terça-feira, 28 de julho de 2015

Guiné 63/74 - P14942: (Ex)citações (287): Um telefonema complicado com final feliz… (Augusto Silva Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Augusto Silva Santos (ex-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73), com data de 21 de Janeiro de 2014:

Olá Camarada e Amigo Carlos Vinhal
Espero que esteja tudo bem contigo e família.
Faz tempo que não dava o meu contributo para uma publicação na Tabanca, razão pela qual e, aproveitando o tema em referência, aqui vai algo que, contado a esta distância no tempo, parece um pouco descabido, mas este foi um acontecimento que nunca esqueci pelos vários envolvimentos.

Um forte abraço,
Augusto Silva Santos


Um telefonema complicado com final feliz…

Durante a minha passagem pelo BCAÇ 3833 / CCAÇ 3306, mais propriamente por Jolmete e, após termos tido um forte contacto com o IN na “famosa” zona de Badã em 04-03-1972, muito perto da não menos “famosa” zona de Ponta Matar, contacto esse do qual infelizmente resultou em 10 feridos para as nossas tropas (alguns dos quais com bastante gravidade), tendo eu escapado ileso por “milagre”, senti nos dias posteriores uma forte necessidade de contactar / falar com os meus entes queridos.
Importa salientar que os deuses nesse dia estiveram de facto comigo… Só me lembro de ter sido projectado pela acção do sopro de um rebentamento de RPG, de ter batido numa palmeira, e ter caído em cima de um soldado, sem ter sido atingido por qualquer estilhaço, portanto sem qualquer ferimento, sorte que infelizmente não tiveram os camaradas feridos que estavam perto de mim.

Dado que tal contacto telefónico não seria possível de realizar, nem em Jolmete nem no Pelundo, restava a alternativa de tentar fazer o mesmo em Teixeira Pinto, o que não era de todo fácil de concretizar.

Assim, cerca de um mês depois, aproveitando uma coluna para o Pelundo, ofereci-me para essa deslocação, primeiro para dar um forte abraço ao meu irmão que estava naquela localidade na CCAÇ 3307 e, depois, para ver então a hipótese de me deslocar a Teixeira Pinto nesse dia para concretizar o meu segundo objectivo.
Azar… Nesse dia, no distante mês de Abril de 1972, já não estava programada mais nenhuma deslocação do Pelundo para Teixeira Pinto. Perante o meu desespero / desânimo e, sem que eu estivesse à espera, aparece o meu irmão com um jeep (ele era Furriel Mecânico Auto da sua Companhia), meteu-me nele e, apenas com uma G3, lá fomos os dois direitos a Teixeira Pinto / Estação dos Correios.

Aproveito para juntar duas fotos que testemunham tal acontecimento, a primeira tirada no varandim da dita estação dos CTT, e a segunda na estrada em frente, ambas com data de Abril 1972.

 Teixeira Pinto, Abril de 1972 - Estação dos Correios

Teixeira Pinto, Abril de 1972

Após algum tempo de espera dado o improviso (não estava programada qualquer chamada), lá consegui que me fizessem um pouco à sorte a ligação, mas finalmente consegui falar com os meus pais, algo que obviamente fiz com muita dificuldade dado o embargo da voz.

Acabámos depois por ir comer umas rolas na “tasca” do Jaime, situação mais ou menos habitual naquelas paragens.

Costuma-se se dizer, “tudo bem quando acaba em bem”, pois tanto na ida como no regresso não tivemos qualquer mau encontro, mas foi uma aventura mais ou menos perigosa, pois o normal era que estas deslocações se realizassem com uma escolta.

E tudo isto por causa da necessidade de um telefonema…

Como explicar isto à geração actual, cujas facilidades de comunicação hoje em dia, são o que são?
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Nota do editor

Último poste da série de 23 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14925: (Ex)citações (286): Fiz um telefonema surpresa para o meu irmão, no dia e hora do seu casamento, em 16/10/1971, em Guimarães...Tive que marcar a chamada oito dias antes, na casa do régulo de Bula que servia de posto dos CTT... (António Mato, ex-alf mil MA, CCAÇ 2790, Bula, 1970/72)

5 comentários:

Manuel Resende disse...

Amigo Augusto, deixa-me ser o primeiro a comentar, ou o segundo , se alguém premir o gatilho antes de mim. De Novembro de 1969 até 20 de Abril de 1970, horrivel data do assassinato dos oficiais do CAOP e outros acompanhantes, houve de facto uma paz plena na nossa zona, zona de Teixeira Pinto, Bula e Cacheu, estávamos nós e eles proibidos de abrir fogo em caso de nos encontrar-mos. Nessa fase era frequente viagens entre Pelundo e Teixeira Pinto, sozinhos e sem arma. Quem me contou isto, de viva voz, foi o Alf. Mosca, um dos assassinados e que era da minha companhia, talvez em Janeiro ou Fereveiro de 1970, altura em que tive de ir ao Pelundo (uma semana) por questões de saúde.
Como deves compreender a partir dessa data recomeçou o "inferno" na zona. É logico que um ou dois anos depois as coisas tenham voltado ao nornal, mas... ... tudo isto para te dizer que houve um grande risco no que fizeste (fizeram) e eram logo dois irmãos.
Um abraço amigo
Manuel Resende

Anónimo disse...

De: Augusto Silva Santos
Para: Manuel Resende

Antes de mais Manuel, muito obrigado pelo teu oportuno comentário.
Sim de facto foi uma perfeita estupidez o que na altura fizemos, felizmente sem consequências. São as loucuras do momento e da juventude...
Na altura (1972), este tipo de deslocações (sem escolta) de e para Teixeira Pinto estavam "oficialmente proibidas". Faziam-se sempre (ou quase sempre)com escolta e mais ou menos programadas. Era frequente ver-se no Pelundo camaradas dos Páras e dos Comandos, mas até mesmo eles vinham sempre com uma escolta mínima. Talvez por nunca ter havido registo de qualquer problema nessas deslocações, tenhamos arriscado.
Um forte abraço.

Luís Graça disse...

Depois dos 6 meses (período em que éramos "piras"), valia tudo... Ganhávamos a ilusão de que éramos imortais, invulneráveis, e que a sorte estava sem,opre do nosso lado. "A sorte protege os audazes", é o lema dos "comandos"...

Quem não arriscou, uma ou mais vezes, a sua segurança (e a dos outros) que mande a primeira pedra. Fui uma vez sozinho ao Xime, numa "Daimler", só com o condutor e o nosso puto, "mascote", o "Tchombé"... Fui lá beber uma cerveja e voltei, a Bambadinca, sem escolta, apenas com uma G3 e a metralhadora da "Daimler"... Fui pela estrada nova, que a TECNIL, do Rosinha, estava a abrir, mas que estava longe de star concluída... Ainda lhe faltava muita coisa, a começar pelo alcatrão... O Augisto Silva Sanmtos "arriscou" por uma boa causa, um bom motivo, eu arrisquei gratuitamente...

Hélder Valério disse...

Caros amigos

Hoje, a esta distância, dois tipos de sentimentos podem ocorrer para quem lê estas 'aventuras'.
Uma das reacções possíveis tem a ver com aqueles que não conheceram os locais, os ambientes, o enquadramento da situação, quer porque não estiveram 'lá', em tempo, quer por serem mais novos e não conseguirem percepcionar o que é o que é relatado tem de extraordinário.
Por muito que se esforcem (e algumas vezes esse esforço é tentado) não é facilmente 'visionável' o que é isso de demorar uma manhã para fazer 3 km, porque é que se "tem de atravessar uma bolanha", com água pelo peito e os pés em lamas em vez de ir a pé enxuto, o que é isso de 'conviver' com milhares de mosquitos vorazes, formigas, baratas, etc....
Outra reacção possível tem a ver com aqueles que 'estiveram lá' e que ou podem 'compreender' perfeitamente, comentando que se estava 'apanhado pelo clima', que seria uma 'bravata' qualquer, ou então considerar que foi uma acção inconsciente e perigosa, que felizmente correu bem.

Como diz o Luís, afinal quem é que, em algum momento, não se achou acima dos problemas?
Tenho lido por aqui em textos, em comentários e também em livros que muita coisa desse género foi feita.

Como também já por aqui escrevi, também me deu um dia para ir de motorizada até Nhacra, visitar o meu amigo Furriel Bento que estava por lá numa Companhia que tinha vindo do Olossato, companhia do então Capitão Mário Tomé e Alferes Salgado. Até João Landim sem qualquer problema mas daí até Nhacra foi aventureirismo, tanto mais que depois disso, em outra tentativa que fiz, só enquadrado em coluna militar.

Caro Augusto, já passou! Foi por uma 'boa causa' e teve um 'final feliz'!
A prudência manda dizer: "fizeste mal, foi um risco desnecessário"... pois foi, mas é isso, "foi", já passou, e também como se costuma dizer ... "mais vale um gosto que 3 vinténs"...

Hélder S.

Anónimo disse...

De: Augusto Silva Santos
Para:Luís Graça e Hélder Valério

Caros amigos, muito obrigado pelas vossas palavras amigas de compreensão / solidariedade.
Um grande e forte abraço para ambos.