quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - 10997: Blogpoesia (319): Sou nada (Ernesto Duarte)

1. Mensagem do nosso camarada Ernesto Duarte (ex-Fur Mil da CCAÇ 1421/BCAÇ 1857, Mansabá, 1965/67), com data de 24 de Janeiro de 2013:

Camarada Carlos Vinhal
Os meus fraternais cumprimentos.
Tenho aparecido pouco, os últimos 2 anos e tal foram muito duros para mim. Os ossos, as tenssões, as faltas de vitaminas, os vírus, as bactérias. Mas quase todos dias vou ao blogue.

Eu fiquei, ontem como hoje, amando e odiando aquela terra. Acho maravilhoso fulanos serem amigos 50 anos depois, como se fossem miúdos. E contra factos não há argumentos.
O blogue tem sido o grande aglutinador, o veio de transmissão dessas amizades. Claro o blogue não funcionam sozinho. Só funciona graças a esses corações maiores que o peito, a quem eu ficarei sempre grato.

Carlos, mando-te umas linhas, passam a ser tuas, do blogue. Se acharem que tem algum valor para publicar, reafirmo são vossas.

Um muito Grande Abraço
Ernesto Duarte
Furriel miliciano
CCAÇ 1421/BCAÇ  1857
1965 a 1967
Mansabá, Oio, Mores


Sou nada 

Eles estão ali 
Esfarrapados 
Mutilados 
Aos pedaços 
Cheios de sangue 
Cheios de lama, feita com sangue e de 
Uma terra que não era a sua 
Amada 
Odiada 
Gritando de desespero 
Gritando de dor 
Gritando pela mãe 
Gritando pela mulher 
Gritando pela namorada 
Gritando pelos filhos 
Vão sucumbindo na frente da nossa impotência e raiva 
Agarram-se a nós como se agarrassem a vida 
Para ela não lhes fugir 
Já sem forças 
Ainda murmuram 
Amei- vos Muito e Muito 
Já não se ouvem, só já mexem os lábios 
E nós ficamos vociferando 
Gritando de raiva até hoje 
Com aqueles que passaram 
O resto da sua vida chorando e dizendo 
Amei-te muito meu filho 
Amei-te muito meu homem 
Amei-te muito pai , mesmo sem te conhecer 
A guerra dizem que é para homens 
Amaldiçoada maneira de dizer que sou homem.
______

Nota do editor:
Ao nosso camarada Ernesto Duarte uma palavra de agradecimento pelas palavras que nos são dirigidas e de encorajamento para enfrentar o tempo que leva a recuperação das maleitas que nos vão chegando com a idade. Somos já um grande grupo de dinossauros que, como sabemos, foi sempre uma espécie ameaçada.
Caro Ernesto para ti um abraço solidário e a certeza de que vais ultrapassar este momento menos bom.
____________

Nota  de CV:

Vd. último poste da série de 19 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - 10962: Blogpoesia (318): Dizem-nos que estamos a envelhecer ( Luís Graça)

6 comentários:

Bispo1419 disse...

Olá Ernesto, meu amigo e camarada!
Força, homem! Relembra o "homem" que gritaste nos teus versos mas olha que esse, definido pela guerra, já viveu há muitos anos e muito dele ficou lá pelas terras de Mansabá..
Com o carinho e/ou a raiva com que lembramos os nossos duros tempos de juventude, continuemos o caminho com a coragem de enfrentar as dores físicas e com a fé de ainda encontrarmos ao longo desse caminho muita beleza e prazer de viver.
Grande abraço
Manuel Joaquim

Felismina mealha disse...

Adorei o poema, na sua forma pura de dizer, a raiva e a dor, e adorei as palavras do Manuel Joaquim, que conhece nelas a dor sentida , a raiva vivida, mas que pretende sejam apenas vagas recordações...

Um abraço fraterno para os dois...








Chapouto disse...

Caro companheiro e amigo tu como eu andamos no mesmo curso de sargentos em Tavira não sei de companhia,fomos no mesmo barco para a Guiné penso eu no Niassa em 18Ag65,eu era CCaç 1426,também andei pelo OIO mais concretamente em Banjara onde a minha companhia permanrceu durante 16 meses tempos difíceis por aquelas bandas como tu deves saber, mas é bom recordar esses tempos e não deitando para traz das costas os maus momentos e os pesadelos que ficam para a história.
Queria pedir-te um favor caso saibas de um sargento chamado Carvalho que ele era dea minha companhia ccomo foi punido ainda cá mas embarcou com nosco mas depois foi para Mansoa, porque estive com ele em Banjara no dia 26Nov65 na operação qque fizemos em conjunto nós de Bafatá e uma companhia de Mansavá não sei era a tua.
um forte abraço
Fernando Chapouto

Bispo1419 disse...

Caro Fernando Chapouto:
A viagem para a Guiné do BCaç.1857 (CCaçs. 1419, 1420 e 1421) fez-se também no Niassa mas 18 dias antes da tua: partida a 31/7 e chegada a Bissau no dia 6/8/1965.

Um abraço do
Manuel Joaquim
(CCaç. 1419)

Unknown disse...

Bispo, melhor Senhor Bispo do nome lembro-me, mas da cara não consigo,já andei aqui nos meus papeis á procura de qualquer coisa que me ajudasse. Está bastante presente o teu nome mais uns quantos camaradas da l419, aquele tempo todo em Mansabá, mas as caras não consigo é a velhice !
Sim foi à muitos anos, não foi ontem é hoje. Está provado,que não esquecemos, enquanto estivermos lucidos não esqueceremos, há muitos elos de ligação no bem e no mal. Nós continuamos a dizer terra odiada, terra amada
Um grande abraço.

D. filismina O Bispo, O Manel o Chapouto e mais uns muitos milhares, foram lá são cá e se viverem eternamente serão sempre grandes homens de Espinha direita.
Um grande obrigada

Unknown disse...

Chapouto Tavira foi apenas um pouco louco, comparado depois com tudo o mais.
Pois fomos a Banjara eu já tinha esquecido quem era de Bafatá. Nós ainda fomos lá mais umas vezes com colunas para Bafatá E fomos umas quantas vezes à revelia do sistema, quando estava-mos em Manhau, Banjara era logo ali.
Quanto ao Carvalho nunca mais sobe nada dele.
A minha companhia com soldados de cá e de lá criou um grupo tipo comando e os outros ficaram em dois grupos de combate muitos maiores.
Os sargentos por razões várias nunca foram bem aceites pelos Soldados. Nós iamos ao bar deles nunca dissemos limpa-me a espingarda e um ou mais estava sempre pronto a ir com eles á caça e ver as lavadeiras, os srgentos gostavam doutra tropa.
Se tiveres fotos porque foram muitas tiradas. O Emcontro destacado com Continência e aperto de mão no meio da estrada sem mais ninguém o militar de Mansabá sou eu.
A guarda de honra ao içar da Bandeira a guarda de honra de Mansabá é comandada por mim.
Lembras-te do tractor de Lagartas, era de um serrador de Mansabá. Nós não tivemos engenho nem arte para o trazer para casa. Tivemos problemas com Bissau.
Um grande abraço