sexta-feira, 21 de junho de 2024

Guiné 61/74 - P25668: Notas de leitura (1702): Factos passados na Costa da Guiné em meados do século XIX (e referidos no Boletim Official do Governo Geral de Cabo Verde, anos 1860 a 1864) (8) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 19 de Abril de 2024:

Queridos amigos,
Faço notar que a coleção existente na Biblioteca da Sociedade de Geografia de Lisboa, no que concerne ao Boletim Oficial do Governo Geral de Cabo Verde e da Costa da Guiné tem falhas de números, da leitura dos Boletins disponíveis não procuro tirar qualquer conclusão ou demonstração, é notório o papel residual que desempenha a Costa da Guiné, também designada por Estabelecimentos de Cacheu e Bissau; falecido Honório Pereira Barreto, não se distingue nenhuma governação local, estamos em tempo de fomes e epidemias, de permanente insegurança dentro da Fortaleza de S. José de Amura e no relatório anual das obras públicas de Cabo Verde há menções ao estado de degradação da Fortaleza de Cacheu e a necessidade de fazer reparações; são referidos tratados de paz com régulos, insurreições, como se escreve em 9 de fevereiro de 1861, "em Cacheu deram-se algumas ocorrências devido ao estado semi-selvagem da classe baixa"; procurou-se melhorar a defesa e a segurança da Fortaleza de S. José de Bissau e em 1864 chega uma colónia cabo-verdiana enviada para o Rio Grande de Bolola, dará que falar, pela importância e dimensão do seu trabalho, virá a ser profundamente afetada pelas guerras que irão assolar o Forreá.

Um abraço do
Mário


Suplemento do Boletim Oficial de 21 de janeiro de 1862, dá-se a notícia do falecimento do Infante D. João, como já se dera a notícia dos falecimentos da rainha D. Estefânia e do seu marido, o rei D. Pedro V

Factos passados na Costa da Guiné em meados do século XIX
(e referidos no Boletim Official do Governo Geral de Cabo Verde, anos 1860 a 1864) (8)


Mário Beja Santos

Não é demais insistir que neste acervo que vou consultando do Boletim Official do Governo Geral da Província de Cabo Verde e Costa da Guiné (convém não esquecer que a Guiné, ou os Estabelecimentos de Cacheu e Bissau, só passará a província autónoma em 1879, a partir daí haverá Boletim Oficial da Colónia), a Guiné não tem qualquer relevância, isto é, tem valor alfandegário, enquanto viveu Honório Pereira Barreto as suas iniciativas eram tornadas públicas, o resto é quase paisagem, o que predomina é o que se passa em Santiago, no Mindelo, na Brava. Vejamos o que se pode respigar ainda no ano de 1860, há curiosidades que merecem registo. No n.º 62, de 16 de fevereiro, consta a Portaria 239 do Ministério da Marinha e Ultramar, nomeia-se o farmacêutico Júlio César Galião, para servir em Bissau por tempo de 3 anos, com os vencimentos de 1.º Farmacêutico da Província. Recorde-se que em tempo de epidemias e a febre amarela anda à solta. Na sucessão destas portarias, coloca-se um outro farmacêutico em Cabo Verde e mais adiante informa-se que seguem medicamentos e utensílios para a Botica de Bissau.

Do Boletim n.º 82, de 15 de dezembro, pela Portaria 276, o Governador Geral toma uma decisão por força de um ato solidário, como se escreve. O Juiz de Direito, José Maria Costa, tinha pedido que fosse diminuído o preço de carregamento, ou mesmo dispensado o frete, do arroz transportado de Bissau para a ilha Brava, o transporte era um iate, por ter sido aquele género obtido por subscrição e destinado a socorrer os indigentes da Brava, e sendo uma dádiva, o Governador determinava que fosse restituída a importância do referido frete de arroz.

Estamos agora em 9 de fevereiro de 1861, Boletim n.º 6, “as últimas notícias sobre o estado sanitário da Guiné foram recebidas pelo iate Bissau na cidade da Praia no mês de novembro de 1860. O Governador da Guiné Portuguesa recebeu fundadas denúncias de que os gentios premeditavam atacar a Praça de S. José de Bissau, felizmente longe de se darem demonstrações hostis, os régulos de Bandim e outros apresentaram-se ao Governador, protestando obediência. Em Cacheu deram-se algumas ocorrências devido ao estado semisselvagem da classe baixa, que alteraram por algum tempo o sossego público, hoje restabelecido.” E mais uma nota curiosa na mesma informação que veio da Praia: “Acerca de Bolama e Rio Grande, que atualmente nos são disputados, espera-se resolução superior definitiva, tão reclamada pela conservação e melhoramento das nossas colónias daquela parte de África. O estado sanitário da Guiné é satisfatório.”

Estamos agora em março de 1862, a Portaria n.º 45 prende-se à reorganização das forças militares e de segurança, exara o Governador Geral:
“Atendendo às circunstâncias especiais em que se acha esta Possessão, e à urgente e muito imperiosa necessidade de criar uma força pública que, auxiliando o destacamento de primeira linha, possa garantir a defesa e segurança desta Praça de S. José de Bissau, e permita que o referido destacamento seja todo empregado em quaisquer operações que se julgarem necessárias fora da mesma praça; tendo em vista a restrita obrigação que incumbe a todos os cidadãos de concorrerem para a defesa do Estado e conservação de qualquer território pertencente à Monarquia Portuguesa; atendendo mais a que será tido na devida consideração o apelo que por este modo se faz à povoação de Bissau, e achará o devido apoio do seu reconhecido patriotismo, interesse pelo bem público, tanto mais quanto tende à sua própria segurança e das suas propriedades, hei por conveniente, usando do voto de confiança dado o Conselho do Governo da Província e da autorização que me confere o Parágrafo 2.º do Artigo 15.º do Acto Adicional à Carta Constitucional da Monarquia, determinar o seguinte:
- Proceder-se-á imediatamente à organização de um corpo de infantaria de 2.ª Linha, com a denominação de Companhia de Voluntários de Bissau, com a força de um capitão comandante, dois tenentes, dois alferes, dois segundos-sargentos, um furriel, um corneteiro ou tambor, quatro cabos, quatro anspeçadas, e 60 soldados, sendo por este modo a totalidade da sua força 78 praças efectivas; a Companhia de Voluntários de Bissau, terá, por enquanto, pequeno uniforme em tudo igual ao do Batalhão de Artilharia da Província, tendo a única diferença de serem as golas e canhões de pano de azul-claro e não usarem vivos nas calças; o armamento desta Companhia terá como o de infantaria do Exército; o Governador dará as ordens e instruções para que sem perda de tempo se proceda ao alistamento e reuniões das praças que se apurarem para este importante serviço.”


Em portaria, logo a seguir, louva-se o comandante do Batalhão de Artilharia de 1.ª Linha, António Maria Maurity.

Estamos agora a 4 de janeiro de 1882, o Boletim Oficial n.º 1 dá notícia de quem são os Vogais da Comissão Municipal da Vila de Bissau, quatro efetivos e quatro substitutos, destaca-se o nome de João Marques de Barros, conhecido comerciante, familiar do cónego Marcelino Marques de Barros, notável figura da cultura guineense. Este ano é parco em notícias da Guiné, referem-se medidas sobre a defesa e segurança da fortaleza de S. José de Bissau, o movimento marítimo deixa claramente ver que o impor-expor está na mão de estrangeiros, há notícias sobre nomeações e exonerações do mais diverso tipo, caso de regedores de paróquia, são referidos acordos celebrados como o que aparece mencionado no Boletim Oficial de 14 de março “aprovado o tratado de paz celebrado entre o Governador da Guiné e os gentios de Cacheu”; não falta referência ao conserto do portão denominado da Puana, na tabanca que defende a Praça de Bissau.

Estamos chegados a 1883 e no Boletim Oficial n.º 13 temos um despacho do Governador Geral:
“Achando-se completamente desprovidos dos habitantes da Praça de Cacheu de pessoa que lhe aconselhe e prepare os medicamentos a que tenham de recorrer para debelar as frequentes doenças, que os acometem na naquele insalubre clima; cumprindo a este Governo Geral tomar todas as medidas que se tornem necessárias à Saúde Pública; atendendo ao que sobre tal objecto representaram os habitantes daquela Praça ao Governador da Guiné, encarrega-se Carlos Frederico Hopffer das funções de enfermeiro da Praça de Cacheu, recebendo o tal serviço a gratificação mensal de 20 mil reis.”

Entrara-se num novo ano e no Boletim Oficial n.º 11, de 26 de março, chama-se a atenção para a Portaria 68, assinada pelo Governador Geral, Carlos Augusto Franco, Cabo Verde volta a estar em grande sofrimento:
“Atendendo à necessidade de encaminhar a emigração, a que, na terrível crise alimentícia, se socorre uma grande parte dos habitantes deste arquipélago, a fim de fugirem aos efeitos da fome que o assola, e proporcionar-lhe, portanto, o sustento em outro ponto desta província, por forma de que futuro possa, pelo desenvolvimento da agricultura da mesma, ser compensado devidamente o sacrifício que fazem os seus cofres com tal despesa;
Hei por conveniente determinar que, com os indigentes que voluntariamente se prestarem a seguir para a Guiné Portuguesa e para ali forem transportados por conta do Estado, se estabeleça no mencionado ponto do Rio Grande de Bolola uma colónia com as seguintes condições:
- Todas as pessoas ou famílias fugindo aos horrores da fome, que atualmente sofre o arquipélago de Cabo Verde, e a quem o Governo tiver dado passagem por conta do Estado para a Guiné, chegando àquela Possessão e não tenham meios de prover à sua subsistência, serão para ali mandados na qualidade de colonos;
- Os colonos destinados àquele território sujeitar-se-ão desde a data da sua chegada ali e por cinco anos à seguintes condições: deverão concorrer para a defesa da mesma colónia, contra todos os ataques de qualquer inimigo; comparecerão todos os domingos e dias santificados para terem uma inspeção pessoal passada pelo chefe da colónia, e assistirem aos ofícios divinos, quando para os mesmos possa ser mandado um sacerdote; serão mandados e obrigados a mandar os seus filhos e filhas às escolas de ensino primário logo que o Governo as estabelecer; ficarão sujeitos à obrigação de prestarem mútuo auxílio aos trabalhos rurais, e nos de edificação das habitações destinadas ao seu primeiro estabelecimento; aos indivíduos que voluntariamente desejarem fazer parte da colónia se dará passagem por conta do Governo, sendo competentemente abonados de mantimentos; receberão ração diária desde o dia do seu desembarque e durante seis meses, ou por todo o tempo que decorrer até à primeira colheita, etc., etc.”

Cartão-postal da primeira igreja de Bolama, cerca da década de 1900
Bissau - uma rua perto das fortificações, porventura ainda na década de 1900
Imagem atual do rio Buba
Buba, celebração do Natal de 1973. Imagem retirada do Arquivo Digital, por José Mota Vieira, com a devida vénia

(continua)
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Notas do editor:

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