"A MINHA IDA À GUERRA"
João Moreira
PREMONIÇÃO
A CCAV 2721 chegou à Guiné em 11 de Abril de 1970.
Foi colocada em OLOSSATO, na região do OIO, próximo da famosa base do MORÉS.
Ao longo da nossa permanência no Olossato os nossos soldados começaram a dizer que a nossa Companhia ia para Nhacra.
Era muito bom, porque em Nhacra não havia guerra.
Este boato começou a correr mais ou menos em Junho, ou seja 2 meses após a nossa chegada.
Nós, graduados, dizíamos-lhes para não acreditarem nisso e não criarem falsas ilusões.
- "QUANDO A ESMOLA É GRANDE O POBRE DESCONFIA". Mas, de 2 em 2 meses lá voltavam os soldados a dizer que a Companhia ia para Nhacra.
Apesar de nós, graduados, continuarmos a dizer-lhes para não acreditarem, eles insistiam.
E o boato ia-se repetindo de 2 em 2 meses.
E em Abril de 1971, num domingo de Páscoa, confirmou-se que a CCAV 2721 ia para Nhacra.
O capitão estava de férias e a Companhia era comandada pelo Alferes Salgado.
Eram cerca das 4 horas da tarde e o alferes Salgado apareceu de jeep em frente ao bar de oficiais e sargentos e convidou-me para o acompanhar na visita que ia fazer à tabanca.
Passado pouco tempo informou-me que tinha recebido uma mensagem a dizer que a Companhia ia para Nhacra.
Trocamos comentários acerca da persistência dos soldados que de 2 em 2 meses não deixavam de afirmar que a Companhia ia para Nhacra, onde NÃO HAVIA "GUERRA".
A chegada da CCAV 3378 em 13 de Maio foi a confirmação da nossa ida para Nhacra.
Em 31 de Maio foram 2 GComb e parte do comando e especialistas da Companhia para Nhacra.
5 de Janeiro de 1972 > João Moreira junto à piscina de Nhacra
O resto da Companhia foi no dia 9 de Junho para Nhacra e sofremos um ataque, após termos instalado os soldados nas futuras instalações do Posto Retransmissor da Emissora Oficial da Guiné.
Íamos para Nhacra - ONDE NÃO HAVIA GUERRA - e fomos recebidos com um ataque.
(continua)
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Nota do editor
Último post da série de 16 DE MAIO DE 2024 > Guiné 61/74 - P25531: A minha ida à guerra (João Moreira, ex-Fur Mil At Cav MA da CCAV 2721, Olossato e Nhacra, 1970/72) (43): HISTÓRIA DA COMPANHIA DE CAVALARIA 2721: Sobreposição à CCAV 3378
3 comentários:
A fazer fé na narrativa do camarada João Moreira, haveria militares na 2721 com acesso privilegiado a informações confidenciais, como as da rotação das unidades.
Estranhíssimo que se falasse na rotação de uma unidade após dois meses da sua chegada à Guiné (Abril de 1970) e da sua colocação em quadrícula numa zona perigosa como era o Olossato, no Oio, com o Morés ali tão perto.
Por outro lado, os Comandos Militares de Bissau tinham programado para próximo do fim do ano de 1970, arrancar as obras de asfaltamento do troço da estrada Mansabá-Farim, a partir do Bironque, até à margem esquerda do Rio Cacheu, Plano de Operações "Faixa Negra", pelo que todas as unidades de quadrícula da Zona de Acção iriam ter trabalho acrescido.
Assim, em Novembro de 1970 foi reactivado o COP 6, que ficou sediado em Mansabá, onde estava como unidade de qaudrícula a martirizada CART 2732. Este COP teve como missão o comando e a coordenação de todas as tropas envolvidas na protecção da zona próxima dos trabalhos e a execução de acções ofensivas nas áreas mais sensíveis. Para o efeito houve um reforço de tropas "normais" e especiais, nestas últimas a 27.ª CComandos e a CCP 121 reforçada com 2 Pelotões da CCP 122.
Sabemos que o Gen Spínola tinha especial simpatia pelas tropas de Cavalaria, não fosse ele oficial desta Arma, por isso o alto privilégio da 2721 em sair de uma zona perigosa como a do Morés e ir para Nhacra, que o que tinha de mais perigoso era ser um "posto avançado" de Bissau.
A CART 2732 que trabalhou desalmadamente na protecção diária aos trabalhos do asfaltamento da estrada, participando ainda em operações ofensivas, fazendo colunoas quase diárias para norte (K3) e para sul (Mansoa), aguentou estoicamente 22 meses em Mansabá, perdendo ainda dois militares a escassos 2 meses da sua retirada definitiva para Bissau.
Durante muitos meses correram os boatos de que iríamos ser premiados com a ida para uma zona mais sossegada mas não passou de boato.
(continua)
Moreira, em Nhacra é que era bom e até tinha uma piscina.
Como é que aconteceu um ataque em Nhacra, tão perto de Bissau e rodeada de tantos aquartelamentos. De onde partiu e fugiu o IN?
Na fotografia aparece um homem com um pano branco a servir de vestimenta. Quando estive, uma vez, em Bissau também vi um homem assim vestido, que parecia não trazer nenhuma roupa interior e trazia uma catana a tiracolo que diziam ser um felupe e que vinha a pé de muito longe.
Saúde da boa
Valdemar Queiroz
(continuação)
História da Unidade CART 2732
Na Pág. 21 do Cap II/Fasc 10 - 01ABR a 30ABR71, pode ler-se:
4. Nossas Tropas
A rotação da CART como prémio pelo enorme esforço dispendido quando da construção da Estrada Mansabá-Farim foi por todos os seus elementos entendido como promessa feita.
A sua não concretização afectou profundamente o seu estado de espírito e influenciou desfavoravelmente o aspecto disciplinar.
Na Pág. 30 do Cap II/Fasc 15 - 01SET a 30SET71, pode ler-se:
4. Nossas Tropas
Devido ao intenso trabalho que tem tido ao longo da comissão, vão-se notando sintomas de cansaço e vão surgindo pequenas mazelas nos seus homens o que faz que só se possa contar com 3 GCOMB operacionais que para manter a actividade irá aumentar o cansaço da Companhia.
Na Pág. 34 do Cap II/Fasc 18 - 01DEZ a 31DEZ71, pode ler-se:
4. Nossas Tropas
Terminando a sua comissão em 17 de Janeiro de 1972 e tendo sofrido este mês 2 mortos, 14 feridos graves e 27 feridos ligeiros, a CART encontra-se bastante desfalcada dos seus efectivos o que contribui grandemente para uma nítida quebra moral. Aliado a este facto, está aparecendo na maior parte dos soldados pequenas mazelas como doenças de pele, paludismos, varizes e outras características de tropas em fins de comissão.
E digo eu para terminar:
Como em tudo na vida, na tropa havia filhos e entiados.
Carlos Vinhal
Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas
CART 2732
Mansabá - ABR70/FEV72
Guiné - 17ABR70/19MAR72
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