhor aluno de Comunicação Social da Universidade Nova de Lisboa. Eu ainda sou do tempo... deste tempo...

Um Abraço

Manuel Amaro