quinta-feira, 6 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12796: In Memoriam (185): Vitor Manuel Amaro dos Santos (1944-2014), cor art ref, ex-cap art, cmdt, CART 2715 (Xime, 1970/71)...


Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Xime > c. 1969/70 > Vista aérea da tabanca do Xime, onde estava sediada uma unidade de quadrícula... Em 26 de novembro de 1970, era a CART 2715 / BART 2917, comandada pelo jovem cap art Vitor Manuel Amaro dos Santos (1944-2014).

Foto: © Humberto Reis (2006). Todos os direitos reservados. [Edição: L.G.]


1. Através do Rui Santos Silva [, nascido em 1945, oficial de cavalaria, que terminou o curso da Academia Militar em 1969,  fez  uma comissão no TO da Guiné, em 1971/73, e é residente em Coimbra,] em mensagem publicada na página do Facebook da União dos Antigos Combatentes da Guerra do Ultranar, com data de 1 do corrente, tivemos a triste notícia do desaparecimento de mais um camarada da Guiné:

Informo que faleceu ontem (dia 28 de Fevereiro) o Ex-Combatente Cor de Artilharia Vitor Manuel Amaro dos Santos,  residente em Coimbra. O funeral realizar-se hoje para Foz do Arouce, Lousã.
Nascido a 22-11-1944,  tem 3 comissões no Ultramar: Guiné, Angola, Angola.

2. Nota de pesar do nosso editor L.G. e do nosso blogue [, uma outra versão foi publicada no Facebook]:

Conheci-o na Guiné... Pertencia ao BART 2917 (zona leste, setor L1, Bambadinca, 1970/72)... 

A sua companhia, a CART 2715 (Xime, 1970/72),  sofreu, juntamente com a minha, a CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71) uma violentíssima emboscada, no decurso da Op Abencerragem Candente, a 26/11/1970..., quatro  dias depois da invasão de Conacri... Resultados: 6 mortos e 9 feridos, incluindo o meu amigo fur mil Joaquim Araújo Cunha, com quem tinha estado a meio da noite, talvez por volta das 3 horas da manhã, a beber um copo antes de sairmos de novo, a caminho do inferno...

O jovem cap art Vitor Manuel Amaro dos Santos, então com 26 anos, nunca mais terá sido o mesmo!... Falei com ele duas ou três vezes ao telefone... A nossa última conversa, há dois anos atrás, não foi fácil... Ele adorava o blogue mas tinha reservas em relação a  algumas referências à Op Abencerragem Candente e ao facto do seu nome estar associado a esta tragédia.

Diria mesmo que ele acompanhava, com emoção e paixão, o blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné...  Convidei-o, no devido tempo, a integrar a nossa Tabanca Grande, e publicar a sua versão dos acontecimentos que levaram à morte de cinco dos seus homens (a que se deve juntar a morte do guia e picador das NT Seco Camará, desde sempre ligado ao Xime, mas na altura ao serviço da CCS/BART 2917, e a viver em Bambadinca)... Essas mortes causaram-lhe profunda amargura... Por razões de saúde, vê-se obrigado a deixar o comando da sua CART 2715, logo em  1 de janeiro de 1971. Era DFA.

Prometo publicar, em breve, um poste complementar em homenagem à memória que lhe é devida... Como comandante operacional, o cap art Amaro dos Santos era um camarada nosso que devemos respeitar, e cujo nome eu gostaria de ver aqui ao lado dos nossos camaradas e amigos que da lei da memória se foram libertando...

Para a sua família e para os nossos camaradas da CART 2715/BART 2917, vão os nossos sentidos votos de pesar e de solidariedade na dor (**)...  (LG)

_________________

Notas do editor:

(*) Vd poste de 9 de janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9335: História do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72): Baixas: mortos e feridos (Benjamim Durães)


(...) CAPÍTULO III > BAIXAS SOFRIDAS, PUNIÇÕES, LOUVORES E CONDECORAÇÕES
A - BAIXAS SOFRIDAS PELAS NT

1 – EM COMBATE

a) - MORTOS

(i) CCS /BART 2917

- Picador Seco Camará, assalariado: Morto em 26/11/70 na Operação “Abencerragem Candente”, está sepultado em Nova Lamego.

(...) (iii) CART 2715

- Alferes Mil Atirador João Manuel Mendes Ribeiro, nº 17853469; morto em 04/10/71 na Operação “Dragão Feroz”; está sepultado em Castelo Branco;

- Furriel Mil Mec Auto Joaquim Araújo Cunha, nº  14138068; morto em 26/11/70 na Operação “Abencerragem Candente”; sepultado em Barcelos;

- 1º Cabo Atirador José Manuel Ribeiro, nº 18849069, morto em 26/11/70 na Operação “Abencerragem Candente”, sepultado em Lousada;

- Soldado Atirador Fernando Soares, nº 06638369, morto em 26/11/70 na Operação  “Abencerragem Candente”,  sepultado em Fafe;

- Soldado Atirador Manaule Silva Monteiro, nº  17554169, morto em 26/11/70 na Operação “Abencerragem Candente”, sepultado em em Condeixa-a-Nova;

- Soldado Atirador Rufino Correia Oliveira, nº 17563169, morto em 26/11/70 na Operação “Abencerragem Candente”, sepultado em Oliveira de Azeméis;

- Guia Nansu Turé, assalariado, morto em 04/10/71 na Operação “Dragão Feroz", sepultado em Bafatá. (...)

5 comentários:

Anónimo disse...

Olá Camaradas
Tive, como é óbvio vários contactos com o Amaro dos Santos.
Não via desde que ambos tínhamos pertencido ao GAC/BMI - RALeiria, a unidade de artilharia da 1Brigada de St.ª Margarida.
Recordo dele uma frase que muito me marcou e que traduz tudo aquilo, com muita simplicidade o que era a guerra na Guiné.
À minha chegada a Bissau ele estava se saída e eu perguntei-lhe:
- Eh pá e a guerra? Como é que é a guerra?
Ele parou e respondeu:
- A guerra pá... a guerra...
Vim a concordar com ele e até hoje não encontrei melhor definição da guerra na Guiné.
Um Ab.
António J. P. Costa

Luís Graça disse...

Tó Zé:

Tenho, no meu telemóvel, ainda gravadas diversas mensagens que o Amaro dos Santos me mandou, há dois anos atrás, e cujo conteúdo me impressionou muito... Era um homem ainda perturbado pelos acontecimemtos de há 40 e tal anos atrás, que indelevelmemte marcaram a sua vida e a sua carreira...

Por respeito pelo homem, pelo militar e pelo camarada que ele foi, não vou fazer uso dessas mensagens, no blogue, reproduzindo-as textualmente... Mas não deixam de ser testemunhos paradigmáticos do grande sofrimento por que todos passámos na Guiné, comandantes operacionais, milicianos e soldados do contingente geral, emtropolitanos e guineenses...

Conhecemos os dois o inferno do Xime, em 26/11/1970, era ele ainda "periquito" e nós, malta da CCAÇ 12, "velhinhos", com 18 meses de Guiné, com o cu calejado por "manga de operações" no triângulo Xime-Bambadinca-Xitole...

Numa das nossas conversas, ao telemóvel, ele ficou muito surpreendido quando eu lhe disse que tinha estado com ele nessa fatídica manhã de 26/11/1970... Que tinha sido eu um dos elementos da CCAÇ 12 que foram resgatar os corpos, horrivelmente mutilados (com exceção do fur mil Cunha, morto com um tiro na testa) da secção que seguia à frente da coluna de mais de 200 homens, e que caiu na zona de morte da emboscada...

Mais, fui eu que lhe disse que foi o "bom gigante" do Abibo Jau, do 1º Gr Comb da CCAÇ 12 (mais tarde miseravelmemnte fuzilado pelo PAIGC, em Madina Colhido, com o Jamanca, cap graduado da CCAÇ 21), quem trouxera o Cunha às costas durante quilómetros... até ao aquartelamento do Xime... Era uma besta de força, o Abibo!

Julgo que com isso ganhei o seu respeito, mas em contrapartida ele não entendia como é que aceitava dar guarida a relatos que punham em causa, no seu entender, a sua conduta nessa operação... Ele desenvolver, desde então, um forte sentido de vitimização e de injustiça... Ao mesmo tempo, era-lhe intolerável a ideia da morte dos seus homens... Não sei se alguma vez conseguiu fazer o luto dessas mortes...

Sempre fiz questão de lhe dizer que ele e os seus homens foram excecionais, ao fazerem frente, com coragem e determinação, à brutal emboscada em que caímos todos ((a CART 2715 e a CCAÇ 12), na antiga picada do Xime-Ponta do Inglês, em 26/11/1970, quatro dias depois da invasão de Conacri (Op Mar Verde)...

A Op Abencerragem Candente foi um punhal cravado no seu e no nosso coração...

O teu e o meu querido amigo Tony Levezinho fazía anos a 24 de novembro... Sei que celebrámos o acontecimento, em Bafatá, com pompa e circunstância... Mas a 25, no dia seguinte, estávamos todos a alinhar no Xime... E cometemos o erro fatal de seguir, duas vezes,. pelo mesmo trilho... A 26, estávamos a chorar os nossos mortos e a cuidar das nossas feridas...

Anónimo disse...

OK Camarada
Se achas que nessas conversas há matéria para uma homenagem póstuma na "Revista de Artilharia", transcreve-mas. Em caso afirmativo dá-me os posts do blog onde a operação é referida para que eu possa compor um artigo para a revista.
Se não... ficamos assim...
Um Ab.
António J. P. Costa

Luís Graça disse...

Tó Zé:

Deves ser do tempo do Amaro dos Santos, na Academioa Militar... Ou melhor ele devia ser ligeiramente mnais velho do que tu, dpis ou três anos, não?...

Chegou à Guiné com 25 anos... Fez os 26 no dia 22 de novembro de 1970, 3 dias antes da Op Abencerragem Candente (que começou a 25...).

Este nome de código, surrealista, fantasmagórico, estranho, terá sido da lavra dele, segundo me confidenciou...

Infelizmente não há ninguém, no blogue, a representar a CART 2715... Temos alguns camaraads da CSS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72)... As relações do Amaro dos Santos com o comando do batalhão não eram as melhores...

Lamentavelmente, eu nem sequer tenho uma foto do Amaro dos Santos, nem um simples endereço de email. Ele mandava-me extensos comentários por telemóvel...Convidei-o em tempos para integrar o nosso blogue... Mostrou interesse em publicar a sua versão doa acontecimentos daqueles dias...

Vou publicar um poste com mais alguns materiais... Para já tens aqui 10 referências, no nosso blogue, à Op Abencerragem Candente...

Estás à vontade para utilizares as nossas fontes de informação e documentação.

Um alfabravo. Luis

http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/search/label/Op%20Abencerragem%20Candente

PS - Vês se me arranjas uma foto do nosso infortunado camarada Amaro dos Santos!... Tenho o seu nº de telemóvel, mas já ninguém responde do outro lado... Tens algum contacto com a família ?

Anónimo disse...

Camarada
O Amaro dos Santos era um ano mais antigo do que eu. Daí que, quando eu cheguei em JAN68, ele estivesse a regressar e ainda nos tivéssemos encontrado na então BAC 1.
Aquela nossa conversa marcou-me, embora à primeira vista não contenha nada de especial para além da impossibilidade de descrever "a guerra" a alguém que queria saber como ela era.
Vai ser difícil arranjar uma foto, mas vou procurar. Talvez o Morais da Silva tenha...
Um Ab.
António J. P. Costa