1. Uma das versões sobre a tragédia de Fajonquito, ocorrida no domingo de Páscoa, de 2 de abril de 1972, já aqui nos foi contada pelo José Cortes, ou melhor, foi-me contada de de viva voz, ao telefone, pelo José Cortes e reproduzida por mim (*).
Recorde-se que o José Corttes [, foto atual à direita], vive em Coimbra, trabalhou como técnico de manutenção nos SUCH [, Serviços de Utilização Comum dos Hospitais] e foi fur mil at inf Inf da CCAÇ 3549/BCAÇ 3884, Fajonquito, 1972/74, a companhia que foi render a CART 2742 de que o cap art Carlos Borges de Figueiredo foi comandante até 2/4/1972.
Recorde-se que o José Corttes [, foto atual à direita], vive em Coimbra, trabalhou como técnico de manutenção nos SUCH [, Serviços de Utilização Comum dos Hospitais] e foi fur mil at inf Inf da CCAÇ 3549/BCAÇ 3884, Fajonquito, 1972/74, a companhia que foi render a CART 2742 de que o cap art Carlos Borges de Figueiredo foi comandante até 2/4/1972.
O José Cortes falou-me com emoção desses tempos da Guiné. Ele próprio tem um filho que foi paraquedista e esteve em missões de paz (por ex.,Timor, Bósnia). Mas, como muitos outros camaradas, queixa-se de que nem sempre a família tem pachorra para ouvir as suas recordações da Guiné. Uma das que está bem presente na sua memória é a da morte do capitão e mais três ou quatro militares da companhia (a CART 2742, Fajonquito, 1970/72) que eles foram render.
Recorde-se que a CART 2742, comandada pelo cap art Carlos Borges de Figueiredo e, posteriormente, pelo alf mil art Baltazar Gomes da Silva, era uma unidade orgânica do BART 2920, mobilizada em Penafiel no Regimento de Artilharia Ligeira n.º 5, tendo assumido a responsabilidade do subsector de Fajonquito, rendendo a CCaç 2436, em 13 de Agosto de 1970, e vindo a ser substituída pela CCaç 3549 em 21 de Maio de 1972..
Recorde-se que a CART 2742, comandada pelo cap art Carlos Borges de Figueiredo e, posteriormente, pelo alf mil art Baltazar Gomes da Silva, era uma unidade orgânica do BART 2920, mobilizada em Penafiel no Regimento de Artilharia Ligeira n.º 5, tendo assumido a responsabilidade do subsector de Fajonquito, rendendo a CCaç 2436, em 13 de Agosto de 1970, e vindo a ser substituída pela CCaç 3549 em 21 de Maio de 1972..
O José Cortes tinha-me prometido contar essa história,k por escrito, mas só não o fez o fez por, alegadamente, ter "fraco jeito para a escrita". Aqui vai, pois, a sua versão oral (*):
(i) havia um soldado da CART 2742 que, uma vez terminada a comissão, queria ficar na Guiné como civil;
(ii) ao que parece o cap art Carlos Borges Figueiredo manifestou, desde logo, a sua firme oposição à ideia do soldado, de resto contrária a todo o bom senso e sobretudo ao RDM: ter-lhe ditro;: "se viesrte comigo, voltas comigo!";
(iii) em consequência, as relações entre o soldado da CART 2742 e o seu comandante tornaram-se conflituosas; neste contencioso, foi envolvido também o primeiro sargento;
(iv) a mulher do capitão havia mandado, da metrópole, "dez quilos de amêndoas" (sic) para distribuir pelo pessoal da companhia; a distribuição foi feita pelo próprio comandante, no refeitório, no domingo de Páscoa, 2 de Abril de 1972;
(v) quando chegou a vez do soldado em questão, o capitão terá passado à frente, num ato que aquele interpretou como de intolerável discriminação;
(vi) o soldado levantou-se, sem pedir a licença a ninguém, e saiu do refeitório; dirigiu-se ao seu abrigo (ou à sua caserna) e veio para a parada com "duas granadas de mão já descavilhadas", uma em cada mão (umna cena digna dos filmes do Faroeste);
(vii) foi direito à secretaria: o primeiro sargento ter-se-á apercebido, a tempo, das malévolas intenções do soldado, tendo-se posto a salvo em bom tempo;
(viii) no interior da secretaria, estavam o capitão, um alferes e um furriel; ninguém sabe o que se terá passado lá dentro; o soldado terá deixado cair as duas granadas, descavilhadas; o teto da secretaria foi pelos ares; lá dentro ficaram 4 cadáveres
(ix) mortos, em 2/4/1972, todos do Exército, por acidente (sic), constam os seguintes nomes, na lista dos Mortos do Ultramar da Liga dos Combatentes:
- Alcino Franco Jorge da Silva, fur mil;
- Carlos Borges de Figueiredo, cap art;
- José Fernando Rodrigues Félix, alf mil;
- Pedro José Aleixo de Almeida, sold básico.
(x) sabemos que o sold básico Pedro José Aleixo de Almeida era natural de Portel, em cujo cemitério local repousam os seus restos mortais; foi o protagonista desta trágica história (fonte: Portal Ultramar Terraweb > Os mortos em campanha do BART 2920, 1970/72);
(xi) por sua vez, o alf mil art op esp José Fernando Rodrigues Félix era de Moimenta da Beira em cujo cemitério local está sepultado:
(xii) o cap mil art Carlos Borges de Figueiredo era natural de Vila Pouca de Aguiar; a sua última morada era Meadela, Viana do Castelo, possivelmente a terra da sua esposa;
(xiii) por último, o fur mil Alcino Franco Jorge da Silva também era de op esp, sendo natural de Carcavelos. Cascais; está sepultado no cemitério de S. Domingos de Rana;
(xiv) não sabemos o que faziam os dois rangers na secretaria, possivelmente terão vindo em auxílio do capitão com a intenção de desarmar o militar, o sold básico Pedro José Aleixo de Almeida, que trazia consigo as duas granadas descavilhadas (ou só uma, segundo outras versões), pronto possivelmente para acaber com a sua vida e de quem mais se lhe atravessase no caminho;
(xv) o José Cortes fala em cinco mortos, mas tudo indica que sejam apenas os quatro que constam da lista da Liga dos Combatentes;
(xvi) li, em tempos, que o caso foi também utilizado pelo serviço de propaganda do PAIGC (nomeadamente pela "Maria Turra", da Rádio Libertação) para desmoralizar as tropas portuguesas: há um documento do PAIGC, no Arquivo Amílcar Cabral, no portal Casa Comum, desenvolvido pela Fundação Mário Soares (FMS), que faz referência ao sucedido, e e que de momento não consigo localizar;
(xvii) o facto de o insólito caso ter ocorrido em Fajonquito, na fronteira com o Senegal, significa que foi de imediato conhecido da população local, das autoridades do Senegal e do PAIGC; o nosso Cherno Baldé, na altura com 10/11 anos, faz referência, num dos seus postes a este trágico "acidente", que ocorreu a 100 metros, quando ele estava a brincar com outros putos na parada (**);
(xviii) gostaríamos de ter outras versões deste acontecimento; infelizmente não temos ninguém, na nossa Tabanca Grande, da CART 2742 / BART 2920; julgo que seja difícil, ainda hoje, aos camaradas da CART 2742 abordar esta história, tão trágica quanto absurda...
Infelizmente, este caso não foi único no TO da Guiné: o acesso fácil a armas de guerra e a usura física e mental da guerra ajudam também a explicar estes surtos de violência patológica que, de tempos a tempos, ocorriam nas nossas fileiras.
Quantos suicídios terão havido no CTIG, ao longo da guerra ? Quantos homícídios terão ocorrido, dentro das NT ?
Na lógica da hierarquia militar, estes casos eram eufemistica e hipocriticamente tratados como "acidentes com armas de fogo" (sic).... E assim ficarão, para a história - como acidentes, inexplicáveis - , se não houver da parte dos contemporâneas e das testemunhas presenciais destes casos a vontade de contribuir, com depoimentos em primeira mão, para o seu esclarecimento...
Intrigam-nos casos como este. O que podia levar um militar português a querer ficar na Guiné, na vida civil ?
- Podia não ter ninguém à sua espera, na sua terra, não ter família, não ter amigosM;
- podia, por qualquer razão, querer esquecer a sua origem ou condição;
- podia estar perdido de amores por alguma bajuda;
- podia estar pura e simplesmente deprimido ou psicótico...
Um indivíduo deprimido ou psicótico pode facilmente perder a noção do perigo, ficar indiferente a uma situação de perigo imediato e iminente, e até desejar a sua própria morte. Não nos parece ter sido uma acção premeditada, pensada e amadurecida a frio... Em princípio, foi uma acção precipitada, irreflectida, impulsiva. O tal "acto de loucura" da "vox populi"...
A ser verdade que o capitão deliberadamente ou não discriminou o soldado, aquando da distribuição das amêndoas, isso poderá ser sido "a gota de água" que transformou um conflito disciplinar num massacre... No final da comissão de uma companhia, na festa do em que se celebrava o dever cumprido, no domingo (afinal, sangrento) de Páscoa de 2 de Abril de 1972...
3. Comentário do nosso leitor (e camarada) Carlos Gomes (*):
3. Comentário do nosso leitor (e camarada) Carlos Gomes (*):
Gostava de comentar o drama da Páscoa de 72 em Fajonquito. Longe de mim fazer juizos de valores, de quem quer que seja, nem fomentar polémicas. Da CCS do BART 2920 fui destacado como enfermeiro para a CART 2742, sediada em Fajonquito, no periodo de 2 dezembro 70 a 20 maio de 71. Por conseguinte um ano antes do trágico acontecimento [2/4/1972]. Se bem me lembro, foi nesse periodo que também chegou o sold Almeida à CART 2742. Dizia-se que ele vinha dos comandos, expulso ou castigado.
Conheci o Almeida quase de imediato, pois ele tinha problemas de pele em várias partes do corpo que passei a tratar. Passado algum tempo apercebi-me que ele, Almeida, tinha algumas pertubações a nivel emocional. Não esqueço a forma maliciosa como a rapaziada o apelidava ou tratava: Almeida, "apanhado, bate mal da bola, maluco"...
O Almeida estava sempre a alinhar nas saídas para o mato, dava para perceber que as relações com o comandante da companhia não eram das melhores. Lembro um episódio em que o Almeida lavava os dentes à porta da camarata e o cap Figueiredo lhe chamar a atenção para o que estava a fazer, o que gerou entre ambos alguma discussão.
Como é óbvio, tambem conheci o cap Figueiredo, algumas vezes lhe prestei assistência. Homem possante e de elevada estatura, era um eximio jogador de futebol de salão. Pelo que sei era militar de carreira (e não miliciano). As suas atitudes na liderança da companhia, em vez de gerar confiança, tinham o efeito contrário. Eu sempre que podia, evitava-o...
2 de Abril de 1972: Tragédia. Pelos relatos que me chegaram, o Almeida passou-se de todo, queria o ajuste de contas com o capitão e o primeiro sargento...Com uma granada na mão, descavilhada, entra na secretaria onde pretende ficar com o capitão e o sargento. O alf Alcino e o furriel Félix tentaram demover o Almeida. Disse-se que o Almeida gritou para que eles saíssem, ao alferes e ao furriel, o que não fizeram ou não tiveram tempo de o fazer. Quanto ao sargento, talvez só ele possa dizer como escapou.
As razões para este acto tavez no concreto nunca se venham a saber, mas duma coisa tenho eu a certeza: actos como estes e tantos outros que aconteceram nesta guerra, não aconteceram por acaso (...)
4. Comentário do Cherno Baldé (**)
(..:) Depois do "acidente" ou melhor do homicidio, a versão que circulou e ficou até hoje entre a população nativa é bem diferente daquela que estou a ler agora na maior parte dos comentários.
Pela versão que prevaleceu entre nós, alegadamente, o soldado Almeida estava revoltado por não poder voltar à sua terra após várias comissões de serviço, em virtude de um castigo a que estava sujeito e tinha decidido acabar com a sua vida e com ele, também, a do comandante da companhia. Claro que isto faz parte dos rumores que circularam, na ausência de informações oficiais, na altura.
Quero dizer a quem me quiser ouvir, e isto por minha conta, que o Almeida era um soldado "profissional" muito aguerrido que dificilmente poderia levar uma vida civil pacata no meio indígena ou gerindo uma lojeca ou um restaurante para servir a malta europeia numa cidade qualquer da Guiné.
Quero dizer a quem me quiser ouvir, e isto por minha conta, que o Almeida era um soldado "profissional" muito aguerrido que dificilmente poderia levar uma vida civil pacata no meio indígena ou gerindo uma lojeca ou um restaurante para servir a malta europeia numa cidade qualquer da Guiné.
O Almeida não era um soldado vulgar e via-se claramente que no se tinha integrado na companhia dos restantes soldados milicianos aos quais ele nutria muita pouca consideração e/ou respeito.Tão pouco se podia integrar no meio dos pretos, embora se identificasse com eles. Penso que, antes de mais, o nosso amigo Ameida (ele era de facto um amigo e defensor das crianças que frequentavam o aquartelamento, ai de quem se atrevesse a fazer mal a uma criançaa na sua presença!) deve ter sido mais uma das inúmeras vitimas daquela guerra terrível. (..)
Guiné > Região de Bafatá > Fajonquito > CART 2742 (1970/72) > "Fajonquito em festa... Com a CART 2742 (1970-72) o ambiente entre a tropa e a população melhorou bastante, atingindo níveis nunca antes vistos. A foto de 1971 (amigavelmente enviada pelo ex-Furriel Mil. José Bebiano), mostra uma calorosa recepção de um grupo de artistas vindos da metrópole para animar a malta. Ao meio e ao lado de uma das artistas pode-se ver o nosso saudoso Cap Carlos Borges de Figueiredo. O rapazinho nas mãos do homem dos óculos escuros é o Carlitos, filho de um soldado português que, mais tarde, iria à procura do pai, tendo aquele recusado o encontro à última da hora. O ex-Furriel José Bebiano, que era de rendição individual, tendo feito toda a sua comissão em Fajonquito poderia, eventualmente, identificar os soldados que acompanham o seu Comandante nesta foto." (Foto de José Bebiaao; legenda de Cherno Baldé).
5. Cherno Baldé > Homenagem póstuma ao Cap Carlos Borges de Figueiredo (**)
(...) Em 1970 chegou uma nova companhia (CART 2742 do Cap Figueiredo) e com ele inaugurou-se o período mais profícuo e dinâmico de Fajonquito. Nessa altura sentiu-se, de facto, que a Guiné estava a mudar e positivamente. Foi nessa altura, também, que acabei por me fixar no quartel como faxina num dos quartos da ferrugem (condutores), onde tinha a clara consciência de estar no meio de amigos, mas nem por isso isento de perigos. Sentia-me a vontade quando estava na caserna com os meus amigos condutores, mas sempre vigilante quando deambulava sozinho dentro do quartel. A idade, o stress provocado pela guerra, as saudades da terra natal e, provavelmente, o sentimento de impunidade por actos considerados menores, propiciavam alguns exageros em forma de brincadeira que não eram sancionados. Claro está que, salvo raras excepções, normalmente os lobos não se comem uns aos outros.
O Cap Figueiredo baniu a proibição da entrada no quartel, abriu as portas aos meninos, mas como contra partida pediu para que todos fossem à escola depois das horas de trabalho de faxina. Não era agradável, mas compensava. Pela primeira vez, foram colocados postes de iluminação na rua principal da vila, para alegria da criançada. Os oficiais da companhia davam apoio aos professores locais dentro e fora das aulas, com modalidades de futebol e ginástica. Foi instituída uma merenda para todos os alunos e prémios aos que se distinguiam nas aulas e nos exames finais, por exemplo, a participação nos campos de férias da Mocidade Portuguesa.
Muitas das pessoas que hoje são quadros nacionais na Guiné-Bissau têm uma dívida de gratidão aos soldados portugueses que, como o Cap Figueiredo e o grupo dos seus oficiais e sargentos, contribuíram para a sua formação de base.
Guiné > Região de Bafatá > Fajonquito > CART 2742 (1970/72) > "Fajonquito em festa... Com a CART 2742 (1970-72) o ambiente entre a tropa e a população melhorou bastante, atingindo níveis nunca antes vistos. A foto de 1971 (amigavelmente enviada pelo ex-Furriel Mil. José Bebiano), mostra uma calorosa recepção de um grupo de artistas vindos da metrópole para animar a malta. Ao meio e ao lado de uma das artistas pode-se ver o nosso saudoso Cap Carlos Borges de Figueiredo. O rapazinho nas mãos do homem dos óculos escuros é o Carlitos, filho de um soldado português que, mais tarde, iria à procura do pai, tendo aquele recusado o encontro à última da hora. O ex-Furriel José Bebiano, que era de rendição individual, tendo feito toda a sua comissão em Fajonquito poderia, eventualmente, identificar os soldados que acompanham o seu Comandante nesta foto." (Foto de José Bebiaao; legenda de Cherno Baldé).
5. Cherno Baldé > Homenagem póstuma ao Cap Carlos Borges de Figueiredo (**)
(...) Em 1970 chegou uma nova companhia (CART 2742 do Cap Figueiredo) e com ele inaugurou-se o período mais profícuo e dinâmico de Fajonquito. Nessa altura sentiu-se, de facto, que a Guiné estava a mudar e positivamente. Foi nessa altura, também, que acabei por me fixar no quartel como faxina num dos quartos da ferrugem (condutores), onde tinha a clara consciência de estar no meio de amigos, mas nem por isso isento de perigos. Sentia-me a vontade quando estava na caserna com os meus amigos condutores, mas sempre vigilante quando deambulava sozinho dentro do quartel. A idade, o stress provocado pela guerra, as saudades da terra natal e, provavelmente, o sentimento de impunidade por actos considerados menores, propiciavam alguns exageros em forma de brincadeira que não eram sancionados. Claro está que, salvo raras excepções, normalmente os lobos não se comem uns aos outros.
O Cap Figueiredo baniu a proibição da entrada no quartel, abriu as portas aos meninos, mas como contra partida pediu para que todos fossem à escola depois das horas de trabalho de faxina. Não era agradável, mas compensava. Pela primeira vez, foram colocados postes de iluminação na rua principal da vila, para alegria da criançada. Os oficiais da companhia davam apoio aos professores locais dentro e fora das aulas, com modalidades de futebol e ginástica. Foi instituída uma merenda para todos os alunos e prémios aos que se distinguiam nas aulas e nos exames finais, por exemplo, a participação nos campos de férias da Mocidade Portuguesa.
Muitas das pessoas que hoje são quadros nacionais na Guiné-Bissau têm uma dívida de gratidão aos soldados portugueses que, como o Cap Figueiredo e o grupo dos seus oficiais e sargentos, contribuíram para a sua formação de base.
O meu caso não é paradigmático porque fui obrigado a ir às aulas que detestava com todas as minhas forças, mas a teimosia dos meus pais, em particular a minha avó, e também, porque o quartel já não servia de refúgio aos refractários, tinha que cumprir as condições do nosso Capitão, depois pouco a pouco o meu horizonte que antes estava confinado à vida da minha aldeia e arredores, foi-se abrindo as maravilhas da ciência e do mundo externo.
Mas como se costuma dizer, Deus escreve direito por linhas tortas, porque, depois de tudo o que fizeram por nós, estava predestinado que ele e parte dos seus oficiais nunca voltariam à sua terra natal. Eis a razão desta homenagem, também, ao Cap Carlos Borges de Figueiredo.
A toda a sua família e aos que o conheceram ou partilharam parte da sua vida e do seu percurso, quero expressar, em meu nome pessoal e em nome de todos os habitantes de Fajonquito, os meus sentimentos de pesar, mesmo que tardios e enaltecer o comportamento do Cap Figueiredo, como homem e como militar que, a justo título, foi um comandante exemplar para a sua época, que veio, sem medo, para o cenário da guerra trazendo consigo a semente da paz; que sem descurar a defesa dos seus homens, transformou as operações militares em operações para a promoção do desenvolvimento; acreditou na capacidade dos mais novos para a construção de uma Guiné melhor sem esquecer a sabedoria dos mais velhos; que investiu parte dos poucos recursos de que dispunha numa derradeira tentativa de construção dos fundamentos do homem novo que a Guiné tanto precisava.
Carlos Borges de Figueiredo foi oficial e comandante que compreendeu como poucos e soube executar com mestria a nova filosofia que o Gen Spínola queria com a sua politica "Por uma Guiné Melhor” (...)
6. Comentário de António Bernardo [nosso leitor e camarada, mas não registado na Tabanca Grande; pertenceu à CCS/BART 2920]
Muito embora, seja um dos melhores textos do Cherno Baldé (**), o mesmo peca por um retrato falseado, no que respeita ao cap art Carlos Borges de Figueiredo, cmdt da CArt 2742, sedeada em Fajonquito e subunidade do BArt 2920 (1970/72).
Mas como se costuma dizer, Deus escreve direito por linhas tortas, porque, depois de tudo o que fizeram por nós, estava predestinado que ele e parte dos seus oficiais nunca voltariam à sua terra natal. Eis a razão desta homenagem, também, ao Cap Carlos Borges de Figueiredo.
A toda a sua família e aos que o conheceram ou partilharam parte da sua vida e do seu percurso, quero expressar, em meu nome pessoal e em nome de todos os habitantes de Fajonquito, os meus sentimentos de pesar, mesmo que tardios e enaltecer o comportamento do Cap Figueiredo, como homem e como militar que, a justo título, foi um comandante exemplar para a sua época, que veio, sem medo, para o cenário da guerra trazendo consigo a semente da paz; que sem descurar a defesa dos seus homens, transformou as operações militares em operações para a promoção do desenvolvimento; acreditou na capacidade dos mais novos para a construção de uma Guiné melhor sem esquecer a sabedoria dos mais velhos; que investiu parte dos poucos recursos de que dispunha numa derradeira tentativa de construção dos fundamentos do homem novo que a Guiné tanto precisava.
Carlos Borges de Figueiredo foi oficial e comandante que compreendeu como poucos e soube executar com mestria a nova filosofia que o Gen Spínola queria com a sua politica "Por uma Guiné Melhor” (...)
6. Comentário de António Bernardo [nosso leitor e camarada, mas não registado na Tabanca Grande; pertenceu à CCS/BART 2920]
Muito embora, seja um dos melhores textos do Cherno Baldé (**), o mesmo peca por um retrato falseado, no que respeita ao cap art Carlos Borges de Figueiredo, cmdt da CArt 2742, sedeada em Fajonquito e subunidade do BArt 2920 (1970/72).
É bom lembrar que, embora ostentasse galões nos ombros, era um homem boçal, diria mesmo que labrego, igual a muitos outros que comandavam outros homens.
A sua personalidade conflituosa levou ao ajuste de contas, ocorrido no domingo de Páscoa,de 2 de Abril de 1972, e aqui já abordado no post 5938 (*)
António Bernardo
[CCS/BART 2920, Bafatá, 1970/72]
______________
Notas do editor:
(*) Vd. poste de 6 de março de 2010 > Guiné 63/74 - P5938: A tragédia de Fajonquito ou as amêndoas, vermelhas de sangue, do domingo de Páscoa de 2 de Abril de 1972 (José Cortes / Luís Graça)
(**) Vd. poste de 18 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4550: Tabanca Grande (153): Cherno Baldé (n. 1960), rafeiro de Fajonquito, hoje engenheiro em Bissau...
(**) Vd. poste de 15 de agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13500: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (47): Retrato de uma família - A guerra, a pobreza e a presença dos soldados portugueses
Vd. também poste de 24 de abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6244: Memórias do Chico, menino e moço (Cherno Baldé) (14): Cap Figueiredo: Capiton Lelö dahdè ou capitão cabeça inclinada
(...) "O que vou dizer pode parecer paradoxal se não incongruente. O Sr. Carlos Borges de Figueiredo, ao contrário de muitos outros, foi um Capitão pacifista pois ele tinha-se distinguido, sobretudo, pela promoção da educação entre as crianças nativas (o número de alunos na escola local tinha aumentado significativamente facto que poderia estar ligado ao ambiente de paz criado e uma grande sensibilidade pelos problemas sociais da população) e organização de eventos sócio-culturais que, não só afastavam, por algumas horas, o espectro da guerra e da morte entre a tropa mas eram também muito úteis e importantes na construção de relações de aproximação e de confiança com a populaçã local, tão prezada por General Spínola.
Foi nessa altura que, pela primeira vez, recebemos a visita de grupos musicais vindos da metrópole. Numa dessas visitas, lembro-me da presença de uma ou mais mulheres cantavam o Fado. A música era muito morna, lenta demais para o nosso gosto temperado na ritmada, quase violenta dança de tambor mandinga. No meio de tudo isso, não nos escapou um detalhe importante. Notamos a deferençaa e o extremo respeito com que todos a(s) tratavam. O respeito dado àquela(s) mulher(res) contrastava de forma flagrante com a maneira como habitualmente lidavam com as nossas mulheres, fossem elas grandes ou pequenas. E não estou a referir-me, claro esta, à esposa do Capitão que, também, deve ter visitado Fajonquito.
Ele ficou conhecido no meio da populacao local com o nome de Capiton Lelö dahdè o que na lingua fula significa o Capitão cabeça inclinada. Talvez aqueles que o conheceram de perto me possam corrigir, parece que ele tinha o hábito de inclinar ligeiramente a cabeça para um dos lados, daí o nome com que o baptizaram e que fica para a historia." (...)
4 comentários:
Caros amigos,
Obrigado a todos pela recepcao positiva do texto sobre a minha familia onde aproveitei, tambem, para agradecer ao soldado portugues, atraves da CART 2742 e do seu comandante, pelo trabalho positivo desenvolvido, por alem da Guerra.
O Antonio Bernardo nao esta de acordo e acha que o retrato eh falseado, opiniao que nao partilho mas respeito, porque cada um tem a sua visao das coisas e tem direito a sua propria opiniao.
No entanto, duvido que ele tenha conhecido o Cap. Figueiredo de perto, fazendo parte da CCS/BART com sede em Bafata.
O soldado Almeida nao sendo do corpo original da CART 2742, eh logico que o Cap. Figueiredo nao o poderia dizer: "Se vieste comigo, voltas comigo".
Se o Cap. Figueiredo era bocal ou labrego, nos nunca o soubemos porque nao testemunhamos nenhum acto de violencia contra os seus homens com os quais jogava futebol, amiude.
Nao obstante, sabemos que o comportamento de alguns comandantes, sobretudo em zonas isoladas nem sempre era o melhor e o soldado Inacio diz mesmo no seu diario, a respeito da sua companhia em Fajonquito: "estamos em terra de ninguem".
O amigo C. Martins resume bem o conteudo do meu texto quando diz: "Benevolencia tua...a realidade era muito mais dura". Claro que era, meus amigos, estavamos num territorio em Guerra, e ela nao se faz, nunca se fez com mimos e o respeito dos direitos humanos em geral e muito menos individuais.
Ao amigo Jorge Cabral, quero dizer "Djarama!", porque o seu texto falava dos fulas de forma que eu considerei desmerecida e paguei na mesma moeda. "O branco que veja se o desterro eh bom". De resto continuo a fazer parte dos seus fas e admiradores, embora tenha produzido pouco nos ultimos tempos. Deve ser da crise.
O amigo JLFernandes continua o mesmo sentimentalao, grande apaixonado e amigo da Guine.
Um grande abraco a todos,
Cherno AB.
Um abraco amigo a todos
Caros camaradas
Já aquando anteriormente este melindroso assunto foi aqui abordado não me atrevi a produzir grandes considerações.
Não o presenciei, não fui testemunha (embora a data 'encaixe' no período da minha comissão, que foi de Novembro de 70 a Novembro de 72, nessa altura estava na Metrópole, em vésperas de casamento, que ocorreu a 5 de Abril), não me chegaram quaisquer 'ecos', nem mesmo na "Escuta" aonde regressei no meio de Abril.
Os pormenores, os 'pequenos pormenores' aqueles de seriam duas granadas, afinal era uma, 'vieste comigo, voltas comigo' afinal, 'não veio comigo', etc., são irrelevantes para a realidade: um soldado, num determinado dia, num determinado local, num determinado momento, por um pretexto qualquer, resultado de desequilíbrio momentâneo ou de 'rebentamento' motivado pela última 'gota de água' estoira (literalmente) com a sua vida e de mais outros, entre os quais o Cmdt. da Unidade a que pertencia.
O que se pode dizer?
O óbvio! Uma consequência lógica ditada pelas circunstâncias e pelo ambiente vivido, no espaço e no tempo. Ou a "culpa", em última instância, não terá sido a guerra? O estar ali, naquele ambiente, com a (in)capacidade para lidar com os problemas que se colocaram?
Podem dizer que muitos mais estiveram lá, muitos mais tiveram problemas e não os 'resolveram' à granada, o que é verdade, mas naquele caso... não foi!
Abraços
Hélder S.
Podia ter personalidade, podia não aceitar que um qualquer militar interferisse na sua vida quando acabasse de cumprir o serviço militar, que convém recordar que era obrigatório, podia achar que seria ali que poderia ser feliz. Podia tanta coisa. Reconheço que não fazia a mínima ideia de que terminada a comissão a que estávamos sujeitos que o comandante de companhia podia decidir pela permanência ou regresso ao continente de um qualquer subordinado. Mas sei, pelo que me foi dado ver, pela na 1ª companhia onde estive, CCAV 3404, que o alguns conflitos era "sanados" ou "resolvidos" à chapada, felizmente nenhum dos atingidos reagiu, o que também me fazia espécie.
A limites e penso que muitas vezes foram ultrapassados, penso que este foi um caso desses. A falta de preparação pedagógica era evidente.
João Silva
Conheci o Capitão figueiredo em 1970, marido de uma antiga professora ( Dr. Rosa Pinheiro) do ensino secundário. Em 22 Dezembro de 1971 embarquei para a Guiné e dias antes a Srª professora cruzou comigo numa das ruas da minha cidade e pediu-me para levar uma encomenda para o marido mas, isso não veio a acontecer, estava na expetativa de passar o natal e dois dias antes fui informado da partida .
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