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sábado, 27 de junho de 2020

Guiné 61/74 - P21115: Boas Memórias da Minha Paz (José Ferreira da Silva) (16): A DGS boa ou má e outras siglas, ou Lembrando a resistência dos meus conterrâneos



1. Em mensagem do dia 8 de Junho de 2020, o nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos esta Boa memória da sua paz, desta vez dedicada à sigla DGS, antes de má memória, hoje um serviço que olha pela nossa saúde.


BOAS MEMÓRIAS DA MINHA PAZ - 15

A DGS boa ou má e outras siglas ou 
Lembrando a resistência dos meus conterrâneos 

Como vulgar cidadão, assumidamente como pouco culto e pouco informado, não sou mais que um Zé-ninguém, Zé português do Norte e mais um fruto da minha geração. Por isso, lamento não esticar mais os comentários, para os quais não tenho a pretensão nem a capacidade de os desenvolver. Resta-me, apenas, recordar a minha “leve ligação” a alguma destas siglas.

Por via do Covid-19, esse vírus que alegadamente veio da China, direcionado para matar os “cotas” ou gente de deficiente qualidade, possivelmente inspirado em critérios próximos do famigerado Nacional Socialismo (National Sozialistische Deutsche Arbeiterpartei), somos levados a repensar na sigla que outrora tanto nos atormentava: a DGS - Direcção Geral de Segurança.

A DGS foi uma inovação promovida pelo “governo de abertura” de Marcelo Caetano em 1969 que, com desmedido destaque publicitário, “acabou” com a PIDE – Polícia Internacional da Defesa do Estado. Pelo que se sabe, apenas a sigla foi substituída.

A PIDE, em 1945, substituiu a PVDE - Polícia de Vigilância e Defesa do Estado, que havia sido criada em 1933.

Ora, os “cotas” da minha geração, sabem bem do que estamos a falar. Podem ser poucos os que sofreram na pele o verdadeiro “tratamento” dessa “segurança”, mas são muitos os portugueses que foram condicionados por ela.

São milhares as histórias contadas, umas mais reais que outras, mas quase todas apontadas para a aversão e o ódio ao comportamento dessas organizações.
Com o 25 de Abril, assistimos a uma certa luta pelo controlo dos arquivos da PIDE/DGS. Diz-se que houve um trabalho muito eficaz por parte do PCP que,até, os fizera deslocar para Moscovo. Por outro lado, também houve pressões que levaram à destruição e desaparecimento de documentação. Curioso o facto de recentemente a PJ ter apreendido mais de 700 fichas pessoais dos mesmos arquivos, que estavam à venda.

(“Fonte: Publico de 23 de Abril de 2020, por Luís Miguel Queirós”)

“A DGS foi extinta a 25 de Abril de 1974. No entanto em Angola os serviços desta Polícia continuaram a funcionar até à independência daquele território em 1975, embora sob a designação de Polícia de Informação Militar e de Gabinete Especial de Informação, e com outras atribuições.
Quanto à integridade do Arquivo, são de assinalar os efeitos negativos das destruições e anulações de processos efectuadas pela própria PIDE/DGS, as destruições ou desvios ocorridos entre 1974 e 1990, e o desmembramento de algumas séries de processos, levado a cabo pelo Serviço de Coordenação da Extinção da PIDE/DGS e Legião Portuguesa, seguido da integração desses processos noutras séries do Arquivo da PIDE/DGS ou em séries do próprio Arquivo dos Serviços de Extinção.”

(“Fonte: História custódial e arquivística da Pide, na Torre do Tombo”)

Fichas aparecidas à venda na internet “Fonte: Público de 23 de Abril de 2020, por Luís Miguel Queirós”

Fui habituado a olhar permanentemente para o grande quadro negro da escola, em cuja parede se destacavam os retratos de Oliveira Salazar e de Óscar Carmona, tendo, no meio deles, uma cruz com Jesus Cristo crucificado. Ainda apanhei Craveiro Lopes, que substituiu Carmona em 1951.
Nessa altura tinha um sentimento patriótico acentuado, por influência da Profª. D. Irene, uma figura marcante no Ensino Primário de Fiães. Ela ensinou-nos a cantar o Hino Nacional e punha-nos de mão estendida a cantar as várias canções- marcha de adoração à Pátria, à semelhança do que se fazia na Mocidade Portuguesa. Sempre que entrava alguém na escola, tínhamos que nos levantar e fazer a saudação nazi, até que nos mandasse o “à vontade”. Todavia, em criança, eu não ligava esse patriotismo a qualquer idolatria aos governantes. Já se sentiam, então, os murmúrios de familiares e amigos, pondo em causa essas lideranças.
Nesses anos seguintes à instrução primária, o que se sabia da polícia política era em segredo e muito devido à audição da Rádio Moscovo. Ainda poucos tinham aparelho de rádio e muito poucos tinham a coragem de sintonizar essa rádio comunista. Nessa altura, todos estavam bem informados quanto à noção do espaço e das limitações sobre esse assunto melindroso.
O medo e a desconfiança estavam amplamente instalados. O respeito pelo professor e pelo padre, também era acentuado. E também eles seriam importantes nos costumes pidescos.
O certo é que todos sabíamos que a PIDE nos controlava e nos poderia castigar à menor acusação. E todos sabiam dos vários exemplos marcantes que nos rodeavam.

Na minha terra, em Fiães da Feira, sempre houve tradição relacionada com a política de oposição. Conheci pessoas vigiadas e perseguidas, na sua vida pessoal e profissional. Porém, mais que isso, tenho que destacar várias personalidades que marcaram a história da nossa democracia.

Começo por uma que, apesar de não estar referida nas prisões e perseguições como outros estão, merece todo o realce pela importante evidência política que mostrou na sua difícil geração.

Em 6 de Janeiro de 1869 nasceu o Dr. Elisio Pinto de Almeida e Castro, filho de António Pinto de Almeida e Castro e de D. Marcelina Barbosa. Seus pais viviam em Fiães, No Palacete da Quinta das Camélias, que o pai mandara construir quando regressou, rico, do Brasil. Todavia, em registos (alguns contraditórios), aponta-se que o nascimento de Elísio e de sua irmã Amélia, ocorreram no Porto, na freguesia de Cedofeita, onde foram baptizados na Igreja de S. Martinho. Mais informam que foram considerados filhos de pai incógnito (os pais ainda não haviam casado), e que só viriam a ser perfilhados em 1880, pouco antes do pai António falecer.

Na minha modesta opinião, esta disparidade em relação ao registo do nascimento dos filhos, no Porto (Cedofeita), poderá ter a ver com a “indesejável/intolerável” situação do casal aos olhos do clero e dos bons costumes locais.

O Dr. Elísio Castro que ficou órfão de pai com 11 anos, licenciou-se em Direito em Coimbra, com 21 anos.
Casou em 22.08.1892, com D. Maria Emília Bessa de Carvalho, no mesmo dia que sua irmã Amélia casou com o irmão de sua noiva.


O Dr. Elísio absorveu, logo em criança, o espírito aberto a novas ideias trazidas pelo seu pai do Brasil e, mercê dos bons relacionamentos por ele criados, procurou dar-lhes continuidade, atingindo o mais alto nível da política e dos poderes.

Apesar de o pai militar na área do Partido Regenerador e de vir a salientar-se mais entre as doutrinas republicanas, o Dr. Elísio conviveu bastante com a Corte, tendo participado em caçadas e torneios de tiro com o próprio Rei D. Carlos. A taça que se mostra na foto ao lado diz respeito a uma finalíssima de tiro aos pombos, ganha pelo Dr. Elísio ao Monarca.
Quando ocorreu o regicídio, o Dr. Elísio manifestou-se grandemente contra esse ignóbil acto que, quanto a ele, não resolveria os problemas do País.

No dia 23 de Janeiro de 1907, sob a coordenação do Dr. Elísio de Castro, realizou-se, em sua casa, em Fiães, no Palacete da Quinta das Camélias, mais uma reunião, que culminou com a criação da Comissão Republicana Municipal da Feira. Na acta divulgada no dia 30 desse mês, verifica-se que o Dr. Elísio de Castro foi eleito Presidente. Nessa Comissão, composta por 10 elementos eleitos, consta, também, outro Fianense, o Médico António Mota.

A implantação da República foi muito desejada em Fiães.
Em 15.05.11, o Dr. Elísio foi eleito Deputado à Assembleia Nacional Constituinte e, em 08.07.11, deixa a Comissão Municipal para acompanhar e colaborar melhor a Assembleia Constituinte de 1911.
Em 02 de Setembro de 1911 o Dr. Elísio de Castro foi eleito o Senador, para um período de 6 anos. Foi condecorado com a Medalha Comemorativa da Revolução do 31 de Janeiro de 1891.

Vista parcial da Avenida Dr. António Mota, de Fiães e a Escola primária de Macieira

Em 27.04.12 foi aberta a Avenida de Fiães, graças à doação de terrenos pelo Dr. Elísio de Castro que, além disso, pagou de seu bolso as expropriações a outros proprietários.

Foto de Abril de 1918, com a presença do Dr. Afonso Costa.

Dadas as boas relações deste Fianense com os seus ilustres colegas republicanos Dr. António José de Almeida e Dr. Afonso Costa (e outros), eles hospedavam-se, periodicamente, na sua casa, em Fiães.
O Dr. Elísio fez parte da Comissão de Honra da candidatura do General Norton de Matos.
Teve dois filhos, ambos licenciados; o Fernando e o Elísio. O Fernando veio a casar com D. Maria Costa, que era filha do Dr. Afonso Costa, que foi Presidente da República.
Faleceu a 12 de Novembro de 1942.

(“Fontes: Publicações no Jornal “Correio da Feira”, Manuel Strecht Monteiro em “Um Fianense na Ascensão e Queda da I República” e José Rodrigues em “Palacete da Quinta das Camélias”).


Nota: O Palacete da Quinta das Camélias veio a funcionar como Escola Preparatória. Ali trabalhou, como Professor de Educação Física, Bernardino Ribeiro, quando chegado de Moçambique, da Guerra do Ultramar. O Bernardino veio a destacar-se como excelente autarca, durante mais de 30 anos.

Lembro o Inspector Escolar Adelino Soares Bastos, a quem, diziam, arrancavam as unhas e as sobrancelhas nas torturas da PVDE. A sua casa, hoje um Infantário, ainda tem os esconderijos nas suas próprias paredes.

Nasceu em Fiães da Feira, no dia 30-11-1882.
Foi empossado como Inspector Escolar em 28-10-1919.
Foi preso, provavelmente, em Abril de 1928. Passou a ser encarcerado/perseguido/fugitivo periodicamente.
Em Maio de 1938 é detido pela Delegação da PVDE do Porto que o leva para o Aljube de Lisboa.
Voltou para a Delegação do Porto, mas regressou ao Aljube em 24-04-39.
Foi julgado pelo Tribunal Militar Especial em 27-06-39 e em 19-08-39.
Transferido para Caxias em 21-05.40.
Libertado por amnistia, em 03-06-40

(“Fonte: João Esteves em “Silêncios e Memórias”)

Casa do Inspector Adelino Soares Bastos. Hoje funciona como Infantário do Centro Social do Pe. José Coelho

O Dr. Alcides Strecht Monteiro, nasceu no lugar do Souto, Fiães da Feira, no dia 1910.
Foi casado com Ana Celeste Ferreira da Silva
Destacados lutadores no MUD - Movimento de Unidade Democrática e nas candidaturas de Norton de Matos e de Humberto Delgado.
Estão ligados no apoio à ASP (1964) e à fundação do PS (1973).
Foi sempre o chefe da oposição no Distrito de Aveiro.
Foi Deputado de 1975 a 1977.
Faleceu a caminho da Assembleia da República na tarde de 14 de Junho de 1977.
Foi condecorado com a Ordem da Liberdade.
Este ilustre Fianense era o Advogado dos pobres e o abrigo dos perseguidos politicamente.

(“Fonte: Prof José Rodrigues em “Biografias de Ilustres Fianenses”)

O PS substituiu a ASP em BadMunstereifel, Alemanha, em 19-04-73.

A Drª. Alcina Bastos nasceu em Fiães, concelho de Vila da Feira, a 7 de abril de 1915. Era filha do Inspector Escolar Adelino Soares Bastos e da Dr.ª Filomena de Sousa Vilarinho Bastos.
Formou-se na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, onde colaborou com o Socorro Vermelho Internacional (SVI).
Exerceu a advocacia no Porto, Espinho e Vila da Feira. Aí aderiu ao Movimento de Unidade Democrática (MUD).
Influenciada por motivos familiares já que o pai, republicano, muito lutara e muito sofrera nas prisões. Alcina Bastos preencheu a sua vida em actividades em prol da liberdade, sendo, não raras vezes, a única mulher a marcar presença nas mesas das sessões políticas então realizadas, apesar de se omitir a sua identificação.
Em 1949, empenhou-se na candidatura do general Norton de Matos à Presidência da República e, em 1958, integrou, juntamente com o irmão Joaquim Bastos, também advogado, a equipa que promoveu e organizou a candidatura presidencial do general Humberto Delgado
Reconquistada a liberdade, empenhou-se no julgamento dos assassinos de Humberto Delgado, marcando presença nas audiências dos agentes da PIDE e na trasladação dos restos mortais do general para Portugal. Integrou a Liga Portuguesa dos Direitos do Homem

O Tenente Armando Agatão Lança, aqui de espada em punho, evidenciou-se na Revolta dos Marinheiros

Foi casada com o militar republicano Armando Pereira de Castro AgatãoLança (19/08/1894-23/05/1965), também interveniente ativo nas conspirações para derrubar o regime que pôs fim à I República (1927 e Revolta dos Marinheiros em 1936).
Teve uma filha (n. 1955) que seguiu o mesmo trajeto profissional da mãe.
Faleceu em 17-08-1993. Quis ser enterrada com a sua toga no Cemitério dos Prazeres e, um ano depois, a título póstumo, foi-lhe atribuída a Ordem da Liberdade.

Alcina Bastos sentada, à direita, durante o comício do general Humberto Delgado no Liceu Camões a 18 de Maio de 1958.

(“Fonte: João Esteves em “Silêncios e Memórias”)

Também Antero Canastro, o “Regedor da Mamoa”, que casou com uma sobrinha do Inspector Adelino Bastos, esteve preso. Por altura de um movimento revolucionário em Lisboa (8 de Setembro de 1936 - Revolta dos Marinheiros), o Inspector que talvez beneficiasse do contacto optimista do seu futuro genro, Tenente Armando Agatão Lança, envolvido no comando dessa revolta, estava convicto do seu êxito e, empolgado, entregou a Bandeira Nacional a Antero:
- O Salazar foi com o caralho, vais hastear a bandeira na Capela da Nossa Senhora da Conceição, a Padroeira de Portugal!

O Antero gritava de alegria, enquanto corria e atravessava o centro da freguesia. De braços abertos, alternava e corrigia a posição da imagem da esfera armilar, por forma a honrar e valorizar condignamente a feliz referência ao acontecimento nacional.

Capela de Nª. Sª. da Conceição, Padroeira de Portugal

Já tinha atravessado a Ponte de Chão do Rio, sobre o Rio Azavessas, e seguia subindo o Monte de Stª. Maria, aproximando-se da Capela, quando lhe gritaram:
- Cuidado Antero, olha que o filho da puta, afinal não morreu! Não morreu e os bufos vão-te foder.

Passados uns dias, o Antero saiu da prisão. Só esteve lá três dias. Perguntavam-lhe uns amigos:
- Porque é que já vieste embora? Não nos digas que te vais armar em bufo da “Pevide”? Nem penses no tal! Enterramos-te vivo, seu caralho!

E o Antero, revoltado afirmava:
- Foi o sacana do Professor Reinaldo que me acusou. Eles só me perguntavam quem me deu a bandeira. Eu disse-lhes que nem reparei a quem a tirei das mãos. Mas eles não me querem fazer mal. Penso que querem mostrar à família da minha mulher que são uns gajos porreiros. Se calhar, até pensam que vou melar e colaborar com eles, esses filhos da puta.

Há dias, o amigo Zéquita do Calvário, que foi aluno do Professor Reinaldo, contava-me que ele pendurava os alunos, pelas orelhas, com os seus braços enormes, levando-os junto do quadro do Salazar enquanto os “acusava” de incumpridores e de falta de patriotismo.

Desde a infância que fomos tomando conhecimento destes lutadores pela democracia e das implicações que sentiriam os seus seguidores.

Aquele ano de 1958 ficaria marcado para o resto das nossas vidas. Meu pai faleceu a 11 de Abril e as eleições realizaram-se a 8 de Junho. Eu completava os 15 anos, mas já era um entusiasta pelo élan de vitória de Humberto Delgado. Parecia que ele iria ganhar e bem. Porém, vivi ainda uma outra frustração, porque não conseguia convencer a minha mãe, a votar Humberto Delgado, apesar da miséria em que tínhamos caído. A influência da igreja e das “pessoas de bem” faziam-na vergar para a habitual condição de subserviência.
O nosso grupo restrito constava de uma lista “fornecida” pelo Padre Inácio ao Presidente da Câmara. De JOCistas, passámos a perigosos vadios que ficavam fora da igreja durante a missa. É verdade que o padre aparentava a preocupação de nos condenar publicamente. Por vezes, suspendia a missa e vinha insultar-nos cá fora.

O Bernardino Ribeiro foi chamado à PIDE e só tinha 17 anos. Quando o viram na sede, no Campo 24 de Agosto, um dos “gorilas”, exclamou:
- Que caralho vem a ser isto, agora mandam canalha para aqui? Isto não é nenhum infantário. Temos mais que fazer.

Mandaram-no embora dizendo:
- Ó miúdo, tem juizinho e quando disseres mal do Salazar, olha bem para os lados.

Ao Carlos Fontes também lhe disseram a mesma coisa. Tinha sido chamado por ter afirmado no café que as despesas das festas políticas da Câmara Municipal eram legalizadas com camiões de pedra ou de areia.

Chegado da guerra, em Março de 1969, estive, juntamente com o Bernardino, na crise estudantil de Coimbra e assistimos parcialmente ao II Congresso Republicano, realizado em Aveiro, 15 a 17 de Maio, distrito onde predominava a luta pela democracia.

Nesse ano da “abertura Marcelista”, regressou dos 10 anos de exílio D. António Ferreira Gomes, o famoso Bispo do Porto. Como o Pe. Artur da Paróquia de Espinho, regressou ao Secretariado da sede Episcopal, o “afastado” Pe. Manuel Henriques Ribeiro, foi para esse lugar, em Espinho. Este Fianense, visitante assíduo do amigo D. António Ferreira Gomes no exílio, em Espanha, também sofria da descriminação no próprio clero. Salazar, por mais que insistisse junto da Santa Sé, para que o lugar do Bispo do Porto fosse preenchido, nunca o conseguiu, mas o nomeado como Delegado Adjunto, D. Florentino Andrade fazia de sua a justiça mais conveniente ao poder civil.

E em Outubro, votámos para as eleições legislativas.

O Dr. Alcides Strecht Monteiro era o chefe da oposição de Aveiro e, como candidato, enviou o seu boletim, pelos CTT, para quem estava inscrito nos cadernos eleitorais. Porém, nos últimos dias, o “bufo” de cada lugar, dirigiu-se às pessoas pedindo a entrega desse boletim, alegadamente por indicação do Sr. Presidente da Câmara. Penso que todas as pessoas lhe fizeram essa vontade.
O Dr. Alcides ainda editou novos boletins que, perigosamente, andámos, durante a última noite, a distribuir pelas pessoas da oposição e de maior confiança, num esforço inglório para suavizar a anormal derrota. Numa dessas ruas e vielas, acabei por embater com o carro do “Inhecas”, num meco de granito.

O Inhecas - José Henriques Ribeiro, que havia sido ferido em 1967, na guerra da Guiné, continuou muito activo na oposição ao regime que nos governava. Militou no MDP, salientou-se como autarca, professor e dirigente associativo. Foi participante no III Congresso da Oposição (e último), realizado, também, em Aveiro. Não o incomodavam, talvez por recearem a firmeza do seu carácter e a sua utilização contínua da cadeira de rodas.

O jovem Dr. Manuel Lima Bastos, que era o nosso mentor revolucionário, foi sempre perseguido e controlado pela DGS. É sobrinho-neto do Inspector Adelino Soares Bastos. Foi ele que nos levou às crises de 68 e 69 em Coimbra, aos Congressos da Oposição e aos seus Comícios. O seu irmão Ângelo seguia-o sempre que podia.
Ligado ao MDP, veio a ocupar lugares de responsabilidade política após o 25 de Abril.
Hoje dedica-se à escrita, tendo publicados cerca de duas dezenas de livros.

Havia, ainda, o médico Carlos Ferreira Soares, de Nogueira da Regedoura, grande amigo e camarada do Inspector Adelino Bastos nessa luta antifascista.

Nasceu em 1903 e faleceu em 1942.
Era conhecido por Dr. Prata, o médico dos pobres. Dizem que, além das consultas grátis, dava e comprava medicamentos para os mais necessitados.
Tal como o seu amigo, andou clandestino e em fuga da PVDE. É célebre o seu esconderijo numa pequena japoneira situada no meio do cemitério.
Foi condenado à revelia em Tribunal Militar Especial do Porto, em Agosto de 1937, com multa elevada e um ano depois, com 4 anos de prisão correcional.
Foi assassinado em 4 de Julho de 1942.

(“Fonte: Antifascistas da resistência”)

Sempre que eu, adolescente, passava no autocarro da Feirense, junto à igreja de Nogueira, a caminho de Espinho, e olhava para o cemitério anexo, fixava a japoneira e prolongava essa visão, imaginando e admirando a bravura desses meus vizinhos patriotas antifascistas a quem muito devemos.

Os restos mortais do Dr. Carlos Ferreira Soares jazem junto da Japoneira (entretanto a primeira já foi substituída) que o escondeu muitas vezes da perseguição da PVDE.

Em 1970, quando eu seguia de barco para Angola, fui chamado à DGS para complementar as informações que pretendiam e ouvir algumas advertências.
Vim a verificar que todos os funcionários públicos eram “obrigados/aconselhados” a preencher a ficha de filiação na União Nacional. Sem negar essa inscrição, fui protelando e prometendo fazê-la. Porém, nunca o fiz.
Passei a ser visitado periodicamente na Câmara Municipal de Cabinda e sempre com o “convite amistoso” de passar por lá, pela DGS.
Por último, foram à Câmara no dia 20 de Abril de 1974, intimar-me para comparecer nas suas instalações “na próxima Quarta-feira, dia 24”.
Como não o fizeram por escrito, eu entendi que ainda não deveria lá ir “voluntariamente”.
Durante a noite, senti alguma preocupação. Apesar de não esconder a minha antipatia ao regime, estava convicto de que não havia nada de comprometedor no meu comportamento de cidadão português, cumpridor e patriota.

A manhã raiou com o desejado 25 de Abril. Quando tive conhecimento da revolta, senti uma satisfação indescritível.

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Felizmente que hoje, a sigla DGS, ao contrário da outra, é a de uma organização que muito orgulha os portugueses.


E é nesta luta que enfrentamos contra a Covid-19 que a ela mais nos sentimos ligados.
Obrigado DGS – DIREÇÃO GERAL DA SAÚDE!

José Ferreira
(Silva da Cart 1689)
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Nota do editor

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