Foto: © Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.
Guiledje 35 Anos Depois
Por Nelson Herbert
16/03/2008
Voz da América / Voice of America
Entrevista a Osvaldo Lopes da Silva (Ficheiro áudio: 13' 11''. É preciso instalares no teu PC o programa RealPlayer)
Osvaldo Lopes da Silva, um antigo comandante de artilharia da guerrilha do PAIGC, na Guiné-Bissau aborda, 35 anos depois e em exclusivo à VOA [Voice of America / Voz da América], aspectos operacionais da pressão militar montada por aquela guerrilha independentista contra o destacamento militar de Guiledje, que culminaria, em 1973, no seu abandono pela então tropa portuguesa (2).
2. Comentário de L.G.:
O Nelson Herbert é jornalista, membro da nossa Tabanca Grande desde Março de 2008. Nasceu em Bissau, a 16 de Setembro de 1962, sendo filho de mãe guineense e pai cabo-verdiano. Como ele nos disse, no mail de apresentação, pertence à " mesma geração do historiador Leopoldo Amado, um amigo e colega de infância e das lides académicas em Bissau e universitárias em Portugal".
A sua infância foi passada em Bissau: "Vivi e cresci defronte à messe dos sargentos da Força Aérea" em Bissau. Aí assitiu, nos anos 70, a um atentado bombista (falhado, que não felizmente não provocou vítimas), contra um autocarro da Força Aérea . "Um ataque atribuído às células clandestinas do PAIGC em Bissau, que conhecia a rotina da concentração de oficiais e militares defronte do edifício da messe, para as habituais sessões de cinema na base em Bissalanca".
Depois da infância e adolescência em Bissau, veio para Lisboa onde se licenciou em Comunicação Social, pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Partiu, nos anos 90, para os Estados Unidos, para fazer continuar a sua formação académica e profissional. Acabou por lá ficar e adoptar a nacionalidade norte-amerciana.
Como editor e jornalista da VOA - Voice of America, cobriu a guerra civil em Angola, país que conhece bem. Foi também enviado especial da Voz da América ao conflito civil na Guiné-Bissau em 1998/99 e na região senegalesa de Casamance.
Confessa-se "um apaixonado pelo capítulo da guerra colonial ou de libertação, capítulo esse a que me tenho debruçado como jornalista, com vários artigos e reportagens. Anos antes, a convite do Governo de Cabo Verde saído das primeiras eleições democráticas no arquipélago, assumi num período em que tive que fixar residência em Cabo Verde, a direcção geral da Televisão Nacional de Cabo Verde".
É actualmente editor sénior da divisão para a África da Voz da América, Serviço em Português, com incidência para a África Ocidental, em particular para nossa Guiné (1).
Voltamos a inserir o link com a entrevista que o Nelson fez ao comandante Osvaldo Lopes da Silva, de nacionalidade cabo-verdiana, e residente em Cabo Verde. O Osvaldo Lopes da Silva também foi entrevistado para o filme de Diana Andringa e Flora Gomes, As Duas Faces da Guerra (Portugal, 2007). A sua presença também esteve originalmente prevista para o Simpósio Interncional de Guileje, Bissau, 1-7 de Março de 2008, o que não veio a acontecer por razões que desconheço. Sei que o seu depoimento sobre a batalha de Guileje também foi recolhido - creio que, pessoalmente, pelo Pepito ou por alguém da sua equipa - no âmbito da preparação d0 Simpósio.
É um importante depoimento sobre a batalha de Guileje, vista pelo lado dos guerrilheiros do PAIGC. É fundamental que se recolha, trate e divulgue este tipo de depoimentos. A grande maioria dos guerrilheiros do PAIGC nunca teve nem terá acesso à palavra (escrita, gravada)... Muitas das suas histórias de guerra e de vida morreram ou vão morrer com eles.
De destacar algumas afirmações no decorrer da entrevista:
"[A] Operação Amílcar Cabral, cuja preparação levou cerca de 3 meses e culminou com a queda, em Maio de 1973, do quartel de Guiledje" (NH)
"(...) Uma das mais importantes e emblemáticas fortificações militares do exército colonial de Portugal na Guiné" (NH)
" (...) Osvaldo Lopes da Silva, um antigo comandante da guerrilha, por sinal o homem a quem Amílcar Cabral confiou a atrefa de preparar as condiçõesa para um eventual ataque àquela fortificação militar colonial na expectativa de que a sua queda ditaria um novo rumo à luta de independência (...) (NH)
"Nós tivemos que fazer um levantamento topográfico de toda a zona. Foi um trabalho muito difícil (...). Era uma zona de floresta um bocado densa (...). Era uma zona muito minada (...). Tivemos algumas baixas (...),sempre por causa de minas (...)" (OLS).
" (...) O inimigo habituou-se a não contar com tiro de precisão. No momento exacto fizemos tiro sem corecção. Foi directamente. Concentração de fogo lá onde nós queríamos" (OLS).
"(...) Durante muito tempo seguimos o trajecto que a tropa fazia para ir buscar água. Deixámos fazer. Eles nunca se aperceberam que estavam a ser seguidos. Então, no momento exacto, quando íamos [,a infantaria,] para o ataque, ocupámos a água. E eles ficaram sem água" (OLS).
"(...) o exército colonial tinha perdido completamente o domínio aéreo. [Com os mísseis], perderam em pouco tempo vinte e tal aviões. Era muito para eles" (OLS). [Esta informação não é factual, a FAP nunca perdeu esse número de aviões no CTIG].
" Outros quartéis caíram, mas o que foi mais espectacular foi justamente Guiledje. Contavámos que resistisse muito mais (...)" (OSL) [Não é claro a que quartéis o comandante OLS se está a referir: Kopá ou Copá ? Oficialmente o exército português nunca reconheceu a perda de mais nenhum aquartelamento, para além do de Guileje, ocupado em 25 de Maio de 1973 pelas tropas do PAIGC e depois por estas destruído ]
" (...) eu pessoalmente digo que fiquei aliviado que eles tivessem saído, foi melhor assim (...) (OSL)
" (...) deixaram a central eléctrica a funcionar... Pensávamos que tivessem ainda lá (...) nos abrigos (...)" (OLS)
" ... Com Cabral tudo estava previsto. Uma das medidas que adoptou, perante a instabiliddae que havia na Guiné-Conacri, foi enviar todas as munições para a Guiné-Bissau, ao longo da fronteira. (...) Dá-se a morte de Cabral, a ideia de Spínola seria uma grande ofensiva, mas não podia ser imediatamente, porque se podia (...) responsabilizá[-lo] pela morte de Cabral" (OSL)
"... Ele [,Spínola,] não contava com a reacção que de facto houve (...) Uma reacção de raiva em todos os diferentes quartéis, do sul da Guiné, mas também do Leste (...). Isso bloqueou toda a iniciativa do Spínola (...) (OSL).
" (...) Rendo homenagem a esse guerrilheiro anónimo [morto por uma mina, e que ia sempre à frente do seu comandante, OLS, tendo ficado enterrado junto ao arame farpado de Guileje]... Citaria [também] o nome de Seabra, Veríssimo Seabra (...). Foi um dos meus companheiros. E há muitos mais guineenses que foram combatentes exemplares, de grande coragem e espírito de sacrifício" (OSL).
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Nota de L.G.:
(1) Vd. postes de: 14 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2639: O Simpósio de Guiledge na Voz da América (Virgínio Briote)
16 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2652: Guineenses da diáspora (3): Nelson Herbert, o nosso Correspondente nos EUA (Virgínio Briote)
21 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2670: Fez-se História em Guileje (Nelson Herbert)
(2) Vd. também a versão do lado português:
27 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2137: Antologia (62): Guileje, 22 de Maio de 1973: Coutinho e Lima, herói ou traidor ? (Eduardo Dâmaso / Luís Graça)
3 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2502: Guiledje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (14): Enquadramento histórico (II): o significado da queda de Guileje
23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2673: Uma semana memorável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (10): Guiledje: Homenagem ao Coronel Coutinho e Lima
23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2677: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação de Coutinho e Lima (1): Comandante do COP 5, com 3 comissões no CTIG
23 de Março de 2008 >Guiné 63/74 - P2678: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação de Coutinho e Lima (2): A dolorosa decisão da retirada de Guileje
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