Comentários ao poste P15378 (*):
1. Abílio Magro ex-fur mil amanuense, CSJD/QG/CTIG (Bissau, 1973/74)
Os processos eram instruídos nas Companhias e, de acordo com o respectivo "instrutor", a caracterização era efectuada na CSJD/QG/CTIG. [CSJD = Chefia do Serviço de Justiça e Disciplina],
Na CSJD/QG/CTIG, face aos factos constantes do processo (reais ou não) era emitido o respectivo parecer.
´
Para ficarem com uma ideia de como a "coisa" funcionava, quero referir o assédio de que fui alvo, em Setembro de 1974, por parte de alguns Capitães Milicianos, comandantes das Companhias que tinham regressado a Bissau e que aguardavam embarque para a Metrópole.
E o assédio tinha em vista a minha colaboração diária (nocturna e paga) a fim de os ajudar na conclusão dos vários processos pendentes na Unidade, sem o que esta não poderia embarcar, denotando os Capitães Milicianos, portanto, algum desconhecimento da matéria em causa.
Noutras circunstâncias tê-los-ia ajudado, com muito gosto e "sem honorários", mas acontecia que eu também estava ansioso para "bazar dali" e, naquela altura, chegava ao fim do dia cansado de tanto queimar papelada e, com o calor das chamas e a fumaça, tinha sempre a garganta seca.
O problema creio que estaria na separação entre combate e... acidente.
Não espero, nem faria sentido, aparecerem hoje os coronéis reformados a dizer que, quando eram capitães (ou alferes), tinham mentido, tinham feito "batota".
No meu Batalhão houve dois casos complicados. O alferes Queiroz (CCAÇ 2616, Buba), morto a levantar uma mina, junto ao quartel, creio que foi considerado em combate. Já o furriel Ferreira, da mesma companhia, morto a levantar uma mina, na estrada Buba-Nhala, terá sido considerado acidente.
Mas creio que os investigadores dos factos e as testemunhas dos mesmos, agiam sempre de acordo com a legislação.
5. Luís Graça / José Marcelino Martins:
E os suicídios, Luís?
Nota do editor:
Supõe-se que muitos dos "instrutores" nada sabiam das consequências futuras para os militares ou seus familiares, pelo modo pouco rigoroso como era instruído o processo. Por outro lado, outros "instrutores", bem mais preparados e conhecedores destes "meandros", lá conseguiam "dourar a pílula", escondendo habilmente alguns factos e, assim, conseguir algum benefício para o militar atingido ou acometido de doença.
Na CSJD/QG/CTIG, face aos factos constantes do processo (reais ou não) era emitido o respectivo parecer.
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Tenho a ideia, não a certeza, que o relato das testemunhas era manuscrito pelo instrutor (Alf. Mil, por norma) e as testemunhas não assinavam, ficando o instrutor responsável por elas. Neste contexto, o processo podia muito bem ser conduzido para o lado mais conveniente, houvesse vontade e engenho para isso.
Para ficarem com uma ideia de como a "coisa" funcionava, quero referir o assédio de que fui alvo, em Setembro de 1974, por parte de alguns Capitães Milicianos, comandantes das Companhias que tinham regressado a Bissau e que aguardavam embarque para a Metrópole.
E o assédio tinha em vista a minha colaboração diária (nocturna e paga) a fim de os ajudar na conclusão dos vários processos pendentes na Unidade, sem o que esta não poderia embarcar, denotando os Capitães Milicianos, portanto, algum desconhecimento da matéria em causa.
Noutras circunstâncias tê-los-ia ajudado, com muito gosto e "sem honorários", mas acontecia que eu também estava ansioso para "bazar dali" e, naquela altura, chegava ao fim do dia cansado de tanto queimar papelada e, com o calor das chamas e a fumaça, tinha sempre a garganta seca.
2. Luís Graça [editor, ex fur mil, arm pes inf, CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71]
Não deixa de ser significativo que mais de um terço (22 em 59, ou seja, 37%) dos respondentes ao inquérito 'on line' desta semana, tenham optado pela resposta "Não sei / não tenho opinião"...
A questão é técnica e juridicamente complexa... Poucos de nós, ao fim e ao cabo, lidaram com este problema... Temos, muitos de nós, a experiência das "baixas", dos camaradas que morreram ou foram feridos... Não sabemos, em muitos casos, como é que o processo burocrático se desenrolou, seguindo os trâmites normais da justiça militar...
A alguns de nós causa estranheza ou provoca até revolta ao vermos, nas listas oficiais dos mortos na guerra do ultramar, camaradas nossos, que conhecemos, como o Quaresma, da CART 2716 (Xitole, 1970/72), terem morrido por "acidente"...
A alguns de nós causa estranheza ou provoca até revolta ao vermos, nas listas oficiais dos mortos na guerra do ultramar, camaradas nossos, que conhecemos, como o Quaresma, da CART 2716 (Xitole, 1970/72), terem morrido por "acidente"...
O Quaresma morreu por estar numa zona de guerra e todos os dias armadilhar e desarmadilhar o engenho explosivo colocado numa das entradas do quartel, para a malta poder dormir "mais descansada"... E quantos casos não houve como o do Quaresma ?! Ora é preciso que estes casos venham à luz do dia!...
Se houve "batota", não tive conhecimento.
Os três mortos da minha Companhia, a CCAÇ 2615, foram todos mortos em combate e todos eles considerados como tal.
O problema creio que estaria na separação entre combate e... acidente.
Não espero, nem faria sentido, aparecerem hoje os coronéis reformados a dizer que, quando eram capitães (ou alferes), tinham mentido, tinham feito "batota".
No meu Batalhão houve dois casos complicados. O alferes Queiroz (CCAÇ 2616, Buba), morto a levantar uma mina, junto ao quartel, creio que foi considerado em combate. Já o furriel Ferreira, da mesma companhia, morto a levantar uma mina, na estrada Buba-Nhala, terá sido considerado acidente.
Mas creio que os investigadores dos factos e as testemunhas dos mesmos, agiam sempre de acordo com a legislação.
4. Carlos Vinhal [, editor, ex-fur mil art MA, CART 2732, Mansabá, abril de 1970/março de 1972]
No caso das minas, normalmente a diferença entre morto por acidente ou em combate dependia de a mina ser "amiga" ou do IN.
Na minha Companhia, o Alferes de Minas e Armadilhas morreu ao tentar neutralizar uma mina AP inimiga, sendo considerado morto em combate. Naturalmente, diria eu.
Um camarada, por ironia do destino impedido na Messe dos Oficiais, quando se dirigia para um abrigo para entrar de reforço, caiu abaixo do Unimog, sendo considerado morto por acidente.
Acho que não haveria muita batota, existiriam por vezes situações dúbias que cada um classificava como queria. Os afogados, por exemplo, mesmo a fugir do IN, eram mortos em combate ou por acidente?
Veja-se mais este caso, infeliz, já aqui abordado no blogue:
7 de agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2035: Alf Mil Guido Brazão, da CCAV 2748/BCAV 2922, morto em acidente com arma de fogo, Canquelifá, 22/10/70 (José M. Martins)
(...) 8º VOLUME – Mortos em Campanha
Tomo II
Guiné – Livro 1
1ª Edição (2001) Página 553 (2º registo)
Nome - Guido Ponte Brazão da Silva
Posto - Alferes Miliciano de Cavalaria – Operações Especiais
Numero - 19769668
Unidade - Companhia de Cavalaria n.º 2748
Unidade Mobilizadora - Regimento de Cavalaria n.º 3 – Estremoz
Estado Civil - Solteiro
(...) Freguesia - São Vicente
Concelho São Vicente – Madeira
Local de Operações - Camamelifén [, deve ser gralha: Canquelifá]
Data do Falecimento - 22 de Outubro de 1970, em Canquelifá
Causas da morte - Acidente, com arma de fogo
Local da sepultura - Cemitério da Ajuda – Lisboa
7 de agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2035: Alf Mil Guido Brazão, da CCAV 2748/BCAV 2922, morto em acidente com arma de fogo, Canquelifá, 22/10/70 (José M. Martins)
(...) 8º VOLUME – Mortos em Campanha
Tomo II
Guiné – Livro 1
1ª Edição (2001) Página 553 (2º registo)
Nome - Guido Ponte Brazão da Silva
Posto - Alferes Miliciano de Cavalaria – Operações Especiais
Numero - 19769668
Unidade - Companhia de Cavalaria n.º 2748
Unidade Mobilizadora - Regimento de Cavalaria n.º 3 – Estremoz
Estado Civil - Solteiro
(...) Freguesia - São Vicente
Concelho São Vicente – Madeira
Local de Operações - Camamelifén [, deve ser gralha: Canquelifá]
Data do Falecimento - 22 de Outubro de 1970, em Canquelifá
Causas da morte - Acidente, com arma de fogo
Local da sepultura - Cemitério da Ajuda – Lisboa
Observações: Accionamento de granada – armadilha IN
E os suicídios, Luís?
Tive um no meu Pelotão, mas desconheço como foi classificado...
Abraço.
J.Cabral
J.Cabral
____________
Nota do editor:
Último poste da série > 18 de novembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15378: Inquérito 'on line' (18): Fazia-se 'batota' com as nossas baixas ? (i) "O embaratecer da guerra levava a que se tentasse reduzir o dispêndio com o pagamento de pensões" (António J. Pereira da Costa); (ii) "Teria de haver sempre duas testemunhas que confirmassem os factos ocorridos e cujas declarações tinham de ser devidamente ajuramentadas" (Abílio Magro)
6 comentários:
Sim, Jorge, já aqui abordámos a questão do suicídio e do homicídio... E houve, de facto, vários casos no TO da Guiné.
É um tema delicado tanto para os camaradas como sobretudo para as famílias... Desconhecia o caso que se passou no teu pelotão, e que lamento. Não sei como a justiça militar lidava com estes casos... Eufemisticamente, tratava-se de "acidenets com arma de fogo"...
Temos que aprofundar o tema...
No blogue há o marcador "suicídio", já com uma dúzia de referências...
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/search/label/suic%C3%ADdio
Gabriel Tavares
Admira-me que fosse norma as testemunhas não assinarerm o respectivo depoimento. A ser assim esse de inquirição não tinha valor. Se por acaso a testmunha não soubesse ou não pudesse assinar era aposta no local da assinatura a respectiva impressão digital. Acontecia quando por exemplo se tratava de militar das milícias. No final do auto do inquirição o instrutor na designação mais moderna,na altura também designado por oficial averiguante fazia constar que uma fórmula que rezava mais ou menos isto. E mais não disse. E sendo-lhe lido o seu depoimento o achou conforme, ratificou e vai assinar ou não assina por não saber ou poder. E se houvesse escrivão, caso dos autos de ccorpo de delito , este dava fé de que tudo se passou conforme nele fica referido. Não vejo razão para que no CTI GUINÉ fosse diferente. E na CSJ/QG/CTI aceitavam essa irregularidade?
Gabriel Tavares
Vd poste de 29 DE JUNHO DE 2010
Guiné 63/74 - P6658: Lista alfabética dos 75 alferes mortos no CTIG, 54 (72%) dos quais em combate (Artur Conceição)
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2010/06/guine-6374-p6653-lista-alfabetica-dos.html
De um total de 75 alferes do exército que morreram no TO da Guiné, ao longo da guerra...
(i) 54 (72%) foram mortos em combate (C);
(ii) os restantes morreram devido a acidente (A) (n=20) (26,7%):
(iii) há apenas 1 morto, entre os alferes, no CTIG, por doença (D) (1,3%).
Dois, pelo menos, que me recorde, foram mortos por subordinados... Eram comandantes de pelotões de caçadores nativos...
Um deles foi o alf mil António Jorge Cristóvão Abrantes, da CART 3493 / BART 3873... Foi nomeado comandante de um pelotão independente, conforme o António Duarte já aqui recordou: "Fruto de uma discussão com um soldado africano, foi 'varrido' com uma rajada de G3. Era de Viseu e filho de um oficial do quadro, suponho oriundo de sargento”. Aconteceu esta tragédia em 18 de setembro de 1972... Causa da morte: acidente.
Segundo a história da unidade, foi “abatido ao efetivo” da CART 3493 / BART 3873 em outubro de 1972. Não se sabe quando tinha sido transferido para o Pel Caç Nat (cujo nº desconheço),
O outro caso é o do alf mil Nuno Gonçalves da Costa, natural de Arcos de Valdevez. Sabemos agora, através do Fernando Araújo, fur mil op esp, que esse infortunado camarada terá sido morto, "traiçoeiramente", a sangue frio, à queima-roupa, " com 3 tiros de G3", disparados por um militar do seu Pel Caç Nat 51, sediado em Jumbembem, setor de Farim, que não acatou o castigo (um reforço) que lhe imposto pelo seu comandante).
A data fatídica foi em 16 de Julho de 1973. Os seus restos mortais repousam no cemitério da sua freguesia natal, São Jorge.
Quem o foi substituir foi o nosso hoje ortopedista Francisco Silva, na altura era alferes miliciano, da CART 3492, que esteve no Xitole. O Francisco Silva revelou-me, em tempos, que o alferes Nuno Gonçalves Costa "era um tipo bom de mais, com problemas para impor a sua autoridade ao pelotão (que era etnicamente heterogéneo, e tinha um historial de problemas de disciplina)"...
Curiosamente na história da unidade, o BART 3873, não há nenhuma referência ao Francisco Silva, que devia ser de rendição in dividual, nem muito menos à data da sua transferência para o Pel Caç Nat 51... Em suma, o Francisco Silva passou, como um fantasma, pela CART 3492.
Outra situção no m+inimo insólita e revoltante... A tragédia de Fajonquito...
Quatro mortos, assassinados por um trsloucado, em 2/4/1972... OFicialmente morreram por acidente (sic), conforma constaq lista dos Mortos do Ultramar da Liga dos Combatentes
- Alcino Franco Jorge da Silva, Fur
- Carlos Borges de Figueiredo, Cap
- José Fernando Rodrigues Félix, Alf
- Pedro José Aleixo de Almeida, Sold
A categoria "acidente" era um saco sem fundo, onde cabiam todos os casos, exceto doença e morte em combate... Acidente de viação, de lazer, afogamento, suicídio, homicídio, etc.
Vd. poste de 6 DE MARÇO DE 2010
Guiné 63/74 - P5938: A tragédia de Fajonquito ou as amêndoas, vermelhas de sangue, do domingo de Páscoa de 2 de Abril de 1972 (José Cortes / Luís Graça)
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2010/03/guine-6374-p5938-tragedia-de-fajonquito.html
Vd.poste de 27 DE ABRIL DE 2014
Guiné 63/74 - P13054: Aqueles que nem no caixão regressaram (8): Terão morrido, no CTIG, entre 1963 e 1974, 143 combatentes nossos, por afogamento (6,9% do total de mortos) (José Martins)
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2014/04/guine-6374-p13054-aqueles-que-nem-no.html
(...) Não há uma estatística acerca dos desaparecidos por afogamento. Nas estatísticas que anexo das três frentes, não se “vislumbra” onde foram incluídos estes camaradas.
Baseio esta opinião no facto de, em 1969, ter havido, num único afogamento, 47 mortes [, no desastre do Cheche, Rio Corubal, 6/2/1969, Op Mabecos Bravios].
Se observarmos, na Guiné, no ano de 1969, temos [, vd. quadro acima]:
Mortes em combate > 119
Acidente com arma de fogo > 31
Acidente de viação > 14
Outras causas > 43
Só poderiam “caber” em combate, mas nota-se que o nº de mortos em combate (119) “está em linha com os anos anteriores” e “não difere muito" dos anos seguintes. (...)
Comentário de 27/4/2014, do António J. Pereira Costa, ao poste P13054:
(...) Segundo se dizia na altura os mortos e feridos por "acidente com arma de fogo" incluíam os mortos e feridos com a manipulação de minas e armadilhas. Se em relação às inimigas, creio que a classificação estaria incorrecta e, por isso, creio que não se verificava, já em relação aos "acidentes com arma de fogo" na montagem de minas e armadilhas por parte das NT, deveriam ser considerados como ocorridos em combate. Hoje creio que é difícil separar uma coisa da outra. (...)
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2014/04/guine-6374-p13054-aqueles-que-nem-no.html
Um Ab.
António J. P. Costa
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