O nosso ex-camarada de armas (e hoje secretário-geral e deputado do PCP) Jerónimo de Sousa foi capa da revista "Visão", na sua edição nº 1216, de 22 de junho de 2016
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 15 de Abril de 2016:
Queridos amigos,
Quando li a reportagem sobre Jerónimo de Sousa e vi referência ao mato da Guiné, atirei-me à leitura. Havia para ali exageros inaceitáveis: a Bambadinca bombardeada, uma ida absolutamente incompreensível de uma seção reforçada da PM para Demba Tacobá, missão apresentada como num dos locais mais desolados da colónia, próximo da fronteira do Senegal.
Trocámos correspondência, gostei do desportivismo do secretário-geral do PCP, propôs uma conversa esclarecedora do que realmente se passara. Gostei daquela hora de convívio. Subsistem mistérios, um deles a natureza da missão, Demba Tacobá, para quem se recorda era uma tabanca em autodefesa num território em que naquele tempo ainda se circulava com absoluta segurança, sou testemunha, Jerónimo de Sousa nunca conseguiu apurar quem os atirou e porquê para castigo de abrir valas e pôr arame-farpado. Falámos da roupa aos pedaços, 47 dias com o mesmo fardamento, lembrei-lhe as micoses, as virilhas cortadas, enfim, rendi-me à versão que me deu.
Foi uma despedida cordial, por alguma razão somos camaradas da Guiné, e para sempre.
Um abraço do
Mário
Jerónimo de Sousa, Companhia da Polícia Militar 2537, 3.º Pelotão, Guiné
Beja Santos
A revista Visão, na sua última edição de Julho de 2016, publicou uma reportagem sobre o secretário-geral do PCP, referindo tratar-se de uma viagem, entre outras paragens, aos esteiros do Tejo, ao mato da Guiné, à infância em Pirescoxe e às primeiras gloriosas reuniões que os históricos do PCP. Interessou-me logo esta relação entre os matos da Guiné e o líder comunista. Li, e fiquei bem perplexo. O Soldado Condutor da Polícia Militar, Jerónimo de Sousa, fez comissão militar na Guiné entre 1969 e 1971. Depõe na entrevista que um dia o comandante o acordou de madrugada e o mandou apresentar no aeroporto com mais elementos de uma secção reforçada, foram 47 dias para um dos locais mais desolados da colónia, próximo da fronteira do Senegal. Reza o texto:
“Aterraram em Bambadinca, recentemente arrasada por 80 morteiradas”.
Li emudecido, Bambadinca foi flagelada em finais de Maio de 1969, praticamente sem consequências, e num outro ataque, poucos anos mais tarde, os foguetões foram todos parar ao rio Geba. Teriam feito uma viagem num Dakota e em Bambadinca mandaram-nos para uma localidade Demba Tacobá, perto de Dulombi. Foi-lhes dito:
“O PAICG apanha aqui a malta à mão. Se querem dormir, cavem abrigos montem segurança. Se querem comida, comprem na aldeia mais próxima. De vez em quando passaremos por cá. Vocês são homens fortes, são da Polícia Militar, passem bem”.
Regressaram a Bissau mês e meio depois, com a mesma roupa que tinham levado, já desfeita, e um alferes enlouquecido.
Aturdido com esta baralha informativa, escrevi ao deputado Jerónimo de Sousa, tentei aclarar que povoação era aquela próxima do Senegal e junto a Bambadinca, que arrasamento fora aquele, como sobrevivera com a mesma roupa no pelo 47 dias a fio. Trocámos correspondência, o secretário-geral do PCP revelou-se bem-humorado e pronto a cavaquear. Marcou-me entrevista para a Soeiro Gomes, e durante uma hora voltámos à Guiné.
Ainda hoje não sabe os motivos que levaram o comandante a enviá-los à pressa para Demba Tacobá. Como se falava de Demba Tacobá, procurei esclarecer se não havia confusão com Demba Taco, perto de Amedalai e de Taibatá e Moricanhe, já a apontar para o Corubal. Não, era mesma Demba Tacobá, uma localidade em que tiveram de abrir valas, viver em moranças numa localidade que nem de arame-farpado dispunha. Lembrava-se de uma criança ramelosa, não tinham levado maqueiro mas havia um saco de primeiros-socorros, lavou os olhos à criança, removeu o pus, e horas depois a criança aparecia-lhe com uns ovinhos nas mãos, era o seu agradecimento. Tratou-se de uma experiência terrível, o alferes entrou em perturbação, dava tiros a despropósito, chegava junto dos militares e rasgava-lhes as cartas de jogar, apanharam paludismo, de Bambadinca o alferes foi transferido para o HM 241 e posteriormente evacuado. Regressaram e foram levados. O mais importante foi a seguir. Estabeleceu um pacto com aqueles homens com quem viveu em Demba Tacobá, tinham aprendido as vicissitudes do viver do mato, andar a angariar alimentos para a subsistência, nem rações de combate lhes deram, compraram um panela por 500 pesos, galinha, cabrito, arroz e alguns legumes, era tudo negociado na localidade. Tinham aprendido a dureza do isolamento.
O pacto era simples: a partir daquele dia não se iria lixar nem mais um soldado. Assim foi durante semanas, o comando não gostou dos relatórios, queria resultados, detenções de gente de bota mal engraxada, barba por fazer, camisa aberta, cabeça descoberta, ou havia resultados ou voltariam a ser metidos no mato. Não desarmaram, iniciaram caça a oficiais e sargentos com tal intensidade que o comando percebeu o fundo da questão.
Jerónimo de Sousa passou a ver de maneira muito diferente a condição militar e lembrou-me uma história. Um dia, a desoras, apanharam um oficial médico totalmente embriagado. Toca de começar um auto de detenção. O tenente-médico gritava:
- “Prendam-me! Prendam-me já! Prefiro a prisão a voltar para o hospital e cortar corpos, não vos passa pela cabeça o sofrimento que vai por aquelas salas de operações e também não vos passa pela cabeça que eu tinha acabado de montar consultório, que amo a minha mulher, que tenho filhos crianças, que um dia me convocaram e para aqui me atiraram. Prendam-me! Estou saturado da minha dor e do sofrimento que tenho que viver na sala de operações”.
Havia ainda um assunto na manga, os tais 47 dias com a roupa a desfazer-se, recordei-lhe brandamente que três dias com aquele roupinha suada, empoeirada e emporcalhada dava direito a feridas e comichões, respondeu que iam conseguindo umas lavagens de tempos a tempos, fingi que acreditava piamente em tudo quanto estava a ouvir, não há corpo humano que resista a tanta falta de higiene.
Tinha-se passado uma hora de conversa, Jerónimo de Sousa avisou-me que ia partir para a Madeira daí a pouco. Perguntei-lhe se tinha fotos daquele tempo, disse que tinha para ali uma foto mal-amanhada e que me ia mandar durante a tarde, o que aconteceu. Avisei-o que a conversa havida ia para o blogue e que ele ainda está a tempo de se inscrever. Sorriu com gentileza, a Guiné fica muito longe mas foi determinante para ele passar a ver a condição humana com outros olhos.
Jerónimo de Sousa na Guiné
Foto: © Jerónimo de Sousa / Mário Beja Santos (2016). Todos os direitos reservados
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Foto: © Jerónimo de Sousa / Mário Beja Santos (2016). Todos os direitos reservados
Nota do editor
Último poste da série de 29 de agosto de 2016 > Guiné 63/74 - P16430: (De)Caras (43): Os "periquitos" da Tabanca da Linha: almoço-convívio de 21 de julho de 2016, no restaurante "Caravela de Ouro", em Algés, Oeiras (Manuel Resende)
13 comentários:
Demba Tacobá existe, na zona leste, no setor L1 (Bambadinca)... Julgo que pertencia ao subsetor de Mansambo, tal como Moricanhe, Afiá, Candamã... (Não tenho a certeza, se pertencia ao regulado de Badora, se ao regualdo de Cossé ou se ao regulado do Corubal)...
Demba Tacobá ficava a norte de Candamã, que pertencia ao regulado do Corubal (duramente atacada em 30/7/1969 pelo bigrupo do Mamadu Indjai, o mítico comandante, ferido várias vezes em combate, que, três anos e meio depois, estará entre os traidores que levaram ao assassínio de Amílcar Cabral, em Conacri)...
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/search/label/Candam%C3%A3
O Torcato Mendonça, ex-alf mil da CARI 2339 (Mansambo, 1968/69), que esteve com um grupo de combate em Candamã, pode esclarecer essa dúvida... A tabanca fica no mapa de Duas Fontes:
http://www.ensp.unl.pt/luis.graca/guine_guerracolonial47_mapa_Duas_Fontes.html
Também andei por aqui e devo ter passado em Demba Tacobá em julho ou agosto de 1969...
Não confundir Demba Tacobá com Demba Taco (subsetor do Xime), onde havia, no meu tempo, um 1 pelotão de milícias, tal como em Taibatá e Amedalai... Eram 3 tabancas em autodefesa muito sacrificadas, e que tanto eu como o Beja Santos conhecemos bem, naquele tempo...
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/search/label/Demba%20Taco
Aproveito para saudar o camarada Jerónimo de Sousa que foi comigo (meia centenas de graduados e especialistas da CCAÇ 2590, mais tarde CCAÇ 12, e outras companhias independentes, incluindo a dele, a CPM 2537) para a Guiné, no T/T Niassa, em 24/5/1969... Nunca nos encontrámos, nem nem lá nem cá... Só o conheço como figura pública...
Também li a sua !"história de vida" da "Visão" e na altura percebi que havia ali coisas por esclarecer: o impacto do ataque a Bambadinca, a eventual confusão entre Dembataco (no subsetor do Xime) e Demba Tacobá (no subsetor de Mansambo)... Mas estava mais inclinado a imputar os eventuais erros e lapsos factuais à ignorância do jornalista...
Afinal, o Jerónimo de Sousa tem razão: deve mesmo tratar-se Demba Tacobá, tabanca fula em autodefesa, na zona leste.no limite dos regulados de Badora, Cossé e Corubal)...
O Jorge Araújo (ex-fur mil op esp, CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/74) também cita Demba Tacobá, como fazendo parte do setor L1, ao tempo do BART 3873 (Bmabadinca, 1972/74):
(...) !"Durante o primeiro ano da missão [1972/1973] foram construídas nove escolas na área de jurisdição do Batalhão, a saber: Ganhoma, Samba Juli, Sincha Mamajã, Sansancuta, Mero, Tangali, Sincha Madiu, Afiá e DEMBA TACOBÁ, desconhecendo-se se destas alguma era Posto Escolar Militar. A edificação da Escola de Mero e de Sansancuta contaram com o apoio dos Pel Mil 358 e 203, respectivamente." (...)
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2014/11/guine-63734-p13895-historia-da-cart.html
Mário e Jerónimo::
Aqui têm a explicação para a "missão" que coube ao Jerónimo de Sousa e seus camaradas,a zona leste, no setor L1, na mesma altura em que lá estávamos lá, tu e eu, em Bambadinca... (E$u tinha acabado de chegar, no início da 2ªquinzena de julho de 1969)...
Mas vejo que há uma erro na data do regresso a Bissau: o pelotão do Jerónimo de Sousa terá sido destacado para Demba Tacobá em 20/7/1969 para ajudar a organizar a autodefesa das tabancas de Samba Juli (que tu conheceste...) , Sansacuta (onde eu estive pelo menos 15 dias) e Demba Tacobá, seriamente ameaçadas pela ofensiva do tempo das chuvas do Mamadu Indjai, o Terrível... Nºão te esqueças que o Mamadu Indjai pôs o flanco sul da zona leste (regulados de Corubal e Padada, em especial), a ferro e fogo, nessa altura, antes de ser gravemente ferido pelas NT...
Ao Jerónimo de Sousa calhou-lhe, na rifa, Demba Tacobá...
Se contares os tais 47 idas de inferno (sem dúvida, é o termo apropriado, para um "tuga", numa tabanca fula, sem arame farpado, sem valas, sem milícias, sem luz elétrica, sem água potável, sem reabastecimentos...), ele deve ter regressado a Bissau em princípios ou meados de setembro de 1969, talvez em 4/9/1969 ou 14/9/1969 e não 14/7/1969 (trata-se obviamente de gralha da autora, a aspirante de cavalaria Mariana Couto Pereira da Silva)...
(...) "A CPM 1751 ficou instalada em Santa Lúzia, efetuou patrulhamentos, guardas, rusgas e escoltas, e em 03Mai69 foi substituída pela CPM 2537.
A CPM 2537 [] a do hjerónimo de Sousa,] ficou, inicialmente em Santa Lúzia, e, a partir de 05Set69, ficou no Forte de Amura, tendo efetuado as mesmas ações que a CPM 1751.
Em 07Jul69, destacou efetivos para reforço temporário dos destacamentos de Rossum, Uaque, Jugudul e Infandre, no setor do BCaç 2885.
Em 10Jul69, cedeu um pelotão para reforço do BCaç 2856, que se instalou em Bafatá, e que em 20Jul69, seguiu para o setor do BCaç 2852 [, Bambadicna, Setor L1], para organizar a autodefesa de Samba Juli, Sansacuta e Demba Tacobá até 14Jul69, após o que recolheu para Bissau.
Em 28Jan71 a CPM 333534 substitui a CPM 2537. (...)
Estes elementos recolhi-os de um trabalho da Academia Militar:
O EMPREGO OPERACIONAL DA POLÍCIA MILITAR PORTUGUESA NO TEATRO DE OPERAÇÕES DA GUINÉ: 1962-1975
Autora: Aspirante de Cavalaria Mariana Couto Pereira da Silva
Orientador: Tenente-Coronel de Cavalaria José Manuel Carreiro Crespo
Relatório Científico Final do Trabalho de Investigação Aplicada
ACADEMIA MILITAR, Lisboa, julho de 2014, 113 pp. (incluindo anexos)
Disponível aqui:
https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/6806/1/Asp%20Cav%20Silva_TIA.pdf
Ainda segunda o relatório atrás citado: resumo da atividade da CPM 2537 (Bissau, 11969/71):
https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/6806/1/Asp%20Cav%20Silva_TIA.pdf
Apêndice A
História das CPM Mobilizadas para a Guiné
(...) A.4 CPM nº 2537: 1969-1971
Retirado de 2ªDivisão/4ªSecção/Caixa 106/ Número 3
03 a 30Mar69 – 1ª parte da Instrução de Aperfeiçoamento no RL2 (rondas, policiamentos, escoltas, serviço interno, etc.);
10Abr a 24Mai69 – 2ª parte da Instrução de Aperfeiçoamento no RL2;
24Mai69 – Embarque;
30Mai69 – desembarque;
31Mai69 – reforço do PPM 2072.
Atividade
- 07Jun69 – reforço de Rossum, Nova Uaque, Jugudul e Infandre;
- 10Jun69 – policiamento em Bafatá;
- 20Jun69 – autodefesa em Samba, Sansancuta e Demba Tacobá;
- 11Abr70 – PPM 2226 rende PPM 2072;
- 24Jul70 – Comandante CPM em missão de escolta;
- 01Ago70 – por insuficiência de pessoal deixa se de fornecer guarda à residência do Exmº. Comandante Militar;
- 19Out70 – CPM efetuou guarda de honra ao governador e Comandante-Chefe das forças armadas, Sua Ex.ª General António Spínola;
- 02Nov70 – CPM monta sistema de segurança às cerimónias;
- Nov70 – por insuficiência de pessoal a CPM deixa de fazer guardas às audiências do TMT;
- 01Dez70 – novas normas de fiscalização e controlo do Porto de Bissau, dentro e fora;
- 23Jan71 – fiscalização do Estádio Sarmento Rodrigues aquando da cerimónia de iluminação;
- 28Jan71 – rendida em todos os serviços pela CPM 3335.
Guarda noturna à residência do Comandante Militar;
Fornecido pessoal para os Postos de Fiscalização do QG e instalações militares;
Patrulhas a funerais;
Policiamentos em todos os espetáculos comunicados;
Posto permanente de fiscalização no Porto de Bissau;
Policiada a Gare de Bissalanca durante a permanência dos TAP;
52 Guardas de honra ao TMT;
23 Rusgas em Bissau;
379 Escoltas de prisioneiros;
15 Controlos de velocidades e operações STOP;
2031 Ocorrências:
o 1243 Movimentos Individuais;
o 428 Circulação Auto: Acidentes 109;
o 80 Desobediência à PM;
o 25 Por entrega da PSP;
o 26 Desertores e ausentes sem licença;
o 266 Agressões, informações e queixas várias.
No mês de Julho de 1969, a actividade do IN no Sector L1 (Bambadinca) foi intensíssima com ataques ou flagelações a diversas subunidades, ou emboscadas nas imediações (indicam-se a seguir as localidades e entre parênteses o dia)... Grande parte têm a assinatura do comandante do PAIGC, na região, o terrível Mamadu Indjai:
Dulombi (1),
Paia Numba (10),
Padada 2E4 (14),
Missirá (15),
Cansamba (15),
Madina Alage (15),
Cansamba (20),
Dulombi (24),
Mansambbo (24),
Xime (24),
Madina Xaquili (24),
Quirafo (25),
Xime (26),
Mansambo (27),
Madina Xaquili (28),
Dulombi (29),
Mansambo (30)
e Candamã (30)...
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2010/07/guine-6374-p6686-minha-ccac-12-5.html
A asneira é do jornalista, que assina a peça, Filipe Luís, quando escreve esta asneirada geográfica (, bolas, podia ter consultado o nosso blogue, e visto os nossos mapas!):
"Marchou com o seu pelotão rumo a uma missão de 47 dias num dos locais mais desolados da colónia, próximo da fronteira do Senegal. Aterraram em Bambadinca, recentemente arrasada por 80 morteiradas" (...)
Ora, Bambadinca fica no centro da Guiné, no regulado de Badora... Os 47 dias, contados a partir de 20/7/1969 (?), foram passados, mal, em 3 tabancas fulas, Samba Juli, Sansancuta e Demba Tacobá... Provavelmente 1 secção por tabanca... A Jerónimo de Sousa calhou-lhe Demba Tabaco...
Algum engraçadinho de Bambadinca, da CCS do BCAÇ 2852, deve ter tentado acagaçar os nossos bravos PM com a peta de que ali o PAIGC comia tugas ao pequeno almoço... Aquilo era feio, mas os tugas e fulas, valentes, aguentaram-se nas canetas... O vendaval do Mamadu Indjai passou e, pelo menos, no meu tempo (CCAÇ 12, julho de 1969 a março de 1971), o PAIGC nunca mais se atreveu a atacar ou sequer flagelar Bambadinca...A CCAÇ 12 defendia o chão fula, os seus soldados eram dali, eram de Badora, Cossé, Corubal...
Repete-se a 1ª parte do resumo da atividade da CMP 2537... No sector L1 (Bambadinca), as tabancas em autodeefsa onde esteve o pelotão do Jerónimo de Sousa froam Samba Juli [, o nome estava incompleto], Sansancuta e Demba Tacobá...
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Apêndice A
História das CPM Mobilizadas para a Guiné
(...) A.4 CPM nº 2537: 1969-1971
Retirado de 2ªDivisão/4ªSecção/Caixa 106/ Número 3
03 a 30Mar69 – 1ª parte da Instrução de Aperfeiçoamento no RL2 (rondas, policiamentos, escoltas, serviço interno, etc.);
10Abr a 24Mai69 – 2ª parte da Instrução de Aperfeiçoamento no RL2;
24Mai69 – Embarque;
30Mai69 – desembarque;
31Mai69 – reforço do PPM 2072.
Atividade
- 07Jun69 – reforço de Rossum, Nova Uaque, Jugudul e Infandre;
- 10Jun69 – policiamento em Bafatá;
- 20Jun69 – autodefesa em SAMBA JULI, SANSANCUTA e DEMBA TACOBÁ; (...)
É verdade, o setor L1 naquela altura estava longe de ser uma colónia de férias... E julgo que os 47 dias em Demba Taco, em plena época de terror do Mamadu Indjai, deve ter sido uma experiência marcante para os camaradas daquele pelotão da CPM 2537... E por ali perto, no subsetor de Mansambo, tinmha sido relamente apanhado à unha, tempos antes, um camarada da CART 2339:
5 DE NOVEMBRO DE 2006
Guiné 63/74 - P1248: Monteiro: apanhado à unha na fonte de Mansambo em 1968, retido pelo IN em Conacri, libertado em 1970 (Torcato Mendonça)
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2006/11/guin-6374-p1248-monteiro-apanhado-unha.html
... Quero dizer Demba Taco, Samba Juli e Sansancuta, as 3 tabancas por onde o pelotão foi dividido. Um mês antes for enviado à pressa o alf mil Fernando Gouvbeia para Madina Xaquili, setor de Galomaro... Era um homem de secretaria, não era um operacional... Na época, Spínola mobilizou toda a malta para defender o chão fula, face à ameaça do Mamdu Indjai...
https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/search/label/Madina%20Xaquili
Não era normal os PM virem para o mato!...O Jerónimo de Sousa não apanhou nenhuma porrada, e no fim o seu pelotão até foi louvado!
Havia ainda um assunto na manga, os tais 47 dias com a roupa a desfazer-se, recordei-lhe brandamente que três dias com aquele roupinha suada, empoeirada e emporcalhada dava direito a feridas e comichões, respondeu que iam conseguindo umas lavagens de tempos a tempos, fingi que acreditava piamente em tudo quanto estava a ouvir, não há corpo humano que resista a tanta falta de higiene.
Parafraseando Fernando Urlich: Aguenta, aguenta, no Cachil operação tridente a C.caç 557 foram 55 dias a ração de combate com a mesma roupa que eram quase só farrapos e alem dos mosquitos a falta de higiene em alguns militares os pés cheios de ninhos de matacanhas valendo ao mais sacrificado o alcunha o "Matacanhas" Mas há sempre o desenrasca durante o dia quando a situação o permitia andavas nus com um qualquer trapo a servir de tanga outro alcunha que devido à sua mini tanga recebeu o cognome o tanguinhas.
Pelos vistos, Zé Colaço, minguém mais, além de nós, se quer "meter com a PM"...
O Jerónimo de Sousa (ou melhor, a CPM 2537) foi comigo (ou melhor, com a CCAÇ 2590, futura CCAÇ 12) no T/T Niassa em 24/5/1969... Mas só o conheço de cá, e como figura pública...
Em todo o caso, entre 20/7/1969 e princípios de setembro de 1969, ou seja, durante 47 dias, andámos perto um do outro.... O seu pelotão foi ajudar a reforçar o sistema de autodefesa das tabancas fulas de Samba Juli, Sansancuta e Demba Tacobá, no setor L1 (Bambadinca), em pleno coração da Guiné (zona leste, chão fula), ameaçadas pela guerrilha do Mamadu Indjai...
Bambadinca não era na fronteira do Senegal, como escreve, grosseiramente, o jornalista da "Visão" que, pelos vistos, não consultou o nosso blogue... LG
Se o camarada Jerónimo de Sousa tivesse tempo (e vagar) para acompanhar o nosso blogue, já teria percebido por que é que o seu pelotão foi parar ao mato, por 47 dias, quando não era habitual as companhias de polícia militar saírem de Bissau... É que quando chegámos à Guiné, havia um homem, chamado Spínola, que começou baralhar as pedras todas do tabuleiro de xadrez da guerra de contraguerrilha....
Num dos postes da sua série "A Guerra Vista de Bafatá", o nosso camarada e amigo Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, do Comando de Agrupamento 2957, Bafatá, 1968/70, que é comandandado por um homem que, dizia-se, não gostava de Spínola, o cor Hélio Felgas)
explica o porquê da sua ida intempestiva para Madina Xaquili, no regulado de Padada, a norte do Rio Corubal, uma das muitas tabancas fulas que, vistas de Bissau, ficavam lá no "cu de Judas"...
Escreveu ele, o Fernando Gouveia, hoje arquiteto reformado da CM Porto:
"(...) Com a retirada das NT de Madina do Boé a 05/06FEV69 e na sequência do fracasso da Op Lança Afiada em Março de 69 era de prever (...) que o IN progrediria no terreno, para Norte, ameaçando as zonas povoadas do Cossé, aproximando-se de Bafatá.
"Em princípios de Junho de 1969 chega ao Agrupamento [de Bafatá] uma ordem do Comando Chefe que determinava o envio de oficiais disponíveis, enquadrando grupos de militares, para as tabancas da periferia da zona habitada, no intuito de segurar lá as populações. Sabia-se que a região do Cossé era habitada predominantemente por fulas e que estes, ao mínimo pressentimento de problemas, se deslocavam aproximando-se de Bafatá.
"É neste contexto que o Cor Felgas, meu Comandante (e do Agrupamento), determina que eu vá para Madina Xaqili, sendo a Companhia sediada em Galomaro [, a CCAÇ 2405 / BCAÇ 2852,] que me asseguraria a logística. (....) O Capitão, pessoa afável que gostaria agora de identificar [, o cap mil inf José Miguel Novais Jerónimo], deu-me todas as indicações sobre o que iria encontrar em Madina Xaquili.
"Sobre os 7 militares metropolitanos que me acompanhariam, escolheu um que sabia cozinhar, um que sabia fazer pão, outro que sabia de enfermagem e um rádio-telegrafista. Quanto ao armamento que me iria fornecer, fiquei alarmado: Além das G3 e de algumas granadas, só tinha o cano (só o cano e um cepo de madeira a servir de prato) de um morteiro 60, e 16 (dezasseis) granadas" (...).
"(...) Chegámos a Madina Xaquili a meio da manhã [ do dia 14 de Junho de 1969]. Era uma tabanca com umas 20 palhotas. Estava em auto-defesa, com cerca de 40 milícias, comandados pelo também africano João Vieira (sem Bernardo). Havia uma razoável cerca de arame farpado e abrigos construídos recentemente. A população civil (2 ou 3 famílias) e as mulheres dos milícias não tinham abrigos" (...).
Uns andaram a abrir valas a a reforçar o sistema de autodefesa das tabancas, outras andaram na porrada, como eu e a minha malta da CCAÇ 12, que mal chegou ao setor L1 começou a ter baixas: para o Sori Jau, o Braima Bá e o Uri Baldé, a "festa" começou e acabou logo ali, em Madina Xaquili, já depois do Fernando Gouveia ter regressado a Bafatá, felizmente sem ter precisado de usar o cano do morteiro 60 (sem prata e com apenas as 16 granadas)...
O Jerónimo de Sousa, também tanto quanto sei, regressou a Bissau, são e salvo, sem "batismod e fogo", felizmente para ele e para os seus camaradas PM... E até foi condecorado pelo cumprimento da missão que lhe confiada a ele e aos seus camaradas de pelotão... O alferes, pelo que ele nos conta, deve ter descompensado e deu baixa ao hospital, sendo posteriormente evacuado para a metrópole... Enfim, ele há coisas, que nos aconteceram naquele tempo e naquela terra, que nunca mais esqueceremos... Um abraço a todos. Luis Graça
Vd. poste de https://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2010/07/guine-6374-p6686-minha-ccac-12-5.html
Bom dia. Peço desculpa por invadir o vosso blogue.
Penso que sou neta de uma camarada vosso!
Aqui alguém conhece António Augusto Lopez?
Levou a esposa para Guiné e tiveram 2 filhas, era da zona de Freixo espada a cinta. O meu avô já morreu a 27 anos, minha avó a 20anos. Tenho poucas recordações dele, gostava de saber mais um pouco dele.
Regressou a Portugal com a família por volta de 1960 e poucos, trabalhou nos escritórios da Citroën e se dedicou a família.
Morreu em 1993 no hospital militar do Porto.
Foi um bom marido, pai/avô dedicado e uma boa pessoa, isto dito por familiares, amigos e conhecidos.
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