sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Guiné 63/74 - P7031: Notas de leitura (149): A Independência da Guiné-Bissau e a Descolonização Portuguesa, de António Duarte Silva (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 22 de Setembro de 2010:

Queridos amigos,
O que é bom acabou-se. Mas foram umas férias impares, andei por museus e casas senhoriais, vagueei por jardins e até apanhei chuva. O melhor de tudo, como já se vai repetindo, foram os vales de Yorkshire, um dos locais mais aprazíveis que conheço.
Chegou a hora de voltar ao trabalho. Talvez da melhor maneira, começando com o outro livro (também incontornável) desse grande estudioso que é o António Duarte Silva. Ele tinha obrigação de se filiar na tertúlia, não conheço melhor informado sobre a Guiné do que ele.

Um abraço a todos na chegada do Outono,
Mário


A independência da Guiné-Bissau e a descolonização portuguesa (1)

Beja Santos

Se com “Invenção e Construção da Guiné-Bissau” António E. Duarte Silva escreveu um ensaio memorável da Guiné Portuguesa entre os anos 40 e a luta da libertação (Edições Almedina, 2010), o seu trabalho anterior intitulado “A Independência da Guiné-Bissau e a Descolonização Portuguesa” (Edições Afrontamento, 1997) possui idêntica qualidade, rigor e originalidade. São investigações complementares, nalguns casos cruzam-se e amplificam os elementos de compreensão sobre a vida da colónia, clarificam os alvores do nacionalismo guineense, as estratégias que levaram à declaração unilateral de independência, comentam o comportamento da Guiné-Bissau recém-independente, analisam exaustivamente a formação do Estado e todas as questões inerentes seja o direito à autodeterminação seja o direito da descolonização. Igualmente o acervo bibliográfico é incontornável. Tudo somado, não se conhece na actualidade melhor investigação sobre as últimas décadas da Guiné, desde que se tornou uma colónia modelo, ainda nos anos 40, passando pela via da libertação nacional e as diferentes constituições bissau-guineenses.

É um estudo suficientemente rico para obrigar a sucessivos olhares, etapas e eventos, obrigando a seccionar a recensão. Como segue.

Primeiro, António Duarte Silva regista o que de essencial avulta na visão colonial portuguesa entre os anos 30 e o movimento descolonizador, subsequente à Segunda Guerra Mundial. Aliás, em idêntico sentido procede o historiador Filipe Ribeiro Menezes na sua monumental obra “Salazar, Uma Biografia Política” (Publicações Dom Quixote, 2010). Sem se entender o pensamento de Salazar desde o Acto Colonial até ao anti-colonialismo que explodiu na Ásia e na África, não é compreensível apreender e caracterizar o que movia as organizações independentistas que actuaram na Guiné ao longo da década de 50.

Segundo, o autor releva os acontecimentos inerentes ao massacre do Pidjiguiti, a importante reunião de 19 de Setembro de 1959, considerada determinante na história do PAIGC, a formação do frentismo anti-colonial, a tentativa do perfil ideológico de Cabral e como o seu pensamento se tornou dominante dentro do movimento de libertação e o início da luta armada, dando-se igualmente um quadro da actuação da FLING. Como é evidente, torna-se necessário equacionar a chamada unidade Guiné-Cabo Verde e até encontrar base histórica, sem descurar os símbolos e mitos dessa unidade. Segue-se o período que vai da “batalha do Como”, em 1964, até à nomeação de Spínola, em 1968. É um lugar-comum dizer-se que foi um período crucial, desde 1963 que o PAIGC se tornou preponderante no Sul e Amílcar Cabral destacou-se, ao nível dos movimentos de libertação, como figura de proa. É o tempo do crescendo da guerra que vai obrigar Spínola a redefinir a manobra e a procurar em simultâneo dissuadir a contra-guerrilha e a captar as populações.

Terceiro, analisa-se o contexto da independência, e aqui o autor dá largas à sua formação jurídica, recordando o historial de sucessivas independências unilaterais, a começar pelos Estados Unidos da América. Não querendo repetir o que já foi anotado em “Invenção e Construção da Guiné-Bissau” é de indiscutível importância perceber o que foi a formação da Guiné-Bissau enquanto Estado africano e as suas singularidades no contexto do Império Colonial Português. Para entender a declaração unilateral da independência, de 24 de Setembro de 1973, é preciso recuar até 1968 e passar em revista a evolução dos acontecimentos no teatro de operações, o significado do relatório da Missão Especial da ONU, em Abril de 1972, os sucessivos triunfos da diplomacia do PAIGC e o seu plano para pôr o Estado em movimento: a eleição da Assembleia Nacional Popular como facto inédito que precede a declaração da independência.


Quarto, o autor descreve a viragem da guerra e os principais eventos de 1973, desde as operações “Amílcar Cabral” e “Nô Pintcha”, o novo plano de encurtamento da área ocupada pelas tropas portuguesas (seguramente o motivo maior que levou ao pedido de demissão de Spínola), o II Congresso do PAIGC e a aprovação da Constituição do Boé. António Duarte Silva analisa pormenorizadamente as repercussões desta declaração de independência, na ONU, no Governo português, nos dois partidos da oposição (Partido Socialista e PCP). Entre 27 de Setembro e 7 de Outubro de 1973, a República da Guiné-Bissau foi imediatamente reconhecida pela grande maioria dos Estados africanos, asiáticos, árabes e comunistas. Numa medida surpreendente, em 2 de Novembro, a Assembleia-Geral da ONU aprovava, por 93 votos, 30 abstenções e 7 votos contra, uma resolução felicitando-se “Pelo recente acesso à independência do povo da Guiné-Bissau, ao criar o Estado soberano que é a República da Guiné-Bissau”. Em 19 de Novembro, a Guiné-Bissau era admitida por unanimidade na Organização da Unidade Africana. Tal como nas independências dos EUA e do Brasil, a guerra prosseguiu mais algum tempo. Os primeiros meses de 1974 viram encarniçados combates, desapareceu a guarnição de Copá, Canquelifá esteve a ferro e fogo, obrigando a uma intervenção do Batalhão de Comandos. Em Março, em reunião secreta, sentaram-se à mesa diplomatas portugueses com uma delegação do PAIGC, com resultados inconclusivos. O representante do Governo português só queria discutir o cessar-fogo para abrir negociações a uma eventual independência da Guiné. A delegação do PAIGC recusou-se a discutir a independência da Guiné sem a complementar com a de Cabo Verde. E assim chegamos ao 25 de Abril de 1974.

(Continua)
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 12 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6975: In Memoriam (51): Djassió Soncó, mulher do guia Quebá Soncó (Mário Beja Santos)

Vd. último poste da série de 10 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6966: Notas de leitura (148): Transição Democrática na Guiné-Bissau, por Johannes Augel e Carlos Cardoso (Mário Beja Santos)

2 comentários:

Anónimo disse...

Faz hoje 37 anos que em Madina do Boé se declarou a independênia da Guiné.

Antº Rosinha

Anónimo disse...

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