sexta-feira, 15 de junho de 2007

Guiné 63/74 - P1851: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (50): Do tiroteiro em Bambadinca na noite de 14 de Junho de 1969 à emboscada da bruxa


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Regulado do Cuor (a norte do Rio Geba) > Pessoal do 2º Grupo de Combate da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71) atravessando em coluna apeada a bolanha de Finete na margem direita do Rio Geba. A tabanca de Finete, em autodefesa, guarnecida pelo Pelotão de Milicia nº 102, é visível ao fundo. Nesta época (finais de 1969/princípios de 1970), Finete dependia da autoridade militar de Beja Santos, comandante do Pel Caç Nat 52 (Missirá, 1968/70). Era sempre penosa a travessia da bolanha, mas obrigatória para se ir de (e para) Bambadinca, Finete e Missirá. Missirá era o destacamento mais avançado, a norte, do Sector L1 da Zona Leste.

No primeiro plano, para além de municiador da Metralhadora Ligeira HK 21, Mamadú Uri Colubali (se a me~mória não me atraiçoa), vê-se o Fur Mil Reis e o 1º Cabo Branco (LG).

Arquivo pessoal de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).



Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados



50ª Parte da série Operação Macaréu à Vista, da autoria de Beja Santos (ex-alf mil, comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1). Texto enviado a 25 de Maio de 2007. Subtítulos do editor do blogue.



Tiroteios inconsequentes em Bambadinca e Missirá... ou a 'emboscada da bruxa'
por Beja Santos

Seriam três da manhã de 14 de Junho [de 1969] quando os sons cavos das deflagrações começaram a sacudir Missirá. Não muito longe, alguém estava a ser atacado com morteiros, rockets e armas automáticas. Logo a seguir, ouviram-se as G3 e, espaçadamente, os morteiros 60 e 81. Levantei-me de imediato, supondo que chegara a vez de Finete. A tropa aglomerava-se no alto dos abrigos, nos postos dos sentinelas, em cima das viaturas. Os céus sulcavam-se de fogo descompassado, ouvia-se claramente o troar dos morteiros, até as rajadas das Daimlers.


Boleia de barco, do Mato Cão a Bambadinca


O que me surpreendia era um fogo que cuspia em várias direcções, mas não havia resposta, como se um quartel, electrizado, decidisse fazer fogo por capricho. As opiniões coincidiam: era de novo fogo em Bambadinca. Com auxílio do Teixeira, iniciou-se a comunicação com o batalhão, com o inevitável "maior deste" a perguntar ao "maior desse" o que se passava. E, subitamente, do outro lado informou-se que tudo estava calmo, não era necessário qualquer deslocação ao "maior deste".

Na parada confirmava-se o silêncio que passara a navegar para lá das matas do Cuor, só de quando em quando o tracejado das balas riscava o céu, até que tudo se acalmou em escassos minutos. Com a voz exausta, o Teixeira relembrou:
- Meu alferes, o contingente de barcos passa em Mato de Cão cerca das 8:30.

Pragmaticamente, fomos todos descansar, já que às cinco da manhã iríamos quebrar o capim encharcado pelo orvalho.

Com ligeiro atraso, o comboio de navios civis protegido por uma LDM entrou no Geba Estreito e deu-nos boleia até ao cais de Bambadinca. A vida na tabanca não conhecia alteração, ferviam gargalhadas no mercado, não se via sinal de destruição. No quartel, deparou-se o mesmo quadro, como se houvesse a maior casualidade nestas flagelações grandes ou pequenas.

Procurei falar com o Pimbas ou com o Major Pires da Silva, estava em reunião, ambos manifestaram interesse em falar-me, dividi tarefas pelos 20 homens que me acompanhavam, fui à messe escrever apressadamente um aerograma à Cristina, ajuntando as trivialidades do costume: que caiem chuvas diluvianas e as viaturas continuam empanadas; só encontro meias de nylon em Bafatá e ando a pedir meias de malha e altas a quem gosta de mim; tenho cada vez mais gente doente, fazem-se prodígios com duas secções desfalcadas que saem de Missirá, recolhem-se milícias em Finete, outro dia descobri que nem morteiros nem bazucas seguiam connosco, só dois apontadores de dilagramas; que está prometido ir a Bafatá dentro de dias tratar dos documentos para o casamento e aproveito para perguntar à minha futura mulher se já tem a minha certidão de baptismo; que o meu padrinho de baptismo me enviou um pacotão de livros mais ou menos fabulosos, entre eles Rumor Branco, de Almeida Faria, um amigo que ela tanta aprecia; que tenho muitas saudades e aguardo cheio de esperança o resultado o meu recurso.

Falo primeiro com o major Pires da Silva, um tanto insone que me relata a sequência do que se passou esta madrugada. Acho aquilo tudo estranho, que raio de inimigo é aquele que não consegue atingir uma instalação, um telhado, uma viatura? Aliás, nos comentários breves que escutei de alguns camaradas, acorre uma palavra aparentemente enigmática mas que teria correspondido à natureza do ataque e ao volume da respostas: uma comboiada.

A seguir, fala-me na operação Goldfinger II o mesmo é dizer que eu vou estar em Aldeia do Cuor, alguém virá por Santa Helena e Mero e patrulhará esmiuçadamente a outra margem do Geba, na expectativa de uma cambança onde eu apanharei os possíveis rebeldes. A operação terá lugar na madrugada de 16.


O último encontro com o Pimbas (2)

Com a serenidade possível, recordo ao Major de Operações que tenho 9 homens que vão ser examinados pelo David Payne, não podem dar um passo; que as camas em Missirá e Finete não estão cheias de gente indolente mas gente que sofre esta permanente canseira de Missirá a Mato de Cão, sem nenhum apoio da tropa de Bambadinca.

O Major Pires da Silva lembra-me que raramente somos chamados a operações. Respondo-lhe que sair com duas secções de Missirá e Finete, neste momento, e por mais de três noites, é comprometer todo o sistema defensivo.
- Ainda bem que me fala nisso, em Julho preciso exactamente de si e de mais 12 homens.

Despedimo-nos e sigo para o gabinete do Pimbas. Está jovial e prazenteiro.
- Menino, penso que tenho um consolo para te dar. Mais mês, menos mês, vais para Fá e depois trabalharás só para as operações de Bambadinca e no sector do Cossé. Até lá, não me tragas mais problemas, aguenta estoicamente.

Fora ali mais para cumprimentar os camaradas flagelados dessa Bambadinca que eu trago no coração. Não regresso nenhuma resposta com mais efectivos, não há disponibilidade para se apoiar o Cuor. Furioso, junto-me aos meus homens, não há almoço para ninguém, petisca-se no Zé Maria, o rumo é Finete, onde tenho a premonição de um duro ataque, a qualquer hora.

A marcha pela bolanha é um calvário, a ponto de se ter feito uma padiola em que levamos o gigante Serifo Candé que anda com as pernas entrapadas que escondem as úlceras. É uma coluna em que se levam cunhetes de granadas à cabeça, por cima de uma rodilha, e pacotes de espaguete nos bolsos.

Trabalhamos com Bacari nas folhas de pagamentos dos milícias de Finete e aproveito para vistoriar as obras de um abrigo, praticamente pronto. Serifo não vem connosco, a marcha para Finete é enriquecida por uma dezena de civis que vieram de Galomaro e vão ajudar nas fainas agrícolas os Soncó e os Mané. É uma progressão difícil de 14 Km cheios de lama, com o olhar sempre atento às possíveis minas.

São 17:30, o céu é chumbo, o entardecer esfria quando, no preciso instante em que uma coluna de militares e civis abatidos pela chuva inclemente entram pela porta de armas, o fogo de morteiros 82 e rockets vem de Cancumba para o interior de Missirá. É a debandada, os militares vão para as posições preestabelecidas, os civis, enlouquecidos, esparvoados, gritando socorro, atiram-se para qualquer sítio. As nossas armas respondem, Cherno começa a sua corrida , o seu olhar perscruta a mata, põe e tira cargas nas granadas de morteiro, manda os seus recados para Cancumba.

É no meio do caos deste foguetório que dou comigo no abrigo de morteiro 81 com o Queirós. Este prepara-se para meter a primeira granada, quando lhe suspendo o gesto:
- Pá, aconteceu qualquer coisa, os gajos retiram, não há mais fogo.

E não havia mesmo, tal como em Bambadinca, um grupo não estimado limitou-se a deixar um cartão, um aviso de que sempre que podem e querem, os de Madina têm ao seu dispor a nossa intranquilidade. Os próximos minutos destinaram-se a mandar silenciar as armas e avaliar os estragos. Felizmente, estragos mínimos, umas pernas e braços escoriados, o Adão teve trabalho para as horas seguintes, tem até mesmo comprimidos para pôr a dormir os mais excitados.

Tudo somado, jantou-se mais tarde e chegou-se ao cúmulo de cumprir as ordens emanadas de Bafatá, 15 homens foram emboscar a cerca de 600 metros, vi-os seguir com o coração apertado, não há nenhuma lei que defina que a seguir a uma curta flagelação não venha um ataque demolidor. Mas, de facto, tudo não passara de um grupo que a pretexto de um patrulhamento se limitara a dar conta da sua existência. Deixara como lembrança vários buracos na parada e pedaços de rockets. O patrulhamento ao princípio da manhã confirmará exactamente isto: eram poucos e retiraram pela estrada de Moruncunda. Trouxemos alguns cartuchos inteiros e cápsulas que mais tarde entreguei em Bambadinca.


Operação Goldfinger II

O dia 15 seria imperativamente dedicado às obras, já que nos competia sair para a Aldeia do Cuor pelas 4 da tarde. A Goldfinger II é uma acção sem história, é um dos picantes de todas as guerras, que por natureza são imprevisíveis. Chovia a cântaros, lá levámos a capa dita impermeável e rações de combate. De acordo com o plano, ficámos primeiro dentro da Aldeia de Cuor e quando anoiteceu totalmente caminhámos para a orla da bolanha, uma emboscada que garantia total visibilidade para o caminho que vinha de Fá Madinga e da antiga tabanca de Canchebeu, a seguir a Biana.

As horas passaram, de novo vi chegar um pelotão (era o Pel Caç Nat 53, comandado pelo Alves Correia, tanto quanto me recordo), ouviam-se gritos desta unidade militar a tornear toda a bolanha, como se procurasse acossar um presumível grupo que tivesse vindo abastecer-se ali perto. Mais tarde, vim a saber que houvera um novo roubo de vacas em Bissaque, perto de Mero, espalhou-se o boato que 100 rebeldes iriam procurar entrar no quartel de Fá. Pois bem, nada aconteceu até às cinco da manhã, e com a primeira luz do dia regressámos moídos a Missirá.

Eu pedi há dias ao Queta Baldé que viesse conversar comigo sobre acontecimentos que mais tarde aqui se descreverão, ligados sobretudo à flagelação de 15 de Julho. A remexer os meus papéis, encontrara um louvor que lhe fora concedido e onde se referia concretamente que ele ripostara ao fogo do inimigo como apontador de metralhadora ligeira, a despeito desta ter sido atingida, tendo concorrido para baixas ao inimigo e captura de armamento.


Nosso alfero, eu que sei que não acredita em bruxas, mas que as há, há - assegura o Queta Baldé


Como a memória do Queta é praticamente infalível, depois de eu lhe ter pedido confirmação sobre os acontecimentos de Bambadinca, Missirá e Aldeia de Cuor, tudo ocorrido em escassas horas, ele que me ouve sempre a manear a cabeça, erguendo de quando em quando um dedo para depois dar uma explicação ou fazer um complemento, a certa altura disse:
- Nosso alfero, tudo isso aconteceu, mas ainda não falou na emboscada da bruxa, que foi logo a seguir, quando levámos população civil para Finete.

Olhei-o atónito, nunca tinha ouvido falar numa emboscada da bruxa e pedi-lhe pormenores.
-Nosso alfero, eu sei que não acredita mas as bruxas são os maus espíritos que andam pelas matas. Inderissa Mané, um dos filhos de Mussá, e quero lembrar que o pai de Mussá era o guarda-costas de Bacari Soncó, o pai de Malã, estava possuído por esses maus espíritos. Então, depois das flagelações a Bambadinca e Missirá, depois de termos passado a noite em Aldeia de Cuor, creio que dois dias depois de tudo isto, e ainda sem viaturas, fomos de Missirá a Finete para juntar mais gente e seguir para Mato de Cão. Estávamos a chegar junto do sítio onde fora a grande tabanca de Canturé, quando Inderissa, um rapaz que fora sempre doente, desatou a babar-se, roubou uma G3 e ameaçou que disparava sobre nós. Felizmente que ia connosco o padre Lânsana que falou com ele de mansinho e acalmou a bruxa. Olhe que podíamos ter morrido ali muitos. Nesse dia, a bruxa perdeu.

Ouvi esta explicação do Queta em completo silêncio, tomei nota de tudo e do alto da minha suficiência para encontrar outras explicações plausíveis, ocorreu-me pensar que Inderissa era epiléptico e que fazia parte dos jogos da vida morrer em acidentes, tão imprevisíveis como aquele.


Leituras: Do Prazer de Matar (F. Brown) ao Rumor Branco (Almeida Faria)

A época das chuvas prossegue desalmada, caminhamos pela bolanha de Finete enregelados com água pela cintura. Fazemos todas as acrobacias possíveis para aguentar a falta de recursos. Escrevo muito, recebi correio do meu padrinho, do Carlos Sampaio, a caminho do norte de Moçambique, de amigos de S. Miguel, cartas íntimas da Cristina, da minha mãe, chegou mais apoio do Ruy Cinatti. Procuro embalar-me nestes estímulos enquanto desabam todas as chuvas do mundo sobre o Cuor, alastrando para a Guiné.

Capa do romance policial O Prazer de Matar, de F. Brown. Lisboa: Livros do Brasil, s/d. (Colecção Vampiro, 137). Capa: Lima de Freitas.

Foto: © Beja Santos / Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.



Apetecia-me poetar, mas relembro a obra do Cinnati descubro a minha falta de vocação. Pego em O Livro do Nómada Meu Amigo e meço a força de um poema de Sophia de Mello Breyner Andersen endereçada ao Cinatti:

Intacta é a sua ausência
Como a estátua de um Deus
Poupada pelos invasores de uma cidade em ruínas.

O Ruy, que me tem enviado alguns dos seus poemas sintéticos, escreve em Ilha: Ave!/Prenúncio de arvoredo . Como é que se pode ser tão admiravelmente simples? Ou então:

Não sei quem me criou. Deus sobre todos
Paira. Esta canção pertence-lhe:
O pão de cada dia nos dai hoje.
Não sei quem me criou. O ar que respiro
Não me deixa ser menos do que sou.

Não me deixa o mar omnipotente,
A terra inteira erguida ao céu profundo.
Cada passo da História me é presente.
Sou o compasso do Mundo.

Volto a reler Frederic Brown, um autor prolífico que tudo experimentou na ficção, desde o policial à ficção científica. O prazer de matar é mais um desses livros da Colecção Vampiro que felizmente se pode encontrar em Bafatá. É um livro soberbo. O detective não o é, é um redactor a quem mandaram fazer a notícia sobre um jovem que sofreu um acidente mortal na montanha russa, num parque de diversões. Este jovem foi identificado devido a uma carteira onde constavam os seus elementos. Afinal não era bem assim, a carteira era de outro jovem, e começa uma investigação informal na semana de férias de Sam Evans, este polícia por empréstimo e curiosidade. No final, o jornalista é confrontado com uma história de esquizofrenia, alguém aparentemente normal que tem sede a toda a hora de destroçar vidas humanas.


Capa do romance Rumor Branco, de Almeida Faria. Lisboa: Portugália Editora, 1962. (Colecção Novos, Série Novos Romancistas, 1). Prefácio de Virgílio Ferreira.

Foto: © Beja Santos / Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.

A grande surpresa é a leitura de Rumor Branco, por Almeida Faria. Ele não tinha ainda 20 anos quando se estreou na literatura e recebeu o Prémio Revelação de Romance, da Sociedade Portuguesa de Escritores. No prefácio, Virgílio Ferreira anuncia o aparecimento de um futuro grande escritor e refere-se a obra fragmentada, uma história sem história, catadupas de frases onde mudam as pessoas, uma bebedeira que lembra Faulkner ou James Joyce.

O personagem é um tal Daniel João, que se vai colando a vários personagens, é pequeno burguês, mas é operário, uma vezes é muito culto, outras vezes não tanto, leva uma vida carregada de mistério, cola-se à nossa pele recorrendo a múltiplos disfarces, procurando empolgar-nos através da descoberta das suas experiências. A pontuação do texto é terrível mas original, obrigado a uma leitura concentrada, a voltar atrás, a perceber a voz e o tumulto interior. Fala da vida cosmopolita mas também do Alentejo, rescreve as palavras à luz do sotaque alentejano, sobe ao sonho da burguesia e desce à miséria dos proletários alentejanos. É preso e perseguido e condenado a uma prisão quase perpétua. Visita Paris e percorre esfuziante Saint-German e Montparnasse. Maneja os cânones do novo romance e do neo-realismo. Lê-se em exaltação e fica-nos uma secura na despedida.

Tenho que escrever à Cristina para lhe contar esta novidade, já que o Almeida Faria é seu colega de curso. Vou escrever e depois deito-me, poderá ser um sono mais regrado, só ao fim da tarde é que parto para Mato de Cão. Todo o mês de Junho vai ser assim. Mas em Julho virá o ciclone, depois um novo período e operações. Ora oiçam.

__________

Notas de L.G.:


(1) Vd. relação dos dez últimos posts anteriores desta série:
11 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1833: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (49): Cartas de além-mar em África para aquém-mar em Portugal (4)

1 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1806: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (48): Junho de 1969: Missirá em estado de sítio

25 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1786: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (47): Finete já está a arder ? Ou o ataque a Bambadinca, a 28 de Maio de 1969

20 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1770: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (46): Encontros de morte em Sinchã Corubal, com a gente de Madina

11 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1748: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (45): A visita do Coronel, o Grande Inquiridor~

4 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1730: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (44): Uma temerária e clandestina ida a Bucol

27 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1704: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (43): Em louvor de Bambadinca, a nossa tabanca grande

20 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1680: Operação Macaréu á Vista (Beja Santos) (42): O Tigre de Missirá volta a rugir

13 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1657: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (41): Cartas de além-mar em África para aquém-mar em Portugal (3)

30 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1637: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (40): Cartas de além-mar em África para aquém-mar em Portugal (2)

(2) Será o último encontro do autor com o tenente-coronel Pimentel Bastos, comandante do BCAÇ 2852, e seu amigo; punido por Spínola, é colocado em Bissau, ou melhor, posto na prateleira... Uma situação humilhante, para ele. Beja Santos só voltará a encontrar o seu amigo em Lisboa.

Guiné 63/74 - P1850: O 10 de Junho, o Hernâni Lopes e a malta da tertúlia (Ayala Botto / A. Marques Lopes / Hugo Moura Ferreira / Lema Santos)

Lisboa > Belém > Forte do Bom Sucesso > Memorial aos Mortos do Ultramar > 10 de Junho de 2007 > Ramos de flores de diversas associações de antigos combatentes.

Lisboa > Belém > 14º Encontro Nacional de Combatentes > 10d e Junho de 2007 > Malta da nossa tertúlia > Da esquerda paara a direitra, reconheço, entre outros o António Santos(e a esposa), o Tino Neves, o Hugo Moura Ferreira (e a esposa), o Marques Lopes e, por fim, o Fernando Chapouto (e a espoa).

Lisboa > Belém > 14º Encontro Nacional de Combatentes > 10 de Junho de 2007 > O Vacas de Carvalho, O Fernado Franco e o Hugo Moura Ferreira (e esposa)


Lisboa > Belém > 14º Encontro Nacional de Combatentes > 10 de Junho de 2007 > O Marques Lopes e o Fernando Chapouto
Fotos: © Hugo Moura Ferreira (2007). Direitos rerservados.

Ainda a propósito do 14º Encontro Nacionald e Combatentes, Lisboa, Belém, 10 de Junho de 2007 (1), aqui ficam mais alguns apontamentos e esclarecimentos:


1. Caro Marques Lopes:

Eu também lá estive mais uma vez, mas como não conheço pessoalmente ninguém da tertúlia não dei por vocês. Foi pena.

Em relação ao Hernâni Lopes, ele próprio referiu que embora tenha feito o Serviço Militar na Reserva Naval, nunca esteve no Ultramar e que não era antigo combatente.

Um abraço para todos
Carlos Ayala Botto


2. Caro Ayala Botto:

As minhas desculpas. Confesso que não estive atento ao discurso do Hernâni Lopes, pois estava na conversa com os amigos. Por isso perguntei ao Lema Santos da razão por ser o Hernâni Lopes a fazer o discurso. E foi ele que me disse que ele tinha estado na Reserva Naval, a cuja Associação pertence, tal como o Lema Santos. Pareceu-me também - e mal, então - que ele me disse que o Hernâni Lopes tinha estado na Guiné. Fica a correcção. Os meus agradecimentos.

Abraço
A. Marques Lopes

3. Caros Amigos e Camaradas;

Os meus agradecimentos a todos e também um esclarecimento: O Ernâni Rodrigues Lopes (escreve-se mesmo assim) foi do 7º CEORN (Curso Especial de Oficiais da Reserva Naval) e entrou para a Escola Naval em 15.8.1964 para a classe de Administração Naval. Como Oficial da Reserva Naval, não esteve na Guiné no seu tempo de permanência ao serviço da Marinha de Guerra.

É presidente da Mesa da Assembleia Geral da AORN - Associação dos Oficiais da Reserva Naval (2) e julgo que terá sido nessa qualidade que esteve presente na cerimónia do 10 de Junho.

O Almirante Nuno Gonçalo Vieira Matias foi Chefe da Estado-Maior da Armada e, enquanto 1º tenente, comandou o destacamento nº 11 de Fuzileiros Especiais na Guiné de 1968 a 1970. É também sócio honorário da Associação.

Um abraço para todos,
Manuel Lema Santos

2. O A. Marques Lopes aproveitou tamnbém para nos mandar mais umas fotos da malta da tertúlia que esteve no 10 de Junho em Belém. Sem legendas...Autoria: Hugo Moura Ferreira.
________

Nota de L. G.:

(1) Vd. posts de:

12 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1841: Estive no 10 de Junho... e que bem que me soube olhar aquela multidão de boinas e de cabelos brancos... (A. Mendes, 38ª CCmds)

13 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1842: 10 de Junho: Nós também estivemos lá (A. Marques Lopes / Lema Santos)

(2) O nosso camarada Jorge Santos, na sua página Guerra Colonial tem (e mantém actualizada) uma lista bastante completa de dezenas de associações de antigos militares e combatentes portugueses, dos três ramos das forças armadas, sediadas em Portugal e no estrangeiro, incluindo os respectivos contactos (endereço postal, telefone, fax, e-mail, URL). Dessa lista também consta a AORN.

quinta-feira, 14 de junho de 2007

Guiné 63/74 - P1849: Quero prestar a devida homenagem ao meu tio, o Alf Mil Manuel Sobreiro, da CART 1612, morto em Mampatá em 1968 (Nelson Domingues)






Guiné > Guileje > BART 1896 > CART 1612 (1967/69) > O Alf Mil de Minas e Armadilhas, Manuel Sobreiro, natural de Leiria, morto numa acidente com um granada defensiva, em Mampatá, em Fevereiro de 1968. Alguém se lembra dele e das circunstâncias em que morreu ?

Fonte: Nelson Domingues > Blogue > As Verdades do Sobreirito(2007). (com a devida vénia...).

1.Mensagem de Nelson Domingues:

Boa noite!

Espero que se encontre de boa saúde.

(i) Sou sobrinho de Manuel Sobreiro, Manuel Jesus Rodrigues Sobreiro (1942-1968).
(ii) Tombou a 24 de Fevereiro de 1968.
(iii) Causa (oficial ou oficiosa): Acidente .
(iv) Unidade Mobilizadora: RAP 2.
(v) Ramo das Forças Armadasa: Exército.
(vi) Naturalidade: Chã da Laranjeira, Sto. Carpalhosa.
(vii) Posto e nº mecanográfico: Alferes Miliciano de Artilharia nº 0022363.
(viii) Unidade a que pertencia no CTIG: Alferes Miliciano Manuel Sobreiro – 2º comandante da CART 1612.

Eu e a minha família sempre ouvimos falar de muitas verdades sobre o acidente que vitimou o meu tio, mas por mais histórias que haja, o meu desejo é recolher o máximo de informação sobre o meu tio para o homenagear condignamente no dia 28 Fevereiro de 2008, no 40º aniversário do seu desaparecimento.

Não o vou maçar mais, agradeço desde já a sua amabilidade para consultar o humilde blogue que estou a iniciar.

Os meus cumprimentos,

Nelson S S Domingues
Rua de Leiria nº 117 1º Andar
2425-039 Monte-Real

Blogue > As Verdades do Sobreirito


2. Reprodução do post de 12 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXLV: As malditas formigas pretas do José Teixeira (Zé Neto)

Luís:

A minha intenção era ficar aqui caladinho no meu canto para não entupir a formidável sequência de factos das campanhas da Guiné. (Creio que estamos a construir um monumento histórico e inédito). Mas o José Teixeira tem o condão de me despertar recordações dispersas, pois fala de sítios por onde andei. Admiro-o muito.

E, a propósito das desgraçadas formigas, veio-me à memória a morte inglória do meu conterrâneo Alferes Miliciano Manuel Sobreiro (2º comandante da CART 1612, por ser o mais classificado dos alferes). O Sobreirito (como eu o tratava na intimidade) tinha a especialidade de Minas e Armadilhas.

Em Fevereiro de 1968, precisamente na área de Mampatá, foi encarregado de desarmadilhar uma zona por onde iam alargar uma picada. Quando já tinha bem presa a alavanca duma granada defensiva instantânea e se preparava para introduzir a cavilha foi mordido num artelho por uma dessas formigas. Ao fazer o gesto de sacudir o insecto escorregou-lhe a alavanca e... sucumbiu crivado de estilhaços.

O Alferes Miliciano de Artilharia nº 0022363, Manuel de Jesus Rodrigues Sobreiro, natural de Riba de Aves, Souto da Carpalhosa, Leiria, não morreu em combate. Os senhores da guerra determinaram que foi "morto por acidente". Tanta injustiça que se cometeu!!! Um dia hei-de abordar este tema (1).

3. Comentário de L.G.:

Infelizmente o nosso amigo e camarada Zé Neto (1929-2007) já não está entre nós para poder dar esclarecimentos adicionais sobre a morte do Alf Mil Sobreiro, seu conterrâneo, e que pertencia ao mesmo batalhão (BART 1896). A menos que a sua neta Leonor, de 17 anos, descubra algum escrito, no computador do avô, que volte a abordar este acidente.

De qualquer modo, as nossas saudações ao Nelson, seu sobrinho, por este gesto público de grande ternura para com o tio Manuel Sobreiro, o Sobreirito. Veremos o que pode fazer a nossa tertúlia, de modo a honrar a memória do tio e do sobrinho. Todos nós temos direito à verdade, a começar pelos familiares e amigos dos nossos camaradas que tombaram na Guiné, em combate, por acidente, por doença ou por qualquer motivo. L. G.

__________

Nota de L.G.:

(1) A CART 1612 era um das três companhias operacionais do BART 1896 (As outras duas eram a 1613 e a 1614). Segundo o Zé Neto, esta última, a CART 1614 era "a subunidade turista da Guiné que nunca ninguém do Batalhão conseguiu descobrir a razão de ficar sempre de fora dos petiscos que calharam às outras duas companhias operacionais (1612 e 1613)". E acrescenta, com ironia: "Eu desconfio, mas, para misérias do Celestino já basta!"...

Sobre esta unidade, há já algumas referências na Net. «Vd. o post de:

23 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1779: Fotobiografia da CCAÇ 2317 (1968/70) (Idálio Reis) (6): Maio de 1968, Spínola em Gandembel, a terra dos homens de nervos de aço

(...) "Pesadas baixas para a CART 1612, na sequência do recrudescimento da actividade operacional do PAIGC

"Há documentos oficiais que confirmam que em resultado de uma mina anti-carro com emboscada, na estrada Mampatá−Uane, morrem 4 soldados da CART 1612. Não tenho elementos que me permitam concluir se estas acções se interconectam, pois o que então me afirmaram é que a captura dos elementos fora operada num ataque com assalto a um pequeno destacamento.

"Esta Companhia de Artilharia, num curto espaço de tempo, é agressivamente fustigada, e relacionada com as colunas Buba − Aldeia Formosa − Gandembel, perdendo um número incrível de militares, em mortos e feridos" (...).

Guiné 63/74 - P1848: Aviso à navegação (1): Temporariamente indisponível a minha página pessoal (Luís Graça)

Amigos & Camaradas:


Há problemas técnicos no acesso à minha página pessoal (Luís Graça, sociólogo > Saúde e Trabalho ), devido à reformulação da sítio da ENSP/UNL onde aquela está alojada... Esses problemas estão pendentes de resolução até, pelo menos, à próxima 2ª feira, dia 18 do corrente... Até lá, santa paciência, vocês não têm acesso, a partir do nosso blogue, a: (i) página da tertúlia; (ii) cartas da Guiné; e (iii) memórias dos lugares...

O blogue é independente (não depende do servidor da minha instituição): podem, no entanto, não aparecer algumas fotos, nalguns posts mais antigos, ou podem surgir links quebrados, etc.

Como dizem os economistas, não há almoços grátis... São os custos da dependência... Mas os amigos e camaradas poderão continuar a consultar tudo o mais que está disponível no nosso blogue e a engrossar o nosso número de visitantes e de visitas (que são já cerca de 10 mil por semana). Poderão continuar a utilizar, nomeadamente, para efeitos de correspondência, os endereços de e-mail dos editores, Luís Graça e Carlos Vinhal, incluindo o endereço oficial Luís Graça & Camaradas da Guiné (que é da nossa conta do Google).

Peço desculpa pelo incómodo. Mas quem passou pela Guiné está habituado a estes relativos desconfortos: às vezes também não havia avioneta, frescos, helicanhão, barco, cerveja, gasóleo, munições, vontade, homens (para não falar das mulheres!), etc. ... Aprendemos, contudo, a sorrir às adversidades, de dentes cerrados...

Obrigado pela vossa confiança e apoio.

Aproveitem, os que residem na área da Grande Lisboa, para irem ao Teatro da Trindade ver a peça Namanha Mackbune (até 1 de Julho de 2007, de 4ª feira a domingo) e matar saudades dos sons, das cores e das emoções ligadas à nossa Guiné, à sua cultura, à sua história, às suas gentes... Aproveitem para ouvir, ao vivo, o grande mestre José Braima Galissá, mandinga, tocador de Kora (que eu já ouvira uma vez no Museu de Etnologia).

Eu já vi, no passdo dia 13 de Junho… Voltei à Guiné, às tabancas mandingas e fulas de Contuboel!!! Grande encenação, belíssimo texto, ambiência magnífica, magníficos actores (entre os quais 8 guinenses, do Grupo Os Fidalgos), sem esquecer o Braima Galissa, a tocar Kora e a cantar como didjiu (tocador e cantor que ia, de tabanca em tabana contando estórias)…

Fabulosa reflexão sobre o poder e a vida, a amizade, o amor e a traição… Sempre actual, e para mais em contexto africano…

O teatro continua a ser a mais universal das artes. No feriado municipal de Lisboa, miseravelmente o número de espectadores não deveria ultrapassar o número de actores (que são para aí dúzia e meia).

Por favor não percam este espectáculo (quem viver em Lisboa ou perto). No Teatro da Trindade (que pertence ao INATEL). Até 1 de Julho, de 4ª feira (21.30h) a domingo (16h). Preço: 10 euros (plateia) a 12 euros (balcão lateral), com descontos (30%) para os sócios do INATEl, malta mais jovem (até 25) ou mais velha (65 ou mais).

PS – Actualizem a vossa lista de endereços de email: temos novos camaradas e amigos (António Bartolomeu, César Dias, Germano Santos, Gilda Brás, Manuel Amante, etc.)

Guiné 63/74 - P1847: Tabanca Grande (12): Miguel Vareta da 38ª Companhia de Comandos, 1972/74

Guiné > Gampará > 38ª Companhia de Comandos (1972/74 > Os Furriéis milicianos Miguel Vareta e Artur Fabião (algumas semanas antes de este morrer em combate em Caboiana – Churo).

Foto: © Miguel Vareta (2007). Direitos reservados.

1. Mensagem de Miguel Vareta


Caro Luís Graça,

No passado Sábado dia 9 tive o prazer de conhecer o Paulo Santiago durante a 3ª parte de um jogo de rugby de veteranos. Conversa aqui, copo acolá, fomos parar à Guiné onde ambos estivemos. O Paulo falou-me do blog, deu-me o endereço e aqui estou.

O meu nome é Miguel Vareta, fui Furriel Miliciano na 38ª Companhia de Comandos na Guiné, entre 1972 e 1974.

Conforme sugerido pelo Paulo Santiago, junto 2 fotos- 1 da Guiné e 1 actual. Na da Guiné (onde estou com T shirt branca) apareço em Gampará (1), com o meu grande amigo e saudoso furriel Artur Fabião que passadas algumas semanas morreria em combate ao meu lado, em plena Caboiana – Churo (2).

Aproveito para mandar um abraço ao Amílcar Mendes que já vi ser visitante regular (3).

Parabéns pelo magnífico blog, um abraço fraterno a todos os ex-combatentes no Ultramar e um abraço muito especial em particular a todo o pessoal da 38ª CCmds.

Cptos

MV

2. Mensagem do Paulo Santiago para o A. Mendes, com data de 9 de Junho do corrente:

Camarada Mendes:

Saí há uma hora de um jantar onde conheci um camarada teu da 38ª.Explico desde o início.

Tive hoje um jogo de rugby de veteranos,disputado entre a minha equipe(Rugby Club da Bairrada) e o CDUP. Na terceira parte (o jantar) de leitão e bom vinho, ficou perto de mim, o Miguel Vareta, que com conversa sobre idades, enquanto se comia e bebia, me disse ter estado na Guiné na 38ª CCmds.

Falei-lhe no blogue do Luís Graça e nos posts que escreveste. Lembra-se de ti, apesar de não seres do grupo de combate dele. Disse não ter estado em Guidaje (2), parece, se percebi bem, entre os copos que se iam bebendo, que estava a recuperar de um ferimento no hospital.

Ficou de pedir para entrar para a Tertúlia, da qual lhe dei o endereço. Na foto que te mando em anexo o ex-FurMil Vareta é o 5º da direita para a esquerda na fila de cima. Está em boa forma.

Abraço

P. Santiago

3. Comentário do editor do blogue: Miguel, obrigado pelas tuas referências elogiosas ao nosso blogue, que pretende ser mesmo um blogue colectivo, feito por e para todos os camaradas que passaram pela Guiné, e os demais amigos da Guiné e dos guineenses. Obrigado pelo teu abraço. És bem-vindo. Ficamos a aguardar que nos contes algumas das tuas estórias. Passas a ser o lídimo reporesentante da 38ª CCmds, a par do A. Mendes, que já é um veterano nestas lides... LG

________

Notas de L. G.:

(1) Gamparà fica(va) situada na margem esquerda do Rio Corubal, mais ou menos frente à Ponta do Inglês (vd. carta de Fulacunda): vd. post de 21 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1540: Os paraquedistas também choram: Operação Pato Azul ou a tragédia de Gamparà (Victor Tavares, CCP 121)

(2) Qual a grafia correcta ? Tu escreveres Coboiana - Churro, o Amílcar há tempos falava em Cubiana-Churro (vd. post de 22 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1200: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (2): Um dia de Natal na mata de Cubiana-Churo ) ... Na carta o nome que lá vem (e que eu uso) é Caboiana ( junto ao Rio Caboiana...).

(3) Vd. alguns dos posts do Amílcar Mendes:

9 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1827: Convívios (14): 38ª Companhia de Comandos, Pínzio, Vilar Formoso, 9 de Junho de 2007 (A. Mendes)

15 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1280: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (7): Um tiro de misericórdia em Caboiana

30 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1223: Soldado Comando Raimundo, natural da Chamusca, morto em Guidaje: Presente! (A. Mendes, 38ª CCmds)

24 de Outubro de 006 > Guiné 63/74 - P1210: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (6): Guidaje ? Nunca mais!...

23 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1205: A vida de um comando (A. Mendes, 38ª CCmds) (5): uma noite, nas valas de Guidaje

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Guiné 63/74 - P1846: 10 de Junho: Cerimónia no Cemitério nº 1 de Leça da Palmeira (Carlos Vinhal)

Cerimónia no Cemitério nº.1 de Leça da Palmeira, no dia 10 de Junho de 2007, em Memória dos Militares leceiros falecidos na Guerra Colonial (1961/74) (Carlos Vinhal)

Os ex-combatentes da Guiné, Manuel Agostinho, António Maria e José Oliveira (Cartaxo), com a preciosa e indispensável colaboração da Junta de Freguesia, organizaram no dia 10 de Junho, no Cemitério nº 1 de Leça da Palmeira, no Memorial aos Combatentes da Grande Guerra ali existente, uma singela mas tocante cerimónia.

A Junta de Freguesia de Leça da Palmeira fez-se representar pelo seu Presidente, Dr. Pedro Tabuada, Tesoureiro, senhor Eduardo Pereira e Vogal, senhor Basílio Ramos.
Esteve também presente o senhor Tenente-Coronel Gonçalves em representação da Delegação do Porto da Liga dos Combatentes.

Assistiram ao acto muitos ex-combatentes com as suas famílias, assim como familiares dos homenageados.

Foram descerradas duas lápides lembrando os leceiros falecidos na Guerra do Ultramar entre 1961 e 1974 em Angola, Guiné e Moçambique.
Seguiu-se ainda a deposição de uma coroa de flores.

Usaram da palavra o Ten Cor Gonçalves, o Dr. Pedro Tabuada e finalmente o camarada Manuel Agostinho que realçou o facto de não haver no Concelho de Matosinhos um Memorial que lembre, reconheça e perpetue o esforço dos jovens matosinhenses na Guerra do Ultramar.

Às 12 horas foi celebrada uma missa na Igreja Matriz pelo Padre João, nosso conterrâneo, sufragando a alma dos nossos camaradas falecidos.


Foto n.º 1 - Descerramento das Lápides evocativas dos militares falecidos

Foto n.º 2 - O Tenente-Coronel Gonçalves quando usava da palavra

Foto n.º 3 - José Oliveira, António Maria e, Manuel Agostinho no uso da palavra


Foto n.º 4 - Memorial aos Combatentes, agora também dedicado aos Mortos da Guerra do Ultramar de Leça da Palmeira


Texto e fotos: Carlos Vinhal

Guiné 63/74 - P1845: Em busca de: Carlos Soares Pinto Ribeiro, ex-Soldado do BCAV 705, Guiné 1964/66

1. Mensagem do nosso camarada Carlos Soares Pinto Ribeiro

Caro amigo, li que poderia dar-me informações que já há algum tempo procuro. Fui soldado no Batalhão de Cavalaria 705 e gostaria de entrar em contacto com alguém que me pudesse dar informações de como encontrar os colegas com quem vivi durante quase dois anos.

Estive fora do País 40 anos, estou reformado e só agora é que tenho tempo para confraternizar.

Mais uma vez lembro-lhe a composição do Batalhão com as suas Companhias 703, 704 e 705 à qual eu pertencia.

Um grande abraço e um muito obrigado por me ler.

Carlos Soares Pinto Soares
Soldado 2609/63
E-mail: carleunicevpa@sapo.pt



2. Mensagem do co-editor do Blogue

Caro Carlos Pinto Ribeiro:

Não há na nossa Tertúlia ninguém que tenha pertencido ao seu Batalhão. Mandei a sua mensagem a todos os tertulianos, na expectativa de aparecer alguém que o possa ajudar.

Fui entretanto ao sítio do nosso camarada Jorge Santos em www.guerracolonial.home.sapo.pt/ e, na secção de Convívios/Ponto de Encontro, encontrei um seu camarada a pedir contactos. É ele Álvaro Baptista com o endereço r.l.baptista@mail.telepac.pt
Acho que deve contactá-lo.

Julgo termos dado o primeiro passo para que possa reencontrar velhos camaradas. A amizade não se esfuma apesar do silêncio de longos anos. Desejamos-lhe boa sorte.

Receba um abraço e votos de muita saúde.

Carlos Vinhal
Co-editor do Blogue do Luís Graça & Camaradas da Guiné

Guiné 63/74 - P1844: Estórias do Gabu (6): Já chegámos à Madeira, ou quê ?! (Tino Neves)

Região Autónoma da Madeira > Ilha da Madeira > Maio de 2007 > Pico do Areeiro, o sítio mais alto da ilha (1818 m) a seguir ao Pico das Torres (1852 m) e ao Pico Ruivo (1862 m). Acessível por carro, é o mais visitado... Um deslumbramento... Ao fim de muitos anos (e de várias tentativas), consegui lá chegar, de carro, ao Pico do Areeiro e vê-lo, em dia sem nuvens nem frio nem chuva... Enfim, não basta chegar ao (e ficar no) Funchal, é preciso conhecer os picos e as veredas da Ilha e, claro, as suas gentes afáveis e hospitaleiras...

Esta estória do Tino Neves levanta-me uma questão (delicada): qual será exactamente a origem (e, portanto, a história) da expressão Já chegámos à Madeira ou quê ?!, que é claramente ofensiva para os madeirenses ?... Se alguém quiser, puder e souber responder, a gente agradece... Aproveito para mandar um abraço ao meu amigo e ex-camarada da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71), José Vieira de Sousa, um madeirense dos quatro costados... (LG).

Foto: © Luís Graça (2007). Direitos reservados.

1. Texto do Tino Neves , ex-1º Cabo Escriturário, CCS/BCAÇ 2893, Nova Lamego (Gabu), 1969/71, enviado em 7 do corrente:

Caros camaradas Luís e Carlos:

Ontem enviei uma pequena estória de um Madeirense (1), e lembrei-me de uma outra, que resolvi primeiro analisar se a mesma teria conteúdo e que não fosse contra às regras do blogue.

Achei então, que para além de não quebrar as regras, serve a mesma para homenagear o homem que foi o ex-Sargento Ajudante Jaime Pitta, madeirense do Funchal e Porto Santo, que, sendo da GNR e para poder entrar no quadro de oficiais da GNR, teve que fazer, aos 54 ou 55 anos de idade, uma Comissão de Serviço na Guiné.

Foi para a Secretaria do Batalhão de Caçadores 2893, o meu batalhão, em rendição individual, alguns meses depois do Batalhão já estar em Nova Lamego (Gabu).

Senhor muito simpático e que eu prezava muito. Depois do episódio que vou aqui relatar, ainda mais o tive em consideração.

Faleceu em Março de 2005, com 88 ou 89 anos, depois de ter adoecido em 2003, nas vésperas de se deslocar a Lisboa para estar presente no 1º Encontro/Convívio da CCS do BCAÇ 2893, em Leiria, encontro pelo qual tanto ansiou.

Aí vai a estória. Um abraço do Tino.


Já chegámos à Madeira, ou quê?!
por Tino Neves


Foi capturado um soldado do PAIGC, e foi levado para as celas do Aquartelamento novo, de Nova Lamego (Gabu), ficando a aguardar transporte por via aérea, para Bissau.

E isso foi uma grande novidade para todos nós Como ainda nunca tínhamos visto um soldado do PAIGC, muito menos fardado a rigor, de caqui creme ou castanho claro - já não me lembro ao certo o tom - , com quico e botas de lona como as nossas, só com diferença na sola (que a deles tinha umas ranhuras que formavam umas divisas de sargento).

Toda a gente queria ver e falar com ele, pois ele falava bem português. Era um rapaz novo, de 18 ou 19 anos, e era apontador de lança-granadas-roquete, com a especialidade tirada em Moscovo.

Estava eu e mais alguns camaradas a falar com o preso, quando chega o Capitão Rodrigues (Cmdt da CCS). Oo soldado que estava de guarda ao preso, reclamou para o Capitão, de que já eram 2 horas da tarde e ainda não tinha sido substituído para almoçar. Então o Capitão pediu-me (ordenou) para ficar no lugar dele enquanto ele almoçava.

Mais tarde, ainda durante o meu posto de guarda ao preso, surge o meu Ajudante Jaime Pitta, que estava de Oficial de Dia, e vendo ali tanta gente agarrada às grades da cela para verem e falarem com o preso, resolveu correr com todos dali:

- Vá, todos embora daqui já ! - grita ele, empurrando a malta e indicando a porta de saída...

Mas eu fiquei, dizendo que não saía porque estava de guarda ao preso. Ele, não acreditando (os Cabos Escriturários não faziam guardas), tornou a repetir:

- Vá, todos embora daqui já! - e empurrando-me com uma certa violência, de tal modo que eu ía caindo.

Eu - como sempre, fui um pouco respondão, principalmente, quando me maltratavam, pois nunca admiti que me faltassem ao respeito - respondi:

- Mas o que é isto, já chegámos à Madeira ou quê ?! … (um termo muito usado nesse tempo).

Ele, o Sr. Ajudante Jaime Pitta, o Oficial de Dia, ouvindo isto, como madeirense que era, não gostou da minha resposta, e correu direito a mim com o braço no ar e de punho cerrado, gritando qualquer coisa que não entendi... Percebi é que ele tinha intenções de me agredir, pelo que fugi, pois não era oportuno fazer frente a um homem da idade dele, em fúria e um pouco tocado (bebido)... E principalmente porque ele tinha toda a razão, eu não tinha nada que responder aquilo, saiu-me...

Depois de fugir, fiquei à porta da prisão, pois não podia abandonar o meu posto, e fiquei a aguardar que ele chamasse o guarda ao preso, pois sabia que ele o faria, uma vez a G3 dele estava lá encostada à parede. quando o fez, respondi:
- Sou eu! - e pedi licença para entrar e explicar tudo.

Depois da minha explicação, ele respondeu:
- Espero que seja verdade, vamos aqui esperar por ele... - Assim que ele acaba de dizer isto, chegou o soldado, acabado de almoçar, que confirmou a minha versão.

Passadas 1 ou 2 horas depois, fez tenções de me convidar a ir ao ser quarto, e eu fui, aí vi um homem com uma grande satisfação e com uma lágrima no canto do olho, a mostrar-me fotos da sua esposa de 20 e poucos anos de idade, e sua filha bebé, e com uma das fotos de sua esposa na praia em fato de banho, dizia:
- Olha, ão é muito bonita e geitosa, a minha esposa querida?!<- É, sim - respondi eu. - Pois é - retorquiu ele - desculpa o acontecido há pouco, pois eu tinha bebido uns copos para matar as saudades dela e da minha filhinha... Aí sem mais palavras e muito emocionado, respondi que o culpado tinha sido eu em dizer aquilo, e que não fora por mal, não queria ofender, tinha saído da boca sem querer. Como já disse atrás já simpatizava com ele e, depois disto, aumentou ainda mais a minha consideração para com ele, e conto hoje esta estória em sua homenagem e que Deus o tenha em descanso._ ________ Nota de L.G.: (1) Vd. último post desta série Estórias do Gabu > 7 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1822: Estórias do Gabu (5): Nunca chames indígena a ninguém (Tino Neves)

Guiné 63/74 - P1843: Convívios (16): O 1º encontro da CCS do BART 2917, em Setúbal, 9 de Junho de 2007 (Jorge Cabral)

Setúbal > 9 de Junho de 2007 > 1º Encontro da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) > Fotografia do Grupo, para mais tarde recordar...

Setúbal > 9 de Junho de 2007 > 1º Encontro da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) > Eu, Jorge Cabral, com o meu inseparável cachimbo, o Durães (que foi o grande organizador da coisa) mais o Pires (ex-furriel do Pel Caç Nat 52).

Setúbal > 9 de Junho de 2007 > 1º Encontro da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) > Eu, Jorge Cabral, no meio, com o Vacas Carvalho (à minha direita) e o Pechincha (à minha esquerda)

Setúbal > 9 de Junho de 2007 > 1º Encontro da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) >Eu, Jorge Cabral, rodeado pelas transmissões, o Mendonça e o Pacheco.

Setúbal > 9 de Junho de 2007 > 1º Encontro da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) >Com o Pechincha em grande forma !

Setúbal > 9 de Junho de 2007 > 1º Encontro da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) >Eu e o David [Guimarães]

Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Missirá > Pel Caç Nat 63 > 1970 > Bajudas de Missirá, na visita do Pacheco.

Fotos e legendas: © Jorge Cabral (2007). Direitos reservados

Mensagem do nosso amigo e camarada Jorge Cabral (que, noutra encarnação, comandou um Pel Caç Nat 63, com quartel em Fá Madinga, primeiro, e Missirá, depois; algures, na Guiné, hoje Guiné-Bissau, nos já longínquos anos de 1969/71, onde conheceu as mais desvairadas gentes, incluindo o pessoal do BCAÇ 2852, 1968/70, e do BART 2917, 1970/72)


Amigo,

Sábado dia 9, compareci ao almoço da CCS do BART 2917. Óptima organização do Durães (1). Muitas presenças. Claro, que de alguns já não me lembrava. Em Bambadinca fui sempre um visitante – o apanhado Alferes de Missirá, do qual se contava…

De rendição individual, num Pelotão de Caçadores Nativos (!), estive sempre em Destacamentos. Dos que viveram comigo, só contacto por telefone com o Branquinho e com o Rocha. Os outros não consigo descobrir… Ora em Setúbal, esteve o Pechincha, que passou muitos meses em Missirá.

Calcula, Luís, a minha alegria. É que ele tem entrado nas minhas estórias (2)...

Abraço Grande
Jorge

PS - Anexo Fotos do Encontro e uma que o Ex-Alferes Pacheco me ofereceu, tirada com ele em Missirá, mais três belas bajudas.

_________


Notas de L.G.:

(1) Vd. posts de:

1 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1556: 1º Convívio da CCS do BART 2917: Setúbal, 9 de Junho de 2007 (Benjamim Durães)

10 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1746: Convívios (3): CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72), Setúbal, 9 de Junho de 2007 (Benjamim Durães)

(2) Pechincha, alcunha do soldado José Manuel Silva Ribeiro, actualmente residente em Guimarães. Vd. post de 5 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1816: Estórias cabralianas (23): Areia fina ou as conversas de Missirá (Jorge Cabral)

Guiné 63/74 - P1842: 10 de Junho: Nós também estivemos lá (A. Marques Lopes / Lema Santos)

Lisboa > Belém > Monumento aos Combatentes > 10 de Junho de 2007 > 14º Encontro Nacional de Combatentes > No foto, podem reconhecer-se alguns camaradas nossos, membros da nossa tertúlia, a começar pelo Xico Allen (na ponta direita), o Fernando Chapouto, o Casimiro Vieira da Silva e o A. Marques Lopes... À esquerda, reconheço o Tino Neves e o António Santos. O Xico, o Casimiro e o Marques Lopes vieram do Porto. Tive pena (LG)



Foto: © Manuel Lema Santos (2007). Direitos reservados.



Mensagem do A. Marques Lopes:




Nós também estivemos lá. Estivemos vários da tertúlia. Os que vêem e o Vacas de Carvalho, que não está nela. Os que vi, porque estiveram outros. Esta fotografia é do Lema Santos, que estava a disparar, e não está por isso.



Lá encontrei muitos guineenses e pude falar com eles. Para meu espanto, também encontrei o sheik David Munir, que cumprimentei. Estava, certamente, para encontrar alguns dos seus fiéis da mesquita de Lisboa.



O Hernâni Lopes, que discursou, foi da Reserva Naval e esteve também na Guiné. É um ex-combatente e merece respeito como tal. No entanto, estou de acordo com o Amílcar Mendes (1): era bom, abandonado os discursos de ocasião, que houvesse "um dia só com ex-combatentes e aproveitar a ocasião para tratarmos de coisas úteis aos ex-combatentes". Seria bom. As Associações que se entendam para isso. Parece-me que aí é que há dificuldades.


Abraço


A. Marques Lopes



__________



Nota de L.G.:



(1) Vd. post de 12 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1842: Estive no 10 de Junho... e que bem que me soube olhar aquela multidão de boinas e de cabelos brancos... (A. Mendes, 38ª CCmds)

terça-feira, 12 de junho de 2007

Guiné 63/74 - P1841: Estive no 10 de Junho... e que bem que me soube olhar aquela multidão de boinas e de cabelos brancos... (A. Mendes, 38ª CCmds)


1. Texto do nosso camarada Amílcar Mendes, da 38ª CCmds:


Luís Graça, no dia 10 de Junho, dia que alguém um dia se lembrou de apelidar o dia do ex-combatente, eu fui lá a Belém (1).

Eu fui lá, mas antes de te contar as emoções que senti deixa-me desabafar!

Dia do COMBATENTE! Essa é boa. Digamos que é o dia em que ex-combatentes se encontram para prestar homenagem aos nossos mortos e em que temos de ouvir um discurso apalavrado a bajular-nos para nos manter quietos. Estive lá e ouvi um senhor a botar discurso que não fez o mínimo sentido. Chamam os jornalistas àquele tipo de discurso Encher Chouriços. E ele nem sequer foi combatente e nem lá estava para fazer merda nenhuma por eles. Estava a cumprir calendário.

Porra, façam alguma coisa por aqueles que ainda estão doentes da alma, por aqueles que ainda hoje não se conseguiram encontrar, por aqueles que esperam ansiosamente um dia do ano para poderem estar junto daqueles que falam a mesma linguagem e para quem aquela conversa chata sobre guerra faz todo o sentido e não é de forma nenhuma uma seca!

Estive lá, Luís, e que bem que me soube olhar aquela multidão de boinas... verdes, amarelas, vermelhas, pretas, castanhas ou só aqueles cabelos brancos ao vento. Estive lá, Luis, e sabes que mais? Já ninguem está triste por sucessivos Governos não terem feito nada pelos ex-combatentes porque todos temos consciência que o fardo dos ex-combatentes está a pouco tempo de acabar. Assim sem mais nem menos. Sabes Luís, que ao falar com muitos deles já ninguém espera nada de nada do governo, estão resignados.

Fiquei surpreso com a quantidade de associações que representam os ex-combatentes. Assim, tão dispersos por várias, não temos força em nenhuma, mas não será isso que alguém quer?
Mas foi um dia lindo. Apenas faço uma pergunta a uma das muitas associações que esteve presente:
-Será possível termos o dia do ex-combatente só com ex-combatentes, sem discurssos de ocasião, e aproveitar a ocasião para tratarmos de coisas úteis aos ex-combatentes? Digamos, um dia mais [para os] ex-combatentes.

Gostaria de ouvir a opinião dos camaradas do blogue. Um abraço a todos.

A. Mendes,
ex-1ºcabo da 38ª Companhia de COMANDOS
Guiné, 1972/74

PS - Amigo Luis Graça, assim que eu puder vou-te fazer chegar as mãos o CD dos COMANDOS, que é um documento fantástico (2). Um abraço. A. Mendes.

__________

Nota de L.G.:

(1) Vd. programa do 14º Encontro Nacionald e Combatentes > Vd. sítio da Comissão Executiva do Encontro Nacional de Combatentes. O discurso este ano foi feito pelo Professor Doutor Hernâni Lopes, antigo ministro das finanças, e que foi Oficial da Reserva Naval, pertencendo nessa condição à Associação dos Oficiais da Reserva Naval (AORN).

(2) Há dias eu tinha-lhe escrito: "A propósito, vi ontem na televisão um reportagem sobre o lançamento de um DVD com a história dos comandos em Portugal (3). Entre outros, vi o Folques, já aqui falado diversas vezes. Quando tiveres um tempinho livre, peço-te para nos falares desse DVD cujo conteúdo eu ainda não conheço".

Vd. post de 9 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1827: Convívios (14): 38ª Companhia de Comandos, Pínzio, Vilar Formoso, 9 de Junho de 2007 (A. Mendes)

(3) Comandos - Um Contributo para a História - 1962/2006. [DVD]

É um documentário de cerca de 100 minutos, da autoria do jornalista Carlos Santos, com imagens dos arquivos do Exército, RTP e SIC e com depoimentos de diversos Comandos. Acabou de ser lançado em Lisboa, no passado dia 8 do corrente, no auditório do Instituto de Defesa Nacional.

A história dos Comandos remonta a 1962, ano em que nasceram em Angola (Zemba e Quibala). Estiveram depois sediados em diversos locais: Luanda, Namaacha, Montepuez, Brá (Bissau), Lamego, Amadora, Carregueira e, mais recentemente, Mafra.

Segundo Carlos Santos, trata-se de "um documento que, pelas imagens e pelos depoimentos recolhidos, fala dos Comandos e da sua História: de como se formam e como agem; do caminho percorrido desde a sua fundação até aos dias de hoje - de África ao 25 de Novembro, de Timor-Leste ao Afeganistão. E dos seus Heróis".

Guiné 63/74 - P1840: A trágica história dos sapadores Alho e Fernandes da CCS do BCAÇ 3832, Mansoa, 1971/73 (César Dias / Germano Santos)

1. Mensagem do César Dias, com data de 4 de Junho corrente, enviada ao novo membro da nossa tertúlia Germano Santos:

Camarada Germano Santos:

Sou o César Dias, também como tu um tertuliano da grande caserna, sempre com o Luís Graça de plantão.

Santos, atrevo-me a enviar-te este e-mail por termos em comum o facto de termos feito a comissão em Mansoa.

Fui um dos Furriéis Milicianos Sapadores do BCAÇ 2885 que , como sabes, foi rendido pelo teu BCAÇ 3832.

A parte final da minha comissão foi passada em Mansabá, onde o vosso pelotão de sapadores nos rendeu. Um dos furriéis era do meu concelho (Torres Novas), o Furriel Alho.

Ainda estávamos no Cumeré à espera de embarque e tivemos a notícia que tinham falecido, ele e outro Furriel, que penso eu seria o Fernandes.

Será que tens mais pormenores sobre esse triste episódio?

Agradeço-te, caso possas adiantar alguma coisa sobre isto. Por agora dou-te as boas vindas a esta grande caserna, verás que te sentirás bem em partilhar as tuas memórias connosco.

Um abraço
César Dias
Santiago do Cacém

2. Resposta do Germano Santos (2):


Camarada César Dias,

Obrigado pelo teu mail. Hoje mesmo recebi também um mail do nosso camarada Luís Graça. Fico contente por participar e estar integrado na tertúlia. Já estou a divulgar o blogue por vários camaradas do meu Batalhão.

O que sei sobre o Alho e o Fernandes é que pertenciam à CCS do Batalhão como sapadores e na altura estavam a servir uma das Companhias do mesmo, a CCAÇ 3304.

Pelo que me disseram, eles foram montar umas minas e estavam a ser observados pelos elementos do PAIGC. Quando retiraram, os elementos do PAIGC levantaram as minas e colocaram-nas uns metros adiante. Passados dias, os nossos camaradas foram observar o local e acabaram por pisar as próprias minas que tinham colocado, mas que não estavam onde as tinham posto.

Esta é a história que me foi contada, mas que posso tentar confirmar junto do Alferes Amorim, que era o responsável pelos sapadores.

Como és da zona de Torres Novas, gostava de te perguntar se conheces um fulano chamado Rito Rodrigues, que mora em Riachos e trabalha em Torres Novas, num Banco (salvo erro o antigo Banco Nacional Ultramarino). Ele era o Alferes responsável pelas transmissões do BCAÇ 3832.

Por agora, fico-me por aqui, mas prometo continuar a dar notícias.

Um grande abraço.
Germano Santos
__________

Notas de L.G.:

(1) Vd. posts de:

30 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1472: Sobrevivente do BCAÇ 2885 (Mansoa e Mansabá) (César Dias)

1 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1557: No regresso éramos menos 32 (César Dias, CCS do BCAÇ 2885, Mansoa, 1969/71)

3 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1643: A morte do 1º cabo José da Cruz Mamede, do Pel Caç Nat 58 (3): 10 mortos em emboscada com luta corpo a corpo (César Dias)

4 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1813: Os heróis desconhecidos de Cussanja, os balantas das boinas amarelas (César Dias)

(2) Vd. post de 11 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1835: Tabanca Grande (10): Germano Santos, ex-1º Cabo Op Cripto, CCAÇ 3305 / BCAÇ 3832, Mansoa, 1971/73

Guiné 63/74 - P1839: 10 de Junho de 2007: Manifestação da Associação dos Combatentes Portugueses na Guiné-Bissau (A. Marques Lopes)

Guiné-Bissau > Junho, o mês das mangas > "A caça às mangas : Sabem a mel, as mangas de Junho. Enganam a fome e divertem os miúdos, que se entretêm a derrubá-las da árvore com tiros certeiros. No tempo das mangas há pedrada que ferve! E de quando em vez um pára-brisas partido, dum veículo estacionado debaixo de uma mangueira. No tempo das mangas todos enchem a barriga" (Fonte: Africanidades, blogue do Jorge Rosmaninho > 30 de Maio de 2007)

Foto: Africanidades (2007) (com a devida vénia...).


Notícia da Lusa, divulgada pelo Diário Digital (Secção: Sociedade), e que chega ao nosso blogue por mão do A. Marques Lopes, o mais bem informado, de todos nós, sobre a actualidade política, social e económica da Guiné-Bissau.


FAP/Guiné: Antigos combatentes reivindicam pensões e reformas

Diário Digital / Lusa > 10-06-2007


Mais de 50 antigos combatentes guineenses das Forças Armadas Portuguesas (FAP) manifestaram-se este domingo frente à Embaixada de Portugal em Bissau para reivindicar o pagamento de pensões e reformas (1).

«Estamos aqui a reivindicar os nossos direitos que são reformas, pensões de sangue e invalidez» para as pessoas que, há 34 anos, combateram do lado dos portugueses, afirmou o presidente da Associação dos Combatentes Portugueses na Guiné-Bissau, Marques Vieira.

«França, Inglaterra e Alemanha pagaram os direitos aos seus antigos combatentes, porque razão Portugal não paga aos seus?», questionou o responsável, adiantando que também pretendem saber se vão «ser pagos na Guiné-Bissau ou se vai tudo para Portugal».

Lembrando que há antigos combatentes doentes sem assistência médica, o porta-voz da associação, Malam Mané, frisou que, quando os portugueses se foram embora daquele território, os guineenses foram perseguidos e alguns fuzilados.

Nesse sentido, a Associação dos Combatentes Portugueses da Guiné-Bissau apela ao Estado português para assumir as suas responsabilidades, após já se terem manifestado no passado dia 25 de Abril, com as mesmas exigências.

___________

Nota de L.G.:

(1) Sobre o problema dos antigos combatentes africanos e suas (justas) reivindicações, vd. posts de:

27 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P998: Antigos combatentes: sem pernas, sem braços mas com memória (Jorge Neto)

7 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1156: Dar voz (e fazer justiça) aos antigos combatentes africanos (Jorge Rosmaninho)

Guiné 63/74 - P1838: Camaradas que já nos deixaram (3): O Ex-Alferes Médico Martins Faria, da CCAÇ 2701, Saltinho, 1970/71 (Paulo Santiago)

Guiné > Zona Leste > Sector L5 (Galomaro) > Saltinho > 1971 > Da esquerda para a direita: tripulação do heli, Alf Mota (CCAÇ 2701), Alf Santiago (Pel Caç Nat 53), General Spínola, Cap Clemente (Cmdt da CCAÇ 2701), Cap Tomás (ajudante de campo do Spínola), sendo o último da direita o Alf Médico Marins Faria (do BCAÇ 3872).

Foto: © Paulo Santiago (2006). Direitos reservados.

Mensagem do Paulo Santiago, enviada hoje por volta das 10h:

Luís e Carlos:

Há poucos minutos, recebi um telefonema do Carlos Santos [ex-Fur Mil da CCAÇ 2701, Saltinmho, 1970/72], que me deixou chocado e entristecido. Morreu, na passada 4ªfeira, o ex-Alf Mil Médico Martins Faria, natural de e residente em Guimarães (1).

Conheci o Faria, quando cheguei ao Saltinho em Outubro de 1970. A CCAÇ 2701 era uma das poucas CCAÇ que, na altura tinha Médico, sendo também a CART [2716] do Xitole ( onde estava o Dr. Nunes de Matos) outra das privilegiadas.

Quando eu estava em Bambadinca, o Faria foi transferido para uma sede de Batalhão, do qual me falha completamente o nome, neste momento.

O ex-Alf Mil Faria era um excelente Médico e um grande camarada, grande conversador e grande companheiro para jogar King. Quando o uísque esgotava no bar, era ao stock do Faria que recorríamos (2).

Nestes últimos anos, costumávmos marcar um encontro para um almoço, eu, o ex-Fur Mil Carlos Santos, os ex-Alf Mil Mota e Julião, o Clemente [ex-comandante da CCAÇ 2701], o ex-Fur Mil Belarmino e, enquanto vivo, o 1º Sargento Picado.

Em 12 de Maio houve um destes almoços, não fui, estava num torneio [de râguebi] em França e soube, através do Santos, que o Faria também não estaria presente, devido a uma operação que fizera à cabeça, não sendo portanto já muito boa a sua saúde.

Isto é tudo tão rápido. Hoje, a filha do Faria, também Médica, telefonou ao Santos, dando-lhe a má notícia e dizendo que o pai se lembrou de nós nas últimas horas de vida.

Mando esta mensagem que, além de evocar um camarada e amigo, poderá encontrar algum tertuliano que tenha passado pelas mãos do Médico Martins Faria. Descanse em Paz.

Paulo Santiago

Ex-alf mil,
Cmdt do Pel Caç Nat 53
(Saltinho , 1970/72).
__________

Nota de L.G.

(1) Julgo tratar-se do Dr. José Alberto Martins Faria, médico especialista em obstetrícia/ginecologia, sócio da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Ginecologia, com residência na Rua Alexandre Herculano, 200, 6º Esq., 4800-026 Guimarães. Tratando-se, de facto, da mesma pessoa, dava consultas de ginecologia/obstetrícia na Casa de Saúde de Guimarães.

(2) Vd. post de 13 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1424: Memórias de um comandante de pelotão de caçadores nativos (Paulo Santiago) (6): amigos do peito da CCAÇ 2701 (Saltinho, 1970/72)

(...) "Não posso esquecer o Médico, Martins Faria, de Guimarães, excelente clínico e excelente pessoa.

"Havia no Saltinho uma regra, não escrita, mas era cumprida. Quando vinham as colunas, vinham várias caixas de uísque, por vezes havia desvios, e penso que em muitas companhias era costume fazer uma distribuição daquelas marcas mais conceituadas, ficando para beber as mais vulgares. Ali não havia distribuição, primeiro bebia-se, quando chegasse nova coluna, caso ainda sobrasse alguma das tais garrafas, vendia-se, prioritariamente, a quem estivesse para vir de férias, fosse oficial, sargento ou soldado" (...).

Guiné 63/74 - P1837: Pensando na Gilda, no Picão, no Zé da Desordem... O nosso grito no 10 de Junho (Torcato Mendonça / Luís Graça)

Portugal > Lourinhã > 10 de Junho de 2007 > Este jovem não morreu na Guiné, em Angola ou em Moçambique, não morrreu na guerra colonial... Não morreu, crivado de balas, em Bagdade ou no Rio de Janeiro... Morreu - ou melhor, não regressou do seu sono profundo - nas traseiras da minha casa de fim de semana, no pátio da Misericórdia da Lourinhã... Ironicamente no dia 10 de Junho de 2007, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades...

Encontrei-o, de manhã, a escassos metros do meu carro, quando ia regressar a Lisboa e ainda pensava passar pelo Monumento aos Mortos do Ultramar, junto ao Forte do Bom Sucesso, em Belém, para me encontrar com alguns dos habitués da cerimónia do 10 de Junho, e que são membros da nossa tertúlia... Desta vez não tinha nada combinado com ninguém, mas de repente perdi a vontade de lá ir... Que me desculpem a franqueza os camaradas e amigos da Guiné que possivelmente também me procuraram...

Não o conhecia, mas era meu conterrâneo, natural da Lourinhã, ao que parece... Dizem que morreu de overdose, um palavrão ou um eufemismo que usamos para esconder a nossa incapacidade, como comunidade, como sociedade, como país, como Nação, como Estado, em criar futuro, esperança, solidariedade, suporte social, sentido de vida... para muitos dos nossos jovens que hoje já não lutam contra o pesadelo da guerra colonial, mas têm que lidar com outros demónios, igualmente predadores e assassinos...

Levava a máquina a tiracolo. Não foi por morbidez ou voyeurismo que tirei a foto, mas sim por que uma foto de alguém que morre, tão jovem, de noite, abandonado na rua de uma pacatíssima vila do oeste estremenho como a da minha terra, deve interpelar-nos, deve incomodar-nos, deve inclusive tirar-nos o sono, deve mexer com as nossas consciências, com os nossos sentidos, com a nossa razão, com o nosso coração...

O absurdo da morte - seja aqui, hoje, na Lourinhã ou no Darfur, como ontem na Guiné, no Quirafo ou na Ponta do Inglês - continua, no mínimo, a indignar-nos e a obrigar-nos a escrever... Why ? Porque se morre hoje, tão jovem, de morte violenta, nas nossas ruas, nas esquinas da noite, nas nossas estradas, nos nossos estaleiros de construção, nas nossas fábricas... ? Como ontem nas picadas, nas bolanhas e nos aquartelamentos da Guiné ? Por overdose, por acidente, por suicídio, por homicídio ? Com a nossa cumplicidade, a nossa burocracia, o nosso cinismo, a nossa indiferença, o nosso egoísmo...

Ironicamente, neste quadro tétrico em que o elemento central da composição é um corpo já com sinais de rigidez cadavérica, as garrafas, uma de álcool e outra de água mineral, parecem ser as únicas testemunhas, mudas, de pé, da tragédia que acabou de se consumar durante a noite (ao que presumo)...

Ironicamente ainda, o rótulo da garrafa é de um uísque novo, o VAT 69, talvez a mais popular marca de uísque do nosso tempo, na Guiné (1)... Na época, a nossa droga era o álcool e o tabaco... Ainda não conhecíamos as outras drogas (ditas pesadas, ilegais...) que hoje matam os nossos filhos e irmãos... Nem sequer a erva, a marijuana, tinha chegado à Guiné do nosso tempo...

Enfim, deixem-me acrescentar esta reflexão - algo melancólica e amarga, horas depois do dia dos nossos mortos e dos nossos heróis - ao Grito (sic) que, do Fundão, nos lança o Torcato, a propósito de casos aqui relatados, ora dramáticos ora trágicos, como o da Gilda, do Picão ou do Zé da Desordem...

Citando o Jorge Cabral e o poema que ele dedicou ao Zé da Desordem:

Que te matou, Irmão?
Uma mina? Um tiro? Uma granada?
Ou foi a Solidão,
Que transformou a vida em emboscada?


Coube-nos, historicamente, o papel (necessário mas repulsivo) de coveiros do Império... Nós fomos a geração das hienas e dos jagudis... Outros foram garbosamente, gloriosamente, os leões e os leopardos... Liquidámos o Império (colonial) há pouco mais de 30 anos, regressámos a casa (vencidos ? vencedores ? nem vencidos nem vencedores ?)... Dizem que também fomos parteiros... De um novo regime, de uma sociedade que se queria nova, de novos países... De qualquer modo, há ainda uma ou mais gerações (a nossa e a a dos nossos filhos) a pagar a pesada factura social e humana desse parto doloroso que fechou um ciclo de 500 anos na história do nosso país e que deu origem a novos países lusófonos...

Cá e lá, em Portugal, na Guiné, em Angola, em Moçambique, em Timor, a vida continua entretanto a pregar-nos partidas... É claro que o drama individual não conta para os historiadores... Dos fracos não reza a História, dizem-nos os leões e os leopardos antes de acabarem nas garras e nos dentes das hienas e dos jagudis... É bom, não esquecê-lo, sobretudo nos tempos de arrogância e de mediatismo em que vivemos, e numa sociedade que apenas glorifica "aqueles que da lei da morte se vão libertando" (citando, mal, o nosso grande Camões).

Obrigado, Torcato, foste tu que me deste o mote, o (pre)texto... e definitivamente deixa de pensar e escrever que nos podes chatear com as tuas sempre oportuníssimas notas de comentário aos posts que mandamos para a blogosfera... (LG)

Foto: © Luís Graça (2007). Direitos reservados.


Mensagem do Torcato Mendonça:

Luís Graça:

1. Vi agora o post do desabafo sobre a Gilda (2). Dias depois, desse meu desabafo, apareceu a caso do Picão (3) ; muito antes tinha aparecido o Zé da Desordem (4). A este, do Jorge Cabral, respondi.

Agora ao do Picão, escrito pelo Amaral Bernardo, ficou a revolta cá dentro… Não queria chatear... só que hoje, 10 de Junho, dizem ser o dia das Forças Armadas, dos Combatentes, dos que, com glória, da vida se libertaram, dizia um sujeito qualquer!

Não gosto dos dias evocativos disto ou daquilo… Tolero, aceito, mas todos os dias são dias de tudo o que querem evocar ou comemorar… Mais ainda, no que aos ex-Combatente diz respeito. Em redundância – respeito, merecem todos os homens e mulheres, que para lá foram empurrados, em juventude perdida, em posterior sofrimento até hoje e, aos poucos, esses sim, não em glória (?) mas em sofrimento, desta vida vão desaparecendo.

Acho que devemos fazer algo. Há tanta gente por aí…e outros que por lá ficaram.

2. Os putos são da Tabanca do Jorge Cabral – Fá Mandinga [e não de Mansambo] (5). Um deles tem um pé deformado, creio que era elefantíase. Seria? Escrevi algo sobre isso. Lá, em Bambadinca, falei com um médico, mas o pai era contra mesinho de branco e não só.

Termino, talvez seja necessário dar um GRITO, a dizer basta e queremos, exigimos, além de respeito, que estes homens sejam tratados com dignidade. Mais não digo, sobe a revolta e vocês não merecem ser chateados com tanto palavreado.

Um abraço,

PS - PARABÉNS PELA FOTO "UM HOMEM E A SUA CRUZ"... ESPECTACULAR! (3)
___________

Notas de L.G.:

(1) Vd. post de 23 de Abril de 2004 > Guiné 69/71 – I: Saudosa(s) madrinha(s) de guerra (Luís Graça)

(...) "Guiné, 24 de Dezembro de 1969. Exma menina e saudosa madrinha: (...) Lá na metrópole há gente que pensa que isto é bonito. Que a África é bonita. Eu digo-lhe que isto é bonito mas é para os bichos. São matas e bolanhas que metem medo, cobertas de capim alto, e onde se escondem esses turras que nos querem acabar com a vida. E mais triste ainda quando se aproxima o dia e a hora em que era pressuposto estarmos todos em família, juntos à mesa na noite da Consoada. Vai ser a primeira noite de Natal que aqui passo. Com a canhota numa mão e uma garrafa de Vat 69 na outra" (...) .

[Vat 69:] Marca de uísque escocês, muito popular na época entre os militares (Havia uma generosa distribuição de bebidas alcoólicas nas frentes de guerra, com destaque para o uísque, 'from Scotland for the exclusive use of the Portuguese Armed Forces').

Na época o salário de um soldado-atirador (cerca de 1500 a 1800 escudos, parte dos quais depositado na metrópole) dava para comprar mais de uma garrafa de uísque (novo) no serviço de aprivisionamento militar (cerca de 40 pesos ou escudos por unidade). No entanto, a bebida mais popular entre os soldados era cerveja. Uma garrafa de cerveja de 0,6 litros chamava-se 'bazuca'.


(2) Vd. post de 6 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1819: De Catió a Lisboa, de menina a Mulher Grande ou uma história triste com final feliz (Gilda Pinho Brandão / Luís Graça)


(3) Vd. post de 8 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1823: Camaradas que já nos deixaram (2): O Picão, da CCS do BCAÇ 2930 (Catió, 1970/72), que morreu há dias na miséria (Amaral Bernardo)

(4) Vd. post de 3 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1398: Poema de Natal: Só agora, camarada, te mataram (Jorge Cabral)


(...) "Correia da Manhã > S/d [Dezembro de 2006] > A recorte de jornal dando a notícia de que um ex-combatente na Guiné, de 60 anos, foi encontrado morto na barraca que lhe servia de casa, em Ponte da Barca, Nazaré (...).

"Segundo informações da GNR, não havia suspeita de crime e o cadáver estava já em adiantado estado de decomposição. O ex-combatente, que era conhecido na vila piscatória como o Zé da Desordem , era divorciado e tinha dois filhos já adultos... Ultimamente afastara-se da família, vivendo sozinho numa barraca, sem quaisquer condições de dignidade. Diz ainda a notícia que trabalhava esporadicamente na construção civil e sofria de diversos problemas de saúde, tendo já estado hospitalizado" (...).

(5) Vd. post de 10 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1829: Tabanca Grande (9): À Gilda e a todas as vítimas de guerras, discriminação, racismo... (Torcato Mendonça)