quarta-feira, 19 de agosto de 2020

Guiné 61/74 - P21270: Bombolom XXVI (Paulo Salgado): Jornal "O Tabanca" da CCAV 2721 no Olossato

1. Mensagem do nosso camarada Paulo Salgado (ex-Alf Mil Op Esp da CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72), autor dos livros, "Milando ou Andanças por África", "Guiné, Crónicas de Guerra e Amor" e "7 Histórias para o Xavier", com data de 18 de Agosto de 2020:


Jornal “O Tabanca”

Companhia de Cavalaria 2721 – Olossato e Nhacra, de Abril de 1970 a Fevereiro de 1972

Pois é: no Olossato, durante algum tempo – aquele que o tempo de que dispúnhamos e a situação no TO permitiam – construímos um jornal. Chamámos-lhe “O Tabanca”. Fruto de vontades individuais que se fundiram num esforço colectivo, “O Tabanca” pretendia, acreditávamos, ser uma forma lúdica e lúcida de dar vazão a ideias que fossem para além das conversas de bar (importantes naquele escoar das horas), das jogatanas de cartas (um escape pouco saudável) e dos copos bebidos em dia de folga (se folga havia) – sempre que as forças físicas e anímicas careciam de algo diferente.

Sem qualquer pretensão, um pequeno grupo começou a magicar algo que nos envolvesse para além da solidariedade conseguida nos momentos de perigo. A ideia, creio, partiu do Capitão Mário Tomé, Comandante da Companhia, logo secundada pelo Bento, pelo Branco e por mim próprio, depois alargada a muita malta que desejava “entrar” naquela andança. E que entrou. A sério.

Foi uma azáfama: primeiro, no Posto de Comando, tendo conversado, debatido e concluído pela designação a atribuir ao jornal. Penso ter sido o Bento (um “homem grande”) a alvitrar a designação. Já tínhamos quase cinco meses de guerra no lombo, e interessava dar outra coesão às tropas – que fosse para além das actividades bélicas; segundo, ver os pontos de interesse de cada um e do corpo de militares; finalmente, envolver, de forma gradual, a malta. Tivemos sorte, porque havia várias motivações pessoais, como é bom de ver. O Branco foi um desenhador excelente, além de autor. Houve muitas participações, incluindo inquéritos a soldados, cabos e graduados sobre diversos assuntos. Cada um escreveu o que lhe apeteceu, por vezes, muitas vezes, raiando a inconveniência, “o politicamente incorrecto”.

Um sentido importante foi dado: o nome Tabanca pretendia significar a forte ligação à aldeia. Por curiosidade, a ligação à tabanca era efectuada por diversas formas: limpeza diária da aldeia com equipa de serviço e jovens designados pelos chefes de tabanca, num Unimog com bidões construídos para o efeito; reuniões semanais com chefes tradicionais, apoio à população para deslocações nas colunas para Bissorã.






Voltarei ao tema “ligação à tabanca” noutro meu bombolom.

Ainda outra curiosidade da Companhia: fizemos vários encontros culturais e recreativos na Sala do Soldado.

Saíram somente quatro números. Com alguma regularidade. Foi um escape excelente. Um espaço de convívio. Ainda nos uniu mais, na Companhia. Basta ver os artigos através dos sumários de três números, os primeiros, pois perdi o quarto. A deslocação para Nhacra, fez dispersar os diversos grupos por aquartelamentos: Dugal, Tchugué, Ponte de Ensalmá e outros – o que retirou a coesão, que não a amizade e a solidariedade.

Paulo Salgado
Ex-alferes miliciano e comandante de companhia interino
Agosto de 2020.
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Nota do editor

Último poste da série de 30 de julho de 2020 > Guiné 61/74 - P21211: Bombolom VI (Paulo Salgado): Amaral Bernardo, um homem bom, um homem grande

1 comentário:

Valdemar Silva disse...

Interessante.
Os "soldadinhos" eram dactilografados com '&' (corpo), 'W' (pernas), '"' (botas), '^'(capacete), '/' (espingarda). No teclado do computador não se consegue sobrepor as várias letras para fazer o boneco, como nas antigas máquinas de escrever.

Valdemar Queiroz