Guiné > Bissau > c. 1973/74 > "Dos poucos momentos que passei em Bissau... Junto às LFG Orion, Lira e Argos (da esquerda para a direita)"
Foto (e legenda): © J. Casimiro Carvalho (2017). Todos os direitos reservados [. Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Recorde-se que, depois do CAOP, em Teixeira Pinto, de que foi o médico entre fevereiro e junho de 1969 (cinco meses), foi colocado no serviço de cirurgia do HM [Hospital Militar] 241, em Bissau (1969/71).
No final do seu serviço no Hospital, João Peckoff [leia-se: José Pardete], procurava ter em Bissau "uma vida de sociedade tão normal quanto possível" (p. 49). Como fazia amizades com facilidade, tormou-se "presença assíduia nos habituais jantares das quintas-feiras, que tinham lugar na Base Naval [ao lado do cais do Pingjguiti], que eram destinados aos oficiais de Marinha e seus familiares, sediados em Bissau ou de visita, e a militares de outras Armas e mesmo a civis, com o estatuto de convidados" (p. 50).
E aqui o autor faz uma homenagem à hospitalidade da LFG [Orión} e do seu comandante (no romance, Freitas de Sousa, leia-se Faria dos Santos], "um gentleman" (sic) , e evoca poeticamente os "tons vermelhos vivos de sangue, atenuados com fins de tarde cálidos e embalados de cinzento numa LFG acostada ao Cais do Pidjiguiti, durante o jantar a bordo, com mais dois ou três amigos" (p. 50).
2. Sabemos que se trata(va) da Oríon (**), de acordo com uma mensagem que o José Pardete Ferreira nos mandou, em 2011, juntamente com uma letra de fado, a do "Fado da Oríon" , que ele dedicou aos camaradas da Marinha, e em especial à malta da LFG Orion, e que nós já reproduzimos em dois postes (*).
(...) Caro Luís, o prometido é devido:
O Fado da Orion foi escrito em Homenagem ao Comandante [Alberto Augusto] Faria dos Santos [, entretanto falecido em 1986, ex-1º ten, comandou o NRP Orion, 1968/70].
A LFG {Orion] passou mais de um ano acostada ao molhe do Pi(n)djiguiti porque tinha cedido à [LFG] Batarda um dos motores.
Quando o recebeu de volta ou ele foi substituído por um novo, já não posso precisar, fez uma viagem experimental e de contrabando "a acreditar nos praticantes da má-língua" e, de seguida, foi o navio almirante da ida a Conacri [, Op Mar Verde, 22 de novembro de 1970], sob o Comando de Faria dos Santos, mais tarde Comandante do porto e, em seguida, Governador Civil de Aveiro.
Poeta e grande amigo, recebia a jantar e bem um pequeno número de amigos na torre, onde, no final, a poesia expulsava o álcool.
Ele foi, igualmente, a nossa chave de acesso à Base Naval de Bissau onde, às quintas-feiras, havia jantar melhorado e aberto a convidados. (...)
Fado da 'Orion' (excerto)
Tristes noites de Bissau,
Neste clima tão mau,
Passá-las não há maneira,
Sem comer arroz, galinha.
Ou então ir à "Marinha"
Aos "jantares da quinta-feira"!
Às vezes um Comandante,
Bom amigo, bem falante,
Obriga uma pessoa,
Com uma grande bebedeira,
Pensar que o Ilhéu do Rei
Fica em frente de Lisboa.
Refrão
Ser marinheiro
De "LFG' no estaleiro,
Sem motores nem cantineiro,
Junto ao cais sem navegar,
E esperando,
A comissão foi passando,
Ai!, os amigos engrossando,
Com o Geba a embalar. (...)
[Nota do autor: 1ª parte e refrão escritos em Bissau em Novembro de 1970; 2ª parte, escrita em Setúbal na madrugada de 15 de Dezembro de 1997. Para ser cantado com a Música do "Fado do Cacilheiro" do Maestro Carlos Dias).
3. Voltando ao romance "O Paparratos" e à figura do nosso doutor, João Pekoff:
(...) "O senhor comandante, entre outras qualidades, tinha a de receber bem, fazendo jus à fama da Marinha de Guerra Portuguesa" (p. 50).
Por outro lado, "gostava imensamente de poesia e a tertúlia que entretanto se fundara em casa do António Almeida [, leia-se Anthímio de Azevedo (Ponta Delgada, 1926- Lisboa, 2014). o famoso metereologista da Rádio Televisão Portuguesa, na altura, diretor do Serviço de Metereologia da Guiné, entre 1967 e 1971,] (...) tornou.se uma alternativa ao doce balançar no navio e à vista do Ilhéu de Rei" (p. 50).
A casa de Anthímio de Azevedo era "local de reunião quase obrigatório após o jantar" [no navio], transformando-se num espaço de liberdade onde se dizia poesia, se falava da guerra e das últimas operações no mato, bem como da crueza da vida e da morte no Hospital, reviam-se comissões de serviço anteriores, partilhava-se projectos para o futuro, etc.
4. Quando o nosso doutor sentia necessidade de sair do ambiente da tropa, tinha em Bissau outras, poucas, alternativas:
"Um balaio de ostras com um molho feito com sumo de limão e piri-piri, acompanahado com umas cervejitas, aqui ou ali, ou ocasionalmente um jantar num dos poucos restaurantes que havia, como por exemplo o Solar dos 10, satisfaziam-lhe os apetites, espirituais e físicos" (p. 50).
Este restaurante seria pertença a um setubalense, que se tornou também comandante dos bombeiros de Bissau. Opinião do autor: "Durante muito tempo foi o Tavares Rico de Bissau" (p. 51). E terá sido no Solar dos 10 que o José Pardete Ferreira, o criador literário do Paparratos e do João Pekoff, apresentou um dia, "numa noite de festa da malta do Hospital", na despedida de um colega, o Fado da Orion (*).
No roteiro gastronómico de Bissau, aponta-se ainda "a sala de jantar da Pensão Portugal, ou casas de pessoas tornadas suas conhecidas" (p. 51).
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Notas do editor:
(**) Último poste da série > 11 de fevereiro de 2021 > Guiné 6/74 - P21885: A Nossa Marinha (2): Em louvor dos bravos da Reserva Naval (1961/74) (Luís Graça / Manuel Lema Santos)