segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Guiné 63/74 - P16371: (In)citações (97): Ainda a história (verdadeira) da Cadi... Tive um grande orgulho quando a população de Bigene, em peso, se veio despedir de mim à pista, com lenços no ar e lágrimas nos olhos (Adão Cruz, ex-alf mil médico, CCAÇ 1547/BCAÇ 1887, Canquelifá e Bigene, 1966/68)

(i) Comentário de Adão Pinho da Cruz, médico cardiologista, ex-alf mil médico, CCAÇ 1547/BCAÇ 1887, (Canquelifá e Bigene, 1966/68) (*):

Caro Cherno Baldé, muito prazer em falar contigo. Tratemo-nos por tu, pois assim é que deve ser, e é muito mais democrático.

Muito obrigado pelos oportunos esclarecimentos, que registarei, pois estamos sempre a aprender. Sim,  meu caro Cherno Baldé, a história da Cadi, rigorosamente verdadeira, é enternecedora e constitui um marco indelével, de relação humana, na minha vida de homem e de médico. 

Como tu dizes, não seria fácil acontecer noutras terras, mas ali em Bigene, e um pouco pela minha acção, passe a presunção e a vaidade, a tropa e a população eram quase uma família. Como médico fiz tudo o que pude, como militar, nada de relevante. Até era tido como subversivo. A minha "bíblia" era o livro "Os Condenados da Terra" (Les Damnés de la Terre) de Frantz Fanon. 

O comandante de batalhão gostava muito de mim, mas dizia que eu parecia um médico de asilados, ao que eu respondia: meu comandante, eu fui feito médico civil e não militar

Mais uma vez perdoa-me a vaidade, mas tive um grande orgulho quando a população de Bigene, em peso, se veio despedir de mim à pista, com lenços no ar e lágrimas nos olhos. O próprio piloto da avioneta confessou-me que nunca tinha visto tal coisa e deu meia dúzia de voltas no ar antes de subir. Talvez o Cherno tenha razão, só num ambiente destes a história da Cadi poderia ter acontecido. (**)

Um grande abraço do Adão

8 de agosto de 2016 às 11:24
 

(ii) Comentário de Cherno AB:

Caro amigo Adão Cruz,

Obrigado por fazeres fé na minha observação, como sempre digo aos meus amigos do Blogue, eu fui um simples faxina no quartel, melhor dizendo, "um rafeiro de quartel",  como haviam muitos, mas que durou por mais de 4 anos e que me deu a possibilidade de observar e de questionar muitas coisas que se passavam ao meu redor.

Sensibilizou-me bastante a descrição que acabas de fazer sobre os prisioneiros (***), facto verídico que eu posso confirmar pela minha própria experiência no quartel onde passei a minha infância.

Um abraço amigo,

Cherno Baldé

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 8 de agosto de  2016 > Guiné 63/74 - P16369: Em, bom português nos entendemos (14): a história da Cadi do dr. Adão Cruz e a expressão em crioulo "ka-misti" ou "n'ka-misti"(não quero) (Cherno Baldé, Bissaau)

(**) Último poste da série > 15 de julho de 2016 > Guiné 63/74 - P16306: (In)citações (96): Nova Lamego, 15 de novembro de 1970, uma das noites mais longas das nossas vidas... Nós, miúdos, achamos que os nossos pais não choram, mas eu sei que também se chora em silêncio e sem lágrimas.... (Adelaide Barata Carrêlo, filha do ten SGE Barata, CCS/BCAÇ 2893, 1969/71)

(***)  Vd.poste de 6 de agosto de 2016 > Guiné 63/74 - P16363: Os nossos médicos (88): Os prisioneiros (Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547)

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