domingo, 24 de abril de 2016

Guiné 63/74 - P16010 Recortes de imprensa (80): João Paulo Diniz (,que vai estar mais logo no Jornal da Meia Noite, da SIC Notícias, para relembrar o seu papel no 25 de abril): "As minhas melhores amizades são do tempo da Guiné, quando fui locutor do PFA - Programa das Forças Armadas, em Bissau, em 1970/72" (Excerto de entrevista, DN -Diário de Notícias, 30/8/2015)

1. Excerto, com a devida vénia, de um entrevista dada pelo nosso camarada João Paulo Diniz, ao DN - Diário de Notícias, em 30/8/2015.

João Paulo Diniz, ex-1º cabo, BENG 447, ex-locutor do PFA - Programa das Forças Armadas, Serviço de Radiodifusão e Imprensa, Repartição de Assuntos Civis e Acção Psicológica, QG / Com-Chefe, Bissau, 1970/72; profissional da Rádio e da TV, com 50 anos de carreira; Oficial da Ordem da Liberdade em 2013; membro da nossa Tabanca Grande, com o nº 630, desde 19 de outubro de 2013]


DN - Díario de Notícias > 30 de agosto de 2015 > 

João Paulo Diniz: "Gostava que me deixassem trabalhar"

Entrevista por Paula Freitas Ferreira


Na noite de 24 de abril de 1974, anunciou a chegada da democracia na rádio. Aos 66 anos, e com uma carreira de cinco décadas celebradas amanhã, o jornalista confessa ao DN que gostava de experimentar ser pivô de TV.


P: Comemora amanhã 50 anos de carreira no jornalismo. Ainda se lembra do seu primeiro dia?

Foi na Rádio Peninsular e pela mão de Augusto Poiares. Desde os 13 anos que lhe pedia constantemente que me deixasse fazer um teste na rádio. Tanto insisti que ele acedeu. Dias depois de fazer o teste, o meu pai telefonou-me e disse que tinham gostado do meu registo de voz. O radialista Aurélio Carlos Moreira tinha gostado da minha gravação e convidou-me para apresentar o Pajú, que era um passatempo juvenil. Tinha 16 anos.

P: E passou a viver na rádio...

João Paulo Diniz, radialista do PIFAS (Bissau, 1970/72).
Foto de Garcez Costa
Atirei-me de cabeça. Passava lá os dias. Saía às duas da madrugada e entrava às seis da manhã. Foram tempos muito felizes e fartei-me de aprender. Tapava buracos. Se faltava alguém, porque estava doente, eu substituía-o. Eles chamavam-me: "Miúdo, anda para aqui para a cabine" e lá ia eu, com todo o respeito, observar o que faziam essas pessoas que tinham uma enorme experiência em rádio.



P: Também esteve ao microfone durante a guerra colonial...

Fui mobilizado para a Guiné, onde estive entre 1970 e 1972. Tive muita sorte. Nesse período foram fabricadas as minhas melhores amizades. Como tinha experiência em rádio, convidaram-me para apresentar o Programa das Forças Armadas, que era carinhosamente chamado de PIFAs. Era um programa do género de Good Morning Vietnam. Anos mais tarde, já a Guiné-Bissau era independente, cruzei-me com o Presidente Nino Vieira e disse-lhe que tinha sido militar na Guiné, que apresentava o PIFAs e ele confessou-me que também eles ouviam o programa.

P: Otelo Saraiva de Carvalho escolheu-o para dar o primeiro sinal que esteve na origem da Revolução de Abril de 1974. Como é que tudo aconteceu?

Estava na cabine da rádio [Peninsular] e chamaram-me à porta, porque estava ali alguém para falar comigo. Era o Capitão José Costa Martins. Chamou-me ao carro e disse que as Forças Armadas precisavam que eu desse um sinal na rádio que iria marcar o início de um golpe de estado. Respondi que não o podia fazer. Não o conhecia, até podia ser da PIDE. Ele identificou-se e fez-me esta pergunta: "E se fosse o Otelo a falar consigo?"

P: E falou?

Sim. Eu tinha-o conhecido na Guiné-Bissau. Respondi que até gostava de lhe dar um abraço. Então o Capitão Costa Martins perguntou-me quando é que eu podia encontrar-me com o Otelo. Estávamos a 22 de abril de 1974 e respondi que podia marcar o encontro lá para meados de maio. Olhou muito sério para mim e disse que teria de ser naquele dia, que era muito importante. Percebi que era. Combinámos encontrar-nos nessa noite no Centro Comercial Apolo 70.

P: Como foi esse encontro?

O Otelo explicou-me os objetivos da Revolução: fim da guerra no Ultramar, libertação dos presos políticos, instauração de uma democracia com eleições livres. E foi então que se escolheu a canção que eu teria que anunciar, logo após a transmissão da senha, que era a frase: "Faltam cinco minutos para as 24 horas". A hora foi depois antecipada e marcada para quando faltassem cinco minutos para as onze da noite. Ele queria que eu colocasse no ar uma cantiga do Zeca Afonso, que estava proibido de passar na rádio e eu sugeri a canção E Depois do Adeus, de Paulo de Carvalho. A música tinha ido ao Festival da Canção e não iria despertar desconfianças.

P: Aceitou logo? Não teve medo?

Claro que sim. Perguntei: "E se corre mal?"

P: Otelo respondeu-lhe?

Disse-me isto: "Se correr mal, nós, que somos militares, vamos para a Trafaria [prisão militar] e o João, que é civil, vai para Caxias [cadeia]".


P: Há quem lhe chame herói de Abril. Arriscou a vida. Podia ter corrido mal...

Não sou nenhum herói. Os heróis foram os militares das Forças Armadas. Não arrisquei a minha
vida, arrisquei a minha liberdade. Eles sim, arriscaram as vidas... (...)


2. Mensagem de hoje do Garcez Costa,  reencaminhando um mail do João Paulo Diniz, de ontem, e  que se retranscreve:

De: João Paulo Diniz
Data: 23 de abril de 2016 às 16:15
Assunto: SIC-Notícias

Olá,

Por este meio gostaria de informar as minhas Amigas e Amigos que fui convidado para estar presente no 'Jornal da Meia-Noite' da  SIC-Notícias. E decidi aceitar.

Data - de 24 para 25 de Abril.


O 'Jornal' começa à meia-noite, já nos primeiros instantes de dia 25 e eu aparecerei não sei exactamente a que horas. Se puderem ver, agradeço, e que depois me digam o que acharam...

Kisses & Abraços,
JP

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Nota do editor:

4 comentários:

Antº Rosinha disse...

Gostei muito de o ver e ouvir na televisão à meia noite.

Este homem tem um olhar histórico muito sapiente, que só pode ter uma geração que estava muito bem preparada e madura.

Nem toda a nossa geração estava tão bem preparada, não somos perfeitos, paciência.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Grande João Paulo, gostei de te rever!.. És um senhor da rádio, mas tem igualmente uma excelente presença televisiva. Sei que te ficou muita mágoa por não te aproveitado na televisão. Tens razão, a independência tem o seu preço...

Foi um excelente prestação, não te esqueceste de nós, da malta da Guiné, não te esqueceste dos teus pais (, evocados com emoção!), não te esqueceste da mensagem essencial de abril, que a liberdade é também responsabilidade e igualdade de oporunidades... E essa equação não é, historicamente fácil. Fizeste justiça às rádios e aos homens da rádio que nessa noite de 24 e 25 de abril de 1974 tiveram un importante papel: Rádios Associados, Rádio Clube, Rádio Renascença!

Um abraço fraterno neste dia 25 de abril de 2016. Obrigado, Luís

Tabanca Grande Luís Graça disse...

João Paulo, voltaste a repetir o que já havias dito noutras entrevistas, a dúvida que formulaste ao Otelo: "Se correr mal ?"... E a resposta do Otelo: "Se correr mal, nós, que somos militares, vamos para a Trafaria e tu, que és civil, vais para Caxias"...

João, também foi um ato de coragem, da tua parte!... Afinal, tiveste o teu pequeno/grande papel na história... Mas não te armas, nem nunca te armaste em herói. Apreciei a tua postura de grande dignidade e de "low profile"... Queria acrescentar isto, em meu nome pessoal. LG

Felismina mealha disse...

Gostei de ler a entrevista! Não sabia que tinha sido o João Paulo Diniz que tinha "dado o sinal"! Muito Fixe! Já tivemos sentados à mesma mesa em Monte Real, em amena cavaqueira com os meus filhos, O Hélder Valério, o Juvenal, o João Caramba e a Rosa, e mais alguns amigos de que não recordo o nome. Foi-nos apresentado pelo nosso amigo Carlos Vinhal.

Obrigada João Paulo Diniz por ter aceite o pedido!

Saúdo todos os Homens de Abril, e todos os amigos da Tabanca Grande.

Felismina mealha