Foto nº 1 > Rio Grande de Buba. o cais e a maré a encher (*)
Foto nº 2 > Rio Grande de Buba, Buba, 1974, a partida da LDG 105 Bombarda (que também navegava no Rio Geba)
Foto nº 3 > Rio Grande Buba, Buba, 1974 > A ingrata missão do meu Grupo: carregar do chão os víveres a granel para as viaturas. (**)
Algumas das melhores fotos do Rio Grande de Buba... Álbum do António Murta, ex-alf mil inf, Minas e Armadilhas, 2.ª CCAÇ / BCAÇ 4513 (Aldeia Formosa, Nhala e Buba, 1973/74).
Fotos (e legendas): © António Murta (2015). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Guiné > Região de Quínara > Buba > Rio Grande de Buba > 1974
1. Comentário do nosso camarada Juvenal Danado, professor (que julgamos aposentado), a viver em Setúbal, onde colabora com alguma regularidade no jornal da região, "O Setubalense".
Tem escritos comentários no nosso blogue. O último foi a propósito de minas e armadilhas, no poste P21435 (***)
(... ) Fui furriel miliciano sapador de infantaria ( Pelotão de Sapadores / CCS/ BCAÇ 2892, Aldeia Formosa, Nhala, Buba, 1969/71), especialidade tirada no CISMI de Tavira.
A abordagem do furriel à desmontagem da mina (***) também não parece nada correta, pelos motivos apontados: as mangas em baixo, o empecilho do cinturão com as cartucheiras, a posição do corpo, a pá (?!!!).
Desmontar uma mina (ainda por cima as anti-carro, frequentemente armadilhadas) nestes descuidos, era meio caminho andado para se ficar reduzido a picadinho.
Como ficou o desditoso furriel Ferreira, da companhia 2616 do meu batalhão (sediada em Buba), que ignorou os avisos, lá de longe, do alferes do pelotão: «Tem cuidado, Ferreira, que essa merda pode estar armadilhada!», quando, em dia de coluna, procurava desimpedir a estrada Aldeia-Buba de um destes engenhos.
Ao que contavam os assistentes à tragédia, o Ferreira (atirador com curso de minas e armadilhas tirado em Bragança) escavou à volta da mina com a faca de mato, como se deve fazer, enfiou a mão por baixo para ver se detetava algum fio, e hesitou. A coluna vinha a caminho e ele sentia-se pressionado, tinha de limpar o caminho.
Agarrou na mina uma primeira vez e fez menção de a levantar; fê-lo uma segunda vez e continuou a hesitar. O alferes voltou a avisá-lo. À terceira, contavam, terá gritado: «Foda-se, ou ela ou eu!». E puxou a mina para si.
A mina estava armadilhada. Diziam alguns que tiveram a sensação de vê-lo subir no ar e depois desfazer-se. O bocado maior que encontraram dele (um mocetão que pesaria à volta de 80kg) foi um pedaço da coluna vertebral, transportada para Buba dentro de uma caixa de ração de combate, e o que os pais receberiam dentro da urna que lhes enviaram.
Aquela mina e as outras anti-pessoal que o Ferreira desmontou naquele fatídico dia, eram para mim (era a minha vez), que estava em Bissau de regresso da licença na Metrópole, quando recebi a notícia.
Daí a uns dias, fui mandado a Buba, como comandante da coluna de reabastecimento. A certa altura dos 30 km que mediavam de Aldeia a Buba, a coluna parou. Preparei-me para a batalha, uma vez que não estávamos muito longe do carreiro de Uane, onde um ou dois bigrupos do PAIGC passavam constantemente. Não era isso. Era o pessoal a homenagear o Ferreira. Nas árvores por cima do local onde se dera a explosão, farrapos da farda do Ferreira, pendurados nos ramos, pareciam acenar-nos.
Comover-me-ei até ao último dos meus dias, cada vez que penso/falo nisto. Descansa em paz, Ferreira.
Juvenal José Cordeiro Danado (****)
2. Comentário do Juvenal Danado ao nosso convite para integrar a Tabanca Grande (***)
Eu acho que faço parte da Tabanca Grande, desde que a descobri, caro Luís. Peço desculpa pelo atrevimento, mas não sabia que era necessário ser convidado.
Não sei se já o disse no pouco que por aqui comentei, mas este blogue presta um serviço inestimável a todos quantos passaram alguns dos melhores anos da sua mocidade na Guiné-Bissau, numa guerra que poderia ter sido evitada, evitando tanto sofrimento.
A Tabanca Grande é um cantinho onde nos podemos encontrar como num recanto confortável de um café, entre amigos, e partilhar as nossas experiências e mágoas. Grande trabalho, Luís. As minhas felicitações e os meus agradecimentos.
Um grande abraço, alargado a todos os companheiros, os que aqui escrevem e todos quantos passaram pela Guiné.
3. Comentário do editor LG:
Obrigado, em nome da Tabanca Grande, pelos teus dois comentários que nos enriquecem (***)... O teu testemunho sobre a morte do furriel mil Ferreira, da CCAÇ 2616, e a tua ida, a a seguir, a Buba, numa coluna logística, é muito forte, Também ainda guardo imagens dessas, ao fim destes anos todos... Eu próprio caiu numa A/C com uma GMC carregada de pessoal...
De facto, tu de há muito que deverias estar sentado, à sombra do nosso poilão... Afinal, faltam apenas aquelas pequenas formalidades: um pedido explicito para integrar a Tabanca Grande, um endereço de email válido, duas fotos (uma atual e outra do antigamente) e uma curta apresentação do teu curriculo militar...
Pedi ao Hélder Sousa, teu vizinho, para te contactar e "apadrinhar" a tua entrada na Tabanca Grande, Tens o nº 820, à tua espera, se te despachares ainda hoje...
Um alfabravo (ou um abracelo, abraço com cotovelo, neste raio de tempo de calamidade).
Luís Graça
__________
Notas do editor:
(*) Vd. poste de de 22 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14916: Memória dos lugares (309): O meu rio próximo, e de estimação, era o Rio Grande de Buba (2) (António Murta)
(**) Vd. poste de 20 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14903: Memória dos lugares (307): O meu rio próximo, e de estimação, era o Rio Grande de Buba (1) (António Murta)
(***)Vd. poste de 9 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21435: Fotos à procura de... uma legenda (126): O sapador só se engana três vezes: a primeira, a única e a última (António J. Pereira da Costa)
(****) Último poste da série > 21 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21380: (In)citações (169): Onde esteve a Cruz Vermelha Portuguesa durante a guerra colonial / guerra do ultramar / guerra de África ?
Luís Graça
__________
Notas do editor:
(*) Vd. poste de de 22 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14916: Memória dos lugares (309): O meu rio próximo, e de estimação, era o Rio Grande de Buba (2) (António Murta)
(**) Vd. poste de 20 de julho de 2015 > Guiné 63/74 - P14903: Memória dos lugares (307): O meu rio próximo, e de estimação, era o Rio Grande de Buba (1) (António Murta)
(***)Vd. poste de 9 de outubro de 2020 > Guiné 61/74 - P21435: Fotos à procura de... uma legenda (126): O sapador só se engana três vezes: a primeira, a única e a última (António J. Pereira da Costa)
(****) Último poste da série > 21 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21380: (In)citações (169): Onde esteve a Cruz Vermelha Portuguesa durante a guerra colonial / guerra do ultramar / guerra de África ?
15 comentários:
Mail enviafdo ao António Murta, autor das 3 fotos que publicamos
14 out 2020 18:20
António: não obstante o teu silêncio, que eu tenho de respeitar (mas que os nossos leitores não entendem), fazes cá muita falta no blogue...
Com a tua licença, reeditei e publiquei mais 3 das tuas sempre belíssimas fotos do Rio Grande de Bula...
Se quiseres acrescentar algo, ficarei feliz... (Acrescento: ficaremos felizes!)
Um abracelo... Luis
Olá, Luís Graça.
Grande surpresa. Gostei de rever algumas das minhas fotografias de Buba e, é claro, para as publicares não tens de pedir licença a ninguém.
Gostei também de ler (e guardar) a descrição minuciosa que o Juvenal Donado fez da tragédia do Fur. Mil Ferreira no levantamento da mina fatal. Mas impressionou-me, porque sabia daquela trágica ocorrência e não conhecia os detalhes, tão pouco o nome da vítima. O caso foi-me relatado pelos camaradas que a minha Companhia foi render em Nhala em 1973, e o que me ficou na memória, para sempre, foi aquela frase tal e qual: "F...., ou ela ou eu!" E sempre que implantava ou levantava minas, tinha a frase a ronronar-me nos ouvidos. Mesmo quando um dia ia perdendo a paciência ao tentar levantar uma das minhas minas A/P, de uma série delas, que não aparecia no chamado Carreiro de Uane (do PAIGC), mas muito longe de Uane. Também tens várias fotografias desse dia extenuante, porque foram publicadas num poste meu aqui no Blogue. Numa delas estou junto dos destroços de uma bota de tipo militar nas imediações do local onde deveria estar a mina. A mina estava no croquis, mas como não estava no terreno e punham-se várias hipóteses... uma delas, era ter sido detetada e mudada de local. Só relaxei quando percebi que alguém teve a infelicidade de a pisar. Pedi para me fotografarem e regressámos a Nhala com as restantes minas às costas.
Abracelo grande.
A. Murta.
Caro Luís
Tentarei "levar a carta a Garcia".
Entretanto, sendo realmente um apelido "danado" este nosso Juvenal é mesmo "Danado" e não "Donado" como aparece em alguns locais do "post".
Quanto à história em si, ao seu relato, é deveras arrepiante.
Se nos conseguirmos colocar, ainda que momentâneamente, na pele deste Juvenal, certamente que facilmente compreenderemos os sentimentos que o assaltam e as ainda dificuldades de lidar com o "assunto".
Eu fiquei impressionado.
A propósito de minas, ainda há dias estive ao telefone com um "tabanqueiro" que já não dá sinais de vida faz tempo, o António Garcia de Matos que também nos relatou alguns episódios relacionados com minas e campos de minas. Está vivo, com várias "maleitas", algumas delas resultantes da prática do "Kart".
Hélder Sousa
PS
Já agora aproveito para dizer que as fotos do Murta estão muito boas.
São cinco da manhã, e só agora fui alertado para o "lapsus linguae" que me está a acontecer com demasiada frequência: como é que eu fui trocar o apelido do Juvenal, que só pode ser alentejano ? Danado e não Donado...
Espero que ele e os nossos leitores me perdoem...Às vezes estou a editar o blogue e a fazer mais coisas...E o "canal único" fica entupido...
Boa continuação do sono.
PS - Donato tem existe em português, e eu só tenho uma pessoa das minhas relações com esse nome, mas não apelido:
donato | s. m.
do·na·to
nome masculino
1. Leigo servente de convento de frades e que usa hábito.
2. Leigo que tinha meia cruz da Ordem de Malta.
"donato", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2020, https://dicionario.priberam.org/donato [consultado em 15-10-2020]
.
Tenho pena que o A. Murta tenha decidido, logo a seguir eliminar o comentário que ele tinha acabdo de postar... há cinco horas. Mas é um direito (e um privilégio) dele.
Ficamos com o registo que comneçava assim:
"Olá, Luís Graça. Grande surpresa. Gostei de rever algumas das minhas fotografias de Buba e, é claro, para as publicares não tens de pedir licença a ninguém."(...)
Era um comentário interessante que acrescentava valor a este poste do Juvenal Danado. Dois ou três Anos depois deste trágico episódio que vitimou mortalmente o fur mil MA Fereira, da CCAÇ 2616, ao tempo do alf mil MA A. Murta (1973/74) ainda ecos, naquelas matas, das últimas palavras pungentes que o Ferreira terá dito: "F..., ou ela ou eu!"...
... Pungentes, não de raiva!... Só podiam ser palavras de raica: "F..., ou ela (a mina A/C armadilhada) ou eu!"...
Quem sabe o nome completo do infortunado herói Ferreira ?
No livro da CCECA, 7º Volume, Tomo II (Guiné), pag. 137, pdoe ler-se apenas este resumo da actividade operaccional da A CCaç 2616 / BCAÇ 2892
(-..), tendo cedido inicialmente dois pelotões para cooperação no
dispositivo de segurança e protecção das instalações e das populações da área
de Bissau, na dependência do BArt 2866 até 07Nov69, seguiu em dois escalões,
em 290ut69 e 09Nov69, para Buba, a fim de render a CCaç 2382, tendo, em
IONov69, assumido a responsabilidade do respectivo subsector de Buba.
Em 26Ago71, foi rendida pela CCaç 3398 e recolheu seguidamente a
Bissau, a fim de aguardar o embarque de regresso.
Observações
Tem História da Unidade (Caixa n." 89 - 2." Div/d." Sec, do AHM). (...)
Nesta CCAÇ 2616/BCAÇ 2892, esteve o nosso querido amigo Francisco Batista, régulo da Tabanca de Brunhoso!...Não sei se este trágico episódio ainda foi do tempo dele...
Ola Luis, bom dia!
O que o Murta apagou foi o duplicado do seu comentario.
Ele (o comentario) esta la.
Helder Sousa
Obrigado, Hélder, às cinco da manhã devia ser proibido ir à caixa de correio do blogue... Tenho que ir ao oftalmologista... Peço desculpa ao António Murta e aos nossos leitores...
"São factos que aconteciam por toda essa terra de água e florestas, martirizada pela guerra, de que ninguém se orgulhava e dos quais os protagonistas têm dificuldade em falar.
No mesmo local morreu também, alguns dias depois, o Furriel Miliciano António Ferreira, um bom camarada, simpático e estimado por todos. Tinha a especialidade de minas e armadilhas e morreu ao tentar levantar uma mina do inimigo. Foi outra perda muito sentida por toda a companhia. A recordação da sua morte e as circunstâncias em que aconteceu, continuam a magoar todos os que com ele conviveram" A página 308 do livro (hoje envio-te Luís) que escrevi sobre Brunhoso e sobre a minha passagem pela Guiné. O mesmo texto do Blogue está incompleto, eu era muito amigo do António Ferreira, estimava-o e admirava-o pela sua camaradagem e nobreza de caracter, ainda fico arrepiado quando se fala nele, confesso que esta noite me custou a adormecer. Não estava em Buba no dia da sua morte, tinha ido a uma consulta externa a Bissau. Segundo me disse hoje, por telefone, o ex-furriel Zamith Passos, do 2º pelotão como eu, era o Ferreira que comandava o nosso pelotão, embora fosse de outro, por nem eu nem o Passos pudermos nesse dia. O António Ferreira era natural de Águeda, o Zamith Passos, durante muitos anos falou com um sobrinho dele, Julgo que ainda tem o contacto. Sobre as causas psicológicas da morte dele, se as houve, não vou especular.
Francisco Baptista
Meu caro Murta, vou recuperar mais fotos tuas!... Bem o mereces!...Um abraço não calamitoso. Luís
Obro«igado, Francisco tpelo teu inestimável esclarecimento... DE facto, o Mundo é Pequeno e a Nossa Tabanca... é Grande. Vou ler o livro com paixão e carinho, e prometo.te fazer uma grande recensão, já que falhei o prefácio que te tinha prometido...Mas arranjaste por certo alguém muito melhor do que eu, conhecendo.te a ti e à tua amada terra, Brunhoso!... Ainda havermos de lá ir,a Brunhoso!...
Vou tentar saber algo mais sobre o nosso camarada António Ferreira... Mas não encontro o seu nome na lista dos mortos da guerra do ultramar, do concelho de Águeda, publicada pelo portal UTW - Ultramar TerraWeb (, que aliás considero um verdadeiro serviço público, devendo nós todos estarmos gratos ao colossal e rigoroso trabalho empreendido pelo seu autor ou autores):
http://ultramar.terraweb.biz/03Mortos%20na%20Guerra%20do%20Ultramar/LetraA/MEC_002n.pdf
Obrigado, Hélder, pela lembrança!... As melhoras para o António Garcia de Mstos, com cujo pai ainda trabalhei na Direção Geral dos Impostos... É nosso grã-tabanqueiro desde 2008!
1 DE NOVEMBRO DE 2008
Guiné 63/74 - P3390: Tabanca Grande (95): António Garcia de Matos, ex-Alf Mil da CCAÇ 2790, Bula (1970/72)
...
1.- Deveras lamentável a reprodução pública de pormenores - relatados pelo ex-furriel milº Juvenal José Cordeiro Danado em 'comment' de um 'post' deste blogue e replicados pelo fundador/editor deste mesmo blogue -, relacionados com restos mortais de um camarada-d'armas;
2.- O malogrado militar, não era natural de Águeda: foi inumado no cemitério municipal de Águeda, mas de facto nasceu em São Pedro do Sul.
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