Mário Beja Santos, ex-Alf Mil Inf
CMDT Pel Caç Nat 52
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá, Finete e Bambadinca, 1968/70), com data de 30 de Maio de 2025:
Queridos amigos,
Já não há colónias, há províncias ultramarinas, o fenómeno descolonizador está em marcha, começou na Ásia, encaminha-se para o Norte de África, dele se fala amiúde nas Nações Unidas. Daí a operação de maquilhagem, logo com a revisão constitucional e a abolição completa da palavra colónia. É claro que a mentalidade não se muda de um dia para o outro, basta ver este estatuto do ensino rudimentar e tudo quanto ele prescreve. É curioso como a figura de Raimundo Serrão tem um lugar apagado na vida da Guiné. Ele encomendou a Fausto Duarte uma obra de autoelogio, intitulada "Guiné, Alvorada do Império", ricamente ilustrada. Devo o facto de procurar tal obra ter chegado ao então Arquivo Histórico do BNU, onde havia um exemplar, mal sabia eu no dia em que cheguei a este ponto de Sapadores que vinha passar quase 1 ano para preparar o livro "Os Cronistas Desconhecidos do Canal de Geba". O panorama económico está em mutação, vai nascer a ideia de que a Guiné será um grande fornecedor de arroz, com pleno autoabastecimento, o governador é metódico, transpõe para a província a legislação conveniente e dedica-se a sério ao sistema educativo. Mas não deixou mais história, bem procurei literatura atinente, nada encontrei.
Um abraço do
Mário
A Província da Guiné Portuguesa
Boletim Oficial da Guiné, 1951 (65)
Mário Beja Santos
O Capitão de Engenharia Raimundo Serrão será Governador da Guiné de 1951 a 1953, irão inaugurar um conjunto de empreendimentos encetados pelo seu antecessor, terá preocupações com a área educativa, verá um crescimento da administração, a Guiné está prestes a sair do ciclo da mancarra, coconote e óleo de palma, os anos 1950 assistiram a uma produção impressionante de arroz.
E o arroz poderá dar litígios, como se pode ver no Boletim Oficial n.º 8, de 22 de fevereiro, há um acórdão do conselho do império colonial que envolve duas empresas rivais, a Sociedade Comercial Ultramarina e a Barbosas & Comanditas, apresenta-se nos seguintes termos:
“A Sociedade Comercial Ultramarina interpôs diretamente recurso por despacho do governador da Guiné, de 20 de julho de 1948, que concedeu a Barbosas & Comandita autorização para instalar em Bissau uma fábrica de descasque de arroz, com o fundamento que tal autorização viola a legislação atualmente em vigor, acarretando-lhes prejuízos provenientes de concorrência desregrada.
Na sua resposta diz o governador que a autorização concedida a Barbosas & Comandita já foi considerada caduca, esclarecendo, porém, que o objetivo era o aproveitamento das vantagens de ordem económica que adviriam para a colónia da instalação de mais uma fábrica, tanto mais que, como recente inquérito prova, a capacidade atual das fábricas está longe de satisfazer as necessidades.
Interposto o recurso, o conselho do império colonial conclui que a concorrente carece de legitimidade, não mostra ter sido usada no despacho recorrido.”
Neste mesmo Boletim Oficial n.º 10 o Governador Raimundo Serrão anui ao pedido feito pela firma António Silva Gouveia para instalar no Olossato, área da Circunscrição de Farim, uma indústria mecânica destinada à extração do óleo de palma e à quebra de coconote.
Em 19 de abril, o Boletim Oficial n.º 16, anuncia que se irá proceder à abertura de propostas para a execução de empreitada de terraplanagem, drenagem e pavimentação do aeroporto de Bissau – 1.ª fase.
No Boletim Oficial n.º 20, de 17 de maio, alude-se à Portaria que no ano anterior criou um conselho administrativo para o Colégio-Liceu de Bissau. O Governador determina que o Colégio-Liceu de Bissau funcionará como instituto de ensino particular, subsidiado pelo Estado, pelos corpos administrativos e pelos concelhos e circunscrições da colónia, e será administrado por um conselho administrativo.
Crescendo o funcionalismo, torna-se imperioso ir resolvendo os problemas da habitação, como se pode constatar da Portaria n.º 307, publicada no Boletim Oficial n.º 21, de 25 de maio:
“Acabam de se construir nesta cidade quatro edifícios que se destinam a moradias de funcionários superiores, circunstância esta que permite ao Governo da colónia atribuir a certos servidores do Estado residências privativas, já que tanto não pode fazer em relação a todas as categorias.” E determina que irão ser atribuídas residências privativas aos seguintes funcionários: magistrados judicial e do Ministério Público, Conservador do Registo Predial e Comercial, Chefes de Serviço, Chefe do Gabinete e Ajudante do Governador, podendo o Governador reservar casas para habitação de outros funcionários tendo em consideração os cargos que exerce.
E logo a seguir, na Portaria n.º 308, vai falar-se da lepra:
“Verificando-se ser elevado o número de leprosos existentes em toda a colónia, torna-se urgente e inadiável proceder à sua sequestração em estabelecimento adequado ao fim em vista; Tendo sido escolhido há muito o local designado por Cumura, na ilha de Bissau, para a instalação de uma leprosaria central:
Considerando que não é possível, por enquanto, a construção de um estabelecimento de tão grande projeção, resolveu o Governo, num intento de se iniciar imediatamente uma campanha de combate a esta terrível doença, fazer executar naquele local instalações onde se possam receber alguns doentes e que se denominará ‘Aldeia dos Leprosos’; A Aldeia dos Leprosos será provisoriamente entregue aos serviços de saúde da colónia.”
Em 26 de julho, o Boletim Oficial publica o louvor de António Carreira, nos seguintes termos:
“Pelas suas inigualáveis faculdades de trabalho servidas por uma inteligência viva toda posta ao melhor exercício da sua profissão. Considerado de há muito um ótimo funcionário do quadro administrativo, tem, no entanto, nos últimos dois anos dedicado à sua função nas vastas atribuições que lhe competem, uma enorme soma de trabalho e conhecimentos. Tem neste período feito estudos interessantes e importantes da sua circunscrição, nos seus variados aspectos, dos quais destaco os referentes ao fomento económico. O seu relatório relativo a 1950 é um documento bastante elucidativo e há pontos nele focados com projeção em toda a província. No campo das realizações materiais, construiu nestes dois anos o posto sanitário e a secretaria do posto administrativo de Bula onde acabou a residência do chefe de posto; construiu em Teixeira Pinto uma residência para missionários e duas amplas enfermarias para doentes no centro de saúde; ao presente tem em construção na sede da circunscrição nada menos de quatro bons edifícios: secretaria da administração, estação e residência dos CTT, residência para o secretário e outra para o enfermeiro. Por sua iniciativa montaram-se na sua circunscrição britadeiras para o caroço do coconote e prensas para o óleo de palma, que permitiram no corrente ano um aumento e melhoria da produção local. Tudo isto demonstra que o administrador Carreira é também um homem de ação.”
E na sequência desses louvores deixa-se menção à criação no ano anterior do Aero-Clube da Guiné. E tecem-se louvores a quem de direito.
No Suplemento ao n.º 46, Boletim Oficial n.º 23, de 19 de novembro, temos novos estatutos da Associação Comercial, Industrial e Agrícola da Guiné, esmiúça-se a natureza da organização, a sua sede, os sócios em geral, etc.
Mais adiante, no Suplemento ao n.º 51, Boletim Oficial n.º 26, de 21 de dezembro, publica-se o regulamento do ensino rudimentar e do magistério rudimentar. O ensino rudimentar constitui o primeiro grau do ensino indígena, é ministrado exclusivamente em língua portuguesa, conforme consta do Acordo Missionário. Este ensino será essencialmente nacionalista e dirigido à preparação do indígena para poder vir a auferir meios para o seu sustento e a sua família; ensino exclusivamente reservado às crianças indígenas dos dois sexos, dos 7 aos 15 anos completos, ministrado em estabelecimentos denominados Escolas do Ensino Rudimentar. Explica-se o que se visa com a classe preparatória, logo a aquisição de vocabulário de uso mais corrente, depois pôr os alunos a falar, ler, escrever e calcular em português, e a incutir-lhes hábitos e aptidões de trabalho conducentes ao abandono da ociosidade e à preparação de futuros trabalhadores rurais e dos artífices, também se informa com as autoridades administrativas devem dar às Missões Católicas Portuguesas todo o auxílio por elas solicitado.
O regulamento cuidadosamente elaborado onde se fala dos ensinos, dos alunos, das turmas e horários, da disciplina, do aproveitamento escolar, das escolas (serão localizadas onde as autoridades eclesiásticas por melhor houverem), os livros escolares (cabe a sua aprovação ao Governo da Província, ouvido o Prelado, não podendo conter nada em desmerecimento da Nação e da civilização portuguesa, da sua história e ação colonizadora, do seu Governo e autoridade, da Igreja Católica e sua atuação missionária); estende-se até aos trabalhos agrícolas e agrícola-pecuários e enquadra a preparação do pessoal docente.
Ver-se-á adiante que Raimundo Serrão não se ficou por aqui quanto ao sistema educativo.
Notícia do falecimento do Marechal Carmona
Instalações do aeroporto de Bissalanca, em fase de conclusão das obras, fotografia de Mário Dias, já no nosso bloguePonte de Ensalmá, inaugurada no tempo do governador Raimundo Serrão, fotografia de Mário Dias, já no nosso blogue
Fortaleza da Amura, nos tempos da presença portuguesa
Efeitos da guerra civil no INEP, fotografia da Casa Comum/Fundação Mário Soares
_____________
Nota do editor
Último post da série de 3 de dezembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27489: Historiografia da presença portuguesa em África (506): A Província da Guiné Portuguesa - Boletim Oficial da Colónia da Guiné Portuguesa, 1950 (64) (Mário Beja Santos)







Sem comentários:
Enviar um comentário