quarta-feira, 19 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25661: Timor Leste: passado e presente (8): Os últimos soldados do império que estiveram prisioneiros do IN, na Indonésia (de setembro de 1975 a julho de 1976): tiramos o quico, o chapéu, a boina, o barrete, o boné... à Ephemera - Biblioteca e Arquivo do José Pacheco Pereira

 






Foto de um grupo de 14  (e lista nominal dos  23)  militares portugueses, do Agrupamento de Cavalaria de Fronteira, em Bobonaro, Timor Leste), que, apanhados pela guerra civil, fratricida, entre  timorenses,  acabaram por ficar prisioneiros do IN (desde setembro de 75 a julho de 76). 

A lista nominal foi publicada pelo DP - Diário Popular, de 19/2/1976; o Diário de Lisboa, de 29 de julho de 1976, publicou, depois,  uma reportagem aquando do seu regresso: "Fim de um pesadelo: sãos e salvos regressaram a Portugal todos os militares prisioneiros em Timor"...  Estes nossos camaradas terão sido mesmo os últimos soldados do Império a regressar a casa, numa altura em que, em Portugal, ainda era escasso o conhecimento sobre o processo de descolonização de Timor. A Força Aérea foi buscá-los a Bali.

O IN neste caso era a Indonésia... Estes nossos camaradas estiveram detidos, a maior parte do tempo em condições infames, sem respeito pela Convenção de Genebra, um mês em Timor Leste e 10 meses na parte ocidental de Timor, indonésia, em Atapupo e, depois, também, em Atambua, no último mês... 

Timor ocidental, outrora colónia holandesa, é ainda de má memória para os portugueses e timorenses, vítimas da invasão e ocupação dos japoneses em 1942/45: foi de Atambua  que vieram as criminosas "colunas negras", armadas e alimentadas pelos ocupantes, e que espalharam o terror pelo território português) (*)...

O militar mais graduado, deste grupo de  23 prisioneiros, era então o  major inf 'cmd' António Ivo do Nascimento Viçoso, falecido com o posto de coronel na situação de reforma: em 1999, "23 anos depois", deu um entrevista ao "Público" onde falou deste duros tempos de cativeiro, e do tratamento frio, calculista, cínico, desonroso, que lhes foi dado pelos indonésios...


1. Estes documentos (que reproduzimos acima, com a devida vénia)  estão disponíveis na Ephemera - Biblioteca e Arquivo de José Pacheo Pereira, a quem temos de tirar o quico, o chapéu, a boina, o barrete, o boné... por se ter tornado,  não o maior "almeida" do mundo, mas seguramente o melhor: "recolhe o lixo de hoje" que nos falta para alimentar a nossa memória...

E não faz distinção entre o "lixo" de 1ª classe ou de 2ª classe, dos ricos e poderosos, ou dos fracos e pobres, das maiorias ou minorias,  dos de esquerda ou de direita, de Deus ou do Diabo, dos santos e pecadores... 

Estamos a falar do o "lixo" que a maior parte de nós deita fora... Ou que os nossos herdeiros consideram "lixo", quando batemos a bota... No nosso caso, de antigos combatentes na Guiné (1961/74) coisas como brasões, guiões, crachás das nossas antigas subunidades; diários, cartas, aerogramas, cartazes, fotografias, recortes de jornal; objetos pessoais ou de guerra, que trouxemos daquele território; documentos militares ou do PAIGC,  etc., etc. 

Porque não há conhecimento sem informação nem informação sem dados... O "lixo" de hoje, depois de tratado,  é "conhecimento" amanhã. Esse, é resto, também a missão do nosso blogue, que foi criado com o propósito de "não deixarmos que sejam os outros a contar (ou a ignorar, escamotear, esquecer) as nossas histórias", que são afinal os nossos pequenos rios da memória que vão confluir para o grande rio da História...

Como a Ephemera escreve, com piada, no seu sítio, "Se o Diabo publicar panfletos vamos ao Inferno recolhê-los"... Aliás, e como diz o nosso povo (que gosta de blasfemar), "tão bom é Deus como o Diabo".

3. Com a devida vénia a esta fantástica e generosa equipa de voluntários que faz o Arquivo Ephemera, reproduzimos o seguinte nota que  o José Pacheco Pereira escreveu, em 10/6/2018, sobre a documentação que lhe chegou às mãos, e que ainda está por tratar, relativa aos 23 militares portugueses prisioneiros na Indonésia, em 1975 e 1976 (quase um ano):

(...) Agradeço a Luís Manuel Barata de Carvalho (um dos 23 prisioneiros) e a José Mendes Lopes (então militar em Timor) a oferta do acervo recolhido por Palma Carlos que inclui a mais completa documentação sobre o que aconteceu aos soldados portugueses feitos prisioneiros quando da invasão indonésia. 

"O acervo inclui um vasto número de fotografias sobre o quotidiano em Bobonaro onde estavam aquartelados antes da invasão, e depois em Batugadé onde estavam detidos e nos diferentes locais de detenção. Entre a documentação inclui-se correspondência pessoal e oficial, todo o processo da sua libertação, e a posterior recepção, homenagens e regularização dos seus direitos militares e civis. 

"Foi um processo complexo, a que não faltou muita conflitualidade política e bastante acrimónia, mas sem o compreender e estudar não é possível analisar o processo de descolonização de Timor. (...)

15 comentários:

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Esta é para o Valdemar, que é bom observador:

(i) Reconhecem-se dois alferes, na segunda fila, de pé, nos extremos, um à esquerda e outro à direita;

(ii) pelo menos um ou dois 1º cabos: na 1ª fila e na 2ª fila;

(iii) o major inf 'cmd' Viçoso pode ser o primeiro da primeira fila, na ponta esquerda;

(iv) haverá um 1º ou 2º sargento, já meio careca, na fila de trás (a 3ª);

(v) andava tudo a precisar de ir ao barbeiro;

(vi) havia uma viola, que bom!

(vii) imagino o que terão sido as "férias" de 11 meses, destes nossos camaradas, na "ilha feiticeira", como os velhos colonos e deportados chamavam a Timor...

Tabanca Grande Luís Graça disse...

O que será feito hoje destes homens, nossos camaradas ?

Um deles já sabemos que morreu, em 2008, o então (em 1975) major inf 'cmd' António Ivo do Nascimento Viçoso... Deu uma entrevista ao Público, em 2009...Era cor inf 'cmd' ref.

Valdemar Silva disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Valdemar Silva disse...

Luís, de quem será a mão que está no ombro do camarada em pé ao centro com uma camisola interior branca?

Tive um colega de trabalho que tinha sido mobilizado para Timor, em 1967, andou por lá mais de 24 meses e queixava-se de só haver carne de porco. Também tive dois colegas que foram mobilizados para a Índia, tendo um deles, como oficial, sido prisioneiro quando houve a rendição.

Valdemar Queiroz

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Bem obsservado, mas pela posição do polegar, pode a mão do dono do baraço que está à direita do dono do ombro...

Antº Rosinha disse...

Mas alguém no terreiro do paço quis saber se existia algo em Timor digno de atenção? durante aquele período do tal Prec? Portugal ficou indiferente a Timor 25 anos!

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Tens razão, Rosinha, mas eu sempre ouvi dizer, desde o meu tempo de escolinha (por acaso uma escola construida com o patacão do maior benemérito do séc XIX, grande esclavagista e grande apoiante da causa da D. Maria II, o Conde de Ferreira...) que Portugal ia do Minho a Timor. Nunca acreditei fosse assim tão comprido, o nosso Portugal, mas eu só fui a Lisboa aos 8 anos, e ao Minho aos 28... e à Guiné mais cedo, aos 22... e em Timor nunca lá pus os pés... E só agora é que me deu para saber mais: por exemplo, por que é que há 70 um puto tinha que saber onde ficava, no mapa-mundi, essa meia ilha chamada Timor, uma cagadela de mosca, ao fim e ao cabo... E não se podia confundir a Oceania e a Ásia, que eram continentes diferentes. Mas, para além da capital, Dili, não sabia menhum topónimo de Timor. Ainda bem que não havia lá linhas férreas, se não teríamos que decorar as estações...

Era uma maçada um país europeu tão pequeno como o nosso ter um império tão grande que não dava para os putos da escola irem dar uma voltinha até Macau, Dili, Lourenço Marques, Luanda, e por aí fora...Afinal, não foi preciso esperar muito anos, aos 20, lá embarcámos nos Uige, Niassa, Vera Cruz, etc., para conhecer melhor a herança dos nossos avoengos... Foi, afinal, o cruzeiro das nossas vidas...

Mantenhas. LG

Antº Rosinha disse...

Pois Luis Graça, tu e eu ainda tivemos muita sorte, porque umas gerações de putos antes de nós, além das capitais das colónias e ilhas adjacentes ainda tiveram que decorar todos os estados do Brasil e suas capitais.

Isto para quem entrou na escola em 1943 e que ainda havia o trema no acordo ortográfico.

Mas no caso de Timor que ficava nos confins, não fazia muita diferença para o terreiro do paço, com o que se passou com a FLA nos Açores e a FLAMA na Madeira, cada um por sua conta, que se desenrascasse.

Luis, tu só foste a Lisboa aos oito anos, mas até já tinhas visto o mar, mas historicamente, quantos milhões aos oito anos, sem nunca terem visto o mar, foram a Lisboa, mas para apanhar o barco para as américas e áfricas, em porões.

Luis, tu lembras constantemente aquela dos "Poucos mas Loucos", e a nossa geração viveu uma das muitas loucuras da nossa história.

Foi tudo uma loucura das valentes! Do princípio ao fim!







Valdemar Silva disse...

Antº, Rosinha, julgo que em Timor havia meia dúzia de colonos, se tanto, mais alguns portugueses deportados pelo governo da ditadura. Também havia tropa metropolitana, um ou dois funcionários do BNU e as entidades oficiais também eram portuguesas como no caso do pai de Zeca Afonso.
Desconhecia essa de ser obrigatório saber a geografia física do Brasil, em que anos escolares é que isso aconteceu?

Valdemar Queiroz

Valdemar Silva disse...

Luís, a mão parece ser do braço de quem está à esquerda do tropa de camisola branca, mas na fotografia ampliada aparece uma sombra diferente de um braço.

Valdemar Queiroz

Antº Rosinha disse...

Valdemar, quem tinha menos 2/3 anos que eu, meus vizinhos amigos e primos que fizeram a escola primária sabiam todos os estados brasileiros e penso que já na terceira classe.

Eu entrei em 1945, portanto garantidamente quem em 1942 entrou na escola teve que aprender alem de Angola e Guiné e Timor, ainda o Brasil.

E sobre o trema, como herdei um livro de outros mais velhos, ainda se escrevia nesse livro "reunião" com trema no "U".

Valdemar Silva disse...

Antº. Rosinha, desconhecia que em 1945 também se dava a geografia do Brasil na escola primária.

Então em porque teria acabado, que em 1955, na minha 4ª. classe, já não se dava essa matéria?

Valdemar Queiroz

Fernando Ribeiro disse...

Caro Luís,
Na escola primária do nosso tempo, aprendia-se que a Província Ultramarina de Timor era constituída pela parte oriental da ilha de Timor, o enclave de Oecussi Ambeno, a ilha de Ataúro e o ilhéu Jaco. Mais se aprendia que a capital da província, Díli, tinha um clima muito insalubre e que o ponto mais alto de Portugal era o monte Ramelau, em Timor, com três mil metros de altitude. Isto, pelo menos, aprendi eu ainda na década de 50, já lá vão "alguns" anos (como me sinto velho!).

Os militares africanos da minha companhia disseram-me que tiveram que aprender, na escola primária que frequentaram em Angola, os nomes das estações de caminho de ferro da Metrópole, assim como os dos afluentes dos rios da Metrópole, mas não tinham que saber os nomes das estações dos caminhos de ferro de Luanda, Benguela e Moçâmedes, nem os dos afluentes dos rios Zaire, Cuanza ou Cunene, na sua própria terra! Pois. Uma coisa era a Metrópole, outra coisa eram as colónias, esses territórios secundários eufemisticamente chamados províncias.

Prezadíssimo Valdemar,
Eu sou ligeiramente mais novo do que vocês, mas aprendi uns rudimentos de geografia do Brasil logo no princípio da terceira classe, e não na quarta. O livro de Geografia por que estudei começava logo pelo Brasil e só depois passava a Portugal Continental, Insular e Ultramarino, como então se dizia. Tinha esta capa, tal e qual:

https://castroesilva.com/imagens/2305/2305MA019_1.jpg

Caro Antº Rosinha,
Os opositores ao Acordo Ortográfico queixam-se de que o dito cujo obriga os portugueses a escrever em "brasileiro". Eu tento aplicar o Acordo, embora ache que ele foi um pouco longe demais. Ao contrário do que muitos dizem em Portugal, o Acordo Ortográfico também obrigou a algumas mudanças na ortografia empregada no Brasil. O uso do trema, por exemplo, foi abolido e hoje já nenhum brasileiro escreve "seqüência".

Valdemar Silva disse...

Caro Fernando Ribeiro, eu fiz a 3ª. e 4ª. em Afife, com exame final em Viana, nos anos de 1954/55/56.
Eu não me lembro desse livro de Geografia, nem de estudar o Brasil na Instrução Primária.
E se o Brasil vinha nas primeiras lições não me esqueceria, como com Timor que era no fim e já não havia grande atenção. Eu era bom aluno e não me esqueceria do Brasil.

Abraço e saúde da boa
Valdemar Queiroz

Tabanca Grande Luís Graça disse...



Monte Ramelau

Pico Ramelau... "O mais alto de Portugal"... Já não me lembrava, eu que fiz o exame de admissão aos liceus com distinção... Pensava que era o "o pico do Pico" (2351 m)...

Obrigado, Fernando, aqui estou sempre a aprender...

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Diz a Wikipedia:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Monte_Ramelau

(,,,) O monte Ramelau ou Foho Ramelau, em tétum, é a mais alta montanha da ilha de Timor e o ponto mais alto de Timor-Leste, com 2.963 m de altitude(...). A montanha localiza-se aproximadamente 120 km a sul da capital, Díli, no suco Baboi Leten, posto administrativo de Atsabe, município de Ermera, e é relativamente fácil escalá-la em três ou quatro horas a partir da localidade de Hatu Builico (município de Ainaro) (...)

O pico Tatamailau, conhecido em tétum como “Foho Tatamailau”, é o ponto mais alto da montanha, que é formada por vários outros picos.(...)

Em dialecto mambai, um dos muitos de Timor-Leste e língua nativa da região de Ainaro, Tatá Mai significa “avô” e Lau, “monte”, ou seja, “o avô dos montes”. (...) Segundo a crença local, quando uma pessoa nativa dessa região morre, seu espírito vai para o alto do Tatamailau.

No livro "Timor: subsídios para a sua história", de 1944, há a seguinte citação sobre o Romelau:

(...) No ponto mais elevado do monte Ramelau, a cerca de 3.000 metros de altitude, a cota mais alta do império português, foi estabelecido um dos vértices de triangulação, aí assentando-se um marco com uma placa na base, em que se inscreveu esta legenda: ‘Portugal – alto Império que o sol logo em nascente vê primeiro.’[6]
Durante o período colonial esta era a mais alta montanha de Portugal, e hoje o Ramelau é o segundo ponto mais alto de todas as ex-colônias portuguesas, após o pico da Neblina, no Brasil, o qual atinge 2.993 m. (...)


A montanha e área circundante estão consideradas pela BirdLife International como Área Importante para a Preservação de Aves.(...)