1. Em mensagem do dia 2 de Março de 2012, o nosso camarada Alberto Branquinho (ex-Alf Mil de Op Esp da CART 1689, Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos mais um "Contraponto", desta vez às voltas com Gandembel.
CONTRAPONTO (42)
ÀS VOLTAS COM GANDEMBEL
A propósito do Post 9552* de 1 de Março de 2012 sobre o livro do Idálio Reis àcerca da sua CCAÇ 2317/Gandembel, aqui venho eu, cheio de ciúmes provocados por afirmações em comentários ao mesmo, sobre ter sido colocada apenas uma Companhia naquele espaço (que, depois de haver construção ou a meio dela, se passou a chamar Gandembel).
As questões, levantadas também nos comentários, poderão resumir-se, afinal, às duas perguntas colocadas pelo Idálio na capa do livro: “Porquê?”/”Para quê”. Não sei se ele aborda as razões/respostas que os “estrategas” poderão ter tido em mente…
Certo é que foi a realidade – a CCAÇ 2317 esteve cerca de OITO MESES sozinha em Gandembel, até ao abandono do aquartelamento.
MAS, convirá lembrar que a construção de Gandembel foi o objectivo da operação “Bola de fogo”. Aí a CCAÇ 2317 não esteve só. A minha CART 1689 (mais velha, com cerca de um ano de Guiné), aproximou-se do local vinda de norte (Aldeia Formosa) e a CCAÇ 2317 vinda de sul. Encontrámo-nos, mais ou menos, no sítio que foi Gandembel. E dormimos juntos.
A primeira noite foi (logo) excitante – pior que o São João no Porto!
Os capitães, na manhã seguinte, decidiram fazer a implantação do quartel um pouco mais a norte, próximo do declive para o Rio Balana, pois sem água…
Durante quase um mês e meio esse espaço foi a nossa casa. A CCAÇ 2317 fazia (fundamentalmente) a construção e a CART 1689 fazia (fundamentalmente) a segurança à construção – patrulhamentos e emboscadas na zona em redor.
A CART 1689 saiu de Gamdembel quarenta dias depois, quando os abrigos de pedra estavam já praticamente prontos, de modo a poderem ser abandonados os tais “buracos de toupeira”, situados mais próximo do arame farpado (quando já havia…).
Portanto, o tais “buracos de toupeira” que o Luís Graça gosta de referir, foram o “habitat” comum das duas Companhias residentes, enquanto viveram em comunhão de mesa e habitação.
Juntas vão três fotos que documentam a existência dos “buracos de toupeira” propriedade privada da CART 1689, no então quase-quartel de Gandembel. Estes abrigos foram fundamentais por causa da diária (e repetida!) chuva de… aço.
Dão-se alvíssaras a quem conseguir descobrir nas fotos este (aqui) escriba. (Ai, o gosto de falar de mim…)
Alberto Branquinho
Fotos: © Alberto Branquinho (2012). Todos os direitos reservados
____________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 1 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9552: Notas de leitura (338): A resposta que me veio pelo correio, quatro anos e meio depois: o livro do Idálio Reis, A CCAÇ 2317, na guerra da Guiné. Gandembel/Ponte Balana (Luís Graça)
Vd. último poste da série de 30 de Novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9118: Contraponto (Alberto Branquinho) (41): (Somos uns) Mal-agradecidos
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quarta-feira, 7 de março de 2012
Guiné 63/74 - P9574: O PIFAS, de saudosa memória (7): Quando a malta do SPM dava música... e o Armando Carvalheda e o Carlos Fernandes eram locutores... (Hélder Sousa, Armando Pires, António Carvalho)
Caros camaradas:
Sim, também me lembro do PFA que, na gíria, era mais conhecido pelo PIFAS, conforme comentário anterior do Henrique Cerqueira. Mas, neste momento, a 'sintonia' está fraca, tenho que me esforçar mais para conseguir obter 'imagens radiofónicas' mais nítidas.
O Rodero refere o Vítor Raposeiro como fazendo parte de um grupo que andou tocando pelos aquartelamentos. Disso não tenho ideia, mas já enviei mail ao Raposeiro para me falar disso ou, então, enviar directamente ao Blogue.
Do que sei, e disso com toda a certeza (porque eu estava lá), é que o Vítor não chegou a integrar a Escuta. Esteve em vários locais nas suas funções relacionadas com o STM: Bissau, Bambadinca, Aldeia Formosa, Bula (ou Buba?), etc. mas na Escuta, não.
Dum modo geral, nessa época, era vulgar encontrar nos elementos das Transmissões camaradas que tinham relação estreita com a música. Faz sentido: a musicalidade do morse podia ser mais facilmente apreendida por essas pessoas.
Assim, naquela época, na Guiné, estiveram o Vítor Barros, o Eduardo Pinto e o Dutra Figueiredo, elementos integrantes de um conjunto de Viseu, Os Tubarões, que foi um dos que foi à final do Concurso Yé-Yé no Cinema Monumental, em Lisboa.
O Vítor Raposeiro era também (e é porque ainda está no activo) um excelente guitarrista e tocava num conjunto com alguma projecção aqui em Setúbal, o mesmo sucedendo com o meu amigo e camarada Nelson Batalha. Também o J. Manuel Fanha, que tocava órgão, era dum grupo de Tomar, foi do meu curso e esteve comigo na Escuta mas que me lembre só animava as noites no Chez Toi...
Vou aguardar por eventuais notícias dos meus amigos para poder avançar. Até lá, um abraço.
Hélder S.
(ii) Armando Pires
Se os documentalistas da nossa Tabanca Grande procuram que possa escrever a história do PIFAS, também podem contactar o Armando Carvalhêda (*), locutor da RDP-Antena 1, e o Carlos Fernandes, também locutor da RDP, mas já reformado mas que o Carvalheda pode contactar.
Se os documentalistas da nossa Tabanca Grande procuram que possa escrever a história do PIFAS, também podem contactar o Armando Carvalhêda (*), locutor da RDP-Antena 1, e o Carlos Fernandes, também locutor da RDP, mas já reformado mas que o Carvalheda pode contactar.
Curiosamente, quando fui para a Guiné, em fevereiro de 69, levava comigo uma carta para entregar à direcção do PIFAS, visto que também era locutor de rádio. Por razões que não interessam para esta história, não entreguei a carta.
(iii) António Carvalho:
Caros Tabanqueiros: Já por estes lados falei do Fernando Eurico Sales Lopes, primeiro Fur Mil Trms da minha companhia. Ele trabalhou no PIFAS entre julho de 72 e meados de 1974. Nunca mais o vi. Foi por aqui referido que está em Macau. Tentei contactá-lo mas sem sucesso.
Era e espero que ainda seja e esteja bem disposto. Se ele aceder a este blogue aproveito para lhe mandar um grande abraço. (**)
Carvalho de Mampatá
______________
Notas do editor:
(*) Armando Carvalhêda [, foto à esquerda, cortesia do blogue Expressões Lusitanas]:
(...) "Música ao vivo cantada na nossa língua. Um programa de Armando Carvalhêda.Desde 1996, a ANTENA 1 tem no ar o programa VIVA A MÚSICA!, único espaço regular no panorama áudio-visual nacional que apresenta semanalmente, durante uma hora música cantada na nossa língua, ao vivo e em directo. O programa desenrola-se no Teatro da Luz, em frente ao Colégio Militar, em Lisboa, todas as Quinta-feiras, entre as 15h00 e as 16h00 [, com repetição aos Domingos às 14:07], e é produzido por Ana Sofia Carvalhêda e realizado e apresentado por Armando Carvalhêda. Por aqui desfilaram já quase todas as grandes figuras da música cantada em português como são os exemplos de: Carlos do Carmo, Pedro Abrunhosa, Ala dos Namorados, António Chainho, Vitorino, Jorge Palma, Mariza, Gal Costa, Tito Paris, Sérgio Godinho, Paulo Gonzo, Pedro Barroso, Camané, GNR, Rui Veloso, Paulo de Carvalho, Rio Grande e Delfins, entre muitas dezenas de outros. Endereço de email: viva.musica@rtp.pt (...) (Fonte: RTP)
(**) Vd. último poste da série > 6 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9568: O PIFAS, de saudosa memória (6): Recebia, via Marconi, a chave do Totobola e transmitia-a depois ao camarada João Paulo Diniz, do PFA (Álvaro Vasconcelos, Centro Recetor do Agrupamento de Transmissões de Bissau, jun 71/jul 72)
Guiné 63/74 - P9573: Agenda Cultural (187): Inauguração da exposição Guerra Colonial - Tarrafal 50 anos depois - CONVITE
A SOCIEDADE PORTUGUESA DE AUTORES, enviou-nos o seguinte convite:
A SOCIEDADE PORTUGUESA DE AUTORES convida V. Exa. para a inauguração da exposição Guerra Colonial - Tarrafal 50 anos depois.
8 de Março de 2012 às 18h00
ENTRADA LIVRE
A exposição estará patente entre Março e Abril de 2012.
Horário:
De segunda a sexta-feira, das 08h30 às 19h00
Contamos com a V/presença
Atentamente,
Sala Carlos Paredes
Rua Gonçalves Crespo, 62– Lisboa
____________Nota de MR:
Vd. último poste da série em:
15 DE FEVEREIRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P9490: Agenda Cultural (186): Exposição de fotografia do nosso camarada Renato Monteiro: Megastore Colorfoto, Av da Igreja, 30, D/E, Lisboa, até meados de Março de 2012
terça-feira, 6 de março de 2012
Guiné 63/74 - P9572: O Nosso Livro de Visitas (128): João Paulo Diniz, do Programa das Forças Armadas (PFA) (Guiné, 1970/72)
1. Muito se tem falado estes dias no nosso Blogue do Programa da Forças Armadas (PFA), da sua mascote PIFAS e dos seus animadores. Muitos nomes vieram à ribalta, lembrados por camaradas que de algum modo se lembram daqueles que via ondas hertzianas ou em espectáculos pelo mato tentavam alegrar aqueles tempos de guerra bem sombrios.
Para grande surpresa chegou hoje mesmo ao nosso Blogue uma mensagem de um desses camaradas que animavam a nossa existência:
Caríssimo,
um abraço dos grandes e votos da melhor saúde!
Através de um Amigo que muito prezo, o Joaquim Furtado, soube - há dias - da existência do blogue 'Tabanca Grande', dedicado aos que passaram pela Guiné, como militares. Desde já felicito os seus mentores, não só pela ideia mas também pelo conteúdo, deveras interessante.
Fiquei particularmente feliz pelas referências ao "Programa das Forças Armadas", carinhosamente designado por 'Pifas'. Confesso que, como profissional, foi das experiências mais extraordinárias que tive na minha carreira.
Também fiquei a saber que está previsto um convívio da rapaziada, a ter lugar no dia 21.Abril. Desde já, se me permitem, gostaria de me inscrever. Mas também solicito o favor de que me sejam enviadas, por mail, mais informações acerca da festa, para que possa fazer a sua divulgação no meu programa "Emoções", na Antena-1.
Um caloroso e fraterno abraço, sempre ao dispor,
João Paulo Diniz
2. Estamos pois em presença do nosso camarada João Paulo Diniz que esteve na Guiné, se não erramos, nos anos de 1970/71/72 e que era um dos animadores de rádio do PFA.
Foi um dos intervenientes no arranque do movimento que havia de levar a cabo o 25 de Abril com a emissão, via rádio, da senha que confirmava o início das operações*.
Ao nosso camarada foi enviada a seguinte mensagem:
Caro João Paulo Diniz, caro camarada
Nestes últimos dias muito se tem falado no nosso Blogue do Programa das Forças Armadas da Guiné, e entre outros nomes de então, veio à baila o seu.
É pois uma enorme honra para nós que se tenha disposto a contactar-nos e, ainda mais, a querer participar no Encontro de 2012 da Tabanca Grande que já vai na VII edição.
Aproveito para em nome de Luís Graça, fundador do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, a convidá-lo a fazer parte da nossa tertúlia. A jóia a pagar é o envio de uma foto dos seus (nossos) tempos de Guiné e uma foto actual, acompanhadas de um texto de apresentação que pode ser uma pequena história/curiosidade ligada à sua (nossa) passagem por aquela terra que nos marcou para sempre.
A sua inscrição para participar no nosso VII Encontro em Monte Real no dia 21 de Abril próximo foi registada com agrado.
Pode tomar conhecimento dos pormenores neste endereço:
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2012/02/guine-6374-p9534-vii-encontro-da.html
Receba um fraterno abraço em nome da tertúlia deste Blogue.
O camarada e amigo
Carlos Vinhal
OBS: - Esta mensagem segue com conhecimento a Luís Graça, Mexia Alves e Miguel Pessoa, membros da organização do Encontro.
____________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 4 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9557: O PIFAS, de saudosa memória (1): Depoimentos de José da Câmara, Carlos Carvalho e Carlos Cordeiro
Vd. último poste da série de 22 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9519: O Nosso Livro de Visitas (127): Carlos Alberto Morais dos Santos, ex-1.º Cabo Mec Auto da CCAV 1749 (Mansabá, 1967/69)
Para grande surpresa chegou hoje mesmo ao nosso Blogue uma mensagem de um desses camaradas que animavam a nossa existência:
Caríssimo,
um abraço dos grandes e votos da melhor saúde!
Através de um Amigo que muito prezo, o Joaquim Furtado, soube - há dias - da existência do blogue 'Tabanca Grande', dedicado aos que passaram pela Guiné, como militares. Desde já felicito os seus mentores, não só pela ideia mas também pelo conteúdo, deveras interessante.
Fiquei particularmente feliz pelas referências ao "Programa das Forças Armadas", carinhosamente designado por 'Pifas'. Confesso que, como profissional, foi das experiências mais extraordinárias que tive na minha carreira.
Também fiquei a saber que está previsto um convívio da rapaziada, a ter lugar no dia 21.Abril. Desde já, se me permitem, gostaria de me inscrever. Mas também solicito o favor de que me sejam enviadas, por mail, mais informações acerca da festa, para que possa fazer a sua divulgação no meu programa "Emoções", na Antena-1.
Um caloroso e fraterno abraço, sempre ao dispor,
João Paulo Diniz
Foto RTP, com a devida vénia
2. Estamos pois em presença do nosso camarada João Paulo Diniz que esteve na Guiné, se não erramos, nos anos de 1970/71/72 e que era um dos animadores de rádio do PFA.
Foi um dos intervenientes no arranque do movimento que havia de levar a cabo o 25 de Abril com a emissão, via rádio, da senha que confirmava o início das operações*.
Ao nosso camarada foi enviada a seguinte mensagem:
Caro João Paulo Diniz, caro camarada
Nestes últimos dias muito se tem falado no nosso Blogue do Programa das Forças Armadas da Guiné, e entre outros nomes de então, veio à baila o seu.
É pois uma enorme honra para nós que se tenha disposto a contactar-nos e, ainda mais, a querer participar no Encontro de 2012 da Tabanca Grande que já vai na VII edição.
Aproveito para em nome de Luís Graça, fundador do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, a convidá-lo a fazer parte da nossa tertúlia. A jóia a pagar é o envio de uma foto dos seus (nossos) tempos de Guiné e uma foto actual, acompanhadas de um texto de apresentação que pode ser uma pequena história/curiosidade ligada à sua (nossa) passagem por aquela terra que nos marcou para sempre.
A sua inscrição para participar no nosso VII Encontro em Monte Real no dia 21 de Abril próximo foi registada com agrado.
Pode tomar conhecimento dos pormenores neste endereço:
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2012/02/guine-6374-p9534-vii-encontro-da.html
Receba um fraterno abraço em nome da tertúlia deste Blogue.
O camarada e amigo
Carlos Vinhal
OBS: - Esta mensagem segue com conhecimento a Luís Graça, Mexia Alves e Miguel Pessoa, membros da organização do Encontro.
____________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 4 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9557: O PIFAS, de saudosa memória (1): Depoimentos de José da Câmara, Carlos Carvalho e Carlos Cordeiro
Vd. último poste da série de 22 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9519: O Nosso Livro de Visitas (127): Carlos Alberto Morais dos Santos, ex-1.º Cabo Mec Auto da CCAV 1749 (Mansabá, 1967/69)
Guiné 63/74 - P9571: Os nossos camaradas guineenses (34): Marcelino da Mata visitou a Tabanca do Centro (Joaquim Mexia Alves)
1. Mensagem do nosso camarada Joaquim Mexia Alves (ex-Alf Mil Op Esp/Ranger da CART 3492/BART 3873, (Xitole/Ponte dos Fulas); Pel Caç Nat 52, (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e CCAÇ 15 (Mansoa), 1971/73), fundador da Tabanca do Centro, com data de 4 de Março de 2012:
Há já alguns meses que se esperava a vinda do Marcelino da Mata à Tabanca do Centro.
Infelizmente, por razões da sua saúde, não tinha sido possível até este 17º Encontro a sua presença para comer connosco o “cozido á portuguesa”.
Mas o Miguel Pessoa, que desde o início se empenhava pela vinda do Marcelino, não desistiu, e, finalmente foi possível neste encontro estarmos com este nosso camarada de armas.
Confesso que tinha muito interesse em estar com este homem, de quem tanto tinha ouvido falar na Guiné, e que nunca tinha tido a oportunidade de conhecer.
Foi um encontro fácil e empático, pois o Marcelino é um homem directo, franco e bem disposto.
Logo se enquadrou na nossa Tabanca do Centro, e sentindo-se um como nós, confraternizou, ouviu histórias e contou histórias, e ficou-lhe sem dúvida a vontade de voltar.
Por mim, o estar com o Marcelino da Mata foi também de certo modo estar com todos os guineenses que combateram ao nosso lado, e que depois lá abandonámos à sua “sorte”, que se revelou madrasta em todos os sentidos.
Devemos a eles combatentes guineenses, e a ele Marcelino, muito provavelmente a vida de alguns de nós, e por isso mesmo, e por tantas coisas mais, serão sempre bem vindos à Tabanca do Centro, para juntos festejarmos a camarigagem que nos une.
Retenho do Marcelino neste encontro, o que me disse à despedida:
Tendo sabido que eu estive no Mato Cão mais ou menos nove meses, disse-me que aquilo era um buraco sem sentido, e que para ele, que só lá tinha estado um dia e uma noite, (antes de mim), era sítio onde nunca quereria estar, pelas condições de vida, obviamente.
Um abraço para todos os “atabancados ao centro”, desejando do coração que no 18º Encontro já possamos contar com a presença do nosso “Almirante” Vasco da Gama, cuja ausência se faz tão notada.
Joaquim Mexia Alves
____________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 4 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8372: Os nossos camaradas guineenses (33): O Zé Carlos regressou ao seu mundo, à sua tabanca, à sua morança... (Luís Graça)
Há já alguns meses que se esperava a vinda do Marcelino da Mata à Tabanca do Centro.
Infelizmente, por razões da sua saúde, não tinha sido possível até este 17º Encontro a sua presença para comer connosco o “cozido á portuguesa”.
Mas o Miguel Pessoa, que desde o início se empenhava pela vinda do Marcelino, não desistiu, e, finalmente foi possível neste encontro estarmos com este nosso camarada de armas.
Confesso que tinha muito interesse em estar com este homem, de quem tanto tinha ouvido falar na Guiné, e que nunca tinha tido a oportunidade de conhecer.
Foi um encontro fácil e empático, pois o Marcelino é um homem directo, franco e bem disposto.
Logo se enquadrou na nossa Tabanca do Centro, e sentindo-se um como nós, confraternizou, ouviu histórias e contou histórias, e ficou-lhe sem dúvida a vontade de voltar.
Por mim, o estar com o Marcelino da Mata foi também de certo modo estar com todos os guineenses que combateram ao nosso lado, e que depois lá abandonámos à sua “sorte”, que se revelou madrasta em todos os sentidos.
Devemos a eles combatentes guineenses, e a ele Marcelino, muito provavelmente a vida de alguns de nós, e por isso mesmo, e por tantas coisas mais, serão sempre bem vindos à Tabanca do Centro, para juntos festejarmos a camarigagem que nos une.
Retenho do Marcelino neste encontro, o que me disse à despedida:
Tendo sabido que eu estive no Mato Cão mais ou menos nove meses, disse-me que aquilo era um buraco sem sentido, e que para ele, que só lá tinha estado um dia e uma noite, (antes de mim), era sítio onde nunca quereria estar, pelas condições de vida, obviamente.
Um abraço para todos os “atabancados ao centro”, desejando do coração que no 18º Encontro já possamos contar com a presença do nosso “Almirante” Vasco da Gama, cuja ausência se faz tão notada.
Joaquim Mexia Alves
____________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 4 de Junho de 2011 > Guiné 63/74 - P8372: Os nossos camaradas guineenses (33): O Zé Carlos regressou ao seu mundo, à sua tabanca, à sua morança... (Luís Graça)
Guiné 63/74 – P9570: Convívios (399): Caldeirada na Tabanca de Setúbal, ou do Sado (Miguel Pessoa / Hélder Sousa)
1. O nosso camarada e tertuliano Miguel Pessoa (ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74, hoje Coronel Pilav Reformado), homem do ar mas dado aos prazeres terrestres, entre os quais o bem comer, conta-nos como, sendo um centrista, bloguisticamente falando, foi até ao sul, acompanhado da sua inseparável esposa Giselda, participar numa caldeirada da futura Tabanca de Setúbal (ou do Sado, a ver vamos).
2. Já repararam que quem está no cerne da questão, a criação da Tabanca de Setúbal, é um outro nosso camarada, que pelo ar se fartou de enviar tiriris e tirirás, não fosse ele um dos homens dos STM, Hélder Valério de Sousa.
Fiquemos atentos ao seu comunicado oficial:
Caros camaradas
Esta minha comunicação tem por objectivo dar conta do Encontro/almoço/convívio ocorrido em Setúbal com vista a dar corpo ao arranque do que pode vir a ser a "Tabanca de Setúbal", como lhe chamámos, embora considere agora que ficará melhor se lhe chamarmos "Tabanca do Sado", por ser mais abrangente e frustrar possíveis bairrismos...
Vai também no sentido de explicar os antecedentes, justificar porque não foi feita maior divulgação e procurar projectar o que pode vir a partir daqui.
Esta iniciativa teve por base o facto de amigos vários pressionarem no sentido de também se fazer em Setúbal em encontro/convívio/almoço à semelhança do que, inspirados pela existência da chamada "Tabanca Grande", que na prática é a reunião anual dos amigos relacionados com o Blogue "Luís Graça & Camaradas da Guiné", a qual, por sua vez motivou e/ou inspirou reuniões semelhantes, mas com menos espaço de tempo de intervalo, consubstanciadas nas "Tabanca de Matosinhos", "Tabanca do Centro", "Tabanca da Linha", "Tabanca dos Melros", etc.
A primeira vez que abordei o assunto foi com o Benjamim Durães que opinou ser talvez interessante não fazer sempre na mesma terra mas sim rodar pelo Distrito: em Setúbal, em Almada, no Barreiro, em Sesimbra e por aí fora. A ideia parece boa mas é de difícil concretização porque exige muita disponibilidade e capacidade logística apreciável, pelo menos se não for possível 'encomendar' essas tarefas aos habitantes locais.
Depois disso houve várias pressões para se fazer qualquer coisa mas o "arranque" é sempre difícil. Há algum tempo atrás, completamente por acaso, o Branquinho e o Zé Dinis encontraram-se no mesmo restaurante, à mesma hora, sem qualquer combinação, em razão das suas viagens próprias. O Branquinho pareceu reconhecer o Dinis, meteu-se com ele, chamaram-me e assim surgiu a notícia na "Tabanca Grande" do primeiro Encontro da "Tabanca de Setúbal". Uma espécie de "ano zero" adaptado às actividades comensais.
Daí para cá fui congeminando como se poderia materializar um Encontro mais alargado. Tive alguns contactos bilaterais com o Vítor Raposeiro e outros, mas não se chegou a concretizar nada.
Agora, aproveitando o pretexto do "festival de caldeiradas", habitual nesta época do ano em que a sardinha ainda está longe de estar boa (mas os alcorrazes, os massacotes, os carapaus, os salmonetes, por exemplo, estão!) entendi ser oportuno 'deitar mãos à obra' até para ver como se correspondia com as 'vontades' do pessoal e aproveitar lições para eventuais futuras realizações.
O meu pensamento foi no sentido de contactar os naturais ou viventes em Setúbal (claro que devo ter cometido falhas, mas só falha quem faz) e mais uns quantos de cada localidade aqui à volta e de que eu tinha endereço, sempre baseado, é claro, no pessoal que de algum modo está relacionado com a "Tabanca Grande". E também dei conhecimento a um ou outro (casos do Zé Dinis e do Zé Brás) que não sendo ou vivendo no Distrito, mantenho relações de camaradagem mais estreita, que vêm do tempo em que se criou o que se chamou o "Grupo do Cadaval" para ajudar a concretizar o livro "História de Portugal em Sextilhas" do Manuel Maia.
Penso que não há lamentações quanto ao almoço, que correu bem, até fomos brindados com o que pareceu ser o início da 'época das chuvas', ficando no ar a recomendação para haver novo Encontro/almoço havendo contudo recomendações para se tentar arranjar outro espaço que eventualmente possa levar mais gente (estimou-se em 30...), com estacionamento e local para se tomar bebida (antes e/ou depois), havendo também o alvitre de que o melhor dia será ao sábado... pois vamos ver!
O meu muito obrigado a todos os que puderam estar e dar vida ao acontecimento. Nunca é demais realçar a presença das nossas estimadas enfermeiras paraquedistas, para além, é claro, de todos os outros, principalmente os que de mais longe vieram.
Aos que não puderam estar e disso deram conta, os meus desejos que na próxima possam estar.
Aos que, por qualquer motivo, não compareceram nem tiveram oportunidade de dar alguma satisfação para a sua ausência, o meu desejo que o conhecimento do evento os entusiasmem e possam vir em futura realização.
O meu abraço
Hélder Sousa
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 5 de Março de 2012 > Guiné 63/74 – P9565: Convívios (319): Pessoal da CART 3567 (Mansabá, 1972/74), Penafiel, dia 24 de Março de 2012
2. Já repararam que quem está no cerne da questão, a criação da Tabanca de Setúbal, é um outro nosso camarada, que pelo ar se fartou de enviar tiriris e tirirás, não fosse ele um dos homens dos STM, Hélder Valério de Sousa.
Fiquemos atentos ao seu comunicado oficial:
Caros camaradas
Esta minha comunicação tem por objectivo dar conta do Encontro/almoço/convívio ocorrido em Setúbal com vista a dar corpo ao arranque do que pode vir a ser a "Tabanca de Setúbal", como lhe chamámos, embora considere agora que ficará melhor se lhe chamarmos "Tabanca do Sado", por ser mais abrangente e frustrar possíveis bairrismos...
Vai também no sentido de explicar os antecedentes, justificar porque não foi feita maior divulgação e procurar projectar o que pode vir a partir daqui.
Esta iniciativa teve por base o facto de amigos vários pressionarem no sentido de também se fazer em Setúbal em encontro/convívio/almoço à semelhança do que, inspirados pela existência da chamada "Tabanca Grande", que na prática é a reunião anual dos amigos relacionados com o Blogue "Luís Graça & Camaradas da Guiné", a qual, por sua vez motivou e/ou inspirou reuniões semelhantes, mas com menos espaço de tempo de intervalo, consubstanciadas nas "Tabanca de Matosinhos", "Tabanca do Centro", "Tabanca da Linha", "Tabanca dos Melros", etc.
A primeira vez que abordei o assunto foi com o Benjamim Durães que opinou ser talvez interessante não fazer sempre na mesma terra mas sim rodar pelo Distrito: em Setúbal, em Almada, no Barreiro, em Sesimbra e por aí fora. A ideia parece boa mas é de difícil concretização porque exige muita disponibilidade e capacidade logística apreciável, pelo menos se não for possível 'encomendar' essas tarefas aos habitantes locais.
Depois disso houve várias pressões para se fazer qualquer coisa mas o "arranque" é sempre difícil. Há algum tempo atrás, completamente por acaso, o Branquinho e o Zé Dinis encontraram-se no mesmo restaurante, à mesma hora, sem qualquer combinação, em razão das suas viagens próprias. O Branquinho pareceu reconhecer o Dinis, meteu-se com ele, chamaram-me e assim surgiu a notícia na "Tabanca Grande" do primeiro Encontro da "Tabanca de Setúbal". Uma espécie de "ano zero" adaptado às actividades comensais.
Daí para cá fui congeminando como se poderia materializar um Encontro mais alargado. Tive alguns contactos bilaterais com o Vítor Raposeiro e outros, mas não se chegou a concretizar nada.
Agora, aproveitando o pretexto do "festival de caldeiradas", habitual nesta época do ano em que a sardinha ainda está longe de estar boa (mas os alcorrazes, os massacotes, os carapaus, os salmonetes, por exemplo, estão!) entendi ser oportuno 'deitar mãos à obra' até para ver como se correspondia com as 'vontades' do pessoal e aproveitar lições para eventuais futuras realizações.
O meu pensamento foi no sentido de contactar os naturais ou viventes em Setúbal (claro que devo ter cometido falhas, mas só falha quem faz) e mais uns quantos de cada localidade aqui à volta e de que eu tinha endereço, sempre baseado, é claro, no pessoal que de algum modo está relacionado com a "Tabanca Grande". E também dei conhecimento a um ou outro (casos do Zé Dinis e do Zé Brás) que não sendo ou vivendo no Distrito, mantenho relações de camaradagem mais estreita, que vêm do tempo em que se criou o que se chamou o "Grupo do Cadaval" para ajudar a concretizar o livro "História de Portugal em Sextilhas" do Manuel Maia.
Penso que não há lamentações quanto ao almoço, que correu bem, até fomos brindados com o que pareceu ser o início da 'época das chuvas', ficando no ar a recomendação para haver novo Encontro/almoço havendo contudo recomendações para se tentar arranjar outro espaço que eventualmente possa levar mais gente (estimou-se em 30...), com estacionamento e local para se tomar bebida (antes e/ou depois), havendo também o alvitre de que o melhor dia será ao sábado... pois vamos ver!
O meu muito obrigado a todos os que puderam estar e dar vida ao acontecimento. Nunca é demais realçar a presença das nossas estimadas enfermeiras paraquedistas, para além, é claro, de todos os outros, principalmente os que de mais longe vieram.
Aos que não puderam estar e disso deram conta, os meus desejos que na próxima possam estar.
Aos que, por qualquer motivo, não compareceram nem tiveram oportunidade de dar alguma satisfação para a sua ausência, o meu desejo que o conhecimento do evento os entusiasmem e possam vir em futura realização.
O meu abraço
Hélder Sousa
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 5 de Março de 2012 > Guiné 63/74 – P9565: Convívios (319): Pessoal da CART 3567 (Mansabá, 1972/74), Penafiel, dia 24 de Março de 2012
Guiné 63/74 - P9569: Agenda Cultural (187): Djubi dé... su pui qu'el qui n' contau, na negal tudo! (Mário Beja Santos)
1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 2 de Março de 2012, dirigida a toda a tertúlia a propósito do seu próximo livro "Adeus até ao meu regresso", que vai ser apresentado pelo Cor Carlos Matos Gomes no próximo dia 29 de Março na Associação 25 de Abril:
Queridos amigos,
Seria reconfortante para mim ter a vossa companhia no lançamento desta compilação de olhares sobre as escritas dos combatentes da Guiné.
Tomo a liberdade de vos mostrar a capa e contracapa e a apresentação.
Conto convosco em 29 de Março, 5.ª feira, pelas 18.30h, na Associação 25 de Abril.
O Coronel Carlos de Matos Gomes honra-me com os seus comentários sobre o livro.
Um abraço do
Mário
DJUBI DÉ… SU PUI QU’EL QUI N’ CONTAU, NA NEGAL TUDO!*
A literatura da guerra colonial, não é novidade para ninguém, tem tido uma evolução surpreendente. Do virar do século à atualidade tem-se escrito muito mais ao ritmo do romance, das memórias e do ensaio que nas décadas anteriores. Parece que quem combateu em Angola, Guiné e Moçambique, hoje pelo menos sexagenário, se sente mais liberto, mais confidente, para contar o que experimentou, entre a ficção e a realidade.
Adicione-se um facto por vezes descurado, mesmo por alguns investigadores: aqueles três teatros de operações onde centenas de milhares de portugueses e africanos combateram entre 1961 e 1974 tiveram características tão diferenciadas, “inimigos” tão específicos e confrontaram-se com um poderio militar e uma capacidade de guerrilha tão singulares que marcaram indelevelmente os registos da escrita, tornando-os praticamente intransitáveis entre Angola, Guiné e Moçambique. Pode argumentar-se que havia a solidão, a angústia, o fragor da mina ou do fornilho, e que essas perceções têm um cunho universal. É verdade, mas é insuficiente: 10 quilómetros na Guiné não são os mesmos 10 quilómetros em Angola ou Moçambique. Os palcos de guerra tinham identidade, as árvores nomes próprios, havia o crioulo, o tornado, o macaréu, a lepra, os ataques com mísseis. Breve, realidades que o contador captou ou procura captar com cores próprias.
Este livro tem uma modesta ambição: repertoriar o que de essencial está escrito desde 1964 sobre a Guiné, os seus teatros de operações e os seus combatentes, em várias manifestações literárias: romance e conto, memórias, ensaios, história, reportagem, poesia e diário. Não é difícil perceber como é que o romance e as memórias superam as outras manifestações. O romance é sempre um confronto ao espelho, são verdadeiros combates corpo a corpo, há uma margem estreita que define o sulco que demarca o épico como testemunho da narrativa de vaidades disfarçadas de heroísmo vivido ou efabulado. A memória é diretamente proporcional à capacidade pronunciada pelo amadurecimento. Se é facto que em termos psicossociológicos se compreende a evolução do romance dos anos 60 à atualidade é manifestamente mais claro entender porque é que os grandes relatos memoriais são bastante recentes e no que toca à Guiné esses relatos atingem grande dimensão nos depoimentos do Comando Amadú Djaló, no Fuzileiro José Talhadas ou no Pára-quedista Moura Calheiros. O que se escreveu nos anos 60, tanto no ensaio, como na reportagem, como na narrativa, comportava compromissos indeclináveis: Manuel Barão da Cunha exalta a gesta dos seus soldados e mostra-se indignado com a indiferença da retaguarda; Amândio César sente-se imbuído pela defesa dos ideais do Império; Hélio Felgas faz um excelente trabalho de casa sem esquecer de promover a sua imagem.
Perto do 25 de Abril emerge uma figura espantosa, hoje de estudo obrigatório, José Martins Garcia, um açoriano que veio pôr as letras em polvorosa, caricaturando até ao derrube dos grandes ícones em que se constroem as mitologias militares. Os anos 80 anunciam outra viragem, os narradores ganharam distância, sentem-se afoitos a descrever relatos mais crus ou a desvendar tabus: basta pensar em José Brás, Álamo Oliveira ou Cristóvão de Aguiar. Na maturidade continuamos a ter surpresas na ficção: basta pensar em grandes parágrafos de Luís Rosa ou António Loja.
Quando chegamos ao virar do século, sentimos claramente quem escreveu para testemunhar e escreveu de uma vez e quem volta ”ao local do crime”. Por exemplo, Álvaro Guerra, no início da sua carreira literária, irá deixar parágrafos soberbos da sua experiência de combatente, depois parece ter encerrado o livro, não mais voltará à Guiné. Em etapas sucessivas, assistimos ao regresso de Armor Pires Mota; aliás, e na minha humilde opinião, além da singularidade de ter sido o único escritor combatente a ter deixado publicado um diário quase em tempo real, ele é autor da gema literária mais preciosa: “Estranha Noiva de Guerra”, um romance único que a crítica praticamente ignora. Coisas indecifráveis da literatura da guerra colonial…
É sobretudo aos sociólogos da literatura que compete apurar o que se passa nas entrelinhas, neste quase meio século de escrita polvilhada por minas e armadilhas, flagelações, atos de coragem, medos e delírios. Estes cientistas serão obrigados a ler peças da mais variada índole: relatos sem qualquer recorte literário com ressentimentos e azedumes, às vezes autênticos ajustes de contas; há depoimentos indispensáveis como os de Otelo Saraiva de Carvalho, Vasco Lourenço ou Salgueiro Maia, graças a eles percebemos melhor o evoluir da guerra, nomeadamente o que se passou na Guiné em meados de 1973 e as suas consequências, diretas e indiretas, nos acontecimentos do 25 de Abril; há prisioneiros do PAIGC, há estudos obrigatórios como os do João Paulo Guerra, há investigações monográficas como a História dos Fuzileiros, há antologias com depoimentos de combatentes, há relatos descritos como diários, há mesmo alguma poesia, alguma dela da autoria de vates da direita radical. Impunha-se, além disso, um pano de fundo para tão vasta boca de cena: é o caso de estudos incontornáveis como os de António Duarte Silva ou os trabalhos clássicos de João de Melo, Rui de Azevedo Teixeira e Margarida Calafate Ribeiro, investigadores com pergaminhos na análise literária na guerra colonial.
Importa insistir que estas recensões são olhares pessoais, são leituras interpretadas e sintetizadas, não podem ser tomadas como uma proposta antológica ou indicadores de qualidade. Durante mais de dois anos, com o apoio incansável de malta do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, amigos como o António Ernesto Duarte Silva, fui tendo acesso a este acervo, na sua maioria inacessível ao grande público. Procura-se acima de tudo ir ao encontro das interrogações do leitor não iniciado que mantém uma grande curiosidade em conhecer o âmbito desta escrita. Não há, nesta perspetiva, ambição mais legítima do que a de preencher uma lacuna: o que nos motivou ou motiva a escrever sobre a Guiné. O que nos reconduz a um dos mais espantosos parágrafos, escrito por Álvaro Guerra em 1973 no seu romance “O Capitão Nemo e Eu”: “Por lá chafurdei na lama das lalas, debati-me no turbilhão dos tornados, derreti-me na fornalha de um sol quase invisível, dissolvi-me na chuva vertical, e amei como um danado aquela terra que me injetou a febre, me secou, me expulsou a tiro. Mas nunca o preço do amor é excessivo, nem a presença da morte o pode aniquilar”.
Agradeço ao Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, uma reserva inesgotável de surpresas para quem quer conhecer a Guiné e a sua literatura, foi aqui que publiquei aos soluços todas estas notas de recensão.
(*) - Olha... se escreveres o que te disse, negarei tudo!
(Negritos e itálicos da responsabilidade do editor)
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Nota de CV:
Vd. último poste da série de 15 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9490: Agenda Cultural (186): Exposição de fotografia do nosso camarada Renato Monteiro: Megastore Colorfoto, Av da Igreja, 30, D/E, Lisboa, até meados de Março de 2012
Queridos amigos,
Seria reconfortante para mim ter a vossa companhia no lançamento desta compilação de olhares sobre as escritas dos combatentes da Guiné.
Tomo a liberdade de vos mostrar a capa e contracapa e a apresentação.
Conto convosco em 29 de Março, 5.ª feira, pelas 18.30h, na Associação 25 de Abril.
O Coronel Carlos de Matos Gomes honra-me com os seus comentários sobre o livro.
Um abraço do
Mário
Capa do livro de Mário Beja Santos "ADEUS, até ao meu regresso"
Contracapa
DJUBI DÉ… SU PUI QU’EL QUI N’ CONTAU, NA NEGAL TUDO!*
A literatura da guerra colonial, não é novidade para ninguém, tem tido uma evolução surpreendente. Do virar do século à atualidade tem-se escrito muito mais ao ritmo do romance, das memórias e do ensaio que nas décadas anteriores. Parece que quem combateu em Angola, Guiné e Moçambique, hoje pelo menos sexagenário, se sente mais liberto, mais confidente, para contar o que experimentou, entre a ficção e a realidade.
Adicione-se um facto por vezes descurado, mesmo por alguns investigadores: aqueles três teatros de operações onde centenas de milhares de portugueses e africanos combateram entre 1961 e 1974 tiveram características tão diferenciadas, “inimigos” tão específicos e confrontaram-se com um poderio militar e uma capacidade de guerrilha tão singulares que marcaram indelevelmente os registos da escrita, tornando-os praticamente intransitáveis entre Angola, Guiné e Moçambique. Pode argumentar-se que havia a solidão, a angústia, o fragor da mina ou do fornilho, e que essas perceções têm um cunho universal. É verdade, mas é insuficiente: 10 quilómetros na Guiné não são os mesmos 10 quilómetros em Angola ou Moçambique. Os palcos de guerra tinham identidade, as árvores nomes próprios, havia o crioulo, o tornado, o macaréu, a lepra, os ataques com mísseis. Breve, realidades que o contador captou ou procura captar com cores próprias.
Este livro tem uma modesta ambição: repertoriar o que de essencial está escrito desde 1964 sobre a Guiné, os seus teatros de operações e os seus combatentes, em várias manifestações literárias: romance e conto, memórias, ensaios, história, reportagem, poesia e diário. Não é difícil perceber como é que o romance e as memórias superam as outras manifestações. O romance é sempre um confronto ao espelho, são verdadeiros combates corpo a corpo, há uma margem estreita que define o sulco que demarca o épico como testemunho da narrativa de vaidades disfarçadas de heroísmo vivido ou efabulado. A memória é diretamente proporcional à capacidade pronunciada pelo amadurecimento. Se é facto que em termos psicossociológicos se compreende a evolução do romance dos anos 60 à atualidade é manifestamente mais claro entender porque é que os grandes relatos memoriais são bastante recentes e no que toca à Guiné esses relatos atingem grande dimensão nos depoimentos do Comando Amadú Djaló, no Fuzileiro José Talhadas ou no Pára-quedista Moura Calheiros. O que se escreveu nos anos 60, tanto no ensaio, como na reportagem, como na narrativa, comportava compromissos indeclináveis: Manuel Barão da Cunha exalta a gesta dos seus soldados e mostra-se indignado com a indiferença da retaguarda; Amândio César sente-se imbuído pela defesa dos ideais do Império; Hélio Felgas faz um excelente trabalho de casa sem esquecer de promover a sua imagem.
Perto do 25 de Abril emerge uma figura espantosa, hoje de estudo obrigatório, José Martins Garcia, um açoriano que veio pôr as letras em polvorosa, caricaturando até ao derrube dos grandes ícones em que se constroem as mitologias militares. Os anos 80 anunciam outra viragem, os narradores ganharam distância, sentem-se afoitos a descrever relatos mais crus ou a desvendar tabus: basta pensar em José Brás, Álamo Oliveira ou Cristóvão de Aguiar. Na maturidade continuamos a ter surpresas na ficção: basta pensar em grandes parágrafos de Luís Rosa ou António Loja.
Quando chegamos ao virar do século, sentimos claramente quem escreveu para testemunhar e escreveu de uma vez e quem volta ”ao local do crime”. Por exemplo, Álvaro Guerra, no início da sua carreira literária, irá deixar parágrafos soberbos da sua experiência de combatente, depois parece ter encerrado o livro, não mais voltará à Guiné. Em etapas sucessivas, assistimos ao regresso de Armor Pires Mota; aliás, e na minha humilde opinião, além da singularidade de ter sido o único escritor combatente a ter deixado publicado um diário quase em tempo real, ele é autor da gema literária mais preciosa: “Estranha Noiva de Guerra”, um romance único que a crítica praticamente ignora. Coisas indecifráveis da literatura da guerra colonial…
É sobretudo aos sociólogos da literatura que compete apurar o que se passa nas entrelinhas, neste quase meio século de escrita polvilhada por minas e armadilhas, flagelações, atos de coragem, medos e delírios. Estes cientistas serão obrigados a ler peças da mais variada índole: relatos sem qualquer recorte literário com ressentimentos e azedumes, às vezes autênticos ajustes de contas; há depoimentos indispensáveis como os de Otelo Saraiva de Carvalho, Vasco Lourenço ou Salgueiro Maia, graças a eles percebemos melhor o evoluir da guerra, nomeadamente o que se passou na Guiné em meados de 1973 e as suas consequências, diretas e indiretas, nos acontecimentos do 25 de Abril; há prisioneiros do PAIGC, há estudos obrigatórios como os do João Paulo Guerra, há investigações monográficas como a História dos Fuzileiros, há antologias com depoimentos de combatentes, há relatos descritos como diários, há mesmo alguma poesia, alguma dela da autoria de vates da direita radical. Impunha-se, além disso, um pano de fundo para tão vasta boca de cena: é o caso de estudos incontornáveis como os de António Duarte Silva ou os trabalhos clássicos de João de Melo, Rui de Azevedo Teixeira e Margarida Calafate Ribeiro, investigadores com pergaminhos na análise literária na guerra colonial.
Importa insistir que estas recensões são olhares pessoais, são leituras interpretadas e sintetizadas, não podem ser tomadas como uma proposta antológica ou indicadores de qualidade. Durante mais de dois anos, com o apoio incansável de malta do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, amigos como o António Ernesto Duarte Silva, fui tendo acesso a este acervo, na sua maioria inacessível ao grande público. Procura-se acima de tudo ir ao encontro das interrogações do leitor não iniciado que mantém uma grande curiosidade em conhecer o âmbito desta escrita. Não há, nesta perspetiva, ambição mais legítima do que a de preencher uma lacuna: o que nos motivou ou motiva a escrever sobre a Guiné. O que nos reconduz a um dos mais espantosos parágrafos, escrito por Álvaro Guerra em 1973 no seu romance “O Capitão Nemo e Eu”: “Por lá chafurdei na lama das lalas, debati-me no turbilhão dos tornados, derreti-me na fornalha de um sol quase invisível, dissolvi-me na chuva vertical, e amei como um danado aquela terra que me injetou a febre, me secou, me expulsou a tiro. Mas nunca o preço do amor é excessivo, nem a presença da morte o pode aniquilar”.
Agradeço ao Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, uma reserva inesgotável de surpresas para quem quer conhecer a Guiné e a sua literatura, foi aqui que publiquei aos soluços todas estas notas de recensão.
(*) - Olha... se escreveres o que te disse, negarei tudo!
(Negritos e itálicos da responsabilidade do editor)
____________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 15 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9490: Agenda Cultural (186): Exposição de fotografia do nosso camarada Renato Monteiro: Megastore Colorfoto, Av da Igreja, 30, D/E, Lisboa, até meados de Março de 2012
Guiné 63/74 - P9568: O PIFAS, de saudosa memória (6): Recebia, via Marconi, a chave do Totobola e transmitia-a depois ao camarada João Paulo Diniz, do PFA (Álvaro Vasconcelos, Centro Recetor do Agrupamento de Transmissões de Bissau, jun 71/jul 72)
1. Mensagem do nosso camarada Álvaro Vasconcelos, ex- 1.º Cabo Transmissões do STM (Aldeia Formosa e Bissau, 1970/72)
De: alvasco@iol.pt
Data: 4 de Março de 2012 00:10
Assunto: PIFAS
Amigo Luís:
Sou "piriquito" nestas aventuras de escrever mensagens no correio electrónico: mas lá vai...
Luís, espero não estar a ser inconveniente para com o João Paulo Diniz, mas este camarada é apresentador de um programa da Antena Um, transmitido todas as madrugadas de cada sábado [, das 5h às 7h]. O nome do programa é Emoções, do qual eu sou ouvinte (quando não adormeço!...). Já tive oportunidade de o cumprimentar por esta via e ele teve a amabilidade de o focar no programa. Aconteceu vai para um ano! É um camaradão que certamente estará disponivel para camarigar connosco.
Desafio-te - com o devido respeito-, a, se te for possível, o contactares, aí em Lisboa. Tanto quanto julgo saber, ele é funcionário da RDP.
Luís, não tenho o prazer de te conhecer pessoalmente, mas permito-me solicitar que perdoes o meu infortúnio de não poder comprometer-me em ser mais útil. Nesta, para mim, complicada informática, mesmo a nível de simples utilizador, sou um "cepo" e não há meio de me desenrascar melhor.
Aprecia a minha limitada experiência: já tentei contactar mais de uma vez com o João Paulo e não voltei a conseguir!...
Assim, por favor, se for realmente possível aproveitar a informação que aqui deixo, espero ter contribuido para essa nova realidade da Tabanca Grande.
Um reconhecido agradecimento e Bem Hajas!
Álvaro Vasconcelos
_______________
Nota do editor:
Último poste da série > 5 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9564: O PIFAS, de saudosa memória (5): Quando o Autocarro do Amor fazia escala na Guiné (Augusto Silva Santos)
Assunto: PIFAS
Amigo Luís:
Sou "piriquito" nestas aventuras de escrever mensagens no correio electrónico: mas lá vai...
Quando estive no Centro Recetor do Agrupamento de Transmissões de Bissau (de Junho de 71 a Julho de 72), recebia, via Marconi, a Chave do Totobola. Depois transmitia-a ao camarada João Paulo Diniz, locutor do PIFAS [, foto atual à direita, cortesia de RTP Memória], para ele dar a novidade o mais rapidamente possível aos ouvintes da Rádio no Programa das Forças Armadas (PIFAS). Recebia a dita logo depois das seis da tarde de cada domingo.
Luís, espero não estar a ser inconveniente para com o João Paulo Diniz, mas este camarada é apresentador de um programa da Antena Um, transmitido todas as madrugadas de cada sábado [, das 5h às 7h]. O nome do programa é Emoções, do qual eu sou ouvinte (quando não adormeço!...). Já tive oportunidade de o cumprimentar por esta via e ele teve a amabilidade de o focar no programa. Aconteceu vai para um ano! É um camaradão que certamente estará disponivel para camarigar connosco.
Desafio-te - com o devido respeito-, a, se te for possível, o contactares, aí em Lisboa. Tanto quanto julgo saber, ele é funcionário da RDP.
Luís, não tenho o prazer de te conhecer pessoalmente, mas permito-me solicitar que perdoes o meu infortúnio de não poder comprometer-me em ser mais útil. Nesta, para mim, complicada informática, mesmo a nível de simples utilizador, sou um "cepo" e não há meio de me desenrascar melhor.
Aprecia a minha limitada experiência: já tentei contactar mais de uma vez com o João Paulo e não voltei a conseguir!...
Assim, por favor, se for realmente possível aproveitar a informação que aqui deixo, espero ter contribuido para essa nova realidade da Tabanca Grande.
Um reconhecido agradecimento e Bem Hajas!
Álvaro Vasconcelos
_______________
Nota do editor:
Último poste da série > 5 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9564: O PIFAS, de saudosa memória (5): Quando o Autocarro do Amor fazia escala na Guiné (Augusto Silva Santos)
Guiné 63/74 - P9567: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (14): O Tininho da feira
1. Em mensagem do dia 1 de Março de 2012 o nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), enviou-nos esta sua "outra" memória:
Outras memórias da minha guerra (14)
O Tininho da feira
O Tininho era o filho mais novo da família dos Quintelas. Eram cinco rapazes e duas raparigas. Trabalhavam todos em conjunto como negociantes de gado. Eles andavam de feira em feira, tal como o pai, e elas tratavam da casa e do gado. Como a mãe faleceu cedo, elas eram bastante acarinhadas pelos irmãos. Apenas o Tininho fez a escola primária. Razão porque eram vulgares as piadas a gozar com essa situação de iletrados, especialmente com o velho Quintela que, apesar de exibir um bonito relógio de bolso, preso por uma valiosa corrente, não sabia dizer as horas.
Os Quintelas não casados viviam na casa paterna, junto ao largo da feira de Lourosel. Era ali que se juntavam, discutiam e apuravam as estratégias para o negócio em equipa. Eu, ainda miúdo, tive a oportunidade de os ver trabalhar. Em dias de feira, dois deles deslocavam-se pelo caminho normal de acesso do gado. Um ficava a mais de um quilómetro e o outro a uns 500 metros. Outro estava à entrada da feira e o velhote e o filho mais velho, iam lá mais para o interior da feira do gado. O lavrador começava a ser influenciado logo no primeiro contacto. Ali, tomava conhecimento dos defeitos e valores do animal e do conselho “desinteressado” daquele senhor. Adiante, a cena repetia-se e, à entrada da feira, já o terceiro Quintela “abusava” dos valores fornecidos anteriormente e desafiava o vendedor a consultar outros negociantes, ao mesmo tempo que o estava a encaminhar para os seus possíveis compradores. Se, por acaso, algum comprador alheio ao esquema se metesse no negócio, era certo que em poucos minutos havia porrada da grossa. Eles, juntos, “amoleciam” qualquer valentão.
Também me recordo de ter visto carregamentos do gado, para levar para a Malveira. Faziam-no ao princípio da noite, de forma a chegar lá de madrugada. Naquela época (início dos anos 50), havia doença no gado, o que se prestava a negócios bastante vantajosos. Porém, algum gado morria antes de partir, e para que ele se aguentasse até à Malveira, pregavam uns barrotes atravessados no camião, de forma a manter o animal de pé. Dizia-se que alguns chegavam lá mortos. É esta a razão por que, falando-se de um doente, se costumava dizer, em tom de brincadeira:
- Sim, sim, esse está bom é para ir para a Malveira.
Ao Tininho não faltava nada. E como ele sempre foi de pequena estatura, beneficiava de um tratamento mais mimado. Até nos jogos de futebol improvisados junto à capela quase não se lhe podia disputar a bola. É que ele, às vezes, zangava-se e ameaçava levar a bola para casa. Por outro lado, gozava do proteccionismo exagerado dos irmãos, sempre munidos de bengala e de uma exuberante naifa de Fafe. Como ele tinha a voz muito fina e a cara muito lisa, também era conhecido por Tininha. Porém, ninguém tinha coragem de o chamar por esse nome, embora não faltasse vontade. Apenas o vizinho Ramião, filho da Dora Vadeca e de pai incógnito, que era deficiente de uma perna e meio atrasado mental, contrariava esse receio. Digamos que para o Ramião era um prazer enorme mostrar a sua coragem. Então, sempre que oportuno, exibia a sua voz grossa, entrecortada e pouco perceptível, e atirava:
- Tafôôuda Tinênha. Pareces mesmo uma Tinênha boieira!
- A Tininha está aqui. – gritava o Tininho com aquela voz feminina, enquanto apertava o centro das pernas provocatoriamente, dando azo à desejada gargalhada geral .
No entanto, o Ramião já havia sido apertado. Quem o safou dos Quintelas foi a GNR, depois dos gritos protectores da sua mãe e a solidariedade dos vizinhos.
O Tininho, que saiu tarde da escola, manteve a sua meninice até à tropa. Sim, ele foi à tropa. Já andava no CICA do Porto, quando rebentou a guerra em Angola. Em pouco tempo foi mobilizado e partiu para Luanda. Como andava sempre endinheirado, não foi difícil obter alguma predominância entre os seus camaradas. Acabou por ser o protegido de um primeiro-sargento, que o indicou para impedido de apoio a um Major, que vivia com mulher e duas filhas, em idade escolar.
As irmãs Quina e Micas, eram vaidosas e gostavam muito de mostrar o seu corpo avantajado, através das roupas ajustadas. E para salientar mais as mamas, atiravam provocadoramente o peito para fora. Digamos que, para aquela época, elas eram umas mulheraças. No entanto, o tempo ia passando e elas pareciam não segurar os namorados, talvez devido à falta de humildade e à sua apetência para mandar. Gostavam muitos das festas de arraial e de frequentar as actividades religiosas. E foi na frequência da igreja que elas desenvolveram uma relação com a família Santana.
O velho Santana, um conhecido industrial de cortiça, além da missa, gostava de ir ao cemitério com a sua neta Bélinha (Isabel), onde rezavam por alma do pai e da avó. O Sr. Santana costumava dar boleia às manas Quintela. A Bélinha, que cedo ficou órfã de pai, tinha a mãe bastante debilitada de saúde. Viviam em casa do avô Santana, que muito as acarinhava e amparava. A Bélinha, que estava internada num colégio de Freiras, só vinha a casa durante fins-de-semana. Ela era a alegria da família, incluindo os dois tios já casados.
Foi grande a alegria dos Quintelas ao receber de volta o Tininho, vindo da guerra de Angola. O rapaz que sempre fora mimado pela família, via esse afecto redobrado devido aos dois anos de ausência. Por outro lado, as manas faziam tudo para que a imagem de menino efeminado, fosse ultrapassada rapidamente. Compraram-lhe um carro VW azul claro, vestiram-no de tudo que era bom (foi dos primeiros a usar camisas TV) e adornaram-no de anéis, relógio de luxo, alfinete de gravata, etc. Embora não fosse bem o género de jovem moderno dos anos 60, ele, quando saía, cheio de pose, no carro a brilhar, de óculos Ray Ban e carregado de Brilcream na cabeça, era uma tentação para um certo género de miúdas. Porém, parecia não ser feliz nas suas conquistas porque, após os primeiros contactos, elas não mostravam interesse no relacionamento.
Agora, que dispunham de carro e de condutor, as manas Quintela mostravam-se mais. E, da igreja, chegaram a trazer a Bélinha, com a devida anuência do Sr. Santana. Como a Bélinha, já com 16 anos e corpo feito, praticamente não tinha outros contactos fora da família e do colégio, mostrava alguma simpatia com o ambiente amistoso das manas Quintela, agora também manifestado pelo irmão Tininho.
- Senhor Santana, como a Bélinha está de férias da Páscoa, podia ir connosco a Fátima, no próximo sábado - dizia a Micas, à saída da igreja, das cerimónias da Semana Santa, que continuou:
- Temos que ir lá a pé cumprir a promessa que devemos pelo meu irmão mas, por agora, só queremos ir à missa agradecer o seu regresso da guerra e dar umas voltas de joelhos na Basílica.
Respondeu, concordando, o Sr. Santana:
- Está bem, mas venham cedo porque a quero em casa antes do jantar. Sabem que a minha filha é doente e não pode ter aflições.
Tudo correu pelo melhor, quer na parte religiosa quer durante o almoço. O ambiente não podia ser melhor. Porém, no regresso, perto da Curia, o carro abrandou, parecendo avariado. O Tininho, mostrando alguma surpresa, pediu às irmãs que lhe dessem um pequeno empurrão. A Bélinha também queria ajudar mas disseram-lhe que não era preciso sair do carro. O carro avançou e o Tininho começou logo a dar sinal de querer voltar para trás. No entanto, quando voltou a sul, não parou e seguiu com a Bélinha. Neste caso, a forma mais correcta de dizer seria: fugiu com a Bélinha!!!
O escândalo rebentou. A desrespeitada e conservadora família Santana, entrou em desespero. E, como ferida no seu orgulho, não podia aceitar qualquer desfecho apaziguador. Por isso, moveu desde logo todos os meios para interceptar o raptor.
Só na manhã do dia seguinte o carro foi localizado perto de Mafra. Soube-se, também, que a Bélinha estava doente e que não seria aconselhável viajar nessas circunstâncias.
- Se a desonrou, tem que casar com ela - diziam uns.
- Isso quer ele. Por isso é que ele fugiu com ela – diziam outros.
- Ele não tem categoria para uma miúda daquelas. Além disso, mostrou que é um animal – diziam ainda outros.
- É evidente que as matronas ajudaram ao golpe - acrescentavam as más-línguas.
Pouco se sabia de concreto sobre o que se passara. O certo é que a miúda, ao fim de três dias, veio mesmo doente para casa, onde se manteve incontactável. O Tininho não se inibia de publicamente, fazer juras de amor e da vontade de “pagar” o seu apaixonado impulso mas, a família Santana, nem o queria ver por perto.
A Bélinha faleceu, pouco tempo depois. Havia gente que acusava a família por ter preferido a sua morte à desonra ou ao seu casamento forçado.
Bastante debilitada, a mãe da Bélinha não aguentou mais que dois meses, o choque daquela tragédia.
E o Tininho foi para a cadeia de Custóias, cumprir 14 anos de prisão.
Mais tarde, quando se perguntava por ele, pouco ou nada sabiam dizer. Como não era benquisto na zona, mudou-se para parte incerta. Também diziam que se dedicava, profissionalmente, à vida nocturna, talvez fruto das ligações adquiridas na prisão.
Há cerca de 10 anos, casualmente, encontrei-o. Eram altas horas da madrugada, quando fui abastecer o carro de gasóleo numa área de serviço, aberta toda a noite. E, quando estava a tomar qualquer coisa ao balcão, ele passou pela frente e foi colocar nas prateleiras umas revistas e os jornais do dia. Ao virar-se para os clientes do balcão e demais pessoal da noite, olhou-me e exclamou:
- Tu és o Zeca, não és? Há quantos anos não te vejo!!!
Disse-lhe que tinha casado em Crestuma e que vivia lá. E perguntei:
- E tu, que fazes?
- Faço vida lá no Porto. Comprei isto há pouco tempo mas dá-me muito trabalho. Não imaginava que custasse tanto.
Curioso, acabei por perguntar:
- E as tuas irmãs, que é feito delas?
Ele respondeu:
- A Micas já morreu e a Quina vive comigo.
- Não casaram? – perguntei.
- A Micas, não. A Quina namorou com o Tono da Lagoa durante dezassete anos e esteve casada com ele um ano e picos. O fdp, disse-lhe que ia visitar um primo a França, para ver se valia a pena mudarem-se para lá, e nunca mais apareceu. Viemos a saber que tinha fugido para a Venezuela.
E continuou:
- Um gajo que faz uma coisa destas a uma mulher, merecia que lhe cortassem o pescoço!
Silva da Cart 1689
____________
Nota de CV:
Vd. último poste de 28 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9411: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (13): Vícios ou frutos da época
Outras memórias da minha guerra (14)
O Tininho da feira
O Tininho era o filho mais novo da família dos Quintelas. Eram cinco rapazes e duas raparigas. Trabalhavam todos em conjunto como negociantes de gado. Eles andavam de feira em feira, tal como o pai, e elas tratavam da casa e do gado. Como a mãe faleceu cedo, elas eram bastante acarinhadas pelos irmãos. Apenas o Tininho fez a escola primária. Razão porque eram vulgares as piadas a gozar com essa situação de iletrados, especialmente com o velho Quintela que, apesar de exibir um bonito relógio de bolso, preso por uma valiosa corrente, não sabia dizer as horas.
Os Quintelas não casados viviam na casa paterna, junto ao largo da feira de Lourosel. Era ali que se juntavam, discutiam e apuravam as estratégias para o negócio em equipa. Eu, ainda miúdo, tive a oportunidade de os ver trabalhar. Em dias de feira, dois deles deslocavam-se pelo caminho normal de acesso do gado. Um ficava a mais de um quilómetro e o outro a uns 500 metros. Outro estava à entrada da feira e o velhote e o filho mais velho, iam lá mais para o interior da feira do gado. O lavrador começava a ser influenciado logo no primeiro contacto. Ali, tomava conhecimento dos defeitos e valores do animal e do conselho “desinteressado” daquele senhor. Adiante, a cena repetia-se e, à entrada da feira, já o terceiro Quintela “abusava” dos valores fornecidos anteriormente e desafiava o vendedor a consultar outros negociantes, ao mesmo tempo que o estava a encaminhar para os seus possíveis compradores. Se, por acaso, algum comprador alheio ao esquema se metesse no negócio, era certo que em poucos minutos havia porrada da grossa. Eles, juntos, “amoleciam” qualquer valentão.
Também me recordo de ter visto carregamentos do gado, para levar para a Malveira. Faziam-no ao princípio da noite, de forma a chegar lá de madrugada. Naquela época (início dos anos 50), havia doença no gado, o que se prestava a negócios bastante vantajosos. Porém, algum gado morria antes de partir, e para que ele se aguentasse até à Malveira, pregavam uns barrotes atravessados no camião, de forma a manter o animal de pé. Dizia-se que alguns chegavam lá mortos. É esta a razão por que, falando-se de um doente, se costumava dizer, em tom de brincadeira:
- Sim, sim, esse está bom é para ir para a Malveira.
Ao Tininho não faltava nada. E como ele sempre foi de pequena estatura, beneficiava de um tratamento mais mimado. Até nos jogos de futebol improvisados junto à capela quase não se lhe podia disputar a bola. É que ele, às vezes, zangava-se e ameaçava levar a bola para casa. Por outro lado, gozava do proteccionismo exagerado dos irmãos, sempre munidos de bengala e de uma exuberante naifa de Fafe. Como ele tinha a voz muito fina e a cara muito lisa, também era conhecido por Tininha. Porém, ninguém tinha coragem de o chamar por esse nome, embora não faltasse vontade. Apenas o vizinho Ramião, filho da Dora Vadeca e de pai incógnito, que era deficiente de uma perna e meio atrasado mental, contrariava esse receio. Digamos que para o Ramião era um prazer enorme mostrar a sua coragem. Então, sempre que oportuno, exibia a sua voz grossa, entrecortada e pouco perceptível, e atirava:
- Tafôôuda Tinênha. Pareces mesmo uma Tinênha boieira!
- A Tininha está aqui. – gritava o Tininho com aquela voz feminina, enquanto apertava o centro das pernas provocatoriamente, dando azo à desejada gargalhada geral .
No entanto, o Ramião já havia sido apertado. Quem o safou dos Quintelas foi a GNR, depois dos gritos protectores da sua mãe e a solidariedade dos vizinhos.
O Tininho, que saiu tarde da escola, manteve a sua meninice até à tropa. Sim, ele foi à tropa. Já andava no CICA do Porto, quando rebentou a guerra em Angola. Em pouco tempo foi mobilizado e partiu para Luanda. Como andava sempre endinheirado, não foi difícil obter alguma predominância entre os seus camaradas. Acabou por ser o protegido de um primeiro-sargento, que o indicou para impedido de apoio a um Major, que vivia com mulher e duas filhas, em idade escolar.
As irmãs Quina e Micas, eram vaidosas e gostavam muito de mostrar o seu corpo avantajado, através das roupas ajustadas. E para salientar mais as mamas, atiravam provocadoramente o peito para fora. Digamos que, para aquela época, elas eram umas mulheraças. No entanto, o tempo ia passando e elas pareciam não segurar os namorados, talvez devido à falta de humildade e à sua apetência para mandar. Gostavam muitos das festas de arraial e de frequentar as actividades religiosas. E foi na frequência da igreja que elas desenvolveram uma relação com a família Santana.
O velho Santana, um conhecido industrial de cortiça, além da missa, gostava de ir ao cemitério com a sua neta Bélinha (Isabel), onde rezavam por alma do pai e da avó. O Sr. Santana costumava dar boleia às manas Quintela. A Bélinha, que cedo ficou órfã de pai, tinha a mãe bastante debilitada de saúde. Viviam em casa do avô Santana, que muito as acarinhava e amparava. A Bélinha, que estava internada num colégio de Freiras, só vinha a casa durante fins-de-semana. Ela era a alegria da família, incluindo os dois tios já casados.
Foi grande a alegria dos Quintelas ao receber de volta o Tininho, vindo da guerra de Angola. O rapaz que sempre fora mimado pela família, via esse afecto redobrado devido aos dois anos de ausência. Por outro lado, as manas faziam tudo para que a imagem de menino efeminado, fosse ultrapassada rapidamente. Compraram-lhe um carro VW azul claro, vestiram-no de tudo que era bom (foi dos primeiros a usar camisas TV) e adornaram-no de anéis, relógio de luxo, alfinete de gravata, etc. Embora não fosse bem o género de jovem moderno dos anos 60, ele, quando saía, cheio de pose, no carro a brilhar, de óculos Ray Ban e carregado de Brilcream na cabeça, era uma tentação para um certo género de miúdas. Porém, parecia não ser feliz nas suas conquistas porque, após os primeiros contactos, elas não mostravam interesse no relacionamento.
Agora, que dispunham de carro e de condutor, as manas Quintela mostravam-se mais. E, da igreja, chegaram a trazer a Bélinha, com a devida anuência do Sr. Santana. Como a Bélinha, já com 16 anos e corpo feito, praticamente não tinha outros contactos fora da família e do colégio, mostrava alguma simpatia com o ambiente amistoso das manas Quintela, agora também manifestado pelo irmão Tininho.
- Senhor Santana, como a Bélinha está de férias da Páscoa, podia ir connosco a Fátima, no próximo sábado - dizia a Micas, à saída da igreja, das cerimónias da Semana Santa, que continuou:
- Temos que ir lá a pé cumprir a promessa que devemos pelo meu irmão mas, por agora, só queremos ir à missa agradecer o seu regresso da guerra e dar umas voltas de joelhos na Basílica.
Respondeu, concordando, o Sr. Santana:
- Está bem, mas venham cedo porque a quero em casa antes do jantar. Sabem que a minha filha é doente e não pode ter aflições.
Tudo correu pelo melhor, quer na parte religiosa quer durante o almoço. O ambiente não podia ser melhor. Porém, no regresso, perto da Curia, o carro abrandou, parecendo avariado. O Tininho, mostrando alguma surpresa, pediu às irmãs que lhe dessem um pequeno empurrão. A Bélinha também queria ajudar mas disseram-lhe que não era preciso sair do carro. O carro avançou e o Tininho começou logo a dar sinal de querer voltar para trás. No entanto, quando voltou a sul, não parou e seguiu com a Bélinha. Neste caso, a forma mais correcta de dizer seria: fugiu com a Bélinha!!!
O escândalo rebentou. A desrespeitada e conservadora família Santana, entrou em desespero. E, como ferida no seu orgulho, não podia aceitar qualquer desfecho apaziguador. Por isso, moveu desde logo todos os meios para interceptar o raptor.
Só na manhã do dia seguinte o carro foi localizado perto de Mafra. Soube-se, também, que a Bélinha estava doente e que não seria aconselhável viajar nessas circunstâncias.
- Se a desonrou, tem que casar com ela - diziam uns.
- Isso quer ele. Por isso é que ele fugiu com ela – diziam outros.
- Ele não tem categoria para uma miúda daquelas. Além disso, mostrou que é um animal – diziam ainda outros.
- É evidente que as matronas ajudaram ao golpe - acrescentavam as más-línguas.
Pouco se sabia de concreto sobre o que se passara. O certo é que a miúda, ao fim de três dias, veio mesmo doente para casa, onde se manteve incontactável. O Tininho não se inibia de publicamente, fazer juras de amor e da vontade de “pagar” o seu apaixonado impulso mas, a família Santana, nem o queria ver por perto.
A Bélinha faleceu, pouco tempo depois. Havia gente que acusava a família por ter preferido a sua morte à desonra ou ao seu casamento forçado.
Bastante debilitada, a mãe da Bélinha não aguentou mais que dois meses, o choque daquela tragédia.
E o Tininho foi para a cadeia de Custóias, cumprir 14 anos de prisão.
Mais tarde, quando se perguntava por ele, pouco ou nada sabiam dizer. Como não era benquisto na zona, mudou-se para parte incerta. Também diziam que se dedicava, profissionalmente, à vida nocturna, talvez fruto das ligações adquiridas na prisão.
Há cerca de 10 anos, casualmente, encontrei-o. Eram altas horas da madrugada, quando fui abastecer o carro de gasóleo numa área de serviço, aberta toda a noite. E, quando estava a tomar qualquer coisa ao balcão, ele passou pela frente e foi colocar nas prateleiras umas revistas e os jornais do dia. Ao virar-se para os clientes do balcão e demais pessoal da noite, olhou-me e exclamou:
- Tu és o Zeca, não és? Há quantos anos não te vejo!!!
Disse-lhe que tinha casado em Crestuma e que vivia lá. E perguntei:
- E tu, que fazes?
- Faço vida lá no Porto. Comprei isto há pouco tempo mas dá-me muito trabalho. Não imaginava que custasse tanto.
Curioso, acabei por perguntar:
- E as tuas irmãs, que é feito delas?
Ele respondeu:
- A Micas já morreu e a Quina vive comigo.
- Não casaram? – perguntei.
- A Micas, não. A Quina namorou com o Tono da Lagoa durante dezassete anos e esteve casada com ele um ano e picos. O fdp, disse-lhe que ia visitar um primo a França, para ver se valia a pena mudarem-se para lá, e nunca mais apareceu. Viemos a saber que tinha fugido para a Venezuela.
E continuou:
- Um gajo que faz uma coisa destas a uma mulher, merecia que lhe cortassem o pescoço!
Silva da Cart 1689
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Nota de CV:
Vd. último poste de 28 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9411: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (13): Vícios ou frutos da época
Guiné 63/74 - P9566: Memória dos lugares (178): Cantanhez: Cabedu... (Foto do calendário de 2008, editado pela ONG Tiniguena)
Guiné-Bissau > Região de Tombali > c. 2007 > Cantanhez > Cabedu > "Ruínas do antigo quartel colonial de Cabedu". Foto de: Emanuel Ramos / Tiniguena. In: Matas de Cantanhez: Biodiversidade ao serviço da soberania. Calendário de 2008. Imagens digitalizadas, editadas e reproduzido com a devida vénia pelo Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné...
1. Por Cabedu (de que temos no nosso blogue, cerca de meia centena de referências) passaram diversos camaradas e subunidades: cito, de cor, o José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, Fá, Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), e o Norberto Gomes da Costa (ex-Fur Mil At Inf, CCAÇ 555, Cabedú, 1963/65), sem esquecer o Tony Grilo, que vive no Canadá, e que foi Apontador de obús 8.8 (em
Cabedu, Cacine e Cameconde nos anos de 1966 a 1968). Também em Cabedu o Orlando Pinela, ex-1.º Cabo da CART 1614 (Cabedú, 1966/68)... Enfim, corro o risco de esquecer outros camaradas da Tabanca Grande, que por lá passaram no tempo da guerra...
Se não estou em erro, Cabedu foi também a primeira das tabancas da região de Tombali a beneficiar da projeto Sementes e Água Potável para a Guiné-Bissau, liderado pela Tabanca de Matosinhos... Foi em Cabedu que o Zé Teixeira, com outros camaradas, assistiu, emocionado, à inauguração do poço que assegurou o abastecimento de água potável à comunidade, em iniciativa da ONG AD - Acção para o Desenvolvimento... Foi aqui que Projeto Sementes e Água Potável para a Guiné-Bissau começou a ganhar raízes...
É da autoria do Tony Grilo o poema Cabedu, nossa terra (1966), que a seguir reproduzimos.
2. Cancioneiro de Cantanhez > Cabedu, nossa terra
por Tony Grilo
Nas tabancas dos nativos
Nós fazemos uma acção
Que certo Mundo não sabe
Que nos sai da coração.
O inimigo espreita,
Atacando gente boa,
Mas os soldados respondem
Sem ser com tiros à toa.
De canais e muito mato
É composta a região,
Os mosquitos são malignos
Terroristas de picão.
Com insectos ou sem eles,
Que o tempo se vá passando,
Oh malta, já estamos vendo
O Niassa navegando.
Em Cabedu, em Cabedu,
Vão desfilando tantos soldados,
Mesmo com guerra, és nossa terra,
Nestes dois anos amargurados.
Oh Cabedu, oh Cabedu,
És fortaleza desta Guiné,
Te defendemos com valentia,
Aqui no mato, de noite e dia.
Cabedu, 1966
Tony Grilo
3. Contactos atuais da ONG Tiniguena:
Tiniguena, Esta Terra é Nossa
Av. Caetano Semedo, Las Palmeras, Bairro de Belém,
Apartado 667, Bissau República da Guiné-Bissau
Tel.: (+ 245) 325 19 06 / (+ 245) 674 51 / (+ 245) 548 97 66
E-mail: tiniguena_gb@hotmail / geral@tiniguena.org
Av. Caetano Semedo, Las Palmeras, Bairro de Belém,
Apartado 667, Bissau República da Guiné-Bissau
Tel.: (+ 245) 325 19 06 / (+ 245) 674 51 / (+ 245) 548 97 66
E-mail: tiniguena_gb@hotmail / geral@tiniguena.org
Lê-se no calendário de 2008, editado pela ONG guineense Tiniguena, dirigida por Augusta Henriques (Vd. desdobrável, em português, com a apresentação desta ONG que faz agora 20 anos, e que na venda dos seus belíssimnos calendários e postais uma fonte de receita):
"É urgente resgatar o legado histórico de Cantanhez... Outrora, as Matas de Cantanhez foram um refúgio seguro e a base principal dos Combatentes da Liberdade da Pátria liderados por Amílcar Cabral. E estas florestas acolheram as primeiras zonas libertadas, onde Cabral fez funcionar escolas e hospitais e organizou uma nova administração, sob a protecção de uma vegestação frondosa e a cumplicidades das populações locais. Além de abrigo, as florestas oferecerama sustento aos que nela se refugiaram. Em Cantanhez foram escritas das mais belas páginas da história da jovem Nação guineense. Urge resgatar este legado histórico que deve inspirar e alimentar as gerações do futuro para o reencontro com a sua dignidade como povo e o seu justo lugar no concerto das Nações".
_______________
Nota do editor:
Último poste da série > 29 de fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9547: Memória dos lugares (177): Canquelifá, a ferro e fogo, fevereiro / abril de 1974 (José Marques)
segunda-feira, 5 de março de 2012
Guiné 63/74 – P9565: Convívios (398): Pessoal da CART 3567 (Mansabá, 1972/74), Penafiel, dia 24 de Março de 2012
1. Mensagem do nosso camarada Manuel Valdrez que prestou serviço na CART 3567, Mansabá, 1972/74:
Caro amigo
Vivi os anos de 1972 / 1974 na Guiné.
Dia 24 de Março vamos fazer um encontro com quem estiver disponível.
Será possível divulgar no blogue a existência desse encontro?
Dia 24 de Março os camaradas da CART 3567 - 1972/74 - Mansabá, promovem um encontro de amizade. 40 Anos depois.
Concentração Quartel RAL 5 - donde partiram para a Guiné há 40 anos.
Os meus contactos: Manuel Valdrez - 939 026 434 e Facebook - https://www.facebook.com/manuel.valdrez
Obrigado pela disponibilidade
Manuel Valdrez
____________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 22 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 – P9517: Convívios (318): Comemoração do Dia do Combatente de Gondomar, dia 3 de Março de 2012 (Carlos Silva)
Caro amigo
Vivi os anos de 1972 / 1974 na Guiné.
Dia 24 de Março vamos fazer um encontro com quem estiver disponível.
Será possível divulgar no blogue a existência desse encontro?
Dia 24 de Março os camaradas da CART 3567 - 1972/74 - Mansabá, promovem um encontro de amizade. 40 Anos depois.
Concentração Quartel RAL 5 - donde partiram para a Guiné há 40 anos.
Os meus contactos: Manuel Valdrez - 939 026 434 e Facebook - https://www.facebook.com/manuel.valdrez
Obrigado pela disponibilidade
Manuel Valdrez
____________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 22 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 – P9517: Convívios (318): Comemoração do Dia do Combatente de Gondomar, dia 3 de Março de 2012 (Carlos Silva)
Guiné 63/74 - P9564: O PIFAS, de saudosa memória (5): Quando o Autocarro do Amor fazia escala na Guiné (Augusto Silva Santos)
O PIFAS de Augusto Silva Santos
1. Mensagem de Augusto Silva Santos*, ex-Fur Mil da CCAÇ 3306/BCAÇ 3833, Pelundo, Có e Jolmete, 1971/73, com data de 4 de Março de 2012:
Olá Camarada e Amigo Carlos Vinhal,
Na sequência da solicitação do Luís Graça sobre o assunto em epígrafe, venho por este meio dar o meu pequeno contributo para este tema, no qual também junto uma foto do meu "PIFAS", velhinho de 40 anos. É algo, entre outras coisas, que guardo quase religiosamente, a maior parte pelas boas recordações que me trazem.
Foi um programa radiofónico que me marcou muito na altura da minha passagem pela Guiné. Era a nossa grande companhia no dia-a-dia que, de alguma forma, ajudava a passar melhor o tempo e a matar saudades através dos muitos temas que passavam.
Infelizmente não me recordo muito bem dos nomes dessas canções ou de quem as cantava, mas lembro-me por exemplo de uma muito engraçada que ainda hoje (embora raramente) se ouve passar nas rádios locais, que salvo erro começava assim: "Era o autocarro do amor". Julgo que não é este o título, mas era assim que era conhecida.
Também me lembro que na altura se ouvia alguma música africana, nomeadamente de Cabo Verde, na parte dos discos pedidos. A esse propósito, também me recordo de algumas passagens com certo humor aquando das solicitações, como por exemplo estando na altura muito em voga as músicas do Gianni Morandi, de alguém solicitar a passagem da canção "Non son degno di te", como "Não sou digno di bo".
Pesquisa CV: Capa do single "O Autocarro do Amor" interpretado por "Os Taras" e Montenegro
Um Grande Abraço
Augusto Silva Santos
____________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 10 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8256: Controvérsias (122): Exemplar de Bilhete Postal da Guiné, edição da Casa Mendes - Bissau (Augusto Silva Santos)
Vd. último poste da série de 5 de Março de 2012 > Guiné 63/74 - P9563: O PIFAS, de saudosa memória (4): Discos pedidos: Para o Mamadu Djaló que firma no Catió, a canção de Gianni Morandi 'Não sou digno di bó'... (Luís Borrega / Joaquim Mexia Alves)
Guiné 63/74 - P9563: O PIFAS, de saudosa memória (4): Discos pedidos: Para o Mamadu Djaló que firma no Catió, a canção de Gianni Morandi 'Não sou digno di bó'... (Luís Borrega / Joaquim Mexia Alves)
1. Comentário do Luís Borrega, ao poste P9558 (*)
2. Comentário de L.G.:
Já há uns bons atrás o Joaquim Mexia Alves se tinha lembrado dessa frase célebre que corria a toda a hora, no programa dos discos pedidos (vd. Poste P1322, de 27 de novembro de 2006):
(...) Li agora o último poste do Jorge Cabral e à conta da música e do crioulo, lembrei-me da célebre frase que corria na Guiné, dita na rádio (qual rádio?), no programa de discos pedidos, e que era assim, mais coisa menos coisa:
- Para Mamadu Djaló qui firma no Catió, Gianni Morandi canta Cá sou degno di bó!!!
Lembremo-nos que era uma célebre música desse cantor italiano, Gianni Morandi [n. 1944], do ano de 1964, e que tinha por título Non sono degno di te [Não sou digno de ti]. (...).
Também o Jorge Portojo se lembra de ouvir o Não sou digno di bó, lá em Catió, no Bar do Libanês, o que só vem comprovar a fama e a longevidade quer do Gianni Morandi quer do Mamadu Djaló...
______________
E va bene così
me ne vado da te
ma
al mondo no non esiste nessuno
che non ha sbagliato una volta
amor!
Non son degno di te
non ti merito più
ma quando la sera tu resterai sola
ricorda qualcuno che amava te
amore amor
amore amor.
Não sou digno de ti,
não te mereço mais,
mas,
no mundo não existe
quem não tenha errado uma vez!
E está bem assim,
deixo-te,
mas,
quando à noite estiveres sozinha,
lembra-te de alguém que te amava.
Num monte de pedras pode crescer uma flor,
em mim, esta noite, nasceu o amor por ti.
E está bem assim,
deixo-te,
mas,
no mundo, não, não existe ninguém, amor,
que não tenha errado uma vez!
Não sou digno de ti,
não te mereço mais,
mas, quando à noite estiveres sozinha,
lembra-te de alguém que te amava,
meu amor,
meu amor!
Camaradas
Ainda me lembro do seguinte:
Numa programa de Discos Pedidos do PFA, foi mais ou menos isto:
Boa noite!
Aqui Programa das Forças Armadas...
Discos pedidos...
Ainda me lembro do seguinte:
Numa programa de Discos Pedidos do PFA, foi mais ou menos isto:
Boa noite!
Aqui Programa das Forças Armadas...
Discos pedidos...
Vamos dedicar a Mamadu Djaló que firma no Catió, a canção de Gianni Morandi "Não sou digno di bó "
... E depois tocou o disco (*)...
Abraço
Luís Borrega
... E depois tocou o disco (*)...
Abraço
Luís Borrega
2. Comentário de L.G.:
Já há uns bons atrás o Joaquim Mexia Alves se tinha lembrado dessa frase célebre que corria a toda a hora, no programa dos discos pedidos (vd. Poste P1322, de 27 de novembro de 2006):
(...) Li agora o último poste do Jorge Cabral e à conta da música e do crioulo, lembrei-me da célebre frase que corria na Guiné, dita na rádio (qual rádio?), no programa de discos pedidos, e que era assim, mais coisa menos coisa:
- Para Mamadu Djaló qui firma no Catió, Gianni Morandi canta Cá sou degno di bó!!!
Lembremo-nos que era uma célebre música desse cantor italiano, Gianni Morandi [n. 1944], do ano de 1964, e que tinha por título Non sono degno di te [Não sou digno de ti]. (...).
Também o Jorge Portojo se lembra de ouvir o Não sou digno di bó, lá em Catió, no Bar do Libanês, o que só vem comprovar a fama e a longevidade quer do Gianni Morandi quer do Mamadu Djaló...
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Notas do editor:
(*) Último poste da série > 5 de março de 2012 > Guiné 63/74 - P9559: O PIFAS, de saudosa memória (3): Depoimentos de José Santos, Luís de Sousa, Abílio Delgado e Rogério Ferreira
(**) Gianni Morandi (n. 1944, Monghidoro,Emilia-Romagna, província de Bolonha, norte de Itália) (Vd. sítio oficial do cantor; mas também a Wikipédia).
Letra e música: Non son degno di te (Ver vídeo, aqui, no You Tube, com legendas em português)... A canção ganhou o Primeiro Prémio do Festival delle Rose, 1964...
O vídeo começa com um militar de carreira, já de idade madura, de bigodinho à moda dos anos 50/60, e acentuadas entradas na testa, a recordar o seu grande amor dos verdes anos, não correspondido... com Gianni Morandi, vestido de magala, aos 20 anos, fazendo serenata à janela da pequena... Um sucesso estrondoso nos anos 60, e um dos discos mais pedidos no PIFAS... ainda no início dos anos 70 (nesse ano, Gianni Morandi, representou a Itália no Festival da Eurovisão)... Recorde-se aqui o bel ragazzo, destroça-corações...
NON SON DEGNO DI TE
Migliacci-Zambrini
Non son degno di te
non ti merito più
ma
al mondo non esiste nessuno
che non ha sbagliato una volta
E va bene così
me ne vado da te
ma
quando la sera tu resterai sola
ricorda qualcuno che amava te.
Sui monti di pietra può nascere un fiore
in me questa sera è nato l’amore per te
O vídeo começa com um militar de carreira, já de idade madura, de bigodinho à moda dos anos 50/60, e acentuadas entradas na testa, a recordar o seu grande amor dos verdes anos, não correspondido... com Gianni Morandi, vestido de magala, aos 20 anos, fazendo serenata à janela da pequena... Um sucesso estrondoso nos anos 60, e um dos discos mais pedidos no PIFAS... ainda no início dos anos 70 (nesse ano, Gianni Morandi, representou a Itália no Festival da Eurovisão)... Recorde-se aqui o bel ragazzo, destroça-corações...
NON SON DEGNO DI TE
Migliacci-Zambrini
Non son degno di te
non ti merito più
ma
al mondo non esiste nessuno
che non ha sbagliato una volta
E va bene così
me ne vado da te
ma
quando la sera tu resterai sola
ricorda qualcuno che amava te.
Sui monti di pietra può nascere un fiore
in me questa sera è nato l’amore per te
E va bene così
me ne vado da te
ma
al mondo no non esiste nessuno
che non ha sbagliato una volta
amor!
Non son degno di te
non ti merito più
ma quando la sera tu resterai sola
ricorda qualcuno che amava te
amore amor
amore amor.
Tradução livre (LG):
Não sou digno de ti,
não te mereço mais,
mas,
no mundo não existe
quem não tenha errado uma vez!
E está bem assim,
deixo-te,
mas,
quando à noite estiveres sozinha,
lembra-te de alguém que te amava.
Num monte de pedras pode crescer uma flor,
em mim, esta noite, nasceu o amor por ti.
E está bem assim,
deixo-te,
mas,
no mundo, não, não existe ninguém, amor,
que não tenha errado uma vez!
Não sou digno de ti,
não te mereço mais,
mas, quando à noite estiveres sozinha,
lembra-te de alguém que te amava,
meu amor,
meu amor!
Guiné 63/74 - P9562: Humor de caserna (26): Chocos recheados para curar o paludismo (Henrique Cerqueira)
1. Mensagem do nosso camarada Henrique Cerqueira (ex-Fur Mil da 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4610/72, Biambe e Bissorã, 1972/74), com data de 1 de Março de 2012:
Olá Camarada Carlos Vinhal
Hoje deu-me uma vontade danada de escrever uma estória para o nosso blog.
Há mais ao menos três semanas estou praticamente prisioneiro em casa pois tive a infeliz ideia de contrair uma pneumonia. Após uma passagem pelo hospital e depois de devidamente receitado aqui estou eu quase como novo.
Por me sentir melhor é que me deu esta vontade de escrever, se bem que durante estas semanas tenho andado muito entretido no nosso blogue que tem sido muito fértil em “casos”, mas mais uma vez os nossos camaradas demonstraram que após a tempestade vem sempre a bonança. O bom senso, a boa formação e acima de tudo a experiência de vida foram os ingredientes principais nessas “discussões” mais ao menos “desabridas”.
Mas a ideia de escrever hoje tem um pouco de paralelismo como que me aconteceu estas semanas, ou seja :
“O Meu Primeiro Ataque de Paludismo”
É verdade sim senhor, este meu primeiro contacto com o Paludismo na Guiné foi duplamente aterrador e angustiante…
Como a maior parte da malta que esteve no interior da Guiné sabe, alimentos frescos era coisa que raramente havia nos aquartelamentos, salvo uma ou outra peça de caça ou peixe da bolanha que aparecia. Em Biambe, quando ao fim de três meses, mais ao menos, a comer esparguete com chouriço leofilizado, arroz e sangacho de atum, enfim a tal comida “Gourmet” do nosso camarada Martins, tivemos a noticia que iríamos receber frescos vindos de avião, penso que pelo Nord-Atlas (não sei se está bem escrito). Nessa altura de fartura de alimentos frescos, que tinham que ser consumidos rapidamente por falta de armazenamento de frio, significava refeições abundantes. Nessa precisa altura cá o Henrique apanha um bruto dum paludismo com febres altíssimas, delírios etc., todas aquelas coisas “boas” que o paludismo nos dá.
A agravar o meu estado anímico porque o físico estava de rastos, o “bandido” do cozinheiro, como tinha recebido chocos nos frescos, cozinhou-os com recheio e tiveram a lata de mos levarem à cama num prato dizendo que me faria bem. Já estão a imaginar aqui o rapaz com 40º de febre a comer aquilo, não é?
Bom, mais tarde o paludismo passou, mas para mim não houve daquela fresca e boa comidinha.
Voltei a ter mais vezes paludismo mas o mais dramático foi mesmo o meu primeiro. É que para agravar, nessa altura já andávamos quase todos de pernas literalmente abertas por causa da micose e furúnculos que creio eu ser originado pela falta de carne e legumes. Felizmente tínhamos por lá alguma fartura de whisky que ajudava a combater o mal do corpo e da alma.
Esta é mais ou menos a descrição do meu batismo de “fogo com o inimigo n.º 1” da malta que era enviada para a Guiné. Já agora um grande abraço para o nosso enfermeiro e outros que espalhados por toda a Guiné lá foram dando conta do recado em altíssimas situações de risco com a saúde dos seus camaradas.
Mais tarde escreverei sobre os nossos Enfermeiros de Campanha.
Henrique Cerqueira
Foto incerta no livro "Golpes de Mãos - Memórias de Guerra", do nosso camarada José Eduardo Rodrigues Oliveira, ex-Fur Mil Enf.º da CCAÇ 675, com a devida vénia.
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 9 de Dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9170: (Ex)citações (164): Furriel, turra é preto e vaca é branca!... (Henrique Cerqueira)
Vd. último poste da série de 28 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9545: Humor de caserna (25): Métodos de sobrevivência dos maltrapilhos do arame farpado (C. Martins)
Olá Camarada Carlos Vinhal
Hoje deu-me uma vontade danada de escrever uma estória para o nosso blog.
Há mais ao menos três semanas estou praticamente prisioneiro em casa pois tive a infeliz ideia de contrair uma pneumonia. Após uma passagem pelo hospital e depois de devidamente receitado aqui estou eu quase como novo.
Por me sentir melhor é que me deu esta vontade de escrever, se bem que durante estas semanas tenho andado muito entretido no nosso blogue que tem sido muito fértil em “casos”, mas mais uma vez os nossos camaradas demonstraram que após a tempestade vem sempre a bonança. O bom senso, a boa formação e acima de tudo a experiência de vida foram os ingredientes principais nessas “discussões” mais ao menos “desabridas”.
Mas a ideia de escrever hoje tem um pouco de paralelismo como que me aconteceu estas semanas, ou seja :
“O Meu Primeiro Ataque de Paludismo”
É verdade sim senhor, este meu primeiro contacto com o Paludismo na Guiné foi duplamente aterrador e angustiante…
Como a maior parte da malta que esteve no interior da Guiné sabe, alimentos frescos era coisa que raramente havia nos aquartelamentos, salvo uma ou outra peça de caça ou peixe da bolanha que aparecia. Em Biambe, quando ao fim de três meses, mais ao menos, a comer esparguete com chouriço leofilizado, arroz e sangacho de atum, enfim a tal comida “Gourmet” do nosso camarada Martins, tivemos a noticia que iríamos receber frescos vindos de avião, penso que pelo Nord-Atlas (não sei se está bem escrito). Nessa altura de fartura de alimentos frescos, que tinham que ser consumidos rapidamente por falta de armazenamento de frio, significava refeições abundantes. Nessa precisa altura cá o Henrique apanha um bruto dum paludismo com febres altíssimas, delírios etc., todas aquelas coisas “boas” que o paludismo nos dá.
A agravar o meu estado anímico porque o físico estava de rastos, o “bandido” do cozinheiro, como tinha recebido chocos nos frescos, cozinhou-os com recheio e tiveram a lata de mos levarem à cama num prato dizendo que me faria bem. Já estão a imaginar aqui o rapaz com 40º de febre a comer aquilo, não é?
Bom, mais tarde o paludismo passou, mas para mim não houve daquela fresca e boa comidinha.
Voltei a ter mais vezes paludismo mas o mais dramático foi mesmo o meu primeiro. É que para agravar, nessa altura já andávamos quase todos de pernas literalmente abertas por causa da micose e furúnculos que creio eu ser originado pela falta de carne e legumes. Felizmente tínhamos por lá alguma fartura de whisky que ajudava a combater o mal do corpo e da alma.
Esta é mais ou menos a descrição do meu batismo de “fogo com o inimigo n.º 1” da malta que era enviada para a Guiné. Já agora um grande abraço para o nosso enfermeiro e outros que espalhados por toda a Guiné lá foram dando conta do recado em altíssimas situações de risco com a saúde dos seus camaradas.
Mais tarde escreverei sobre os nossos Enfermeiros de Campanha.
Henrique Cerqueira
O 1.º Cabo Aux Enf.º Pereira da CCAÇ 675 em acção de assistência a um ferido
Foto incerta no livro "Golpes de Mãos - Memórias de Guerra", do nosso camarada José Eduardo Rodrigues Oliveira, ex-Fur Mil Enf.º da CCAÇ 675, com a devida vénia.
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 9 de Dezembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9170: (Ex)citações (164): Furriel, turra é preto e vaca é branca!... (Henrique Cerqueira)
Vd. último poste da série de 28 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9545: Humor de caserna (25): Métodos de sobrevivência dos maltrapilhos do arame farpado (C. Martins)
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