1. Mensagem de Mário Vitorino Gaspar [ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68]
Data: 4 de outubro de 2015 04:47
Caros Camaradas
Vai mais uma e talvez interessante, muito embora já tenha abordado esta situação. Agora com novos elementos. Por exemplo no meu Processo Individual vê-se nitidamente ter terminada a minha vida militar ali. O traço de cima para baixo isso indica.
Data: 4 de outubro de 2015 04:47
Caros Camaradas
Vai mais uma e talvez interessante, muito embora já tenha abordado esta situação. Agora com novos elementos. Por exemplo no meu Processo Individual vê-se nitidamente ter terminada a minha vida militar ali. O traço de cima para baixo isso indica.
Um abraço,
Mário Vitorino Gaspar
2. História de Vida > Só me Casei Depois de Vir da Guiné
por Mário Gaspar
Cheguei da Guiné a 6 de novembro de 1968 e passei à disponibilidade a 28.
A caderneta militar desliga‑se da minha mão trémula. Volto a folheá‑la. Resolvi ir à minha Unidade Mobilizadora. Na Secretaria fui atendido por um major, que depois de ler o que lhe estendia para as mãos, me respondeu:
– Não faz diferença nenhuma!
– Não faz a si mas faz‑me a mim! – Respondi‑lhe.
Venho a saber que o furriel Miliciano Vítor José Correia Pestana falecera
Comecei por responder a anúncios de trabalho, fui a entrevistas de algumas empresas. Sabia o que queria e rejeitei aquelas que não me interessavam.
Fui contactado por uns serviços do Exército que funcionavam na zona do largo da Estefânia, em Lisboa, devido a possíveis doenças tropicais. Queixava‑me de problemas intestinais, mas não encontraram sinais de qualquer doença depois de ter feito exames, não só aos intestinos como às fezes.
Duas empresas me motivaram, a primeira
a Regisconta – “Aquela Máquina…” – como vendedor. Fui aprovado na primeira fase e as condições eram óptimas. Quando os dois possíveis indivíduos a contratar estavam eliminados, tinha pela frente 10 perguntas de Cultura Geral. Não sabia quem era o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, não fui admitido. [Na altura, era o gen António Vitorino da França Borges, nomeado pelo Governo].
Em segundo lugar estava a DIALAP – Sociedade Portuguesa de Lapidação de Diamantes, SA. Após Testes Psicotécnicos sou aprovado e tenho pela frente a entrevista que convenço, entro ao serviço a 27 de janeiro de 1969 como possível Lapidador de Diamantes.
Havia que fazer um estágio de 9 meses, mas assinei o contrato em maio, quando o estágio terminava em setembro, portanto muito antes da data prevista, visto ter obedecido às pretensões desta grande empresa.
Resolvido a questão do emprego decidi casar-me com uma das madrinhas de guerra. Tive o cuidado de resolver, antes as responsabilidades com aquelas que assumira compromissos.
O acto realizou-se na Igreja de São João de Brito no dia 29 de junho de 1969, em Lisboa. No dia do casamento, no altar, no final do discurso do padre, ouvi o seguinte:
Fui contactado por uns serviços do Exército que funcionavam na zona do largo da Estefânia, em Lisboa, devido a possíveis doenças tropicais. Queixava‑me de problemas intestinais, mas não encontraram sinais de qualquer doença depois de ter feito exames, não só aos intestinos como às fezes.
Duas empresas me motivaram, a primeira
a Regisconta – “Aquela Máquina…” – como vendedor. Fui aprovado na primeira fase e as condições eram óptimas. Quando os dois possíveis indivíduos a contratar estavam eliminados, tinha pela frente 10 perguntas de Cultura Geral. Não sabia quem era o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, não fui admitido. [Na altura, era o gen António Vitorino da França Borges, nomeado pelo Governo].
Em segundo lugar estava a DIALAP – Sociedade Portuguesa de Lapidação de Diamantes, SA. Após Testes Psicotécnicos sou aprovado e tenho pela frente a entrevista que convenço, entro ao serviço a 27 de janeiro de 1969 como possível Lapidador de Diamantes.
Havia que fazer um estágio de 9 meses, mas assinei o contrato em maio, quando o estágio terminava em setembro, portanto muito antes da data prevista, visto ter obedecido às pretensões desta grande empresa.
Resolvido a questão do emprego decidi casar-me com uma das madrinhas de guerra. Tive o cuidado de resolver, antes as responsabilidades com aquelas que assumira compromissos.
O acto realizou-se na Igreja de São João de Brito no dia 29 de junho de 1969, em Lisboa. No dia do casamento, no altar, no final do discurso do padre, ouvi o seguinte:
– Acabo de casar o morto vivo!
Estranhei, mas logo esqueci aquela frase. Quando fui buscar o Registo de Casamento à Igreja, o Sacristão entrega-me a Caderneta Militar, resolvo abri-la e assusto-me. Dado como morto.
Leio na Caderneta Militar, numa das páginas: – 1967, “Desembarcou em Bissau em 17 de janeiro (1967), desde quando conta 100% de aumento de tempo. Morto em 12 de outubro (…)” e noutra folha: "Baixa de serviço em 12/10/1967 por Falecimento".
Estranhei, mas logo esqueci aquela frase. Quando fui buscar o Registo de Casamento à Igreja, o Sacristão entrega-me a Caderneta Militar, resolvo abri-la e assusto-me. Dado como morto.
Leio na Caderneta Militar, numa das páginas: – 1967, “Desembarcou em Bissau em 17 de janeiro (1967), desde quando conta 100% de aumento de tempo. Morto em 12 de outubro (…)” e noutra folha: "Baixa de serviço em 12/10/1967 por Falecimento".
Senti um arrepio percorrer‑me o corpo.
Fotocópias da minha morte na Caderneta Militar: Baixa de Serviço
“Por falecimento” e “Morto”
A caderneta militar desliga‑se da minha mão trémula. Volto a folheá‑la. Resolvi ir à minha Unidade Mobilizadora. Na Secretaria fui atendido por um major, que depois de ler o que lhe estendia para as mãos, me respondeu:
– Não faz diferença nenhuma!
– Não faz a si mas faz‑me a mim! – Respondi‑lhe.
Venho a saber que o furriel Miliciano Vítor José Correia Pestana falecera
Como se vê a morte do Vitor José Correia Pestana coincide com minha: "12 deoutubro, em Gadamael", por "acidente com arma de fogo".
Terá existido um engano. Não existe informação desde 28SET67 o que indica que estou MORTO
A partir do meu casamento sou conhecedor da minha morte a 12 de outubro de 1967.
Só me casei depois de vir da Guiné. Terminada uma comissão em que estive em contacto com a morte, regresso e a morte continua no meu trajecto.
Mário Vitorino Gaspar
Ex Furriel Miliciano Atirador e de MA
A partir do meu casamento sou conhecedor da minha morte a 12 de outubro de 1967.
Só me casei depois de vir da Guiné. Terminada uma comissão em que estive em contacto com a morte, regresso e a morte continua no meu trajecto.
Mário Vitorino Gaspar
Ex Furriel Miliciano Atirador e de MA
Na minha Caderneta Militar, não existe informação desde 28 de setembro de 1967 o que indica que estou... MORTO!
Fotos (e legendas): © Mário Gaspar (2015). Todos os direitos reservados. [Edição: LG]
____________
Nota do editor
Último poste da série > 2 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15190: História de vida (40): Casei-me, em 31/7/1966, nove meses depois do regresso da guerra; quinze dias depois, embarquei no paquete Império, a caminho de Angola onde trabalhei como professor primário e quadro bancário (José Augusto Miranda Ribeiro, ex-fur mil, CART 566, 1963/65)
Último poste da série > 2 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15190: História de vida (40): Casei-me, em 31/7/1966, nove meses depois do regresso da guerra; quinze dias depois, embarquei no paquete Império, a caminho de Angola onde trabalhei como professor primário e quadro bancário (José Augusto Miranda Ribeiro, ex-fur mil, CART 566, 1963/65)
5 comentários:
Mário, parabéns, pela vida!...E pela tua história de vida...
Já aqui comentámos que, infelizmente, não foste o único caso de troca de nomes. O António Batista da Silva, esse outro morto-vivo da nossa Tabanca Grande, que mora na Maia, passou por um processo ainda mais kafkiano" do que o teu: foi "morto e enterrado"...
O padre de São de Brito devia ser um gajo com sentido de humor (negro), quando te diz, a ti, à noiva, aos padrinhos e demais participantes da cerimónia:
- Acabo de casar o morto!...
A idade com que casaste está na média da nossa geração ... Em 129 respostas até à data, ao nosso "inquérito", cerca de metade dos camaradas da Guiné diz que se casou logo depois de vir da Guiné, nesse ano ou no ano a seguir...
Que chegues pelo menos à bodas de platina, com a cabeça frescam são os meus votos...
Abraço. Luís
Camarigos,
Quantos mais "mortos-vivos" haverá?
Para já conhecemos dois.
Felicidades, camaradas "vivos".
Abraço.
Caros Camaradas
Seguiu já um texto que se for publicado explica melhor a situação.
Cópia onde consta o traço após a data 28SET967. MORTO – Abatido!
Se regressei a 30 de Outubro onde existe a informação. Não existe,
estou morto. O pior de tudo é que houve um Oficial no Regimento de
Artilharia de Costa (RAC), em Oeiras fez emendas na Caderneta, na
minha Caderneta. Tudo a vermelho.
Posso também, todos podemos alterar as Cadernetas Militares?
Decerto que não
Mário Vitorino Gaspar
Caros Camaradas
Se em Dezembro de 1968 soubesse que o Presidente da Câmara Municipal de
Lisboa era António Vitorino da França Borges, tinha sido Vendedor e de Balcão
da Regisconta. O vencimento era óptimo, acabava mais cedo, talvez a actividade.
O Morto Vivo
NOTA: Luís, foste tu que respondeste e me informaste que era António Vitorino
da França Borges.
Nunca me interessei. Obrigado Luís!
Mário Vitorino Gaspar
Caro Mário
Deve realmente ter sido uma grande surpresa!
E, como diz o Luís, o Padre do casamento tinha que ter 'sentido de humor' Podia não ter o 'sentido da oportunidade', mas humor, tinha de certeza.
A vida tem destas coisas.
Do teu relato confirma-se que era possível arranjar emprego com alguma facilidade. Havia a guerra, havia a emigração e uma coisa e outra gerava falta de profissionais. No caso de pessoas que tinham a 'questão da tropa resolvida' era então mais fácil.
Abraço
Hélder Sousa
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