sábado, 5 de novembro de 2011

Guiné 63/74 - P8998: As nossas queridas enfermeiras pára-quedistas (28): Comemoração dos 50 anos dos cursos de 1961 das Tropas Pára-quedistas (Rosa Serra / Maria Arminda)

1. Mensagem da nossa camarada Rosa Serra (ex-Alferes Enfermeira Pára-quedista, BCP 12, Guiné, 1969), com data de 1 de Novembro de 2011:

Caro Luís
A razão deste mail, diga-se em abono da verdade, não é propriamente o seu pé que merece toda a atenção, mas sem ofensa para o dito, o assunto é outro.

Não sei se sabe mas dia 27de outubro a U.P.P. (União Portuguesa de Pára-quedistas) fez uma comemoração a todos os pára-quedistas que fizeram 50 anos de brevêt ou seja a todos cursos de 1961, o que vem sendo um habito desta "associação" que realiza o evento na nossa unidade mãe em Tancos.

Este ano houve uma particularidade, estiveram presentes as primeiras enfermeiras pára-quedistas que ficaram conhecidas pelo curso das 6 Marias.

As nossas amigas lá estiveram a dizer bem alto "PRESENTE" juntamente com todos os militares pára-quedistas que festejaram as suas bodas de ouro.

As quatro: Maria Arminda, Maria do Céu Policarpo, Maria Ivone Reis e Maria de Lurdes Rodrigues exibiram as suas boinas verdes e os seus brevêts. A Maria Zulmira e a Maria Nazaré foram representadas uma pelo seu irmão José André e outra pela sua filha.

A Maria Arminda fez um discurso. Se achar bem poderá ser publicado no nosso blogue juntamente com a noticia, se não concordar já sabe é só apagar sem qualquer problema.

Um abraço com desejo de boas melhoras.
Rosa Serra


As famosas finalistas com o seu director de curso


Tancos, 8 de Agosto de 1961 > Da esquerda para a direita: Maria do Céu, Maria Ivone, Maria de Lurdes, Maria Zulmira, Maria Arminda e o Capitão Fausto Marques (Director Instrutor).
Nota: Falta a Maria da Nazaré que torceu um pé no 4.º salto e só viria a acabar o curso alguns dias depois.


DISCURSO DO 50.º ANIVERSÁRIO DO 1.º CURSO DE PÁRA-QUEDISMO PARA ENFERMEIRAS

Ex. Senhor General Almendra
Senhores Oficiais Generais
Senhores Instrutores e Monitores
Minhas Senhoras e Senhores
Camaradas

Estamos hoje na Casa Mãe das Tropas Pára-quedistas a comemorarmos conjuntamente homens e mulheres, os cinquenta anos dos nossos Cursos de Pára-quedismo.

Seria mais uma comemoração igual às que anteriormente se efectuaram, com grande significado por certo para todos os que nelas estiveram incluídos, se acaso não tivesse ocorrido um acontecimento que se tornou histórico e que veio acrescentar um significado muito especial, para quase todos em geral, os que no decurso do ano de 1961 ingressaram na vida militar e em particular nesta Unidade.

Foi um ano relevante para os Governantes Portugueses, para as nossas Forças Armadas e para um grande número de cidadãos que repentinamente viu alterado o seu quotidiano, na sequência das constantes mobilizações para fazer frente ao conflito em que o país necessitou de se envolver, o que por certo não foi esquecido, nem o esquecerão jamais no decurso das suas vidas todos os que nele, de uma forma ou outra, marcaram presença e em especial, aqueles que puseram as suas vidas ao serviço de outros, “Os Combatentes”.

Foi o início da que então se veio a designar entre outras, por “Guerra do Ultramar”, com o massacre das populações indefesas no Norte de Angola, que se transformou posteriormente numa guerra de guerrilha, estendendo-se rapidamente aos territórios da Guiné e Moçambique, que tendo durado treze anos como todos sabemos, deixou profundas marcas na sociedade portuguesa e sequelas num elevado número dos ex combatentes.

Foi também um ano marcante na vida das mulheres, que pela primeira vez davam entrada numa Instituição militar para prestarem serviço, no âmbito da sua especialidade profissional de Enfermeiras.
Recordar o papel que as mulheres desempenhavam na sociedade de então e tentar fazer a comparação com os dias de hoje, é simplesmente surreal.

Nos anos sessenta as mulheres desempenhavam tarefas domésticas, ajudavam o cultivo da terra, operárias fabris, funcionárias dos serviços públicos e poucas prosseguiam os estudos nas universidades.

O homem era o centro das decisões, chamado a prestar serviço militar obrigatório, senhor do poder absoluto no seio da sua família, sendo à mulher reservado o papel de dona de casa, educadora dos filhos e poucas mais tarefas de relevo lhes eram atribuídas ou permitidas.

Situando-nos nessa época e aos seus costumes, seria pouco provável e até mesmo impensável, que algum dia poderiam cruzar a porta de armas de uma qualquer unidade militar, mulheres, que ao lado dos homens, viessem a receber instrução para desempenho de uma actividade, e aí permanecessem como militares.

Não havendo uma lógica aparente para ser dado esse gigantesco passo, a criação de um grupo que viria a frequentar o 1º Curso de Pára-quedismo para Enfermeiras, foi sem dúvida uma decisão superior, que após os acontecimentos de Março de 1961 em Angola, com inúmeros mortos e feridos, pôs em marcha um projecto inovador e o consequente virar de página da nossa história militar.

Não podemos esquecer nesta decisão, o arrojo do então Tenente-coronel Kaúlza de Arriaga, nas funções de Sub-Secretário de Estado da Aeronáutica, que apresentou ao Presidente do Conselho de Ministros, Dr. Oliveira Salazar, um plano para a criação nesse Ramo Militar de um grupo de mulheres enfermeiras, sediado no Batalhão de Caçadores Pára-quedistas em Tancos.

Foi nesse “Corpo de Forças Especiais,” que o mesmo criara em 1955 e que lhe oferecia a confiança necessária para o êxito da sua proposta, que a 26 de Maio de 1961, as onze candidatas, entraram pela primeira vez num quartel, para fazerem os seus testes psico-físicos.

O consentimento do Dr. Oliveira Salazar foi importante e decisivo, mas a conjugação de esforços no sentido de se efectivar tal projecto, teve também a anuência das chefias Militares, sobretudo dos Comandos das respectivas Unidades, Batalhão de Caçadores Pára-quedistas e Base Aérea nº.3.

Convêm também relembrar neste processo, a importância da Sr.ª. Dª Isabel Bandeira de Mello, conhecida entre nós por Isabelinha Rilvas, à época a primeira Pára-quedista da Península Ibérica, em ceder ao Tenente-Coronel Kaúlza de Arriaga, a documentação relativa aos treinos que executavam as “Enfermeiras do Ar”, pertencentes à Cruz Vermelha Francesa.

A Isabelinha como colega e amiga da maioria das candidatas que integraram esse primeiro curso, teve também a sua quota-parte de influência, na decisão em aceitarem esse desafio.

Pela primeira vez iam ser treinadas em Portugal, mulheres para Pára-quedistas. A sua preparação teve início a 6 de Junho/61 e terminou a 8 de Agosto, com a conquista da tão almejada boina verde e brevê, que lhes conferiram o título pelo qual passaram a ser designadas, “ As Enfermeiras Pára-quedistas”.

Para se chegar a esse dia, foi preciso percorrer um duro e difícil caminho; vencer barreiras a que não estávamos habituadas, ultrapassar receios e preconceitos, superar debilidades físicas, momentos de fadiga, desânimo e medo do fracasso. Porém entrámos determinadas e convictas de que poderíamos chegar ao fim.
Aceitámos voluntariamente esse grande desafio, de trocar a nossa vida rotineira, tranquila e profissionalmente estável, por outra que imaginávamos ser mais agitada, mas da qual não sabíamos como iria decorrer.
Éramos jovens, e como tal generosas e aventureiras.

Sabíamos que numa terra distante, parte do nosso vasto território ultramarino que apenas conhecíamos dos bancos da escola, tinha havido uma chacina de brancos e negros, portugueses em Angola e que repentinamente foram enviados militares, para a defesa das populações.

Não ficámos indiferentes e aceitámos o convite que nos foi formulado, deixamos as nossas famílias, e colegas de trabalho, projectos de vida em curso, e partimos para África e a par com os nossos militares, socorrer a quantos de nós necessitassem.

Nessa caminhada nunca estivemos sós. Desde o primeiro dia em que entrámos nesta Unidade, contámos com a compreensão e ajuda entre outros do nosso instrutor e director do curso, o então Capitão Fausto Marques, e o monitor, Sargº Jacinto Carneiro. Todos se foram habituando à nossa presença e nos foram aceitando, até mesmo os que já se encontravam mobilizados em África, que sem nos conhecerem, quando lá chegámos na primeira missão, nos receberam com o maior carinho e aceitação, o que veio a acontecer posteriormente, com muitos outros camaradas da Força Aérea.

Sentimos e constatámos que ao longo dos anos e pelas unidades por onde passámos, ganhámos amigos, deixámos marcas da nossa presença e muitos foram, os que também nos marcaram.

Passámos a ter outra família para além da biológica. Interiorizamos a sua mística e hoje sentimos que fazemos parte desta “GRANDE FAMÍLIA PÁRA-QUEDISTA” cujo lema, a todos recorda, “OS QUE NUNCA POR VENCIDOS SE CONHEÇAM”.

Recordamos com saudade todos os que já partiram e com quem convivemos, em especial e porque é o 1 º Curso, no que respeita às enfermeiras, que estamos a comemorar, que quero neste momento relembrar, as nossas colegas Mª da Nazaré e a Mª Zulmira que connosco fizeram parte do “GRUPO DAS SEIS MARIAS”, e que nos deixaram uma profunda saudade e muita pena por não estarem connosco, neste dia.

Hoje à distância de meio século, todos nos apercebemos de como foi importante para a emancipação das mulheres e posteriormente para os consequentes ingressos das mesmas, nos três Ramos das nossas Forças Armadas, o ter existido na Força Aérea um grupo de Enfermeiras Pára-quedistas.

Camaradas Amigos

Cinquenta anos, passado na vida de todos nós e uma parte no meio militar, é algo que não pode nem foi por certo esquecido, por quantos nos Pára-quedistas, de boina verde e asas ao peito, serviram PORTUGAL.
E citando o nosso poeta maior

“HONRA-SE A PÁTRIA DE TAL GENTE”

Setúbal, 26 de Outubro de 2011
Maria Arminda Santos
Ex-Tenente Pára-Quedista
____________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 3 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P8990: As nossas queridas enfermeiras pára-quedistas (27): Missão à Índia (II parte) (Maria Arminda)

3 comentários:

Marques disse...

*** Não estou a conseguir fazer o post funcionar, peço desculpa pelo spam***
Caros amigos
Deixo aqui este comentário porque acabei de ver a Enf/paraquedista Maria Arminda na televisão, dizendo que uma das suas primeiras missões foi socorrer um acidente de aviação no Chitado onde todas as vitimas se encontravam carbonizadas. Sou familiar do Ten Cor oliv. Marques falecido no acidente de aviação do Chitado em 1961, que julgo ser o mesmo a que a enf/paraq se referia. Muito pouco sei sobre este acidente e muito pouco me foi transmitido. Apenas sei que esse acidente ceifou a vida a mais de 18 pessoas entre eles o meu avô e o seu filho menor. gostaria de junto da enf Maria Arminda saber onde e como posso ter mais informações a respeito deste acidente. Com os meus cumprimentos

Carlos Vinhal disse...

Pede-se ao autor do comentário o favor de indicar o seu contacto electrónico, se preferir de modo sigiloso, para luisgracaecamaradasdaguine@gmail.com
Carlos Vinhal
Co-editor

Anónimo disse...

Camarada Marques. Efectivamente, fui ao Chitado após o acidente. Tivemos para saltar para procurar esse avião, duas enfermeiras a Mª de Lurdes Rodrigues e eu, o médico também paraquedista, Henrique Soudo, integrados num pelotão de paraquedistas. A bordo do avião que nos transportava, tivemos conhecimento que o avião sinistrado, tinha sido encontrado e não havia sobreviventes. Contudo fui integrada num grupo de peritos técnicos da F.Aérea, que levava o médico chefe, Dr João Varela, já falecido) e pilotos entre eles o então Ten Vito Negrão.Tive ocasião de ir mesmo ao local, mas os corpos já tinham sido retirados para Sá da Bandeira onde fomos na missão de reconhecimenro e infelizmente também reconheci um. O que vi marcou-me para toda a vida e por isso não mais esqueci.
Quanto ao teor da missão desconheço. Apenas ouvi falar de uma reunião, no Sul de Angola.De que se tratava desconheço. Só a FA. talvez nos seus registos lhe poderá dizer. Vi e sei que o avião depois de embater com uma asa numa árvore muito alta caiu a pique e estava muito prestes a aterrar. Encontrava-se talvez de meio a um Kilómetro na posição transversal à pista. Estava de nariz enfiado no chão, cauda no ar. tinha as duas asas, mas a parte principal toda ardida. Acompanhei as exéquias em Luanda e depois a esposa de um dos pilotos, o Sargº Correia. As outras viuvas e familiare(filhos), foram acompanhadas, para Lisboa pelas enfermeiras Mª de Lurdes e Mª Zulmira. Os netos do General Francisco Chagas, filhos do outro piloto, o Tenente Chagas, foram acompanhados para Lisboa pela minha colega Mª da Nazaré. Eu depois de chegar do Chitado fiquei sozinha em Luanda a acompanhar as esposas dos pilotos que se recusaram a partir com as outras senhoras, antes dos corpos chegarem a Luanda. Infelizmente só a viuva que depois acompanhei para Lisboa é que assistiu à cerimónia porque se deu outro infeliz acontecimento, que por não ter interesse para o amigo, não o conto neste momento. Todos estes acontecimentos fizeram com que eu dormisse sempre de luz acesa até regressar a Luanda e só a apagasse depois de nos juntarmos as quatro enfermeiras, que fomos as primeiras a prestar serviço em Angola.