Caros Luís e Vinhal:
Recebam um grande abraço de estima e consideração, extensivo ao meu querido amigo Magalhães Ribeiro.
Aqui vai mais um extracto das minhas memórias (escritas).
Passem bem.
Rui Silva
Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.
Das minhas memórias “Páginas Negras com Salpicos cor-de-rosa”
Quando do PCA (Posto Comando Aéreo) veio a ordem para avançarem os dois Grupos de Combate da 816 para atacar a base de Morés.
- … viajei num Dornier com o inimigo, na véspera, o “manjaco”.
- … na emaranhada mata de Morés, vegetação “inexpugnável”, andar de gatas, lianas no pescoço, quico que se perde, catanas à esquerda e à direita a abrir caminho.
- … já dentro da mata, o inimigo surpreende-nos com morteiradas esporádicas, mas sem saber onde estávamos ao certo. Ouvia-se a percussão das granadas.
- Assisti ao diálogo, via rádio, entre o Comandante da força de assalto e o PCA que chegou a querer que avançássemos (2 pelotões!), … que estávamos perto.
Localização do Morés
Chegados a Bissau, de férias na metrópole, eu, o Baião, o Piedade e o Coutinho logo soubemos o que já também prevíamos, que a Companhia já estava instalada no Olossato e portanto era para lá que nos devíamos dirigir. A Companhia tinha deixado Bissorã depois de 5 meses ali aquartelados e a bater a zona, claro.
Uma vez em Mansoa (trampolim para o Olossato) foram primeiro o Baião, o Piedade e o Coutinho, em Dornier. Um dos quatro, por não ter lugar, teria de ficar para o próximo transporte e então foi eu o escolhido.
Em Mansoa aguardei que houvesse coluna ou lugar numa avioneta que fosse para lá, isto é para Olossato.
Passados três dias eis então que me surge a ordem para tomar lugar num “Dornier” que ia para o Olossato. Ao entrar no pequeno aparelho logo me apercebi de que grande operação estava na forja. A suspeita passou à certeza quando o Capitão de Operações dos “Águias Negras” - Batalhão a que estávamos adstritos - dirigindo-se a mim, diz:
- Você vai mesmo numa boa altura....- Disse-o com um sorriso significativo.
O Dornier ia superlotado. À frente, ao lado do piloto, o dito Capitão de Operações da BArt 645 e, atrás, metido entre cunhetes de munições, granadas e mais granadas e outro material de guerra, ia eu e, virado para mim, cara-a-cara, a agradável companhia de um “turra” que ia de mãos atadas com uma corda.
Deste modo viajei num Dornier com o inimigo, na véspera, o “manjaco”.
Raciocinei então que aquele tipo fora apanhado (logo no Olossato soube que tinha sido feito prisioneiro algures na mata de Morés) e agora nos iria servir de guia em alguma operação e que não ia ser pequena pela certa, a avaliar pelo abastecimento de grande quantidade de munições.
O Capitão chegou a oferecer-me a sua pistola temendo alguma reacção do “turra” cá atrás na avioneta. Não sei até que ponto ele admitia isto. Mais tarde, em reflexão, não me custou a admitir qualquer reboliço por parte do “turra”, ainda que isso lhe pudesse custar a vida, (e a dos outros) para provocar o despenhamento da avioneta, pois lembrei-me muito bem da resistência dos presos para interrogatórios em Bissorã, onde eles preferiam arriscar até a vida a contar algo que comprometesse os seus companheiros de luta.
Era esse o meu estado mental. Ali na avioneta poderia muito bem estar ali um desses heróis. Que se passou ao lado de uma possibilidade dessas, parece-me bem que sim.
Nunca uma avioneta demorou tanto a aterrar; era esse o meu estado de espírito.
Ao fim da tarde, já no Olossato, tomei conhecimento com os meus colegas de patente, da operação em causa. Tratava-se nem mais nem menos que ir a Morés, melhor dizendo, à base de Morés, ou melhor ainda, à base central de Morés e já naquela noite.
O nome Morés infundia terror. Morés era só… a principal base de toda a região do Oio, a mais forte do norte, e seguramente das mais fortes da Guiné.
Muito bem armada - as melhores armas estavam lá -, com trincheiras e outros abrigos subterrâneos, até em cimento (dizia-se), com arrecadações que abasteciam as várias bases do Oio, hospital, e com grande efectivo. Bom “pincel”, dizíamos nós.
Por outro lado estávamos orgulhosos de sermos os escolhidos para actuarmos no principal papel numa operação: o grupo de assalto! Fazer o assalto à tão importante base terrorista da Guiné.
Morés, tão pouco ou tão muito, onde jamais a tropa tivera qualquer êxito na verdadeira acepção da palavra. Mas, ir a Morés e… porque não?
Foi o que me estava reservado logo que regressei ao seio da Companhia, após férias. Era curioso: férias com desbunda natural, a própria da idade, e logo ao “outro dia” no mato da Guiné à “procura” da morte.
Operação: Águia Negra
Objectivo: Golpe de mão à casa-de-mato (base central) de Morés
Efectivo militar:
- 2 Grupos de Combate da 816 reforçados com milícias e carregadores indígenas e outros voluntários (a troco de alguns pesos) do Olossato, à frente da coluna e como grupo de assalto (cerca de 90 homens)
- A Companhia de Caçadores n.º 1418, sediada em Bissorã, logo de seguida na coluna e em apoio à retaguarda do grupo da 816.
- Do lado de Mansabá, isto é do lado oposto, avançava uma outra Companhia servindo de “isco” e eventualmente como reforço, se necessário, ao grupo de assalto.
Data: 3 de Novembro de 1965
MEIA-NOITE! A Companhia 1418, com os dois Grupos de Combate da 816 à frente, deixa então Olossato rumo à base de Morés. À frente ia então o “turra”, meu companheiro de viagem aérea de Mansoa para Olossato. Ia devidamente aprisionado e escoltado, não fosse dar o salto. A seguir ao “turra”, nosso guia na circunstância, o 3.º Grupo de Combate, ou seja o meu, depois o 2.º e por fim a fechar a coluna os “periquitos” de Bissorã.
Mergulhados no mato e na mais completa escuridão, (des) confiados na colaboração do guia, e entregues à sorte de Deus - e do diabo também, sempre por ali perto - cerca de 200 homens, armados até aos dentes, seguiam ao encontro do inimigo, algures acoitado e bem seguro, melhor defendido e muito bem armado, dentro daquela vasta zona da complexa mata de Morés de seu nome.
Mas tudo se desmorona como um castelo de cartas. O guia ludibria-nos intencionalmente, fazendo-nos andar às voltas e mais voltas até que nos vimos em plena mata virgem - se não o era assim o parecia. Vimo-nos assim na emaranhada mata de Morés, vegetação “inexpugnável”, andar de gatas, lianas no pescoço, quico que se perde, catanas à esquerda e à direita a abrir caminho.
Aqui, com as consequentes dificuldades de progressão e orientação. Tínhamos entretanto, e como era inevitável, sido detectados, ou para isso não contribuísse o “turra” com as suas deambulações pelo mato, o que não raras vezes acontecia. Mas os “turras” da base, embora já conscientes da nossa presença nas imediações, não sabiam qual o local exacto em que nos encontrávamos, como adiante se verá.
O alvorecer, altura ideal e a combinada para o assalto, já ia bem longe. Eram agora quase 11 horas da manhã e então paramos. Aí, sentados ou de cócoras – a vegetação não dava para mais -, o Alferes Costa, da 816, que chefiava a coluna, e portanto a Operação, dada a ausência do Capitão Riquito, então de férias na metrópole, estabelece contacto com o PCA e pôs este ao corrente da situação. A resposta veio então de forma bem peremptória: “Continuem que estão perto”.
Aqui o Capitão da 1418 insurge-se com tal determinação do PCA e ameaça não avançar mais com os seus homens em face das circunstâncias, a que não era alheio uma muito reduzida possibilidade de êxito contra a hipótese mais que viável de pagarmos tudo muito bem caro. O inimigo estava perfeitamente conhecedor das nossas intenções e… à nossa espera.
Uma vez e já dentro da mata, o inimigo surpreende-nos com morteiradas esporádicas, mas sem saber onde estávamos ao certo. Ouvia-se a percussão das granadas.
Julgo que eles batiam os trilhos, só que, nesta Operação, a ideia foi de os evitar e ir muito a corta-mato. Aqui o “manjaco” foi um bom trunfo e colaborou, até…
Entretanto as percussões de granadas de morteiro da base terrorista ouviam-se com nitidez o que queria dizer que estávamos bem perto deles. Estas eram lançadas ao redor da base, aqui e acolá, com o intuito de nos detectarem ao certo, mas isso só eles conseguiam se nós respondêssemos com qualquer tipo de fogo, o que não acontecia obviamente. Assim entre uma percussão e o rebentamento duma granada, passavam-se escassos segundos de extrema expectativa e angústia para nós. Receávamos que acabasse por cair alguma em cima de nós.
Ao fim de aturada discussão entre o Alferes Costa e o PCA, através do rádio, o PCA, em face das circunstâncias, manda então que a 1418 se instale ali fazendo a segurança à retaguarda e que PROSSEGUÍSSEMOS NÓS para o objectivo!!
Assisti ao diálogo, via rádio, entre o Comandante da força de assalto e o PCA que chegou a querer que avançássemos (2 pelotões!),… que estávamos perto.
- O quê? Só os dois Grupos de combate para a frente? Eles estão doidos!
Foi uma exclamação quase geral e em cadeia.
- Não pode ser meu Alferes! Somos muito poucos para eles.
- Eles estão mesmo à nossa espera e ainda por cima entrincheirados, e nós a peito descoberto?
Dizia este e aquele e ao fim e ao cabo o que ia no pensamento de todos. O ambiente era de evidente pessimismo e não era para menos. O Alferes Costa, em tão ingrata situação, não disfarçava o seu nervosismo. Ele tinha de cumprir a ordem e esta era de avançar para o inimigo. Incrível!!!
- Vamos lá ficar todos.
- Não temos qualquer hipótese.
- É uma operação suicida.
- O PCA fala assim porque anda lá em cima.
- Diga isso lá para cima, meu Alferes.
Estas e outras frases ouviam-se em tão caótica situação.
O Alferes Costa insiste com o PCA em reconsiderar tal estado de coisas, e este, finalmente, mas claramente contrariado, permite que regressemos ao Olossato abandonando assim a ideia de entramos suicidamente em confronto com o inimigo, instalado e avisado e super-armado. Sim, cerca de 90 homens (alguns apenas carregadores, isto é, sem armas) assaltarem uma base bem armada e melhor defendida, onde não faltavam os potentes morteiros de calibre 82 e as entrincheiradas metralhadoras pesadas, base já mais que prevenida das nossas intenções, era uma loucura, que resultaria, por certo, numa operação repleta de aspectos muito trágicos.
Assim:
Respiramos fundo uma vez libertos daquele pesadelo e a marcha de regresso começou logo a processar-se.
De Morés ficamos a conhecer o que era a mata para aqueles lados e, por pressentimento, quão forte era aquele refúgio inimigo.
Por insolação e/ou esgotamento foram evacuados vários militares.
Mas havíamos de lá voltar…
Descreve, no seu Site Leões Negros - CCaç 13, o camarada Carlos Fortunato o que era Morés ao tempo (1970) e, que coincidindo com a minha percepção e leitura, na altura, sobre aquele tão importante refúgio de Morés em 1966, transcrevo com a devida autorização do Carlos Fortunato, assim como as fotografias que se inserem.
No entanto, ao meu tempo, ainda não se falava na presença de cubanos, nem de canhões, e tenho consciência também, que Morés foi melhorando, com o tempo, aquela fortaleza, cada vez com armas mais sofisticadas e abrigos mais consistentes, ou Morés não fosse o “santuário” do PAIGC no centro da Guiné:
Uma escola na Tabanca de Morés
A mata do Morés era um dos nomes míticos da guerra na Guiné, tratava-se de uma mata muito densa, no meio da Guiné, na qual se encontrava situado o quartel general da zona norte do PAIGC.
A mata do Morés era um dos “santuários” da guerrilha, apenas superado pelas zonas junto à fronteira sul, pois aí com forte apoio do exterior, e com boas linhas de abastecimento vindas do território da Guiné-Conakry, o seu poder de fogo era inesgotável, transformando num inferno os aquartelamentos junto à fronteira. Na fronteira norte o problema na altura ainda não era tão grave, pois o apoio do Senegal, ainda não era um apoio declarado.
Nesta mata, segundo as informações existentes na altura, a guerrilha possuía uma força estimada em 900 homens bem equipados, onde se incluíam forças especializadas, cubanos, armas pesadas, anti-aéreas, abrigos subterrâneos contra bombardeamentos, hospital subterrâneo, etc.
Apesar de ser uma certeza de que possuía forças consideráveis na zona, era sempre difícil avaliar a dimensão das forças que iríamos enfrentar, pois a guerrilha facilmente as dispersava pelos vários acampamentos existentes, ou as concentrava se existisse um alvo que quisesse destruir.
No centro desta mata existia a tabanca do Morés, mas sem grande importância, e sem grande possibilidade de defesa, pois encontra-se em terreno aberto.
As bases do PAIGC estavam espalhadas pela mata, bem camufladas e era frequente a sua mudança, para evitar a sua localização.
O sucesso de uma operação nesta mata, dependia muito das informações conseguidas por dissidentes do PAIGC, nomeadamente quando se conhecia a localização de depósitos de material, não era este o caso da nossa “visita”, pois creio que se queria apenas afirmar ao PAIGC, que não existia nenhum local onde não pudéssemos ir.
Pelo que nos foi dado observar na nossa rápida “visita”, a mata possuía caminhos muito estreitos e alguns deles minados, ladeados por um mato tão cerrado que era impossível passar, ou lançar uma granada, nos lados desses caminhos trincheiras, para ninhos de metralhadoras, nas copas de algumas árvores uma placa de madeira e uma caixa, indicavam locais de vigia e talvez a existência de um sistema de comunicações, os abrigos anti-aéreos eram muito rudimentares, e consistiam num enorme buraco cavado no chão, sem qualquer estrutura que o suportasse.
Uma cozinha em Morés
Combater no meio da mata do Morés colocava grandes dificuldades, a primeira era que ficávamos privados de apoio aéreo (a vegetação é de tal modo cerrada que não se consegue sinalizar a nossa posição, para a aviação nos dar apoio, são escassas as clareiras e normalmente estão sob a mira dos morteiros), as progressões são difíceis ( tem que se caminhar agachado ou a rastejar, para conseguir passar entre as árvores), a alternativa de seguir pelos trilhos existentes tinha os problemas referidos anteriormente, pois existia um sistema defensivo implementado, que mesmo sendo rudimentar, dava-lhes vantagem, uma grande vantagem, num confronto com as nossas tropas.
Apesar de a actividade da guerrilha se caracterizar por acções de flagelação e fuga, a verdade é que nalguns casos excepcionais esta começava a defender terreno, como o caso do Morés.
Uma ocupação deste tipo de terreno, implicava muitas baixas, e a guerrilha acabaria sempre por fugir e regressar mais tarde.
O PAIGC considerava-se invencível nesta mata.”
____________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 18 de Agosto de 2011 > Guiné 63/74 – P8684: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (13): Como se apanha uma alcunha logo no primeiro dia de Guiné
15 comentários:
Morés: mito ou realidade ? Em todos os sectores, havia sítios temidos e temíveis como o Morés... Lembro-me, por exemplo, do Fiofioli, no Sector L1 (onde estive com a minha CCAÇ 12)... Em 1969/71, só lá se foi uma vez, com a grande Op Lança Afiada (Março de 1969, ao tempo do BCAÇ 2852), sob o comando do Coronel Hélio Felgas...
O Carlos Fortunato, da CCAÇ 13, um rapaz do meu tempo (viemos nop mesmo barco, ele foi para a 13, Bissorã, eu Para a 12, Bambadinca), voltou lá ao Morés, em Novembro de 2006...
A deceção que ele teve teria sido a mesmo de quem foi (se é que foi ...) ao Fiofioli, trinta ou quarenta anos depois...):
(...) "No Morés já não existiam vestígios nenhuns, do que tinha sido o Quartel General do PAIGC na zona norte, abrigos, ou construções, fomos até aos cajueiros, onde em 1971 houve um violento combate entre o PAIGC, e os Comandos Africanos, e registamos a descrição de um antigo comandante do PAIGC sobre o que se passou na altura [, Op Safira Solitária, nome de código tão ao gosto do Bruno de Almeida].
"Aproveitamos para chamar as crianças, e dar mais uma bola, que tínhamos comprado em Mansoa, foi a alegria do costume, e pediram-me também camisolas, não pude satisfazer o seu pedido, embora com muita pena, ao ver as camisolas rotas de alguns deles.
"No Morés indicaram-nos que podíamos seguir por outra estrada para regressar, era uma estrada de terra batida que ia dar directamente a Bissorã, e era boa garantiram-nos, assim fizemos.
"A estrada que nos indicaram no Morés era péssima como a anterior, mas a partir de determinado momento começou a estreitar e desapareceu ..., com o jipe entalado entre capim, espinhos e árvores, tive que regressar em marcha atrás, até um desvio que dava para uma aldeia.
"Na aldeia quando perguntávamos pelas estradas que deviam existir ali, a resposta foi 'Estrada já acabou', na verdade o mato e as culturas da população tinham ocupado esse espaço, e já não existiam essas estradas... os meus 'guias' estavam tão perdidos como eu, e nem um antigo mapa que eu tinha descrevendo detalhadamente as estradas e caminhos, servia para nada" (...)
Fonte:
http://viagem2006.com.sapo.pt/Viagem.html
E a propósito, continuo à espera que o Torcato Mendonça decida "desatar o nó" da Op Lança Afiada... Não sei se ele foi ao Fiofioli, mas de todos nós que aqui escrevemos ele era o mais indicado ou o mais provável... Esteve na Op Lança Afiada, e isso dá-lhe uma autoridade que eu nem ninguém tem para falar do Fiofioli, mito e realidade... Pode ser que ele um dia desate mais um destes nós com que "amarrámos" a memória... Mas eu respeito o seu pudor... LG
Caro Rui Silva,
São com relatos operacionais de quem esteve no local, que se poderá constituir história de guerra original, relacionada com localidades, neste caso o Olossato e a sua mítica mata do Morés. Estou a tentar conjugar esses relatos numa forma cronológica, nos locais por onde passei. O Olossato foi um deles. Rui vai ao teu baú e continua a retirar de lá relatos como este, que apreciei bastante. Veremos o que dará quando os conseguir reunir.
Um abraço,
Raul Albino
Raul Albino, caro amigo e camarada: E a gente espera que continues (ou voltes) a escrever no nosso blogue... Também tens os teus fãs. E eu sou um deles... Luis Graça
Pois é ...pois é.
Já escrevi e rasguei muita folha, já apaguei (delete)alguns milhares de palavras da "lança Afiada" e do Fiofioli...mata bonita, hostital do Dr. Diaz (cubano)com enfermarias separadas e os Átilas tudo limparam. Aliás, limparam e destruíram tabancas,plantações, escolas, gados e arroz. Mas o principal cambou o Corubal, o IN teve poucas baixas. Eu acabo um apontamento desse tempo assim: -...terminou, estão felizes. Só que a guerra assim é uma merda!
Tenho ali um dossier e muita folha escrita, muita para ser sintetizada pois é o preâmbulo.Mexe com muito e eu não queria tão forte. Quando me lembrei desta série "Nós da Memória" era para a fazer nos intervalos da "Lança Afiada".
Está um escrito por acabar "dos Nós" que devia ter ido hoje. Motivos particulares não me deram a pitada de que necessito. Escrevo...porque escrevo e sempre ao correr da pena e sai...não se perde nada. Com tempo. Outros escritos irão enchendo este blogue.
Agora valores mais altos, feliz ou não, se levantam...AB T
Desculpa Rui Silva. O comentário era em resposta ao nosso Camarada e Amigo Luís Graça.Ele tem razão ...há meses e meses que tenho aquilo entre mãos...
Não o devia ter feito sem mencionar os nomes, até porque gosto das tuas "Páginas Negras com Salpicos Cor de Rosa". AB T
Caro Luís Graça e Rui Silva
Em Fevereiro de 1972 os então "piriquitos" do BART 3873 (Bambadinca)e diversos Grupos de Combate do BCAÇ3872, onde incluía o meu, estiveram envolvidos na OP "Trampolim Mágico", conforme pequeno relato que anexo do blogue da minha companhia.
"Entre 24 de Fevereiro e 26 de Fevereiro, o 2º GC (por mim comandado) e 3ºGC da CCAÇ 3491 participaram na Operação "Trampolim Mágico", na área de intervenção do BART 3873, com sede em Bambadinca, (que tinham chegado à Guiné poucos dias depois de nós - éramos todos "piriquitos") agrupados da seguinte forma:
O Grupo Castanho, formado por 4 GC da CART 3493, juntamente com o 2º e 3º GC da CCAÇ 3491;
O Grupo Laranja, formado por 4 GC da CART 3492, reforçados por 1 GC da CCAÇ 3489 e outro da CCAÇ3490;
O Grupo Amarelo, formado pelos 4 GC da CART 3494, reforçados por 2 GC da CCAÇ12;
O Grupo Preto, formado pelos GEMIL 309 e 310;
O Grupo Verde, formado pela CCP123;
Em apoio: 1 parelha de Fiats G91, 1 parelha de T-6, 2 Hélios e 1 Héli-canhão e a artilharia de uma LDG.
Os grupos Castanho e Laranja foram embarcados em LDG e desceram o Rio Geba, onde passaram um dia, desembarcando em Porto Gole. No dia seguinte, embarcámos de novo e lançados a todo o "vapor" fizémos desembarques na Ponta Luís Dias (tem o nome de um dos alferes da nossa companhia, mas não tem nada a ver com ele) e, em Tabacuta, sob o bombardeamento da aviação e da artilharia da LDG e com a presença no terreno do Comandante-Chefe, General António de Spínola. Posteriormente efectuámos acções de ataque a aldeias dominadas pelo IN, atravessando as matas do Fiofioli até Mansambo. Dada o número das nossas forças os guerrilheiros foram fugindo, deixando para trás as mulheres, as crianças e os velhos, efectuando flagelações à distância, em especial de noite, para tentar nos localizar. Nesta operação, em que estavam envolvidos batalhões recém-chegados à Guiné, houve momentos, em especial no Grupo Castanho, em virtude de termos ficado parados muito tempo ao sol (a excepção foram os nossos dois GC, que eram os últimos da coluna e que, ao nos apercebemos que iríamos ficar ali muito tempo saímos do sol, procurando abrigo na sombra das árvores) que poderiam ter dado em desgraça, face à falta de água, originando muitas evacuações por cansaço, insolação e desidratação.
A operação que implicou muitos meios não obteve os êxitos esperados, para além da destruição de locais do IN, da apreensão de diverso material e de documentação e da recuperação de população (32 pessoas) e foi mais um meio de mostrar ao IN a nossa presença na zona onde eles estavam implantados."
Rui gostei imenso de ler o teu relato dessa abordagem à mítica mata do Morés, anos antes do violento combate entre as forças do PAIGC e os Comandos Africanos.
Um abraço
Luís Dias
Um abraço
Luís Dias
Estive na operação relatada pelo Luís Dias, pertenecendo ao Grupo Laranja o que não me lembrava de todo.
O que me lembro, se a memória não me atraiçoa, é que o meu 1º Pelotão da cart 3492 foi o primeiro a desembarcar da LDG no Corubal.
Subimos um "talude" e dei de caras como Gen. Spinola e o seu adjunto, que não sei se não seria o Cap. Ayala nessa altura.
A coisa correu bem, mas tivemos efectivamente alguns problemas com a água, e ao que me lembro fomos reabastecidos da mesma por helicóptero, tendo-se gerado nessa altura uma certa confusão, por causa da ânsia de beber de alguns, rapidamente sanada.
Gostava de um dia falar contigo Luís acerca dessa operação para me lembrar de mais pormenores.
Curiosamente passados uns meses andei nas "bordas" do Morés mas já com a C. Caç. 15, da qual guardo gratas recordações.
Um abraço camarigo para todos e obrigado ao Rui Silva pelas suas memórias.
Muito me congratulo por estarem nos comentários gente do alto a "falar", (e logo um deles o chefe da Tabanca Grande);
três ilustres tertulianos a quem bato a pala.
Caro Luís:
De facto subscrevo quando dizes em título "Morés: mito ou realidade?"
Morés pode ter sido mito, pois a minha Companhia foi lá 3 vezes e...não houve refrega dura. Tímidas emboscadas e já no regresso. Numa operação -a n.º2- (Castor)trouxemos de uma arrecadação mais de uma tonelada de material. Esta operação teve honras de página inteira na revista de então "A Flama" e apenas houve um ligeiro contacto no regresso, pois, foi lá ir, colher e andar, ao contrário de outrs sítios como Iracunda, Cansambo, etc. obnde a réplica era sempre forte e demorada.
Ouvimos falar de Morés mal chegamos à Guiné, ou melhor quando em Brá soubemos que íamos para o Oio.
Assim diziam os Comandos ali instalados e já com algum traquejo da guerra: Morés era "manga di chocolat" diziam eles.
Em Bissorã ouvimos também dizer que Morés era o "Pato Bravo" da região.
Vou por aí Luís, talvez mais mito que realidade.
No entanto a aviação não parava de ir lá bombardear (?)
Caro Raul Albino:
Trilhate os mesmos caminhos que eu e estás em boa posição para falar de Morés. Atira-te.
Do baú, isto é, das minhas memórias, aqui à mão no caderno,, há mais, e também salpicos.
Caro Torcato:
Desata o nó. Tens histórias para contar! Que relutância é essa?
Fiofiol, Lança Afiada...
Obrigado por gostares das minhas "Páginas...
Um abração para os três.
Rui Silva
Quando escrevi o comentário atrás só existiam os comentários do Luís, do Raul e do T.
Não haviam outros.
Para os outros toda a minha consideração também.
Rui Silva
AI..PCA..PCA
Essa coisa do PCA não existiu na minha guerra..também pudera na minha zona não durava muito tempo lá em cima.
Sem querer ofender seja quem for, penso que foi das coisas mais idiotas que existiu durante a guerra..onde é que já se viu.. e viu-se muita vezes um "inteligente" a comandar a operação lá de cima sem fazer a mais pequena ideia das condições do terreno cá em baixo, para além de denunciar as posições das NT, o efeito surpresa era zero.
No apoio e vigilância às colunas ainda vá..só que na Guiné quando apareceram os misseis..é que a porca começou a torcer o dito.
C.Martins
Meu caro Rui Silva:
Eu sei, a culpa do erro é minha pois não respondi ao teu pedido de informação sobre a CCaç. que acompanhou a 816 na operação ÁGUIA NEGRA ( andava nas vindimas e a coisa "varreu-se-me" da ideia, devia ter respondido de imediato, desculpa).
Pois é, eu participei nesta operação, a CCaç. de Bissorã era a minha 1419, comandada pelo cap. António S. Alexandre. A CCaç.1418, referida no teu texto, estava longe em Buruntuma e Ponte Caium.
O teu relato fez-me reviver todas as peripécias do desenrolar da ação,a 1ª operação a sério em que me vi metido e onde o esforço da progressão foi tal que nunca mais tive uma com maior dificuldade.
Para finalizar, uma referência à operação Castor:
Participei nela,( outra vez a 816 + a 1419), foi um êxito estrondoso pela quantidade de material de guerra capturado e pela surpresa causada ao IN que só reagiu muito tarde, já íamos de regresso ao Olossato carregados com o resto do material que os helis deixaram no solo ( o menos valioso militarmente).
Neste regresso, já na orla da floresta mais densa, onde o caminho para o Olossato tocava em ângulo reto a velha estrada Mansabá/ Bissorã, deu-se um tremendo "fogachal", no que foi o que designas por "ligeiro contacto" (coment. atrás).
É verdade, da nossa parte ninguém ficou ferido para além de dois ou três que sofreram queimaduras nas mãos devido ao aquecimento dos tubos dos morteiros 60. Mas de "ligeiro contacto" não teve nada, foi cá um arraial de fogo de ambos os lados!...Um arraial daqueles que não se esquecem.E deste é que não me esqueci nem me esquecerei:
Toda a gente vinha carregada com material capturado.Deitado no meio da estrada, com a cabeça atrás de um grande saco de "carregadores" vazios que transportava, colei-me ao chão. (Vínhamos muito juntos e as bermas do caminho ficaram, de imediato, completamente ocupadas com "pessoal" a fazer fogo). A dado momento, apercebendo-me de fogo inimigo perto, levanto a cabeça e vejo, logo a seguir ao saco, uma rajada a picar o solo à minha frente. Saiu-me um íntimo e angustiado "ai, minha mãezinha!".
Estaria a ser um alvo? Com melhor pontaria iria ser "costurado" desde o buraco do cu até à nuca?!
Assim o sentia! (Ainda hoje tenho essa sensação quando recordo esta cena) Deve ter durado uns segundos mas para mim foi uma eternidade.E o apontador devia ser do tipo "bate e foge". Ou teria sido atingido por nós no momento em que me apontava e,por isso, errou o alvo?
Como vês, meu caro Rui,há sempre visões diferentes duma determinada situação. Militarmente, tens razão, não passou duma emboscada onde muito se "berrou" e nada aconteceu, um ligeiro contacto sem memória militar.
Pessoalmente, foi uma situação inesquecível que, para além do susto, me deu também uma ideia mais segura das fragilidades "guerreiras" do PAIGC, naquela altura.
Um grande abraço
Caro Manuel Joaquim.
Antes de todo o mais recebe um grande abraço deste teu amigo e conhecido do Oio.
E como foi bom encontrarmo-nos em Monte Real em Junho!
De facto tinha a dúvida se era a 1419 se a 1418.
Nas minhas memórias, que foram escritas na altura, escrevi a 1418 mas no relatório da companhia indica de facto a 1419. Dei primazia às minhas memórias. A certeza porém que a Companhia veio de Bissorã.
Sei que a emboscada no regresso foi muito forte mas como sairam todos ilesos... Mas tens razão, pois o fogachal foi de chamar pela mãe.
Quntas mães eram para ali chamadas!
Agradeço a tua atenção e, tudo no seu lugar.
Um abraço também para o teu "minino" guineense.
Rui Silva
Caro camarigo Rui Silva
Estes teus relatos têm uma grande virtude. 'Levam-nos' ao interior das operações. Podemos sentir o ambiente que rodeia cada momento.
Gostei bastante do que li e a avaliar pelos comentários, não fui o único.
Aproveito apenas para realçar o comentário do Manuel Joaquim naquilo que é algumas vezes o meu 'cavalo de batalha' e que é o facto de ser prudente emitirmos opinião sobre uma coisa ou acontecimento afirmando que tal é 'segundo o nosso ponto de vista' e não uma verdade absoluta pois é recorrente que duas pessoas presentes no mesmo local tenham entendimentos diferentes sobre a mesma coisa.
Abraço
Hélder S.
Amigo Rui Silva
Muita gente falou sobre Morés, mas não se esqueçam que o Bart.645-Agúias Negras ,bateu essa zona antes das vossas companhias. Para nós Morés na foi um mito, mas sim grande realidade. Lembro que de uma vez, a 15 de Agosto de 64, as Carts 642 e 644, fizeram uma cobertura á nossa entrada na casa de mato principal (Morés)juntamente com uma força de obuses 8x8.Fizemos muitas baixas ao IN devido á surpresa. Apreendemos muito material, cujas fotos possuo e também fotos dos helis a descarregar no Olossato, Mas na retirada fomos atacados 8 vezes á base de granada de mão, isto até perto do Olossato, tendo nós 14 feridos e um morto, o 1º cabo Melo, essas forças atacantes eram oriundas das casas de mato satélites.
Assim, fala-se em mito porque era dificil lá chegar, devido como já disse ás forças existentes nas casas satélites, que deviam ser umas 5. A Cart.643 atesta que era realidade.
Rogerio Cardoso
Enviar um comentário