sexta-feira, 28 de maio de 2021

Guiné 61/74 - P22230: Casos: a verdade sobre... (25): a vida e a morte do maj inf graduado Jaime Frederico Mariz (1936-1973): "sei muito poucas coisas do meu pai" (Frederico Rezende)


Jaime Frederico Mariz Alves Martins (Oeiras, 8/1/1936 - Guiné, 6/4/1973).


1. Mensagem de Frederico Resende, filho do nosso infortunado camarada major de infantaria graduado Jaime Frederico Mariz
 
Date: segunda, 24/05/2021 à(s) 09:27
Subject: Maj Infª Grad Jaime Mariz
 

Caro Sr Luís Graça, bom dia

 A minha filha Maria deu-me ontem conta da existência deste blogue.

O meu nome é Frederico (como o meu pai) Rezende (apelido que uso de minha mãe ). Sou filho do Maj Jaime Mariz.

Gostaria que, se não se importar, me enviasse informações sobre a sua vida e morte. Eu e minha mãe que entretanto já morreu, nunca soubemos exactamente o que se passou. Apenas que o avião tinha sido atingido e que não foram encontrados destroços.

A minha mãe foi à Suiça contactar a Cruz Vermelha e na altura a PIDE teve conhecimento e fez-lhe a vida num inferno. Desta forma contactou o PAIGC que confirmou que tinha abatido o avião.

Mas de concreto nunca soubemos muito mais.

Fico a aguardar.

ObrigadoCumprimentos

Frederico Rezende

2. Resposta do editor Luís Graça:

Caro Frederico:

O nosso blogue tem pelo menos 7 referências ao seu querido pai e nosso infortunado camarada. Não o conheci pessoalmente, estive na Guiné em 1969/71, mas quem com ele lidou, escreveu que era "pessoa de fino trato, aberto, civilizado, camarada". Pode ver aqui as referências que temos sobre o então comandante do COP 3 (*):
 
Se mo permitir, vou publicar a sua mensagem, na expetativa de poderem aparecer mais testemunhos sobre o senhor seu pai e as circunstâncias que antecederam aquele voo fatídico. Tudo indica que a avioneta DO 27, no percurso Guidaje-Bigene, em 6 de abril de 1973, terá sido abatida por um míssil Strela. E os restos mortais do seu pai nunca terão sido encontrados. 

Oxalá possamos escalarecer algumas das suas dúvidas  (**). Disponha do nosso blogue. Se tiver fotos e outras recordações do seu pai, e se as quiser publicar no nosso blogue, esteja à vontade. De resto, como gostamos de dizer, "os filhos dos nossos camaradas, nossos filhos são"... Este é um blogue exclusivamente de partilha de memórias e de afectos dos bravos que estiveram na Guiné, entre 1961 e 1974, dos 3 ramos das Forças Arnadas,

Um alfabravo (ABraço), Luís Graça, editor

3. Resposta do Frederico Rezende, com data de 27 do corrente:

Caro Sr Luís Graça:

Muito obrigado pela sua resposta que muito me sensibilizou.

Peço-lhe então o favor de publicar a minha mensagem e de me ir dando novidades caso as haja.

Sei muito poucas coisas sobre o meu pai. Sei que fez o curso de Lamego, sei que fez alguns cursos de contra-informação na África do Sul e das comissões que ele fez. Sei que foi Cmdt da PSP em Lisboa e pouco mais.

Caso seja possível mais informações ficaria muito agradecido.

Fico a aguardar. Bem haja
Frederico Rezende

4. Elementos para uma nota biográfica do major inf grad Jaime Frederico Mariz (Oeiras, 1936-Guiné, 1973), recolhidos  no nosso blogue (*)

Jaime Frederico Mariz Alves Martins:

(i) nasceu em Oeiras, em 8 de janeiro de 1936;

(ii) entrou para a Escola do Exército (antecessora da Academia Militar) em 16 de outubro de 1954, com 18 anos;  era o nº 400 do Corpo de Alunos;

(iii) fez três comissões de serviço no ultramar: em Moçambique, com  o posto de tenente (setembro de 1961 / fevereiro de 1964); em Timor, como capitão (abril de 1965 / maio de 1967); de novo em Moçambique, como capitão (setembro de 1968/setembro de 1970);

(iv) morte em combate no TO da Guiné, em 6 de abril de 1973;

(v) circunstâncias da morte: tendo embarcado num DO-27 em Guidaje com destino a Bissau, no decurso de uma missão de evacuação (TEV), o avião foi abatido por um míssil Strela, na região de Sambuiá, no norte da Guiné, entre Guidaje e Bigene; não foram encontrados vestígios do aparelho nas buscas posteriores quer terrestres quer aéreas; foi um dia fatídico para a FAP pois o PAIGC, em cerca de três horas, abateu 3 aviões e falhou o ataque a outros dois; o aparelho, DO-27 3470 era pilotado pelo fur pil Fernando António de Carvalho Ferreira; o major Jaime Frederico Mariz, cmdt do COP 3, aproveitou uma "boleia", pretendendo ficar em Bigene

(vi) segndo pesquisa efetuada pelo nosso coeditor Jorge Araújo, a aeronave da FAP, DO 27 3470, foi localizada submersa (algures na região norte da Guiné) tendo sido fotografada pelo médico holandês Roel Coutinho (vd. poste P18702)



Wikimedia Commons > ASC Leiden > Coutinho Collection > D 09 > Portuguese plane wreck in Northern liberated areas > Guinea-Bissau > Airplane wing number with Coutinho watching [Asa do avião,  DO-27, com o nº 3470, e o Coutinho a observar] 

(vii) No seu Diário da Guiné, o ex-alf mil António Graça de Abreu (CAOP1, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar. 1972/74), descreve o major Jaime Frederico Mariz nestes termos:  (...) "o major Jaime Mariz que conhecia muito bem, desempenhou durante algum tempo as funções de 2º. Comandante do Batalhão 3863, de Canchungo (Teixeira Pinto). Almoçámos e jantámos muitas vezes juntos na messe de Teixeira Pinto. Era pessoa de fino trato, aberto, civilizado, camarada. " (...) (Em nota de rodaté: "O corpo do major Jaime Mariz jamais foi encontrado, nem sequer foi possível fazer-lhe um funeral digno" (Mansoa, 7 de abril de 1973) (vd. poste P3826).

________

Notas do editor:

(*) Vd.  os 7 postes com o descritior "Jaime Frederico Mariz (maj)":


25 de setembro de  2020 > Guiné 61/74 - P21391: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XLIV: Jaime Frederico Mariz Alves Martins, maj grad inf (Oeiras, 1936 - Guidaje, 1973)

2 de junho de  2018 > Guiné 61/74 - P18702: (D)o outro lado do combate (31): Os dois aviões DO-27-A1, da FAP, nºs 3333 e 3470, abatidos em 6 de abril de 1973... Fotos do médico holandês Roel Coutinho (Jorge Araújo)

24 de abril de 2014 > Guiné 63/74 - P13031: 10º aniversário do nosso blogue (22): Quando os senhores coronéis da censura censuravam notícias com declarações de Spínola e a escalada da guerra no CTIG, incluindo a queda do DO 27 em que pareceu, entre outros, o major Jaime Frederico Mariz, comandante do COP 3, em 7/4/1973 (António Duarte, leitor do blogue)

29 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9960: (Ex)citações (179): A actuação da FAP em Guidaje (José Manuel Pechorro)

1 de Fevereiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3826: FAP (3): A entrada em acção dos Strella, vista do CAOP1, Mansoa, Março-Maio de 1973 (António Graça de Abreu)

17 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1668: In Memoriam do piloto aviador Baltazar da Silva e de outros portugueses com asas de pássaro (António da Graça Abreu / Luís Graça)

(**) Último poste da série > 20 de maio de  2021 > Guiné 61/74 - P22215: Casos: a verdade sobre... (24): o roubo de 200 cartas (ou mapas) do Serviço Cartográfico do Exército, atribuido às Brigadas Revolucionárias, em dezembro de 1972: o seu impacto no CTIG (Luís Graça / C. Martins / António J. Pereira da Costa)

9 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Este holandês, médico, simpatisante do PAIGC, é como eu logo suspeitei, de origem judaico-portuguesa, do lado do pai. A mãe é de origem alemã.

A família esteve escondida durante a guerra. Ele nasceu em 1946, mas a irmã nasceu durante a guerra, escondida em casa de vizinhos...Ele acabou por assumir o seu passado de judeu sefardita...

Foi pelo menos o que eu conseguiu perceber de uma entrevista a um revista, em holandês, língua que não domino. Utilizei o tradutor do Google. A revista, trimestral, é a "Benjamin", editada pela JMW (Ação social judaica), portanto uma revista que tem como público-alvo os holandeses de origem judaica.

https://www.joodswelzijn.nl/sites/default/files/pdf/benjamin_pdf/Benjamin_111_PESACH_voor_internet.pdf

O dr. Roel Coutinho tem um valioso álbum fotográfico sobre a Guiné, ainda do tempo da guerra, vista do "outro lado do combate", ou seja, do PAIGC.

antonio graca de abreu disse...

Obrigado, Luís, por te lembrares de mim nesta justíssima aproximação ao major Mariz.É um dos camaradas de armas a quem dedico o meu livro Diário da Guiné, 1972/74. Nesses dias escalavrados, quentes e fatais, antes dos Strella, almocei com ele no Clube de Oficiais, em Santa Luzia, Bissau. Apenas os dois, na mesma mesa, o major Mariz, um amigo mais velho. Hoje, na imensa distância temporal, recordo nesse almoço termos falado dos becos sem saída da nossa guerra de então, das injustiças do mundo.O major Mariz desapareceria no céu e na terra, na semana seguinte.

Abraço,

António0 Graça de Abreu

Anónimo disse...

António José Pereira da Costa (by email)
Date: sexta, 28/05/2021 à(s) 15:41
Subject: Re: Maj Infª Grad Jaime Mariz

Boa tardem Frederico

Se o major Mariz é quem eu penso, nasceu na Amadora (ao tempo, Concelho de Oeiras) e era filho de uma amiga da minha mãe, a S.ª D. Esménia. Moravam na Venteira, mas não sei onde.
Tenho ideia de o ver a ajudar à missa, mas, sendo mais velho e mais antigo, nunca nos cruzámos, embora eu estivesse na Guiné, nessa altura. Além disso, eu sou oficial de Artilharia.

Fui colega no Liceu Passos Manuel dum irmão dele. Ainda fomos da mesma turma no 5.º Ano e fomos finalistas em 1963/64.

Este era mais velho do que eu e terá seguido um curso na área das Letras. Nunca o encontrei nos encontros dos "Dinossauros da Amadora".

Sugiro que, sendo quem é, consulte o Processo Individual do seu pai quem se não estiver já no Arquivo Histórico, deverá estar no Arquivo Geral do Exército, ambos situados junto da Biblioteca do Exército no Largo do Outeirinho da Amendoeira, perto do Antigo Mercado de Santa Clara ou das Escadinhas do Arco D. Rosa, vindo da Rua dos Remédios.

O Cor Art Ref António Carlos Morais Silva recolheu elementos sobre todos os ex-alunos da EM, EG, EE (deve ser o caso do seu pai) e AM.

Em anexo segue um ficheiro que contém alguns elementos relativos ao seu pai. Na foto é o único que está com um uniforme n.º 2 cinzento e que, no meu tempo, já se não usava.
Segue também uma foto do memorial que, na AM (átrio do Paço da Rainha), evoca os mortos nas diferentes guerras.

À data da morte, o seu pai seria Cmdt de um COp (Comando Operacional) um tipo de unidade que agrupava operacionalmente 2/3 companhias e mais alguns meios operacionais, o que pode dizer da sua capacidade militar, considerando que nem havia sido "promovido", mas apenas graduado, talvez aguardando a promoção.

Com os melhores cumprimentos
Um Abraço

António José Pereira da Costa

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O nosso comum amigo (meu e do Tó Zé) e nosso camarada, membro da Tabanca Grande, António ou Tony Levezinho também faz parte do grupo dos "Dinossauros da Amadora". Talvez ele saiba algo sobre a família do Jaime Frederico Mariz Martins Alves. LG

Anónimo disse...

O Major Mariz Fernandes era comandante do COP 3 em Bigene; ainda o conheci pessoalmente enquanto alferes miliciano da C. CAÇ. 4540 que esteve em Bigene de Setembro de 72 a Dezembro do mesmo ano, quando foi transferida para Cadique no Cantanhez; ainda fiz operações na zona de Sambuiá onde caiu a avioneta, tendo perecido também o médico de Bigene Dr. Cantante Xavier. O falecimento destas duas pessoas causou enorme consternação no pessoal da C. CAÇ. 4540.

António J. P. Costa disse...

Camarada
Mariz Fernandes é outra pessoa.
É de Artilharia e, segundo creio, está vivo.
Um Ab.
António J. P. Costa

António J. P. Costa disse...

Enviei este e-mail ao filho do Major Mariz

Boa noite Frederico
Escrevi mal o nome da sua avó, mas o I no início de certas palavras soa como se fosse E.
Confirma-se que os vossos avós moravam na Venteira, perto da Igreja Nova, construída no antigo campo do Estrela da Amadora.
Mas recordo o seu pai ainda na capela da Falagueira que era a "igreja da Amadora". Julgo que o oficiante era o Padre Lúcio Marçal do Rego que foi quem transferiu o culto para a igreja da Venteira.
Foi o seu tio Celso que andou comigo no Liceu. Reconheci o nome. Fiquei com a ideia de que era um jovem contestatário, mas perdi-lhe o rasto após o Liceu.
Não tenho conhecimento do tal sapateiro "bufo", mas é possível que tivesse sido um "bufo de 500 paus"...
Tenho ideia (muito vaga) de que um avião Tiger Moth com a fuselagem em lona ou similar caiu naquilo que tinha sido a pista da "Aviação República" e se incendiou. Relativamente à consulta do P. Ind. do seu pai, creio que não necessita de nenhuma autorização especial, visto que ele morreu há quase 50 anos. Contudo, e porque mora na Madeira será bom contactar os Arquivos. Talvez o Geral, admitindo a hipótese de que os documentos ainda não tenham transitado para o Histórico.
Seguem os ficheiros, de novo.
Poderá contactar o Cor Morais da Silva que também mora na Venteira.

António Costa

Anónimo disse...

Frederico Rezende (by email respondendo ao coronel António José Pereira da Costa=
28 mai 2021 21h

Caro Sr Coronel
Muito obrigado pelas suas por esta sua informação.
Peço o favor de ler em baixo aproveitando as suas palavras;

(i) O meu pai morava na Amadora.

Do que me lembro morava no Largo da Igreja e também me lembro que havia lá um sapateiro que depois do 25 de Abril veio-se a saber que era informador da PIDE.

A minha Avó chamava-se Isménia.
E pelos vistos era amiga da Sra sua Mãe.

O meu pai tinha mais quatro irmãos.

Os dois mais novos ainda são vivos. O meu pai era o mais velho. A seguir ao meu pai era o meu Tio António e lembro -me que foi Cmdt dos Bombeiros na Praça da Alegria em Lisboa ao mesmo tempo que o meu pai era Cmdt da PSP e o Comando da Divisão ( julgo que a 1ª Divisão ) era mesmo ali ao lado.

O meu outro Tio já falecido era o Celso e trabalhava na TAP na parte da manutenção, creio.
Lembro-me de ouvir contar que o meu pai começou como aluno de aviação e lembro-me de me contarem que “rasava” o telhado do prédio da minha Avó para a assustar e pelo que sei resultava.

Julgo que terá caído algum avião na altura ou terá havido alguma situação de susto e o meu pai “virou-se “ para o Exército.


(ii) Tenho curiosidade emconsultar o processo individual do meu pai e agradeço a sua sugestão.

Tenho alguma dificuldade de o fazer pois moramos na Ilha da Madeira e tenho que averiguar como o poderei fazer quando for a Lisboa. Será difícil obter as respectivas autorizações para consultar o PI?

(iii) Confirmo que o meu pai foi aluno da EE - Escola do Exército.

(iv) Confirmo que o meu pai era Cmdt do COP 3.


Muito obrigado a todos pela vossa atenção e ajuda

Cumprimentos

Frederico Rezende

João Carlos Abreu dos Santos disse...

Infos:
A foto acima reproduzida, representa a asa direita da DO27 oriunda da BA12 e tripulada pelo furriel piloto João Manuel Baltazar da Silva, cujo aparelho, quando em sobrevoo ao itinerário Samogi>Talicó, cerca das 09:45 de 6ªfeira 06Abr1973 foi atingido por míssil SAM7 lançado pelo PAIGC: além do piloto, pereceram também o alf milº médico João Manuel Cantante Santos Silva (do COP3), e o 1Sg Sapador João Agostinho Gonçalves Oliveira Figueira (da CCac19); os corpos daqueles militares vieram a ser resgatados por um grupo de combate da CCP123 e transportados para o BCP12; o alferes está sepultado no cemitério da Marinha das Ondas (Figueira da Foz); o sargento está sepultado no cemitério do Funchal; (quanto ao piloto, até ao momento desconheço local de inumação).
Naquele mesmo dia, quando as NT procediam à 2ª tentativa de evacuação de feridos gravemente atingidos no itinerário Guidaje>Sambuiá, pelas 13:15 a DO27 #3333 tripulada pelo furriel piloto Fernando António de Carvalho Ferreira, foi atingida por outro míssil SAM7 lançado pelo PAIGC: além do piloto, pereceram também o 1Cb enfº Paulo Feliz Fonseca Cóias (da BA12), e o maj grd inf Jaime Frederico Mariz Alves Martins (cmdt do COP3); nenhum dos corpos daqueles três malogrados militares foi encontrado.
Pouco depois o major pilav Rolando Frederico Mantovani Borges Filipe, 2º comandante do GO1201, seguiu da BA12 tripulando um T6 rumo ao sector de Guidaje, vindo aquela aeronave a ser atingida por outro SAM7 lançado pelo PAIGC à vertical do itinerário Batur>Guidaje; (até ao momento desconheço se o corpo foi resgatado e eventual local de inumação).
Paz às suas Almas.