1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau,
1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados, entre
outros, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:
Desafio do tempo
Sobraram bolas de pedra, perdidas nos montes.
Quem as deixou?
Cravadas no chão, contemplam o sol e a chuva.
Desfiam as horas dum rosário sem fim.
Porque chamaram a um, no caminho para a escola, "O penedo que fala"?
Se vestem de musgo e eras.
Escavam pedreiras, expostas à força de guilhos.
Servem as pedras dos muros, casebres e casas.
Esteios delgados sustentando ramadas de amoras e vinho.
Assinalam passadas de fenícios e gregos.
Encheram as costas dos mares com padrões e cruzes.
As marcas da história. Que o tempo jamais consegue apagar...
Berlim, 24 de Maio de 2019
10h29m
Jlmg
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Depois da trovoada e chuva grossa...
Um tapete denso de raminhos e folhas verdes cobria o chão de terra negra.
A água fugira já, deixando rastos de poças humedecidas, com arcos amarelos, de pequeninas pétalas.
Poisadas nas ramagens que vêm do chão, reluziam pérolas faiscando ao sol.
Um casal de cisnes deixou o lago, atraiçoando o bando e subiu no canal.
Devora não sei o quê, mergulhando o bico. Mas deve ser bom...
Em passadas curtas, seguem risonhos, os meninos da escola, com seus parentes.
E, ao colo das mães muçulmanas, vão os pequeninos que as creches ajudam a criar.
Pelo leito da estrada, deslizam em incessante correria, os carros e as carrinhas que fazem de tudo.
Está fresco o ar.
Nada melhor que uma passeata ao pé de casa, no amanhecer do dia.
Ouvindo Martha Argerich - Chopin: Piano Concerto No. 1 in E minor, Op. 11 (2010)
Berlim, 21 de Maio de 2019
9h5m
Jlmg
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Um manto de luz
Um manto radioso de luz cobre o casario da cidade.
Se infiltra entre a ramagem dos bosques e chega ao chão.
Ao sabor da brisa terna deambulam como balões os grãos de pólen.
Sem saberem onde vão ficar.
Um bando de corvos esvoaçam ferozmente sobre as alturas das ramagens. Parece o fim do mundo.
Assustados os passaritos se escondem, à pressa, onde podem.
Sorumbáticos os diversos brinquedos do parque infantil, aguardam desejosos que venha a pequenada.
O areal ainda ostenta os sulcos das derradeiras pazadas que ali deixaram.
A trave longa de madeira do baloiço está poisada a norte sobre a roda dum pneu.
A roldana presa à estrutura do escorrega espera que se encha o balde de areia para subir.
À volta estão vazios os bancos das mamãs e das educadoras do jardim infantil.
Os meus olhos, de repente, foram atacados pelo reflexo ofuscante do sol na vidraça do prédio em frente.
Uma boa maneira de correr comigo e me mandar para casa...
Berlim, 19 de Maio de 2019
8h48m
Lindo dia de sol
JLmg
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Nota do editor
Último poste da série de 19 de maio de 2019 > Guiné 61/74 - P19803: Blogpoesia (620): "Cordas e laços", "Princesa do mar" e "Aspirar sempre ao melhor...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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