quarta-feira, 26 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24252: Palavras fora da boca... (2): "Prós insultos não há contemplações nem indultos"... e também: "Quem não tem poilão, acolhe-se à sombra do chaparro"... Proverbiário da Tabanca Grande, 5ª edição revista e aumentada:




Tabanca de Candoz > 9 de abril de 2023 > Um dos nossos sobreiros: temos uma meia dúzia nas extremas da quinta, não dão cortiça de qualidade, mas dão bolotas e sombra, abrigam a passarada, e crescem desalmadamente... É a nossa árvore sagrada, como o poilão o é na Guiné-Bissau... E a propósito diz o nosso proverbiário,  agora em 5ª edição (revista e aumentada): "Quem não tem poilão, acolhe-se à sombra do chaparro"...

Foto (e legenda): © Luís Graça (2023). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. O meu pai, meu velho, meu camarada, Luís Henriques (1920-2012), gostava muito de falar em verso, de fazer rimas, quadras, versos de pé quebrado, citar provérbios populares, contar histórias e anedotas, evocar os seus tempos de expedicionário em Cabo Verde durante a II Guerra Mundial ou relembrar os tempos de jogador de futebol, e de treinador de camadas juvenis... Muitas vezes fazia-nos rir, sorrir, pensar... Tenho pena que muita da sua "sabedoria popular" ou "filosofia espontânea"  tenha ido para a cova com ele... Algumas coisas fomos, eu e os seus netos,  registando, filmando, tomando boa nota... E também o "obriguei" a escrever os seus cadernos diários (deixou-nos três, com  centenas de páginas), quando teve, nos últimos anos, de ir para um lar com a minha mãe...

Mas ele era um repentista, um espontâneo, um improvisador, incapaz de repetir, com a mesma precisão e graça, o que acabava de lhe sair da boca... Tudo dependia do contexto, das situações, dos interlocutores, e da disposição e da inspiração de momento... E, claro, fiava-se na sua memória de elefante... Tinha um r
eportório para dar e vender... Nunca o vi escrever um dito, uma história, um verso... Era um homem de palavra e de palavras, que nunca usou como arma de arremesso contra ninguém. Talvez por essa razão não tinha inimigos conhecidos:

Tudo isto vem a propósito de uma quadra que ele gostava muito de citar apropriada para prevenir situações de conflito:

Palavras fora da boca,
São pedras fora da mão,
Tu mede bem as palavras,
Tira-as do teu coração.

Era uma variante da conhecida quadra popular:

Palavras fora da boca,
São pedra fora da mão,
Tu tens me dito palavras
De cortar-me o coração.

2. Também no blogue, em postes e comentários, mandamos às vezes umas "bocas", ora mais felizes ou bem humoradas, ora mais provocatórias e inapropriadas (neste caso, "bocarras"), entre amigos e camaradas. No blogue e sobretudo no facebook... A (in)cultura geral das redes sociais criou, em dada altura, um clima de intolerância e de impunidade propício à violência verbal, ao insulto... Ora, cá entre nós, gostamos de lembrar: "P'rós insultos, não há contemplações nem indultos". 

Palavras fora da boca, falar da boca para fora quer dizer "falar sem pensar", "falar sem certeza do que se diz", "dizer uma coisa sem seriedade"!... "Palavras da boca para fora" são, de acordo com o Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, "locuções e frases inteiras que dizemos 'da boca para fora', sem esforço mental aparente (mas com sentido, ainda que inconsciente), [e que] recheiam o nosso discurso, consti[tuindo] uma classe lexical, a das expressões idiomáticas, fraseologias ou sintagmas fixos." In: Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/aberturas/falar-da-boca-para-fora/1979 [consultado em 25-04-2023.]
 
Temos vindo a reunir algumas dessas "frases feitas" para proveito e governo da Tabanca Grande, o mesmo é dizer, dos nossos editores, colaboradores permanentes, autores, leitores, comentadores... Está na altura de fazer uma 5ª edição, revista e aumentada, com algumas dessas expressões idiomáticas ou sintagmas fixos que usamos, uma vez por outra, umas, ou mais frequentemente, outras... Os "insultos", naturalmente, ficam de fora da coleção, embora pedagógico recolhê-los....

Chamámos-lhe, em tempos, "o nosso proverbiário", fazendo já parte do nosso "livro de estilo" (**). Quarenta e nove anos depois do 25 de Abril de 1974, dezanove depois da criação do nosso blogue, queremos continuar a ser a Tabanca Grande, "a mãe de todas as tabancas", mas também um espaço de partilha de memórias (e de afetos) tolerância, verdade, liberdade e responsabilidade,  um espaço, na Net, "onde todos cabemos com tudo o que nos une e até com aquilo que nos separa". Referimo-nos, naturalmente, aos "amigos e camaradas da Guiné", e nomeadamente aos "antigos combatentes do CTIG"...


O NOSSO PROVERBIÁRIO

A blogar é a que a gente... se entende.

A 'roupa suja' lava-se na caserna, não na parada.

Água de Lisboa, "manga di sabi".

Alfero Cabral cá mori!

Ainda pior do que o inferno da guerra, 
é o inverno do esquecimento dos combatentes.

Amigo do seu amigo, camarada do seu camarada.

Amigo traz amigo e amigo fica.

Ao luar, entre nevões, até as renas parecem pavões! (Zé Belo dixit)

Aponta, Bruno!

Aqui o povo é quem mais... "ordenha".

A(r)didos e... mal pagos!

As nossas queridas enfermeiras paraquedistas: 
os anjos que desciam do céu.

As vacas roubadas que andam de mão em mão, acabam sempre comidas em boa ocasião (Salgueiro Maia dixit)

Até aos cem, ainda se aguenta, depois dos cem, só com água benta.

Até aos cem é sempre em frente!... E depois dos cem, 
é só para quem for resiliente...

Até aos entas, bem eu passo, dos entas em diante, 
ai a minha perna, ai o meu braço!...

Até à... próstata!

Bazuca: o que fazia mal ao fígado, fazia bem à alma.

Beber a água do Geba.

Boa continuação da viagem pela picada da vida!... 
Cuidado com as minas e armadilhas!

Bons tempos, Cabral, consigo ia ficando maluco! (Barbosa Henriques, capitão "comando" dixit)... E eu ia ficando comando!... (Alfero Cabral retorquiu)


Brincando por fora, sangrando por dentro.

Cabral só há um, o de Missirá e mais nenhum.

Cabrito pé de rocha, "manga di sabi".

Camarada e amigo... é camarigo!

Camarada não tem que ser amigo: é o que dorme contigo, 
no mesmo buraco, na mesma cama, no mesmo abrigo.

Camarada, mais do que um dever, é uma honra que te é devida, 
ir a Monte Real pelo menos uma vez na vida.

Camarada, que a terra da tua Pátria te seja leve!

Camarada, salvo seja!

Com a sua licença, meu general, a merda... que a gente come!

Combatente um vez, combatente para sempre!

Como camaradas que fomos (e continuamos a ser), tratamo-nos por tu!


Dão-se lições de artilharia para infantes.

Desaparecidos: aqueles que nem no caixão regressaram.

Desarmados, jubilados, reformados, aposentados mas não... arrumados.

Dezanove anos a blogar... são dez comissões na Guiné!

E quem não bebeu a água do Geba, nunca poderá entender 
a vida, o conteúdo e o continente das nossas estórias.

E também lá vamos facebook...ando e andando.

E viva a Pátria! E viva o nosso General!... Puuum!!! (Gasparinho dixit)

É proibido fazer juízos de valor sobre o comportamento de um camarada (do ponto de vista operacional, disciplinar, ético, moral, social).

Encontro Nacional da Tabanca Grande: orar, comer.. 
e amar em Monte Real!

Entra e senta-te à sombra do nosso poilão.

Estás porreiro ou vais p'ró carreiro!?...

Estorninhos e pardais, aqui somos todos iguais.

Exorcizar os nossos fantasmas.

F... e mal pagos.

For the Portuguese Armed Forces from Scotland with love... 
[Da Escócia com amor, para as Forças Armadas Portuguesas.]

Guerra do Ultramar, guerra de África, guerra colonial
(como se queira, ao gosto do freguês).

Guerra ganha, guerra perdida? 
Camarada, não percas tempo com a discussão do sexo dos anjos...

Guiné, da floresta verde e do chão vermelho.

Guiné, terra verde-rubra.

Guiné? ... Não era pior nem melhor, era diferente.

Guiné?... Não, nunca ouvi falar!


Há comentadores e comentadores: alguns são como o peixe e o hóspede, 
ao fim de três dias fedem...

Havia os desertores, os refratários, os faltosos... e nós.

Humor com humor se (a)paga.


In Memoriam: para que não fiques, pobre camarada, 
na vala comum do esquecimento.

Já estás com o bioxene, já estás com os copos, já estás! (Valdemar dixit)

Já estou mal da cachimónia, / E eu aqui no treco-lareco, / A ouvir o próprio eco, / Na Tabanca da Lapónia.

Lá vamos blogando, recordando, (sor)rindo, 
e às vezes cantando, gemendo e chorando!

Lá vamos contando (e cantando) os quilómetros pela picada da vida fora!

Lembras-te, combatente, que és pó e em que em pó hás de tornar-te.

Lembra-te, ó português, a tua bandeira é a das cinco quinas, 
a dos cinco pagodes é na loja... do chinês!

Lugares ao sol, não temos... Só à sombra, do nosso poilão!

Luso-lapão só há um, o Zé Belo, e mais nenhum.


Mais morto de alma do que vivo de corpo.

Mais vale andar neste mundo em muletas do que no outro em carretas.

Mais vale um camarada vivo do que um herói... morto!

Melhor que as bajudas, era a 'água de Lisboa' que nos fazia esquecer as bajudas.

Meu pai, meu velho, meu camarada.

Miguel & Giselda, o casal mais 'strelado' do mundo.

Muita saúde e longa vida, porque tu, camarada, mereces tudo.


Não deixes que o teu espólio de memórias vá parar à Feira da Ladra ou ao OLX.

Não deixes que sejam os outros a contar a tua história por ti.

Não é o Panteão Nacional, é melhor, é... a Tabanca Grande.

Não fazemos a História com H grande, mas a História não se fará 
sem a nossa... pequena história.

Não há tabanca sem poilão.

Nem mais um soldado para as colónias! 

Nem medalhas ao peito nem cicatrizes nas costas.

Ninguém leva a mal: em cima o camarada, em baixo o general.

No céu... não há disto: comes & bebes!


O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande!

O nosso maior inimigo: o Alzheimer (de que Deus nos livre!)...

Ó Pimbas, não tenhas medo!

O seu a seu dono: respeita os direitos de autor.

Ó Sitafá, deixa lá, cabeças e rabos de sardinha não são bem a mesma coisa (Alfero Cabral dixit).

O último a morrer, que feche a tampa... do caixão.

Olhe que não, sr. general, olhe que não!

Os bravos não se medem aos palmos.

Os bu...rakos em que vivemos.

Os camaradas tratam-se por tu.

Os camaradas da Guiné dão a cara, não se escondem por detrás do bagabaga.

Os filhos dos nossos camaradas, nossos filhos são.

Os netos dos nossos camaradas, nossos netos são.

Os nossos queridos 'nharros'...


P
ara que os teus filhos e netos não digam, desprezando o teu sacrifício: "Guiné? Guerra do Ultramar? Guerra Colonial? Não, nunca ouvi falar!"...

Partilhamos memórias e afetos.

Patrício Ribeiro, o "pai dos tugas" em Bissau.

Periquito, salta pró blogue, que a velhice já cá está!

Periquitos até aos 6 meses, maçaricos até a um ano... 
e depois vecês (velhinhos comó c...)

Porra, porra, lá iam lixando o Comandante-Chefe (Spinola dixit, quando o seu heli aterrou, por engano, numa "área libertada")

P'rós insultos, não há contemplações nem indultos.

Quando o último eucalipto deste país arder, despeçam o último bombeiro, por extinção do posto de trabalho.

Que Deus, Alá e os bons irãs te protejam!

Quem não faz 69, não chega... aos 100!

Quem não sabe beber, beba merda!

Quem não tem poilão, acolhe-se à sombra do chaparro.

Quem não tem "turpeça", senta-se no chão... e quem "turpeça" também cai.

R
apa o fundo ao teu baú da memória.

Recorda os sítios por onde passaste, viveste, combateste, amaste,
sofreste, viste morrer e matar, mataste,
e perdeste, eventualmente, um parte do teu corpo e da tua alma...


Saber resolver os nossos diferendos, os nossos conflitos... sem puxar da G3!

Santo António de Bissau, / Bravo, meu bem, / De todos o mais casmurro,/ Quer do preto fazer branco, / Bravo, meu bem, / E do branco fazer burro.

Sempre presentes, aqueles que da lei da morte já se foram libertando.

Siga a Marinha!

Só há três coisas de que aqui não falamos: futebol, política e religião.

Somos uma espécie em vias de extinção.

Soubemos fazer a guerra e a paz.

Spinolândia, sim, Guiné, não.


Tabanca Grande: a mãe de todas as tabancas.

Tabanca Grande: onde todos cabemos com tudo o que nos une 
e até com aquilo que nos separa.

Tabanca Grande: onde não há portas nem janelas 
nem arame farpado   nem cavalos de frisa

Tuga, que Deus te livre da doença do... Alemão.

T/T Niassa, Uíge, Ana Rita, Angra do Heroísmo... Os cruzeiros das nossas vidas.


Um blogue de veteranos, nostálgicos da sua juventude (René Pélissier dixit).

Um povo que sabe rir-se de si próprio, não precisa de ir ao psiquiatra.

Uma geração que soube fazer a guerra e a paz.

Uma guerra... a petróleo! (Tó Zé dixit)

Uma noite nos braços de Vénus, três semanas por conta de Mercúrio.  

Vamos à guerra, que a morte é certa.

Volta, Zé Belo, estás perdoado! (disseram  os "sámi" ao régulo que queria "desertar" da Tabanca da Lapónia.


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Notas do editor:


terça-feira, 25 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24251: Efemérides (388): Revolução dos Cravos (José Câmara, ex-Fur Mil Inf)

1. Mensagem do nosso camarada e amigo José Câmara, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56 (Brá, Bachile e Teixeira Pinto, 1971/73), com data de 24 de Abril de 2023, dando-nos conta da homenagem prestada pelo Estado de Massachusetts a todos os veteranos portugueses imigrados nos Estados Unidos da América, quando se comemora mais um ano da Revolução dos Cravos:

Amigos e companheiros,
No passado dia 20 de Abril de 2023 a sucursal da Nova Inglaterra da Sociedade Prince Henry comemorou a Revolução dos Cravos. O Salão de Festas do Taunton Sports foi o palco escolhido para o efeito.
Para além da Vice-Presidente da Sucursal da Sociedade Prince Henry, foram oradores principais um representante do Senador Estadual Marc Pacheco, do Senado do Estado de Massachusetts, que não pode estar presente, a Representativa Estadual, Sra. Carol Doherty, a Presidente da Câmara Municipal de Taunton, Sra. Shaunna O’Connell e o Sr. Rogério Lopes, Cônsul de Portugal em New Bedford.
O Núcleo da Nova Inglaterra da Liga de Combatentes, a que pertenço com muita honra, foi o Convidado de Honra.

Não fiz perguntas quando fui contactado para comparecer. Como quase sempre acontece, julguei que o Núcleo fora convidado para fazer a Guarda de Honra no evento, daí a minha surpresa quando me apercebi do que estava a acontecer. E mais ainda quando me apercebi das Citações de várias entidades oficiais do Estado de Massachusetts, devidamente recebidas pelo Presidente do Núcleo, Sr. Eduíno Faria, natural da ilha do Faial, 1.° Cabo Enfermeiro da CCAÇ 194/BII17, emigrante na cidade de Taunton, Massachusetts.

Sei e compreendo que isto tem muito pouco a ver com o propósito desta nossa página, mas acredito que que vale a pena divulgar o respeito do Estado de Massachusetts para os seus imigrantes e, neste caso, pelos militares que serviram com honra e dignidade os interesses de Portugal.

Abraço transatlântico.
José Câmara

Foto 1 – Citação do Estado de Massachusetts
Foto 2 – Citação da Casa dos Representantes do Estado de Massachusetts
Foto 3 – Citação da Câmara Municipal de Taunton, Estado de Massachusetts.
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Nota do editor

Último poste da série de 25 DE ABRIL DE 2023 > Guiné 61/74 - P24250: Efemérides (387): "25 de Abril", por Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887, Canquelifá e Bigene, 1966/68

Guiné 61/74 - P24250: Efemérides (387): "25 de Abril", por Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887, Canquelifá e Bigene, 1966/68

25 DE ABRIL

Um cravo vermelho
cristal de vida no céu de chumbo
cada dia um mundo limpo e perfumado
graças a ti flor da minha idade.
Caminho da esperança às portas da cidade
todo o mel e todos os frutos ali à mão.
Graças a ti cravo vermelho que venceste a solidão
veio o tempo ao nosso encontro
e a manhã despertou agitando as árvores.
E a noite se fez de estrelas
que desceram aos cantos do jardim.
Um cravo vermelho e quente
mais que tudo amando a vida
em qualquer língua entendida.
O mundo tinha o sabor de uma maçã
e os olhos inacabados eram cravos vermelhos.
Não havia cárceres nem torturas
apenas o calor de uma fogueira
na praça do entusiasmo
e uma jovem mulher
dormindo um sono de criança
nos telhados da revolução.
O seu rosto era uma nuvem
dourada pelo sol e pela lua
os cabelos trigueiros uma seara
e nos lábios
a canção de Abril que encheu a rua.
Hoje…
Hoje não sei se é dor se alegria
o que sonho
quando abro ao sol as portas de Abril.
Não sei se é dor
tristeza ou alegria
aquilo que sinto neste dia
em que Abril faz tantos anos
de saudade e nostalgia.
Anos de luminoso tremor
corações ao alto
quadros verdes de sonho e raiva
de sol e chuva em celeste azul
luzindo nos olhos de uma gaivota
branca gaivota de penas mansas
voando solitária dentro de mim
à volta de um cravo vermelho
que me ficou dentro do peito.
Abro as janelas a medo
neste areal de céu escuro
contra o mundo
a idade e o cansaço
e não sei se é vida ou amargura
a estreiteza deste espaço.
Sei que um rio de negras águas
cavalga as margens do meu ser
por entre as fendas da secura
ameaçando afogar a democracia
às mãos de nova ditadura.


adão Cruz

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Nota do editor

Último poste da série de 25 DE ABRIL DE 2023 > Guiné 61/74 - P24249: Efemérides (386): Homenagem aos combatentes do concelho da Lourinhã, no dia 25 de Abril de 2023

Guiné 61/74 - P24249: Efemérides (386): Homenagem aos combatentes do concelho da Lourinhã, no dia 25 de Abril de 2023


Foto nº 1

Foto nº 2


Foto nº 3


Foto nº 4


Foto nº 5

Lourinhã > 25 de Abril de 1974 > 10:00> Monumentos aos Combatentes do Ultramar > Homenagem aos combatentes do concelho que passaram pelos três teatros de operações da guerra do ultramar / guerra colonial, dos quais 20 faleceram em combate. Os seus nomes foram evocados pelo nosso camarada e amigo Jaime Bonifácio Marques da Silva (Foto nº 2). Um coroa de flores foi depositada na base do monumento. Usaram da palavra o presidente da AVECO - Associação dos Veteranos Combatentes do Oeste o camarada Castro (fotos nº 3 e 5) e ainda o presidente do município, João Duarte (foto nº 4). Na foto nº 5, à esquerda, o ex-alf mil José Levy Soeiro, que pertencia à CCAÇ 3, em rendição individual, ao tempo da batalha de Guidage (já o convidei a integrar o nosso blogue; natural de Lisboa, vive no concelho da Lourinhã há mais de 20 anos; é amigo do nosso camarada A. Marques Lopes)

Fotos (e legenda): © Luís Graça (2023. Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
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Nota do editor:

Último poste da série> 23 de abril de  2023 > Guiné 61/74 - P24244: Efemérides (385): Convite para participação na homenagem aos antigos combatentes da guerra do ultramar da Freguesia de Paus, Concelho de Resende, vivos e caídos em campanha, dia 29 de Abril de 2023, que contará com uma represenção do nosso Blogue

segunda-feira, 24 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24248: Notas de leitura (1575): Atitudes e comportamentos raciais no Império Colonial Português (1): "Relações Raciais no Império Colonial Português", por Charles Ralph Boxer, Tempo Brasileiro, 1967 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 9 de Setembro de 2020:

Queridos amigos,
Comércio negreiro ou esclavagismo, colonialismo e relações raciais, missionação em sociedades islamizadas ou animistas, são questões fortes e sensíveis no estudo do Império Colonial Português. Não é a primeira vez que aqui se fala do tráfico de escravos e de preconceitos raciais, e como eles evoluíram ao longo dos séculos. Recorde-se agora duas vozes autorizadas, Charles Ralph Boxer e Valentim Alexandre, o primeiro estudou a fundo não só o Império do Oriente como o colonialismo brasileiro e o segundo tem uma investigação caleidoscópica sobre Brasil e África, e no livro aqui escolhido, Velho Brasil, Novas Áfricas, discorre sobre o fim do Império Luso-Brasileiro e o quadro ideológico que foi a questão colonial orientada para África até ao fim do Estado Novo. Espero que a seleção destes documentos vos traga utilidade.

Um abraço do
Mário



Atitudes e comportamentos raciais no Império Colonial Português (1)

Mário Beja Santos

A
bruptamente, e um tanto a propósito da destruição de estátuas de figuras do esclavagismo, vieram umas tantas almas a terreiro exigir que Portugal pedisse perdão pelos nefandos crimes cometidos ao longo de séculos com o negócio negreiro, parecia que estavam a inventar a roda, não tomavam em consideração que Portugal tomou posições firmes quanto ao abolicionismo da escravatura e criou escola de pensamento hostil ao tráfico, e desta paródia de exasperos e de ignorância misturou-se, a propósito e a despropósito, colonialismo e racismo, comportamentos que podem andar a par mas que são fenómenos distintíssimos. Mesmo antes de Gilberto Freyre ter feito a apologia do luso-tropicalismo já um pensamento nacionalista fazia constar que no Império Português havia uma sociedade racialmente integrada, que não era permitido que se erguessem barreiras ao contacto amistoso entre colonizador e colonizado, e evocava-se o exemplo do Brasil.

Em "Relações Raciais no Império Colonial Português", por Charles Ralph Boxer, Tempo Brasileiro, 1967, aquele que terá sido o mais influente historiador estrangeiro do Império Marítimo Português abordava as relações raciais num conjunto de conferências que proferiu em Virgínia. O professor Boxer estendeu o seu olhar a três áreas distintas: o início do Império em África e como se desenrolou a sua presença na costa ocidental africana: em Moçambique e na Índia; e no Brasil e Maranhão. Obviamente nos vamos cingir a considerações gerais e à natureza das relações raciais na costa ocidental africana.

Começa por dizer:
“O velho Império Colonial Português era essencial uma talassocracia, um império marítimo e comercial, com interesses quer nas especiarias do Oriente, nos escravos de África, quer no açúcar, tabaco e ouro do Brasil. Era, no entanto, um império marítimo moldado em forma militar eclesiástica. Por séculos, a palavra oficial mais comum para as possessões ultramarinas portuguesas era As Conquistas. Quando em 1501 o rei D. Manuel I assumiu o título de Senhor da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Índia, Arábia e Pérsia, os Portugueses não tinham ainda conquistado nenhum destes países”.

Era já uma mentalidade que assentava numa associação então obrigatória com o Papado, pensava-se que a Igreja tinha poder para repartir terras e dar títulos. Portugal esteve presente em Marrocos entre 1415 e 1769 e quando abandonou as suas possessões a Fé Cristã ficou praticamente reduzida a zero. Ao contrário, o proselitismo português no Congo e em Angola foi bem-sucedido, a prática religiosa angolana de hoje teve este forte antecedente. O facto de se ter procurado a missionação na Alta Guiné em locais de puro comércio e de uma espúria presença de brancos, associado aos terríveis climas, febres e doenças então sem tratamento, reduziu os resultados desse cristianismo, mesmo se averbarmos práticas religiosas seculares em Cabo Verde e S. Tomé. E vejamos o que o historiador Boxer observa sobre as viagens e o comércio ao longo da costa da Guiné, diz claramente que os escravos, o ouro e o marfim eram as principais fontes de lucro procuradas pelos homens brancos. Entendia-se por Alta Guiné a região situada entre o Rio Senegal e o Cabo das Palmas, aí preponderavam comerciantes ou intermediários do comércio de troca entre africanos europeus, eram relações versáteis e inconstantes, variavam entre uma tribo ou área e outra.

E aconteceu a miscigenação, como ele comenta: “As relações sexuais livres entre negros e brancos fizeram surgir uma população mulata inteiramente portuguesa, nas ilhas de Cabo Verde e nas de S. Tomé e Príncipe, no Golfo da Guiné. As colónias insulares eram desabitadas na época do seu descobrimento e foram colonizadas principalmente por uma mistura de brancos vindos de Portugal, Espanha, Itália e escravos importados de uma larga variedade de tribos do continente. No princípio, a ilha de Santiago, e depois S. Tomé, transformaram-se em depósitos de escravos vindos da Baixa e Alta Guiné que ali eram reunidos e despachados para as plantações e minas da América Espanhola e Brasil. Com o correr dos séculos, o amálgama racial completou-se, predominando o elemento negro na constituição física e o português no aspeto cultural”. O historiador disserta sobre este amálgama racial, revela os graves problemas religiosos dos padres em simonia, a moralidade do clero sempre se mostrou em maré baixa.

No caso do Congo e de Angola, escreve o historiador, a procura de escravos intensificou e perpetuou as guerras intertribais e chegou o momento de situarmos o problema das relações raciais. Cita um autor obrigatório, António de Oliveira Cadornega, autor da "Historia Geral das Guerras Angolanas, século XVII". Os negros e os mulatos, era a sua opinião, deviam estar no fim da escala social, mas eram fundamentais, até porque muitos dos descendentes das relações mistas tornavam-se homens importantes. Um frade capuchinho italiano, Frei Girolano Merolla, escreveu em 1691 a respeito desta raça misturada: “Odeiam os negros mortalmente, até mesmo suas mães que os tiveram, e fazem tudo o que podem para igualar-se aos brancos”. O testemunho vale pelo que vale, Cadornega lembra o angolano Luís Lopes de Sequeira, cuja mãe era uma mulher de cor e que comandou as forças portuguesas que derrotaram e mataram o rei D. António I do Congo na Batalha de Ambuila. E tinham estatuto social os oficiais da milícia mulata “tinham permissão para frequentar as receções oficiais do governador-geral, em pé de igualdade com os brancos”. Havia pois uma atitude bivalente dos portugueses brancos em relação aos seus parentes mulatos.

Falando de Cabo Verde e S. Tomé, observa que o clero negro, mulato e mestiço, era sujeito a contínuas torrentes de críticas. “Os missionários capuchinhos italianos que trabalhavam no Congo e Angola durante os séculos XVII e XVIII eram especialmente severos em suas denúncias do clero secular nativo, ordenados por sucessivos bispos de Luanda, tachando-os de concupiscentes, simoníacos e muito comprometidos com o tráfico de escravos”. Era um comércio vital, como lembrou o Conselho Ultramarino lembrando ao rei D. Pedro II que a preservação do Brasil dependia do contínuo suprimento de escravos de Angola.

E mais adiante, escreve Boxer:
“É evidente que havia outras razões para o fracasso português em desenvolver no Congo e Angola um tipo de sociedade multirracial dominada pelos brancos, como aconteceu no Brasil. As sociedades tribais africanas eram muito mais fortes, mais numerosas e melhor preparadas para resistir à penetração europeia (…). O resultado da concentração de todos os esforços no tráfico de escravos em Angola por mais de dois séculos, foi a formação de uma poderosa classe de brancos comerciantes e donos de escravos, o crescimento de uma classe de negros destribalizada que cooperavam nesse comércio com os brancos, e o surgimento da classe dos mulatos e mestiços, alguns dos quais conseguiram importantes cargos na milícia, no comércio de escravos e na Igreja. Estas três classes estavam limitadas às cidades costeiras, das quais Luanda era a de tamanho mais considerável e vizinha de algumas fortalezas (presídios) no interior, nenhuma das quais estava a mais de 200 milhas da costa. No resto do país, a organização tribal não foi alterada nem foi influenciada pelos portugueses, com exceção dos Dembos e dos Ambaquistas ou comerciantes ambulantes de Ambaca”.

E termina este role de considerações recordando que esta presteza de acasalamento com mulheres de cor não ocasionou a ausência de preconceito racial no homem português. A regra-geral que prevalecia (e prevalece) na sociedade é a de uma consciente superioridade branca.

E vamos concluir esta digressão ouvindo Valentim Alexandre, outro historiador que muito se tem debruçado sobre o Império Português, damos-lhe a palavra para ele comentar o que foi África no imaginário político português e as questões da colonização étnica.

(continua)

Historiador Valentim Alexandre
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Nota do editor

Último poste da série de 21 DE ABRIL DE 2023 > Guiné 61/74 - P24239: Notas de leitura (1574): "Seis Irmãos em África", segunda edição; Porto, 2017; edição de autor, mas os autores são seis: Fernando, Rogério, Dálio, Carlos, Álvaro, Abílio, quem compilou os textos foi o Abílio, trata-se dos manos Magro que percorreram diferentes paragens africanas (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P24247: Facebook...ando (26): Homenagem ao Xico Allen (1950-2022): a filha Inês, em Fátima, no passado sábado, no convívio anual da CCAÇ 3566, "Os Metralhas" (Empada e Catió, 1972-74)


A Inês Allen, filha do saudoso Xico Allen  (1950-2022) com um cartaz com o "boneco" dos "Metralhas", a CCAÇ 3566 (Empada e Catió, 1972/74). Foto: Cortesia da página do Facebook da Inès Allen (2023).





O Francisco Allen, mais conhecido por Xico Allen (1950-2022), e também por Xico de Empada, ex-sold cond auto, da CCAÇ 3566, "Os Metralhas" (Empada e Catió, 1972/74), era um histórico da Tabanca Grande, para onde entrou, em princípios de 2006, pela mão do seu amigo e vizinho Albano Costa. Bancário reformado, vivia em Vila Nova de Gaia.
 

1. Poste do nosso camarada Antero Santos [ex-fur ml at inf MA, CCAÇ 3566 e CCAÇ 18  (Empada e Aldeia Formosa, 1972/74), publicado ontem no Facebook da Tabanca Grande:

No sábado, dia 22, em Fátima, realizou-se mais um convívio da CCAÇ 3566, Os Metralhas de Empada".

Foi o primeiro convívio em que não esteve presente fisicamente o Xico Allen, o organizador de sempre destes convívios embora estivesse presente no espírito de todos os presentes.

Contámos ontem com a presença da filha do Xico Allen, a Inês, que nos deu conta de várias coisas e especialmente do projecto que já está em marcha para atribuir o nome do Xico Allen ao campo de futebol que o clube de futebol de Empada espera conseguir construir de forma a perpetuar a memória deste nosso camarada, o combatente que garantidamente visitou Empada depois do nosso regresso em 24 de Junho de 1974.

PALAVRAS DA INÊS ALLEN:

"Conheço-vos a 'todos' desde criança, mas hoje foi a primeira vez que estive fisicamente presente no vosso encontro anual.

"O Xico descobriu muitos onde ,'Judas perdeu as bota', visitou alguns no hospital e ia pôr flores à campa de tantos outros…

"Sem internet ou GPS comprometeu-se a dedicar horas e kms a encontrar os cerca de 150 Metralhas espalhados por Portugal e além fronteiras!

"Na estrada, por onde passava, fazia questão de telefonar… fosse para almoçar ou tomar um café!

"Hoje foi difícil…representá-lo foi uma grande responsabilidade, mas… a toda a família Metralhas de Empada - Guiné muito obrigada pelo vosso incrível carinho e apoio.

"O orgulho que me fizeram sentir do meu pai… não cabe no peito.

"Muito obrigada também pelas 375 'empadas' angariadas hoje, por amizade e pela compra de livros, para a concretização do  Csampo de Futebol Xico Allen”.


https://www.facebook.com/15492.../posts/10223198459100347/lp


2. Seleção de alguns comentários a este poste do Facebook:

(i) Manuel Galvão

(...) "Pois eu até fui um dos mais próximos companheiros do nosso querido Xico.  Por vezes tivemos diferenças na forma de viver,mas ele foi realmente um marco da companhia 'Os Metralhas'  do após-Guiné, aonde por meios diversos tentou procurar sempre este e aquele e a mim foi num belo
 de verão, em Agosto, no Gerês: eu pelo meu lado e ele com os seus,  ao passarmos uns pelos outros,uns metros após,ele gritou: 'Galvão, Galvão!'  e eu olhei para trás e deparei-me então com o Xico e os seus todos e eu claro logo o reconheci e então foi logo ali uma emoção de encontro uns oito anos após fim do serviço militar.

Depois, e como eu era emigrante,  continuei a minha vida  e fui o perdendo de novo de vista. Num belo ano de primavera,  ele foi a França ( a Paris, penso que em trabalho,  e lá de seguida ele me voltou a procurar de novo via telefone,aonde telefonou a todos Galvões da lista, até encontrar aquele que era eu e, claro, a partir daí ficámos muito ligados e apenas estávamos  desligados por razões da vida de cada um. Vivemos então muitas e belas coisas." (,,,)

(ii) Manuel Rocha

Eu não pertenço aos "Metralhas", mas permitam que, depois de ler o comovente texto anoto a minha admiração pela vossa amizade. Felicidades para vocês.

(...) Muito obrigado!!... É por estas e outras experiências, que sou adepto do lema.... "Que não sejam outros  a contar a nossa história. (...)

(iv) Manuel Mendes-Ponte

Excelente texto, gostei daquela citação, "conheço-os a todos", faz me lembrar o dia em que Spinola fazia o discurso de boas vindas às tropas chegadas da metrópole, aconteceu comigo em Dezembro 72 no Cumeré.

(v) Florinda Sousa

Conheço esta menina, Inês Allen,  desde que nasceu. Conheço o Xico desde 1974, depois do fim da sua comissão na Guiné , por intermédio da que mais tarde foi sua esposa e mãe de seus filhos a minha querida amiga Zélia Neno .

O Xico deixou os genes da aventura, do empreendedorismo e da vontade de conviver na sua querida filha Inês que tão bem tem dado continuidade aos seus desejos.

É com muita emoção que vou seguindo os seus objectivos - o ansiado Campo de Futebol.
Saudações para todos os seus "Amigos da Tropa".~

Na minha única mas emocionante viagem à Guiné, em 2009, foi o Chico o guia e impulsionador. Tive com ele convivências inesquecíveis. Louvo a filha por dar continuidade à obra solidária do pai.

(vii) Teixeira Jteix

Os 'Metralhas' não mereciam a fatalidade da perda do seu maior impulsionador, pós- "guerra", felizmente que tem na sua filha Inês a continuidade da sua obra. Parabéns!... Fazia parte do "Bando do Café Progresso" e acompanhou-nos sempre que possível. Descansa em paz amigo,  Xico!...


 
Justa homenagem, Inês. O Xico Allen, teu pai, continua connosco como grande amigo e camarada da Guiné!...Vou fazer um poste no blogue.

É uma "mulher de armas", a nossa Inês, que acompanhou o pai, Xico Allen e um grupo de antigos combatentes, numa das suas muitas idas à Guiné-Bissau, em 2006... Aqui em Jugudul, em Abril de 2006, na casa do empresário Manuel Simões (1941-2014). 

Olha, Inês, gostávamos que aceitasses o nosso convite para te sentares, aqui à sombra do nosso fraterno e simbólico poilão da Tabanca Grande, ajudando-nos a matar as saudades que sentimos pela falta do Xico Allen, um dos históricos do nosso blogue, tal como a tua mãe Zélia Neno

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Nota do editor:

Guiné 61/74 - P24246: Parabéns a você (2161): David Guimarães, ex-Fur Mil At Art MA da CART 2716/BART 2917 (Xitole, 1970/72)

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Nota do editor

Último poste da série de 15 DE ABRIL DE 2023 > Guiné 61/74 - P24223: Parabéns a você (2160): António Pimentel, ex-Alf Mil Rec Inf da CCS/BCAÇ 2851 (Mansabá e Galomaro, 1968/70)

domingo, 23 de abril de 2023

Guiné 61/74 - P24245: In Memoriam (476): João B. Serra (1949 - 2023), historiador, professor, programador cultural, biógrafo do escritor e militar Manuel Ferreira(1917-1992) (que esteve com os pais de alguns de nós, no Mindelo, ilha de São Vicente, Cabo Verde, durante a II Guerra Mundial)



João B. Serra > s/l > s/d >  "Almoço dos primos"... Era primo do nosso camarada Manuel Resende pelo lado da esposa deste, a nossa amiga Isaura Serra Resende... Os primos Serra reuniam-se anualmente. O João B. Serra, nascido nas Caldas da Rainha em 22 de abril de 1949,  morreu no passado dia 19, de cancro, doença que lhe fora diagnosticada há 10 anos.



Caldas da Rainha > 9 de maio de 2019 > Última aula do Professor João B. Serra, aqui na foto com Jorge Sampaio (1939-2012).



Lisboa > Centro Cultural de Belém (CCB) > 16 de dezembro de 2017 > O João B. Serra discursando no encerramento das comemorações do centenário de Manuel Ferreira.


Fotos (e legendas): © Manuel Resende (2023). [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Faleceu passado dia 19, aos 73 anos, o historiador, programador cultural e professor do ensino superior João Bonifácio Serra, natural das Caldas da Rainha. Tem no nosso blogue cerca de uma dezena de referências.

O funeral realizou-se no sábado, dia 22, no Centro Funerário de Cascais, em Alcabideche, onde o corpo foi cremado. justamente no dia em que completaria 74 anos. (*)

A notícia foi-nos dada, logo na quarta feira,  pelo João Rodrigues Lobo , membro da nossa Tabanca Grande, também ele, como o falecido, antigo aluno do ERO (Externato Ramalho Ortigão), das Caldas da Rainha. Sendo uma figura pública, de projeção não apenas regional como também nacional, a notícia do seu falecimento teve ampla cobertura pela comunicação social, nomeadamente na imprensa de referência como o Expresso e o Público. Foi também notícia no jornal Região de Leiria e Gazeta das Caldas, e ainda na imprensa de Guimarães.

Era professor coordenador jubilado do Politécnico de Leiria, Foi também investigador e docente no ISCTE e na Universidade NOVA de Lisboa. Para além do percu
rso académico,  foi programador e presidente da Fundação Cidade de Guimarães, responsável pelo projecto Guimarães 2012 Capital Europeia da Cultura. Foi igualmente presidente do Conselho Estratégico Rede Cultura 2027, entidade responsável pela candidatura de Leiria a Capital Europeia da Cultura 2027.

Mas já antes, de 1996 e 2006, trabalharia com o Presidente da República Jorge Sampaio,desde o primeiro até ao último dia nos seus dois mandatos, na qualidade de consultor, assessor e depois chefe da Casa Civil.

Licenciado em história pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, iniciaria a atividade profissional como professor do ensino secundário em 1970. Ajudou a criar a Escola Superior de Artes e Design de Caldas da Rainha, tendo sido ainda titular, nessa Escola, da cátedra Unesco em Gestão das Artes da Cultura, Cidades e Criatividade.

Autor de diversos estudos sobre temas de história política e social portuguesa dos séculos XIX e XX, e  designadamente sobre a História da República e o republicanismo, integrou ainda a equipa de investigadores encarregada de elaborar uma História do Parlamento Português. Teve um especial carinho pela sua terra natal, Caldas da Rainha. 

Tinha página no Facebook. Era primo do Manuel Resende, pelo da esposa deste. AS fotos que publoicamos são deste nosso amigo e camarada, régulo da ;Magnífica Tabanca da Linha.



2. A sua ligação com o nosso blogue remonta a 3 de abril de 2017, quando nos escreveu o seguinte mail:

Professor Luís Graça,

Através do seu blogue, onde tem publicado informação muito relevante e inédita sobre campanhas africanas efectuadas pelas forças armadas portuguesas, colhi indicações úteis para um trabalho de investigação que estou a realizar.Trata-se de uma biografia do escritor capitão Manuel Ferreira, nascido em 1917, com o propósito de participar nas comemorações do seu centenário que passa em Julho próximo.

O meu pedido de ajuda respeita a imagens que tem publicado no seu blogue sobre a presença militar em Cabo Verde dos expedicionários de 1941. Essas imagens abarcam a cidade do Mindelo, as instalações militares em São Vicente e Sal, dispositivos e operações militares.

Gostaria de poder utilizar algumas delas na exposição que estou a organizar e no respectivo catálogo. Para tal pretendia aceder aos originais, de modo a tentar obter a melhor qualidade de reprodução possível. Se me autorizar, farei a digitalização dos positivos ou negativos que me puder disponibilizar, devolvendo de imediato os originais.

Poderá ajudar-me neste meu projecto?
Fico-lhe muito grato.

João Serra
Prof. Coordenador do Insitituto Politécnico de Leiria



Caldas da Rainha > Museu José Malhoa > 22 de julho de 2017 > Exposição temporária "Manuel Ferreira: capitão de longo curso" > Imagem do RI 5,  cuja secretaria Manuel Ferreira (1917-1992) chefiou, entre 1954 e 1958, e por onde muitos de nós passámos, antes de ir parar à Guiné, durante a guerra colonial (1961/74)...Escritor e investigador, e mais tarde capitão SGE Manuel Ferreira (Leiria, 1917 - Oeiras, 1983) passou por aqui, já depois de ter estado no Mindelo, São Vicente, Cabo Verde (e 1941-1946), e na Índia Portuguesa (1948-1954).

Foi neste quartel, em 1957, quando chefiava a secretaria regimental, e nesta cidade onde viveu 4 anos, que ele escreveu o seu livro de contos, "Morabeza" (publicado no ano seguinte, em 1958).  Será depois  ser transferido para Lisboa. Em 1962, sai o seu primeiro romance de temática cabo-verdiana, o "Hora di Bai". E em 1965 é mobilizado para Angola. como tenente SGE, tendo feito parte até então da direção da extinta Sociedade Portuguesa de Escritores.




T/T Vera Cruz > A caminho de Angola > Em primeiro plano, o ten SGE Manuel Ferreira (Gândra dos Olivais, Leiria, 1917- Oeiras, 1992) a bordo do paquete Vera Cruz em agosto de 1965 a caminho de Luanda. Cortesia de João B. Serra.

Foto (e legenda): © João B. Serra (2017). Todos os direitos reservados.  [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


3. À volta da figura do escritor Manuel Ferreira (1917-1992) e dos militares expedicionários em Cabo Verde, e nomeadamente no Mindelo, Ilha de São Vicente, durante a II Guerra Mundial, trocámos umas dezenas de emails.  Uns meses depois ele agradeceu, publicamente, no seu blogue a colaboração
que lhe prestámos (nomeadamente, cedência de fotografias mas também contactos, na Gândara dos Olivais, Leiria, terra natal do militar  e escritor).(**)

18 de Dezembro de 2017 ·

(...) Um ano depois. Chegou anteontem ao fim, no CCB, o programa de comemoração do centenário de Manuel Ferreira. Tudo começou há um ano, quando, ocasionalmente, me encontrei com a primeira edição de uma uma obra sua, que desconhecia. (...)

Foi uma sessão de homenagem digna a que anteontem se efectivou. Amigos, antigos alunos, admiradores e familiares encheram a sala "Almada Negreiros" para lembrar as múltiplas dimensões daquele que perfaria este ano o seu centenário. Ouvimos os testemunhos de historiadores, escritores, professores de hoje sobre o percurso de vida e a obra imensa, generosa e pioneira de um militar que José Saramago equiparou a um Pêro Vaz de Caminha. Alguém que se aplicou em dar a conhecer a descoberta de novos países - através das suas criações literárias -, num processo em que ele próprio se descobriu como outro.

Não me cruzei no passado com Manuel Ferreira. A biografia que dele fui traçando ao longo deste ano não teve outro antecedente que o da curiosidade em preencher lacunas sobre a produção do livro com o qual me deparei em Dezembro de 2016. O empenho colocado nesta investigação não resultou de nenhum apelo ou solicitação externa. Repito: não me foi pedido nem encomendado.
 
O livro foi “A Casa dos Motas”, publicado em 1956. Esta edição, a primeira, de autor, foi impressa no Bombarral e tem ilustrações de Ferreira da Silva, um ceramista cuja obra tenho estudado e sobre o qual estava a preparar um ensaio (aliás, inserido num volume coordenado por Isabel Xavier, que viria a ser editado em princípios de 2017). A relação entre Ferreira da Silva e Manuel Ferreira, intrigante para mim, constituiu o ponto de partida da investigação.

Falei com pessoas que o tinham conhecido e coloquei a possibilidade de Manuel Ferreira ter sido professor na Escola Comercial e Industrial das Caldas da Rainha. Nenhuma destas diligências foi frutuosa. Manuel Ferreira militar? Essa passou a ser a melhor hipótese. Tentei o Arquivo Histórico Militar. Existia um processo, sim, mas estava ainda no Arquivo Geral do Exército, e para o consultar eu teria de me munir de uma autorização de um herdeiro legalmente habilitado. Fui à procura de um descendente, o Eng. Hernâni Ferreira, e foi assim, e aí, que tudo principiou.

Os elementos que a consulta do Arquivo Geral do Exército me facultou eram fascinantes. Excediam tudo o que entretanto tinha apurado sobre a trajectória de Manuel Ferreira, constante quer das notas biográficas divulgadas nas suas publicações, quer das memórias que o próprio filho e amigos retiveram. Pareceu-me justificado que a celebração do centenário de Manuel Ferreira, em Julho de 2017, pudesse ir além de uma cerimónia protocolar e constituísse uma oportunidade para conhecer a sua biografia. Propus a diversas instituições nacionais que o assumissem e elaborei, com vista a fundamentar essa proposta, um texto com informação relevante inédita sobre Manuel Ferreira, que fiz chegar aos seus responsáveis. (...)

O que me motiva hoje é referir e agradecer a todos aqueles que se entusiasmaram com o projecto de aprofundar o conhecimento sobre Manuel Ferreira e a sua acção, que acompanharam o desenvolvimento da pesquisa, que colaboraram no esclarecimento de alguns dos respectivos passos, que acolheram ou participaram na sua divulgação, que, enfim, manifestaram solidariedade com os meus propósitos e corresponderam com empenho ao que lhes foi solicitado.

Agradeço em primeiro lugar às direcções do Instituto Politécnico de Leiria e da Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha a liberdade de, em sobreposição aos meus deveres profissionais de professor e investigador, desenvolver este projecto de cariz cívico. Senti a presença reconfortante de Rui Pedrosa e de João Santos.

 (...) Agradeço (...) a Adriano Miranda Lima que me dispensou elementos da sua própria investigação.  (...)

 Agradeço a Luis Graça (...), Augusto Silva Santos e Helder Sousa que me proporcionaram elementos dos seus arquivos pessoais. (...)

Num mail de 26 de junho de 2017, 12:35, escreveu-me:

(...) Fui ontem a Gândara dos Olivais. Tive uma cicerone excelente, no trato e no conhecimento, a tua prima Glória Gordalina. O encontro e a conversa com a Dra. Piedade, sobrinha de Manuel Ferreira, foi muito proveitoso. Esclareci melhor ambientes, referências e circunstâncias familiares e fundamentei algumas pistas pelo que ouvi e pelos silêncios que também escutei. Obrigado, Luis. (...)

As fotos do João B. Serra que publicamos acima,  são da autoria do Manuel Resende, nosso camarada e amigo, primo do falecido, pelo lado da esposa do Manuel, a nossa querida amiga Isaura Serra Resende.

Guardo dele a imagem de um homem de trato agradável e afável. E enquanto meu vizinho da Estremadura, sinto que é uma perda difícil de reparar na área da educação, da cultura, e da preservação da nossa memória coletiva. 

 família e aos amigos mais próximos do falecido, bem como ao Instituto Politécnico de Leiria, apresentamos as condolências da Tabanca Grande.

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Notas do editor:

(`) Último poste da série > 10 de abril de 2023 > Guiné 61/74 - P24216: In Memoriam (475): Coronel de Infantaria Reformado, Ângelo Augusto da Cunha Ribeiro (1926-2023), ex-Major Inf, 2.º Comandante do BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70)

Guiné 61/74 - P24244: Efemérides (385): Convite para participação na homenagem aos antigos combatentes da guerra do ultramar da Freguesia de Paus, Concelho de Resende, vivos e caídos em campanha, dia 29 de Abril de 2023, que contará com uma represenção do nosso Blogue


1. Mensagem das nossas amigas Fátima Soledade e Fátima Silva, ambas filhas de antigos combatentes do ultramar, com data de 22 de Abril de 2023:

Boa noite, Carlos
Espero que se encontre bem.
Tal como lhe disse anteriormente e agradecendo todo o apoio prestado, envio o convite endereçado pela Senhora Presidente de Junta, Lurdes Ramos para a cerimónia de Homenagem aos Combatentes do Ultramar naturais da freguesia de Paus.(1)
A cerimónia é aberta à comunidade.

Serão homenageados todos os militares falecidos e vivos, naturais da freguesia de Paus, do concelho de Resende, mas em particular os três que faleceram em combate, são eles:
Amadeu de Oliveira (Angola)(2);
Joaquim Rodrigues (Guiné)(3) e
Lucídio Rasinhas (Guiné)(4).


Com muita estima e consideração,
Fátima Soledade e Fátima Silva


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Notas do editor:

(2) - Soldado Armas Pesadas da CCAÇ 390/BCAÇ 381. Falecido em combate em 29JAN63, em Úcua
(3) - Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2893. Falecido em combate em 15NOV70, em Nova Lamego
(4) - Soldado Atirador da CCAÇ 2405/BCAÇ 2852. Falecido em combate em 13JUL69, em Bafatá

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Notas do editor

(1) - Vd. poste de 18 DE MARÇO DE 2023 > Guiné 61/74 - P24151: Efemérides (382): Homenagem aos antigos combatentes da guerra do ultramar da Freguesia de Paus, Concelho de Resende, vivos e caídos em campanha, dia 29 de Abril de 2023, que contará com uma represenção do nosso Blogue

Último poste da série de 1 DE ABRIL DE 2023 > Guiné 61/74 - P24183: Efemérides (384): A tragédia do Quirafo foi há 51 anos, em 17 de abril de 1972... Em 2010 ainda havia vestígios da fatídica GMC... (Rogério Paupério / José António Sousa, membros da Tabanca de Matosinhos, ex-militares da CCAV 3404 / BCAV 3854, Cabuca, 1971/73)

Guiné 61/74 - P24243: Blogpoesia (790): Reflexão, simplista, sobre a Poesia (Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887, Canquelifá e Bigene, 1966/68)


REFLEXÃO, SIMPLISTA, SOBRE A POESIA

adão Cruz

É muito difícil saber o que é a poesia. Sempre duvidei de quem diz que sabe o que é a poesia. Tenho lido e ouvido tanta coisa sobre poesia e muito pouca coisa me convence. Isto não retira a qualquer um de nós o direito que temos a expor o nosso pensamento.

Com a proximidade cada vez maior entre as Humanidades e a Ciência, muito especialmente as Neurociências, uma ampla janela se abre, como nunca se abriu, para o entendimento da natureza e do conceito de poesia.

O Ser Humano é uma estrutura muito complexa de sentimentos, uma infinidade de sentimentos, em sentido neurobiológico, obviamente. Desde os sentimentos mais comuns e mais conhecidos, como o sentimento do amor e do ódio, o sentimento da alegria e da tristeza, o sentimento da coragem e do medo, até sentimentos menos experimentados como o sentimento da beleza, o sentimento poético e o sentimento artístico. Sim, porque eu penso que beleza, a poesia e a arte, à luz das Neurociências, não são mais do que sentimentos.

Sem ter a veleidade de pretender impor conceitos de poesia, sinto a necessidade de a entender e de me entender no seu complexo e maravilhoso mundo, tão levianamente tratado por tantos devaneios pretensamente filosóficos. Embora nascendo embrionariamente connosco, os sentimentos têm de ser vivenciados, construídos, apurados e consolidados ao longo da vida, mais ou menos profundamente e de forma diferente em cada um de nós. Comparada com a assombrosa e constante neuroplasticidade cerebral do nosso dia-a-dia, a programação genética é uma componente muito menos decisiva na construção daquilo que somos e na elaboração da nossa mente.

Parece-me, desta forma, que o sentimento poético é um sentimento muito profundo e ao mesmo tempo muito subtil, uma espécie de essencialidade harmoniosa da vida, provavelmente de uma neuronalidade muito delicada. A poesia não é, a meu ver, um sentimento de cópia, mas a simbolização, a evocação e a invocação ao mais alto nível, da beleza e da nobreza da realidade. Para quem possui este sentimento bem enraizado, a expressão poética pode ser entendida não só como harmonia verbal, em que todos os materiais fonéticos e simbólicos se diluem num resultado de suprema fruição estética, mas também como seiva ou brisa mágica que percorre transversalmente qualquer forma de expressão artística. Daí que o chamado poema, considerado a matriz literária onde habitualmente nasce e germina a poesia, pode ser estéril ou constituir mesmo a negação do sentimento poético. A poesia pode ter uma presença mais viva num texto em prosa do que num poema, ou ser muito mais sentida numa pintura ou numa peça musical do que em qualquer forma de expressão literária.

Apesar de demasiado simplista, atrevo-me a concluir através desta reflexão, que é um erro pretender que o sentimento poético chegue às pessoas da noite para o dia, por artes mágicas, como se de uma prenda banal se tratasse. Dito por outras palavras, penso que, não sendo negativa, pode ser enganadora e não racionalmente formadora, a pretensão de levar às pessoas a poesia ou sentimento poético através de celebrações, festividades e dias mundiais.

Dizia Schiller, que o vulgar é tudo aquilo que não desperta outro interesse que não seja o sensível. A arte e a poesia não devem descer ao puramente sensível, à mera receptividade sensorial, à fugaz captação de estímulos incapazes de serem trabalhados condignamente nas complexas oficinas neuronais da nossa mente. Mesmo que seja um lugar-comum dizê-lo, só criando na sociedade, através de verdadeiras políticas culturais, as condições que permitam entender a natureza e a profundidade da poesia e da arte, elas poderão ser sentidas como elemento essencial da vida.

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Nota do editor

Último poste da série de 20 DE ABRIL DE 2023 > Guiné 61/74 - P24237: Blogpoesia (789): "Dia de enganos", poema da autoria de Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887 (Canquelifá e Bigene, 1966/68)

Guiné 61/74 - P24242: (In)citações (239): O nosso blogue faz hoje 19 anos, sabiam?!... Não é uma eternidade, é uma enormidade... de tempo, equivalente a 10 comissões no CTIG...

Foto nº  2 > Tabanca de Candoz > 20 de abril de 2023 > O melro-preto (Turdus merula) alimentando os três rebentos... Não é a mãe, é pai (plumagem preta e bivo amarelo)... Fotograma de vídeo feito por Américo Vieira, "Meco" (para a família e amigos) (Vd. o vídeo aqui, na página do Facebook Fotos de Américo Vieira). Comentei eu:

"Parabéns, Meco, no dia 8 deste mês ainda o melro estava chocar os ovos... E não era mãe, era o pai...Três, de casca verde-azulada que eu fotografei. Mãe imprevidente (é ela que faz o ninho, o pai pode transportar os materiais...), foi construir o ninho num arbusto de alecrim, junto a uma carreiro, na nossa Quinta de Candoz... a menos de um metro, metro e meio,  do solo, num sítio por ondem passam predadores, incluindo o "bicho homem"... Agora é preciso evitar que cães e gatos deem com o ninho até os melrinhos aprenderem a voar... E boa sorte para eles... E, tu,  continua ser o "olheiro" da bicharada de Candoz e arredores... O mesmo é dizer: o seu "guardião"... Se me permites, venho cá, de vez em quando, "roubar-te" umas fotos... És um fotógrafo com grande sensibilidade ambiental e qualidade estética... Luís Graça."

Foto (e legenda): © Américo Vieira (2023). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



Foto nº 1 > Tabanca de Candoz > 8 de abril de 2023 > Os ovos de melro no ninho construído num arbusto de alecrim,

Foto (e legenda): © Luís Graça (2023). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Hoje o nosso blogue faz 19 anos. O poste n.º 1 foi publicado justamente em 23 de abril de 2004...(E este é já o P24242.) Para uma pessoa física, não é nada, ou melhor, são apenas 19 aninhos, cheios de vida, de sangue na guelra, de vontade de lutar e viver... 

Para um blogue, 19 anos é tempo de mais... Na Internet, na Web,  é  quase uma eternidade... Pensando bem, é uma enormidade, para os antigos combatentes, é o dobro do tempo que durou aquela maldita guerra (que, em boa verdade, arrastou-se por menos  de 11 anos, de princípios de 1963 a  meados de 1974, se descontarmos os "incidentes", nos dois anos antecedentes, 1961 e 1962)... 

Não estamos à espera de soprar a vela e, muito menos, que nos cantem os parabéns a você... Não temos bolo, nem velas, e já lá vai o tempo em que a gente achava piada a essas coisas, na Guiné: estávamos vivos e queríamos continuar a estar vivos... Celebrávamos os 22, 23, 24 anos... pagando uma rodada (ou mais) de cerveja ou de uísque pelos camaradas mais próximos. 

Não sei se algum de nós se lembraria um dia de recitar o poema do Álvaro de Campos, "Aniversário"... O Fernando Pessoa não estava ainda na moda... Lembram-se?

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.

Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida. (...)

O resto podem ler aqui (é lindo, lúcido,  irónico,  deprimente):

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...
15-10-1929
Poesias de Álvaro de Campos. Fernando Pessoa. Lisboa: Ática, 1944 (imp. 1993). - 284.


2.  Ninguém hoje faz anos, a não ser o blogue... O blogue somos todos nós e não é ninguém, em particular... Começou por ser (ou queria ser) uma tertúlia... É pelo menos uma comunidade virtual que reúne vivos e mortos: hoje formalmente somos já 874...  os que aceitaram reunir-se à sombra do simbólico, fraterno,  sagrado poilão.

A propósito ou a despropósito desta pequena (e discreta)  efeméride, os nossos leitores poderão escrever qualquer coisinha, a título de comentário, crítica, sugestão... Sobre o passado, o presente ou o futuro (de todos nós, "amigos e camradas da Guiné")...

Com alguma ingenuidade nossa ainda queremos chegar aos 900 membros da Tabanca Grande até final deste ano... É uma meta difícil, mas também só vale a pena chegar aos 900, se  os "novos" (os "periquitos")  trouxerem algum "sangue novo"... 

Em suma, precisamos de "caras novas", precisamos de renovar a "hemoglobina" e as "plaquetas" do blogue... Precisamos de "transfusões de sangue"... Todos temos a sensaçáo de que o nosso baú da(s) memória(s) já está muito rapado... Mas mesmo assim, o blogue continua vivo... como os melros da Tabanca de  Candoz. 

Obrigado a todos os que ainda mantêm vivo o blogue mais antigo dos antigos combatentes da guerra colonial da Guiné... Não queremos que nos deem os parabéns, ou melhor, queremos apenas que continuem a ler-nos, a comentar, a mandar textos e fotos,  é disso que o blogue vive... Tem que ser alimentado como os melrinhos da Tabanca de  Candoz... E quem conseguir "pòr ovos", ainda melhor!... Até ao viségimo aniversário, e cuidado com as minas e armadilhas espalhadas pela picada fora...LG
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Nota do editor:

Último poste da série > 8 de abril de 2023 Guiné 61/74 - P24231: (In)citações (238): Da contestação da Guerra, à mobilização e regresso da Guiné, o operário de Sines e a evolução das costelas (Victor Costa, ex-Fur Mil At Inf)