sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20628: Notas de leitura (1262): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (44) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 18 de Setembro de 2019:

Queridos amigos,
Encaminhamo-nos para o desfecho esperado, o regresso a casa.
É tempo de cirandarmos por diferentes regiões, falou-se do Sul, do Norte, foram sobretudo estas as áreas de atuação do BCAV 490, faltando o Leste, é dele que hoje se fala, continuando para o episódio seguinte. E é o quadro de vida que também merece ser pontuado: a mina e a emboscada, por exemplo. E deixa-se um desabafo ao leitor: quanto mais se lê sobre as primícias da luta armada, logo releva silêncios e omissões dos dois lados, praticaram-se excessos, brutalidades inarráveis.
O PAIGC, no fervor da propaganda, não esquecia a morte de um dos seus primeiros líderes militares, Vitorino Costa, mas omitia as atrocidades, cortes de orelha e narizes, tudo ficou documentado, mas não convinha dar muito nas vistas, haverá sempre mistérios de parte a parte. E quanto mais se tenta perceber a reação dos Altos Comandos Portugueses a um fenómeno avassalador, totalmente inesperado enquanto atos subversivos, terá que se concluir que esses Altos Comandos, mormente Louro de Sousa e Arnaldo Schulz não podiam deixar de disseminar forças militares por todo o território e tentar, com aldeamentos nas proximidades dos destacamentos, dar a segurança indispensável. O que é curioso é que o mediático Spínola, que criticava acerbamente os seus antecessores, não mexeu nas pedras essenciais, e teve muitíssimos mais meios que esses seus antecessores não tiveram.

Um abraço do
Mário


Missão cumprida… e a que vamos cumprindo (44)

Beja Santos

“Grande amargura se passou
com estilhaços de uma granada.
A vinte e sete deste mês
morreu mais um camarada.

Em Maio com seus companheiros
o amigo Rogério saiu
e de manhã cedo se viu
num carreiro dois bandoleiros.
O Rodrigues foi dos primeiros
que aos bandidos apontou,
um deles morto ficou
e o outro nos acompanhava
e quando a Fambantã se chegava
grande amargura se passou.

O bandoleiro começou a gritar
com sinais despercebidos
fez despertar os bandidos
que nos vieram espiar.
Começaram então a atirar
à nossa rapaziada.
Foi uma espécie de emboscada
que nos armaram.
E no Candeias acertaram
com estilhaços de granada.

O Rogério levava o preso pela mão
e a ele logo apontaram
uma granada lhe jogaram
ficando estendido no chão.
O comandante do Pelotão
uma transmissão urgente fez
e o helicóptero, mais uma vez,
trouxe um ferido com gravidade,
que foi pra a eternidade
a vinte e sete deste mês.

Um telegrama à metrópole chegava
havendo grandes gemidos.
Os seus pais estavam convencidos
que seu filho regressava
pouco tempo lhe faltava
para se abraçarem na chegada.
Enquanto andou na porrada
lutou sempre com fé
mas, por azar, cá na Guiné,
morreu mais este camarada.”

********************

O bardo dá-nos a notícia de mais um morto em combate, notícia inopinada, e porquê? Quem vai acompanhando em sequência cronológica este final da comissão, dá-se bruscamente com a morte do Rogério, talvez em data anterior às delícias da vida em Bissau. O que quer que seja, remete-nos para considerações da grande elasticidade em que esta guerra da Guiné se apresenta, o BCAV 490 tarimbou no Norte, fez toda a batalha do Como, teve rescaldo na península de Bissau e partiu para o Norte, ali o esperavam novas agruras. Já se falou do Sul, onde praticamente brotou a luta armada, ainda em 1962, rebentando infraestruturas e comunicações, isolando comunidades, intimidando apoios, com resposta não menos violenta das nossas Forças Armadas. E logo em 1963 a guerrilha se apropriou da Ilha do Como, que deu pretexto mediático para anunciar uma “zona libertada”. Falou-se um pouco acima de Sangonhá, de Cacoca ou de Guileje, regiões de muito sobressalto, procurava-se travar o avanço da guerrilha nas zonas fronteiriças, impedir a formação de corredores de circulação nacionalista, a luta alastrou para o Corubal e para o Morés. No Leste, foi um tanto diferente, mas em finais de 1964 iniciava-se uma via-sacra para as forças portuguesas na região do Boé. Vale a pena darmos agora atenção a alguns testemunhos.

José Miranda Alves, em edição de autor, escreveu as suas recordações que intitulou “A passagem por uma guerra inútil, memórias e acontecimentos da minha juventude”. Conta-nos a sua infância e juventude, num pequeno lugar de Montalegre, vila onde aos 19 anos vai à inspeção, e faz questão de nos dizer com quem vai nesse dia: com o Toninho Martins, do lugar de Sidrós, o Alexandre Alves (Barreira), de Vila Nova, o já falecido João do Alves, o António do Amaro e ele, eram todos do Ferral, o Francisco de Trás da Casa de Viveiro, mais o Zé, mais o Chico Torrão de Santa Marinha e o também falecido Aníbal do Militão Sacoselo. O Zé Miranda trabalhou desde adolescente como eletricista, andou na Barragem de Pisões, no Alto Rabagão. Tem 20 anos quando recebe aviso para se apresentar no Regimento de Infantaria 13, em Vila Real, é incorporado em outubro de 1964, rememora muitas coisas, não esqueceu a semana de campo e outros detalhes.

Em agosto de 1965, o BCAÇ 1856 está sediado no Gabú, ele pertence à CCAÇ 1416. Foi mandado fazer um estágio com uma Companhia de Comandos, andou em operações no Oio, regressa e fez mais operações, em Canquelifá. Anda por Paunca e Cabuca. E em 27 de abril de 1966 inicia-se a sua estadia de um ano em Madina do Boé. O 3.º Pelotão da CCAÇ 1416 ficou em Béli, esta Companhia vinha substituir a CCAV 702. A partir deste momento, os relatos que o Zé Miranda nos dá são os ataques em catadupa a Madina, os grupos do PAIGC não escolhem a hora a que flagelam, mas têm as suas preferências no escurecer ou antes da alvorada, assim não havia o risco de aparecer a aviação. Os abastecimentos por terra são sempre operações com mortos e feridos, a passagem do Corubal em Ché Che informava o PAIGC, não faltavam minas nem emboscadas. A despeito deste fogo permanente, construíram-se abrigos e fizeram-se patrulhamentos próximos, mais era impossível. São recordados os bravos pilotos que traziam vitualhas, munições, medicamentos, correspondência e levavam feridos e também a correspondência para as famílias. Vem a férias entre janeiro e fevereiro de 1967, não deixa de registar que na sua ausência ocorreu uma emboscada na estrada Ché Che - Madina que provocou seis mortos e cinco feridos, em 9 de fevereiro. Destaca uma entrevista que anos depois foi feita ao seu comandante de Companhia, Capitão Jorge Monteiro, condecorado com a medalha de Valor Militar com Palma, este não esconde o seu ceticismo sobre as vantagens de se manter ali uma unidade militar, com uma capacidade de resposta mínima. E há também uma figura brejeira no seu testemunho, o Capelão Mota Tavares, reguila e contestatário.

Este documento pode associar-se a outro, porque lhe é muito próximo, intitulado “Uma Campanha na Guiné, 1965-1967, História de uma Guerra”, o seu autor é Manuel Domingues, que foi alferes, o seu fito foi o de deixar um testemunho, na falta de história da unidade do BCAÇ 1856, que, pasme-se, veio render o BCAV 490.

Manuel Domingues, nesta sua edição de autor, com data de 2003, enceta a publicação contando a origem, formação e mobilização do batalhão. A unidade mobilizadora foi o RI 1 e em junho de 1965 fizeram instrução de aperfeiçoamento operacional na Guarda. É profundamente crítico sobre a preparação militar, recorda a apresentação tardia de muitos especialistas, tudo veio a ter reflexos no funcionamento global da unidade e até nos aspetos operacionais. Por exemplo, o responsável da CCS – Companhia de Comando e Serviços, e os elementos das Transmissões só se apresentaram em setembro, já na Guiné. O BCAÇ 1856 ficou às ordens do Comando-Chefe. E confirma que a CCAÇ 1416 partiu logo para o Leste (Gabú), a CCAÇ 1417 veio a ter treino operacional em Bula e Fula Mandinga, e a CCAÇ 1418 treinou em Bissau, Bula e Teixeira Pinto. Em maio de 1966, o BCAÇ 1856 assume a responsabilidade do setor L3, o que significa que a sua missão se estendia por dois terços do concelho do Gabú e um sexto da área total da Guiné.

Manuel Domingues recorda que a grande maioria da população pertencia ao grupo étnico Fula mas que havia também bastantes Mandingas e núcleos de Pajadincas. As companhias operacionais irão ficar em zonas de fronteira, da seguinte forma: a CCAÇ 1416, em Madina do Boé, com um destacamento em Béli; a CCAÇ 1417 foi para Bajocunda, com um destacamento em Copá; e a CCAÇ 1418 sediou-se em Buruntuma, com destacamento em Ponte Caium. Manuel Domingues fala do imenso sofrimento das gentes de Madina do Boé. O que nos remete para outro livro, desta feita um romance, de que falaremos em seguida, “sairòmeM, Guerra Colonial”, Gustavo Pimenta, Palimage, 2000.

(continua)
____________

Notas do editor

Poste anterior de 31 de Janeiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20610: Notas de leitura (1260): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (43) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 3 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20619: Notas de leitura (1261): Longas Horas do Tempo Africano, por Manuel Barão da Cunha; 10.ª edição, revista e reestruturada, Oeiras Valley, Município de Oeiras, 2019 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20627: Agenda cultural (727): lançamento, hoje, às 18h00, no Mindelo, ilha de São Vicente, da obra "Forças Expedicionárias a Cabo Verde na II Guerra Mundial”, do cor inf ref e nosso grã-tabanqueiro, Adriano Miranda Lima


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo >"As peças anti-aéreas do Monte Sossego; fotografia oferecida pelo  meu amigo [e conterrâneo, da Lourinhã] Boaventura [Horta] em 21/3/43."´ (*)

Foto (e legenda): © Luís Henriques (1920-2014) / Luís Graça (2017). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].




A obra “Forças Expedicionárias a Cabo Verde na II Guerra Mundial”, do nosso camarada Adriano Miranda Lima, cor inf ref,  vai ser lançada, hoje ao fim da tarde, às 18h00, no Mindelo, Ilha de São Vicente, Cabo Verde (**). A notícia foi-nos dada ontem às 16h pelo Manuel Amante da Rosa, nosso grã-tabanqueiro, que tenciona estar presente hoje, no evento.

Segundo o blogue Praia de Bote, o lançamento estava previsto para ontem,  e contaria com a com a presença do Chefe de Estado Maior das Forças Armadas de Cabo Verde, estando a apresentação a cargo da  dr.ª Ana Cordeiro, historiadora e antiga directora do Centro Cultural Português do Instituto Camões (Pólo do Mindelo), e sendo o autor, Adriano Miranda Lima,  representado pelo seu primo José Carlos Soulé.

Adriano Miranda Lima, que reside  em Tomar, nasceu no Mindelo,  S. Vicente .  Durante a guerra colonial, esteve em Angola e Moçambique. Prestou serviço durante muitos anos no RI 15 (Tomar). Esteve 40 anos sem voltar à sua terra.  Tem 15 referências no nosso blogue.

É colaborador assíduo do blogue Praia de Bote, onde  publicou,  em 2012  cerca de uma dezenas de postes sobre as forças expedicionárias a Cabo Verde na II Guerra Mundial. Colaborámos com ele autorizando a reprodução de algumas fotos dos álbuns dos "nossos pais, nossos velhos, nossos camaradas", que integararam essas forças, tendo passado  pelas ilhas de São Vicente, São Anão e/ou Sal. É também um grande defensor do património cultural de Cabo Verde.

 _________________

Sinopse:

Já quase se perde na memória do povo das ilhas que, entre 1941 e 1945, durante a II Guerra Mundial, forças militares de 5820 homens, destacadas pela então Metrópole, desembarcaram em Cabo Verde e distribuíram-se por S. Vicente (3015), Sal (2100) e S. Antão (705), onde prepararam posições defensivas contra um eventual invasor. 

Tudo aconteceu porque Portugal, embora neutro no conflito, foi pressionado pela Inglaterra e pelos EUA a reforçar a defesa das suas ilhas atlânticas (Açores, Cabo Verde e Madeira) para evitar que a Alemanha as ocupasse e tirasse proveito do seu potencial estratégico.

É de tudo um pouco que fala o livro. Da actividade militar e seus envolventes e vicissitudes de ordem operacional e logística, mas também do alvoroço que a presença das tropas representou para a rotina e a pacatez das ilhas. A narrativa debruça-se sobre a interacção dinâmica das forças militares com as circunstâncias concretas que as envolveram no quadro da sua missão, e abre espaço, e bastante, para pôr em evidência as múltiplas situações em que os militares interagiram com as populações e a sociedade civil.

Daí que haja muitas histórias para contar, e algumas de grata memória para as populações, como a acção médica e o apoio sanitário que as tropas disponibilizaram para os civis, em que se destaca sobremaneira a figura grandiosa do capitão médico José Baptista de Sousa, cuja imagem ainda perdura na memória do povo de S. Vicente. Para não falar também das sobras de rancho que mataram a fome a muitas pessoas carentes, iniciativa em que se destacou o comandante de companhia capitão Fernando Marques e Oliveira.

Relevo merece igualmente o pano de fundo social em que se desenrolou a missão das Forças Expedicionárias. As nossas ilhas foram à época assoladas por uma seca prolongada que, agravada pelo descaso ou pela inoperância do governo central, vitimou 24.463 criaturas, sobretudo aquelas que dependiam exclusivamente da agricultura para a sua sobrevivência. 

Do lado das Forças Expedicionárias reveste significado estatístico a circunstância da morte de 68 militares, trágica ironia porque as mortes não resultaram de acções violentas ligadas à actividade militar mas de doenças infecciosas que poderiam ter sido debeladas caso a penicilina estivesse já disponível em território nacional. Nesta particularidade, o quadro de carências era comum à população civil e à militar.

Portanto, nas 250 páginas do livro a historiografia cruza-se com a sociologia e conta histórias reais de homens fardados e de vidas humanas.

Fonte: Com a devida vénia ao blogue Praia de Bote, fundado e editado por Joaquim Saial, e de que o Adriano Lima  é um assíduo colaborador.

_____________

(**) Último poste da série > 27 de janeiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20600: Agenda cultural (726): Seminário de História do Colonialismo #2, dia 28 de Janeiro de 2020, pelas 15h30, Campus de Campolide da Nova

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20626: (Ex)citações (362): O ventre e o patacão da guerra, segundo duas preciosas listas de junho de 1974, guardadas pelo Zé Saúde... Cada um de nós tinha direito a um "per diem" de 24$50 para comer, o equivalente na época a um dúzia de ovos da Intendência (, a preços de hoje, 4,10 euros)



Lista nº 1 > CCS/BART 6523 [, Nova Lamego, 1973/74] > Relação dos víveres existentes no dia 17/6/1974

é

Lista nº 2 > CCS/BART 6523 [, Nova Lamego, 1973/74] > Relação dos artigos de  víveres existentes no dia 18/6/1974

Fonte: cortesia de José Saúde (2016). [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Excerto do poste P16177:

(...) Mantenho ainda comigo uma cópia de um relatório literalmente especificado de uma passagem de bens alimentícios em armazém entre dois furriéis da minha companhia - CCS / BART 6523 [, Nova Lamego, 1973/74[ - que entretanto assumiram a presunçosa função de vagomestre.

Curioso, por que é justo que o citamos, é que ambos foram “atirados” para uma incumbência completamente à parte daquela a que tinham sido submetidos durante o período em que foram mancebos de uma outra especialidade mas que ditou, ao arrepio da verdade, o seu subsequente futuro por terras da Guiné. Um que assumia o cargo desde a nossa chegada a Gabu; o outro a quem foi proposta a possibilidade de substituir o primeiro durante o seu período de férias, 30 dias.

Ainda assim, fica a textura de um documento que descrimina todo o conteúdo do material armazenado e os custos que cada um deles tinham à época. No balanço geral feito à narrativa exposta, oferece-me viajar nas fileiras da ventosidade do tempo e relembrar o “montão de patacão” que os homens que lidavam com os valores sob a sua “divina” proteção mantinham no interior de um quartel onde existiam inevitáveis privações.

Revejo as quantidades, os preços por unidade e o seu subsequente total, assim como os bens nutritivos que por ora eram então averiguados no momento da transição dos artigos de viveres que ambos os furriéis assumiam. Um entregava e outro recebia.

Da listagem observada, existe a certeza que,  se de um lado estavam os bens depositados,  do outro os ditos frescos. Ou seja, tudo o que fosse arroz, açúcar, azeite, batata, banha, feijão, grão, massas, vinho, óleo, vinagre, etc, etc, etc, pertencia a um lote, sendo que os frescos eram constituídos pelo frango congelado, peixes e fruta da época, entre outros, mas devidamente faturados.

O distinto documento era completado com as rações de combate, farinha, sal, café e outros bens necessários. Não há registos das compras espontâneas que se articulavam com o quotidiano, isto é, das vacas, dos leitões, dos porcos, dos cabritos, das galinhas, e outros, que concluíam a ementa.

Reportando-me aos números, refiro que a relação dos artigos em escudos era o seguinte: viveres existentes e frescos transportavam 319 986$20; outros viveres 88 587$10.


Creio que poucos, ou quase nenhuns, dos soldados depositados num quartel onde as “fissuras” de

uma peleja teimavam em ceifar vidas de jovens em plena idade de puro crescimento, desconheciam o conteúdo real de bens alimentícios que a companhia detinha.

Relembro ainda as famosas patuscadas organizadas pela malta que entretanto comprara um leitão, ou um cabrito, e que depois da sua trivial passagem pelo forno, servia de repasto fino para uma rapaziada que se orgulhava com o distinto acolhimento de um prato bem composto. A acompanhar lá estavam as cervejolas bem fresquinhas.

Relíquias de um tempo sem tempo numa Guiné que despejou em nós um cosmos de emoções. (...)



2. Comentário do editor Luís Graça:

O Zé Saúde, em boa hora, reproduziu este poste (**) e os respetivos documentos no seu livro "Um ranger na guerra colonial: Guiné.Bissau (1973-74). Lisboa: Colibri, 2019", pp. 163-166.

São preciosas informações sobre a "economia de guerra": por exemplo, em 17 de junho de 19974, a escassos 3 três meses, da retirada dos "últimos soldados do Império", o "stock" de mantimentos (víveres)  da CCS/ BART 6523, sediada em Nova Lamego (hoje, Gabu) importava em cerca de 320 contos, o que hoje, em euros, representaria qualquer coisa como 53.563,53 €.

O item com maior peso, na relação, era o vinho: 3.320 litos de vinho, a 11$60 o litro, importavam em 38.512$00 (, valor que, a preços de hoje, equivaleria a 6.446,65 €).

Um escudo em 1974 era equivalente hoje a 0,17 €. Mas é preciso ter em conta que o "escudo guineense" (o "peso") só valia, no mercado cambial, 0,90 escudos metropolitanos..

Seguia-se o arroz (, de produção local, da "bolanha") de que havia um "stock" de cerca de 5 toneladas e meia. A  7$00 escudos o quilo,  somava 38.416$00, o que daria hoje qualquer coisa como 6.430,58 €... Havia ainda 2 toneladas de arroz, importado, da metrópole, a 14$50 o quilo,o dobro do preço do arroz guineense.

O item mais caro, desta relação, era o bacalhau liofilizado: havia pouco mais de 40 kg, a 167$20 o quilo (o equivalente hoje a 27,99 €).

Ficamos a saber que o frango (congelado) custava, em 1974, para a manutenção militar, 7 € o quilo...

Da relação do dia 18/6/1974 (Lista nº 2), vai o nosso destaque para a ração de combate nº 20 de que havia em "stock" 680 unidades, a 43$00 cada (7,20 €, hoje).

Outro item essencial para a alimentação da tropa era a farinha (e o fermento): da lista nº 2 constavam quase 5 toneladas de farinha (4.350 de farinha de 1ª, mais 450 kg de farinha americana)... O preço por quilo da farinha de 1ª (portuguesa ?) era então de 6$00 (, o equivalente hoje a 1 euro)... Em "stock" havia 285 (quilos ou embalagens ?) de fermento leverina, a 35$50 por quilo (ou unidade), equivalente hoje a  5,94 €.

Um item que era um luxo era o ovo, fazendo parte tal como os "congelados" dos víveres "frescos", que eram  transportados de Bissau por via aérea: o "stock" era de 60 dúzias de ovos, a 24$30 a dúzia. Como não havia produção local, os ovos eram importados da metrópole...

Recorde-se que cada militar tinha direito a um "per diem" de  24$50  (=4,10 €), o equivalente a uma dúzia de ovos...

Por outro lado, a proporção de "frescos" (hortaliças, legumes, peixe, carne, leite, ovos...) era pequena em relação ao resto...Na lista nº 1, os frescos não ultrapassam os 400 kg, cabendo um 1/3 ao "frango congelado"... Não sabemos como é que o frango (congelado) chegava a Nova Lamego e em que condições, de higiene e salubridade ... O mesmo se pode dizer da pescada (congelada), que não ia além de 85 kg, no inventário do dia 17/6/1974 (Lista nº 1)...

A capacidade de frio, nos nossos quartéis, era muito limitada: não havia eletricidade todo o dia, os geradores eram ligados à noite, pelo que os frigoríficos e arcas frigoríficas tinham que funcionar também... a petróleo!

Em contrapartida, veja-se o peso das "massas" (1.225 kg) e das "salsichas" (meia tonelada), bem como da "marmelada" (mais de meia tonelada), das "conservas de peixe" (330 kg.)... Havia mais de 2,3 toneladas de feijão, na maior parte "seco" (1,9 toneladas)... Em relação ao  "feijão verde" (400 kg.) não sabemos a sua proveniência...

Nestas condições, era complicado para o vagomestre (que, além disso,  não era nutricionista, ou teria pouca formação em nutrição tal como os médicos da época...) fazer dietas equilibradas e saudáveis (, veja-se aqui, no sítio da Direção Geral de Saúde, a "roda dos alimentos", um instrumento de educação alimentar largamente reconhecido pela população portuguesa pela sua utilização desde 1977 na campanha 'Saber comer é saber viver').... 

Não sabemos qual era o recurso, no Gabu, a produtos frescos locais, provenientes do mercado local e da horta da tropa: refiro-me, por ex., às alfaces, as cenouras, às couves, às frutas tropicais, à carne (vaca, porco,cabrito) eao peixe...Comia-se mal, em quantidade e qualidade... abusando-se do "casqueiro", das massas, do arroz, dos  legumes secos, da banha,  e das conservas (chouriço, cavala, atum...).

A título exemplificativo, aqui vão outros itens a preços de hoje, por quilo (ou por litro, no caso do azeite e do vinho):

Azeite: 8,03 €

Batata: 1,37 €
Café: 1,87 €
Cavala (conserva): 11,94 €
Chouriço: 10,85 €
Feijão frade: 2,56 €
Grão (de bico):2,90 €
Margarina: 2,90 €
Massa: 2,03 €
Pescada-marmota: 3,36 €
Sal: 0,17 €
Sardinha (conserva): 8,97 €
Vinho: 1,94 €


Quanto às conservas (sardinhas, cavalas...),  tal como o chouriço, partimos do princípio que vinham em embalagens (latas) de quilo. Convertidos em euros (a preços de hoje),. os valores obtidos não nos parecem divergir muito do que se pratica hoje em relação a 1974...

Constatamos, por fim, que na "despensa" da CCS/BART 6523, havia tambêm, em existência, mercadorias que pertenciam a outras subunidades: CCAÇ 11, 1ª CART / BART 6523, 3ª CART / BART 6523...
_____________

Guiné 61/74 - P20625: Parabéns a você (1753): Ana Mittermayer Duarte, Amiga Grâ-Tabanqueira; Hugo Moura Ferreira, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 1621 e CCAÇ 6 (Guiné, 1966/68) e José Teixeira, ex-1.º Cabo Aux Enfermeiro da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70)



____________

Nota do editor

Último poste da série de 4 de fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20621: Parabéns a você (1752): Cap Inf Ref José Belo, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70) e Mário Silva Bravo, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 6 (Guiné, 1971/72)

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20624: Historiografia da presença portuguesa em África (198): Relatório da Província da Guiné Portuguesa, 1888-1889, pelo Governador Interino Joaquim da Graça Correia e Lança (1) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Fevereiro de 2019:
Queridos amigos,
A historiografia da Guiné colonial não pode prescindir destes relatos de uma Guiné autónoma desde 1879, todos estes relatórios revelam vozes múltiplas, tecem-se críticas à indiferença da metrópole, relevam-se potencialidades na agricultura, denunciam-se concessões em que não se explora a terra, acentua-se o definhamento do Sul devido às guerras entre Fulas do Forreá, passa-se ao crivo o funcionamento da administração, de um modo geral não se esconde a lástima da administração civil e militar, tudo ao abandono, a administração não chega ao interior.
Sem a análise destes documentos são incompreensíveis os levantamentos na região de Bissau, na circulação do Geba, na hostilidade permanente em todo o interior da Guiné. Sem este pano de fundo que os primeiros governadores descrevem jamais se entenderão as guerras de pacificação. Mas será preciso esperar por Vellez Caroço para se poder falar da colónia da Guiné como um todo territorial e administrativo.

Um abraço do
Mário


Relatório da Província da Guiné Portuguesa, 1888-1889, 
pelo Governador Interino Joaquim da Graça Correia e Lança (1) 

Beja Santos

Conselheiro Joaquim da Graça Correia e Lança

O conjunto dos primeiros relatórios enviados pelos governadores da Guiné para o Ministro do Ultramar e da Marinha são documentos indispensáveis para conhecer opiniões, reflexões e até sugestões de personalidades que se revelam de preparações culturais bastantes diferenciadas. Não escondem as dificuldades, as guerras entre os Fulas, as questões da agricultura, a degradação das instalações e dos equipamentos, as tremendas carências nos transportes, a falta de infraestruturas rodoviárias e portuárias. O primeiro documento importante saiu do punho de Pedro Inácio de Gouveia, já aqui foi publicado. Correia e Lança apresenta-se com uma enorme humildade, homenageia os governadores que o precederam, sem esconder o muito pouco tempo que lá permaneceram.

Nada melhor do que lhe dar a palavra para lhe conhecer o pensamento, o que ele pretende obter enquanto Governador Interino:
“Uns governadores dividem o relatório anual em tantos capítulos quanto os diversos ramos do serviço público; outros seguem a ordem por que nos orçamentos estão descontadas as despesas, e vão assim relatando os vários serviços; outros ainda não adoptam nenhum destes sistemas e dão-lhes uma ordem de harmonia com os principais assuntos da sua administração. Eu, e releve-se-me a ousadia, não seguirei nenhuma das maneiras que tenho visto adoptar, talvez porque as condições especiais da Guiné me aconselham a dar ao relatório uma forma mais metódica, de maneira que muito natural e logicamente se vão tirando as conclusões a que eu quero chegar”.

O curioso, depois desta nota introdutória, é que ele vai estruturar a sua narrativa em moldes praticamente idênticos a anteriores relatórios, ou seja, enuncia considerações gerais, fala das questões económicas, das questões políticas e depois das questões administrativas.
Relembra que “Foi em virtude de um grave conflito gentílico, que é doloroso recordar (subentenda-se: o massacre de Bolor), pelo que foram vitimados cruelmente muitos soldados portugueses, que surgiu a reorganização administrativa da Guiné em Província independente. Se até essa data, 1879, as autoridades superiores apenas se preocupavam em resolver questões de administração, e unicamente à medida que as questões surgiam, levando-se uma vida de expedientes e imprevidências, não foi mais feliz o território que dá um título constitucional ao augusto monarca português. Em seguida a criação da Província não se resolveu o problema gentílico, antes se agravou; que não foram lançadas as bases de uma reforma económica que assegurasse o desenvolvimento agrícola e não se cuidou em reorganizar a administração: decaiu a agricultura; estão agravados os conflitos gentílicos, está comprometido o comércio. É convicção arreigada de que a Guiné há de definhar porque o seu comércio diminui e se desnacionaliza”.
E para mostrar que na opinião nacional a descrença na Guiné era um dado assente, reproduz a opinião de um publicista: “A Guiné pouca importância tem; são feitorias comerciais que nada comerciam com a metrópole, e cujo foco de atracção está nos estabelecimentos vizinhos da Senegâmbia francesa”. E comenta: “O sábio publicista recorreu à lenda que de há muito se formou acerca da decadência desta colónia portuguesa. É assim que a opinião pública se desorienta, que os mais ousados se entibiam, que os capitais se retêm, que a própria navegação nacional passa de roda como se a Guiné de facto já não pertencesse à monarquia portuguesa”.

Correia e Lança mostra-se profundamente cético com a situação degradada que se vive no Forreá, está descrente na dedicação dos Fula-Pretos ou Forros pela agricultura, acha que a sua opinião se distingue da opinião geral de quem vive na Guiné. Mas ele explica porquê: “Mamadu Paté Bolola, o chefe do Forreá, ludibria o próprio Governo. Tendo-se-lhe feito um empréstimo de cereais que pediu a pretexto da fome originada pela guerra, prometendo pagar pela colheita, pois que ia desenvolver a agricultura em larga escala, não pode cumprir esta promessa pela simples razão de que não fez lançar à terra semente alguma da que se lhe emprestou”.

Centrado na questão agrícola, observa que a zona agrícola de grande fertilidade é a do litoral, mas fala num grave condicionalismo: “Não está porém ocupado administrativamente em toda a sua grande extensão, mas nas margens do Rio Grande, Geba e Cacheu até Farim seria fácil abrir grandes propriedades agrícolas com resultado certo e remunerador”. E comenta com absoluta franqueza: “Na Guiné fizeram-se muitas concessões de terrenos mas a propriedade agrícola não se fundou. A Província de África que naturalmente estava indicada para colonizar a Guiné era Cabo Verde. Os cabo-verdianos aclimatam-se facilmente e poderiam prestar à agricultura grandes serviços. A Província conta hoje com um grande número de colonos daquela precedência, mas em geral os que para aqui vêm preferem a vida burocrática aos labores do campo, e os que não conseguem qualquer emprego público vão arrastando com dificuldade uma vida de expedientes comerciais. Ultimamente, porém, algumas propriedades têm-se organizado, pertencem de uma parte a cabo-verdianos”. O mundo das feitorias que tinha conhecido um franco desenvolvimento no último período da escravatura estava a definhar, como ele escreve: “Hoje no Rio Grande apenas se mantêm as feitorias da Casa Blanchard & C.ª e a do Sr. João Hopffer”.

Faz uma descrição minuciosa da economia dos Bijagós e depois dá conselhos sobre culturas promissoras: mancarra, cana sacarina, algodoeiro, índigo, cochinilha, tabaco, borracha, palmeira de dendém, coqueiros. Exalta também a plantação da cola: “O fruto desta bela árvore, semelhante a uma castanha, de um sabor amargo mas agradável, constitui um artigo de primeira necessidade na larga zona da Senegâmbia e do Sudão, onde residem as raças Fula e Mandinga”.

No capítulo do comércio e indústria, Correia e Lança adiciona a sua opinião, deste modo: “A Guiné Portuguesa está destinada a um papel muito secundário da vasta zona compreendida entre o Senegal e a Serra Leoa”. E explica que as grandes artérias por onde o comércio interior há de deslizar passa pelos rios Senegal e Gâmbia, Casamansa, Nunes e Pongo. Mostra-se muito crítico sobre as pautas aduaneiras, a obtenção de receitas e a movimentação de mercadorias. Os três centros mais importantes de comércio da colónia eram Farim, Geba e Bissau, e dá a relação dos géneros comercialmente mais apetecíveis: borracha, cera, marfim, couros, tudo em troca de pólvora, tabaco, cola, panos, álcool e armas. Observa que em Cacheu o comércio que se fazia era de coconote e borracha. Em Bolama o principal produto exportável era a mancarra. Buba já estava pouco comercial: “A índole dos Fulas do Forreá, em correrias e pilhagem contínua pelos caminhos que conduzem do Futa Djalon a Buba, contribuiu para a decadência comercial daquela praça”.

E faz conclusões:  
“A Província da Guiné Portuguesa, envolvida por uma zona de comércio livre, não pode manter-se no equilíbrio de concorrência senão declarando livre a importação. A corrente comercial, que a liberdade da importação deve estabelecer, barateando a vida, auxiliando a agricultura e facilitando o comércio, há de determinar o aumento considerável na exportação. A Província deve ser ligada directamente à metrópole por meio de carreiras a pavor de grande tonelagem. A situação monetária estrangeira deve ser limitada à moeda que nos mercados da Europa não sofra depreciação. A indústria indígena está no seu período rudimentar, sem manifestação de progresso sensível.”

(continua)

Antiga casa de sobrado, hoje sede da AMI, que preservou o edifício. 
Fotografia de Francisco Nogueira no livro “Bijagós, Património Arquitetónico”, Tinta-da-China, 2016, com a devida vénia
____________

Nota do editor

Último poste da série de 31 de janeiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20611: Historiografia da presença portuguesa em África (197): "Nha" Carlota (1889-1970) e Artur Lopes Nunes (1909-2007), dois portugueses de antanho

terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20623: Memórias ao acaso (Miguel Rocha, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2367/BCAÇ 2845) (1): Origem do nome, Vampiros

Crónica do Miguel José Ribeiro da Rocha[1], ex-Alf Mil Inf.ª da CCAÇ 2367 do BCAÇ 2845, “o 800”

MEMÓRIAS AO ACASO

01 - Origem do nome, VAMPIROS

As canções de intervenção, mormente as de Zeca Afonso, trazidas pela malta das Faculdades Coimbrãs, cujos cursos haviam sido interrompidos pelo recrutamento intensivo para o Serviço Militar, faziam parte das noites de tertúlia da "aspirantada" que no verão de 67 arribou ao RI 7/Leiria, para dar a sua primeira recruta. Prática que se acentuou no formar do Batalhão, nas noites gélidas do inverno de 67/68, no BC 10, em Chaves, com a Guiné como destino resistentemente adivinhado.

A CCAÇ 2367, "a vinte e três sessenta e sete", era assim que entre nós se articulava o seu número, saiu da Metrópole sem nome de guerra.

Olossato - Rua principal
Com a devida vénia ao Blogue CC2367 Guiné Bissau 1968-1970  

É no Olossato, já como força de Intervenção e com independência consentida para planear as suas operações que, para além das mais rotineiras, efectua uma série de "golpes de mão" bem sucedidos a tabancas e acampamentos do IN, estabelecidos na sua zona de acção.
Basicamente, o "modus operandi" consistia em sair de noite e silenciosamente do nosso aquartelamento, fazer o percurso até ao objectivo, esperar pela visibilidade mínima, efectuar o cerco e assalto, e retirar rapidamente.

A ironia é que fragmentos dos versos da canção Vampiros do Zeca, cantados por pura rebeldia nossa, nos latejavam na mente, por perfeito encaixe, na hora de partida para estas operações. Assim nasceu o nome da CAÇ 2367.

“Vampiros”.
O grafismo foi inspirado no emblema da colecção policial de livros de bolso, do mesmo nome.
____________

Nota do editor

[1] - Vd. poste de 21 de novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20369: Tabanca Grande (488): Miguel José Ribeiro da Rocha, ex-Alf Mil Inf.ª da CCAÇ 2367/BCAÇ 2845 (Olossato, Teixeira Pinto e Cacheu, 1968/70), tertuliano com o número 800 da nossa Tabanca

Guiné 61/74 - P20622: Tabanca Grande (490): Luiz Farinha, ex-alf mil, STM Auto, CCS/BCAÇ 3832 (Mansoa, dez 1970 / fev 1973), psicólogo clínico aposentado, escritor: senta-se à sombra do nosso mágico e fraterno poilão, no lugar nº 803


Guiné > Região do Oio > Mansoa > CCS/BCAÇ 3832  (Dezembro de 1970 / fevereiro de 1973) > O afl mil Farinha, STM Auto (1)


Guiné > Região do Oio > Mansoa > CCS/BCAÇ 3832  (Dezembro de 1970 / fevereiro de 1973) > O afl mil Farinha, STM Auto (2)


Guiné > Região do Oio > Mansoa > CCS/BCAÇ 3832  (Dezembro de 1970 / fevereiro de 1973) > Ponte Nova sobre o Rio Mansoa

Fotos (e legendas): © Luiz Farinha  (2020). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem do nosso novo grã-tabanqueiro Luíz Farinha, que passa a ser o nº 803, a sentar-se à sombra do nosso mágico,  simbólico, fraterno e protetor poilão...(e quem não tem poilão deita-se no chão):


De: José Luiz Farinha
Data: quarta, 15/01/2020 à(s) 14:29
Assunto: Pedido de informação... e de entrada na Tabanca Grande

Estimado Companheiro.

Sou o ex-alf mil Farinha,  com a especialidade de STM Auto, da CCS / BCAÇ 3832 (Mansoa, 1970-1973). Vivi momentos inesquecíveis durante estes anos na Guiné, que, sem dúvida, modificaram a minha vida e, ainda hoje, em certa medida, a afetam. 

Como sempre me dediquei à escrita, embora como atividade secundária e não remunerada, algum tempo depois da desmobilização escrevi um pequeno livro, mais uma modesta brochura do que propriamente um livro, pela editora Contra a Corrente, hoje desaparecida, texto que rapidamente se esgotou.

Passados poucos anos, recebi o honroso pedido do escritor João de Melo, então praticamente em início de carreira, para que eu autorizasse a inclusão de um dos meus relatos numa obra que ele estava a elaborar sobre textos que versassem a guerra colonial nas três frentes. Eu acedi com gosto e a obra saiu pelo "Círculo de Leitores". ["Os Anos da Guerra, 1961 – 1975, Os Portugueses em África, Crónica, Ficção e História”, com organização de João de Melo, Publicações Dom Quixote, 1988 e 1998: vd. aqui a exaustiva recensão bibliográfica do nosso camarada Mário Beja Santos, em cinco postes, em 2010].

O livrinho da "Contra a Corrente", malgrado a sua efémera vida, no entanto nunca me saiu da cabeça, como que um molde experimental de algo que poderia ser maior.

E, muitos anos depois, recentemente, aposentado como psicólogo clínico, voltei a pegar nele e a trabalhá-lo de uma forma mais profunda e extensiva.  Durou cerca de um ano esse aprimoramento que terminou num romance com muito de autobiográfico. 

Então, a minha pergunta/pedido de ajuda é o seguinte: estou no Brasil há cerca de 20 anos e não conheço o mercado editorial português nem ninguém ligado ao ramo.  Será que alguém do seu
blogue poderia dar uma ajuda (dicas, pistas, contatos, etc) para a publicação deste romance?...
Aguardo uma resposta que desde já muito agradeço, seja ela qual for. 

Felicidades para a Tabanca. 

Abraço firme.

Luiz Farinha,
Piedade, Jaboatão dos Guararapes, Estado do Pernambuco, Brasil
Contactos (omitimos o telefone e o endereço postal)
jlsfarinha1947@gmail.com

2. Resposta do editor Luís Graça:

Em 31/1/2020, o Luiz Farinha mandou-nos as fotos da praxe (uma atual e outra do "antigamente"), gesto que interpretámos como sinal da sua vontade de se juntar a esta grande comunidade de amigos e camaradas da Guiné. As fotos estão reproduzidas acima, incluindo a sua foto atual.

De Luís para Luiz, de sociólogo da saúde para psicólogo clínico, de camarada de Bambadinca para camarada de Mansoa, de escritor para escritor: temos muita coisa em comum, a começar pelo nome... Curioso, o meu pai também era Luiz com Z...Somos da mesma "colheita" (1947). Vejo, além disso,  que estamos ambos ligados à saúde, eu porventura  com um percurso mais académico, e com dois filhos "psis": um psiquiatra e uma psicóloga clínica... E mais: ambos temos o gosto da escrita...e alguma obra publicada...

"Parabenizo-te", como gostam de dizer os nossos amigos brasileiros, pela tua mensagem que muito nos honra, e  a que respondo, um pouco tardiamente, mas sempre a tempo.

Fico feliz por encontrar mais um camarada da diáspora lusófona (e, neste caso, lusitana). Mas, antes de mais, deixa-me apresentar-te a Tabanca Grande. Contigo passamos a ser 803  "grã-tabanqueiros", entre vivos e mortos, todos irmanados pelo mesmo espírito de partilha de memórias (e de afetos) à volta daquela terra, verde-rubra (sem conotações...) que foi a Guiné de 61/74.

O facto de passares a pertencer à Tabanca Grande, à nossa "tertúlia" (, talvez a maior do mundo bloguístico, em português, centrada na experiência de uma guerra...)  significa que aumentas também as tuas possibilidades de encontrar um editor para o teu livro para o qual desejo, desde já, bom sucesso. Editor e leitores...

O nosso blogue, Luís Graça & Camaradas da Guiné, orgulha-se de já ter ajudado no "parto" de dezenas de livros (da poesia à ficção, do conto ao romance, da historiografia à autobiografia), da autoria de "amigos e camaradas da Guiné", na sua grande maioria antigos combatentes. Sem favor, são obras que, com maior ou menor mérito, podem ser classificadas como "literatura da guerra colonial" (, termo que, de resto, não é pacífico).

Temos aqui gente de grande talento e com obra de mérito. Eles poderão (e eu também, em próximo poste) falar-te um pouco mais detalhadamente do mercado editorial português,e dar-te alguns dicas para contactos.

Terás que ter um pouco mais de paciência. Mas sugiro que, na volta do correio, nos digas algo mais sobre a tua pessoa, a tua vida em Portugal, na Guiné e no Brasil, e sobretudo que nos mandes um "cheirinho",um excerto, do teu romance (que dizes ter "muito de autobiográfico").

O nosso blogue tem algumas regras, de bom senso e de bom convívio, que deves conhecer. Lê aqui.s 10 regras da política editorial do blogue. O teu nome passa a figurar na lista alfabética, de A a Z, da Tabanca Grande, constante da coluna (estática), no lado esquerdo, da página principal do blogue. Sê bem vindo, camarada Luiz Farinha. (*)

______________

Nota do editor:

Últmos postes da série:

(*) O último camarada a entrar para a Tabanca Grande, embora a título póstimo,  foi o Libório Tavares, ex-alf mil capelão, o nº 802, a seguir ao Alexandre Margarido (nº 891):


19 de dezembro de  2019 > Guiné 61/74 - P20471: Tabanca Grande (489): Alexandre Margarido, ex-cap mil grad inf, op esp / ranger, último cmdt da CCAÇ 3520 (Cacine, Cameconde, Quinhamel, 1972/74)...Senta-se à sombra do nosso poilão sob o nº 801

Guiné 61/74 - P20621: Parabéns a você (1752): Cap Inf Ref José Belo, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2381 (Guiné, 1968/70) e Mário Silva Bravo, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 6 (Guiné, 1971/72)


____________

Nota do editor

Último poste da série de 2 de Fevereiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20615: Parabéns a você (1751): Germano Santos, ex-1.º Cabo Op Cripto da CCAÇ 3305 (Guiné, 1970/73)

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20620: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XXXV: Francisco Vasco Gonçalves Moura Borges, cap cav, 1º cmdt da CCAV 2721 (Sintra, 1944 - Lisboa, HMP, 1970): ferido gravemente no decurso da Op Jaguar Vemelho, no mítico Morés, acabou por morrer um mês depois em Lisboa, no Hospital Militar Principal





1. Continuação da publicação da série respeitante à biografia (breve) de cada um dos 47 Oficiais, oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar que morreram em combate no período 1961-1975, na guerra do ultramar ou guerra colonial (em África e na Ásia). (*)

Trabalho de pesquisa do cor art ref António Carlos Morais da Silva [, foto atual à esquerda], membro da nossa Tabanca Grande [, tendo sido, no CTIG, instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá Mandinga, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael, entre 1970 e 1972 ]

2. Sobre a Op Jaguar Vermelho, onde o cap cav Moura Borges, cmdt da CCAV 2721 (Olossato e Nhacra, 1970/72), foi ferido gravemente (, acabando por morrer um mês mais tarde, em Lisboa, no Hospital Militar Principal), temos uma referência, um poste do nosso camarada Carlos Fortunato (**).  

Mobilizada pelo RC 4, a CCAV 2721 partiu para o TO da Guiné em 4 de abril de 1970 e regressou a 28 de fevereiro de 1972. Teve como comandantes, além do infortunado cap cav Moura Borges, o cap cav Mário [António Baptista] Tomé. O nosso camarada e amigo Paulo Salgado foi alf mil op esp nessa companhia, e poderá dizer-nos algo mais sobre a Op Jaguar Vermelho.
________________


(**) Vd. poste de 20 de outubro de  2014 > Guiné 63/74 - P13766: (Ex)citações (240): Água da bolanha... quem a não bebeu ?!... Recordando aqui o pesadelo que foi a Op Jaguar Vermelho, no Morés, em 9 de junho de 1970... (Carlos Fortunato. ex-fur mil trms. CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71, e presidente da direção da ONDG Ajuda Amiga)

Guiné 61/74 - P20619: Notas de leitura (1261): Longas Horas do Tempo Africano, por Manuel Barão da Cunha; 10.ª edição, revista e reestruturada, Oeiras Valley, Município de Oeiras, 2019 (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 30 de Janeiro de 2020:

Queridos amigos,
Manuel Barão da Cunha, um caso sério de reincidência na literatura da guerra colonial, um apóstolo da sua difusão organizando tertúlias entre Lisboa e Oeiras, desta vez convoca um elevado número de testemunhos que referenciam o homem e a sua obra.
Tendo começado a escrever ainda no Estado Novo, sobressaiu pelo cuidado posto na exaltação dos seus soldados, na satisfação expressa pela obra feita. Vê-se claramente que tem o seu coração repartido por Angola e pela Guiné. E é admirável este seu trabalho alquímico de mexer e remexer nas coisas do passado, o chamamento que faz de vivos e mortos que pertencem à sua história, participantes de toda a sua vida militar e até civil.
Deve-se a Manuel Barão da Cunha uma enorme gratidão coletiva por ser um porta-bandeira sem rival no dever de memória, trazendo-nos à presença toda e qualquer pessoa que calcorreou o império ou nele combateu. É uma dívida de peso, impagável. Mas ele também não se importa.

Um abraço do
Mário


Longas horas do tempo africano, por Manuel Barão da Cunha

Mário Beja Santos

Num estudo recente sobre as cartas de guerra, uma investigação de Joana Pontes intitulada Sinais de Vida, Tinta-da-China, 2019, esta conhecida investigadora e jornalista observa que a generalidade da correspondência estudada confina-se a um tempo demarcado, o da comissão militar, aos lugares que o combatente percorreu ou onde vive, não há um entendimento do fenómeno da guerra no seu todo, as motivações de fundo, acrescendo que com o passar dos anos, um pouco como o passar dos meses da comissão militar, é percetível o desalento e a vontade de regressar. Serve este preâmbulo para abrir caminho a uma outra consideração: toda a literatura da guerra colonial tem que ser ponderada no tempo em que se publicou, conheceu sucessivas etapas. Não é homogénea, o que se escreve sobre a Guiné tem particularidades, não se encontra na literatura de guerra angolana ou moçambicana. Qualquer relato remete-nos para a localização e a natureza do inimigo. Um exemplo mínimo: quem escreve sobre a Guiné inclui, inevitavelmente, rios e rias, lodo, diferenças de maré, humidade excessiva, calcorrear quinze quilómetros nos emaranhados de uma floresta-galeria provocam uma exaustão sem paralelo; quem escreve sobre Angola e Moçambique fala em longas distâncias, viagens de centenas de quilómetros, operações com montes e vales.

O que se vai espelhar na literatura, consoante o palco e a experiência vivida pelo combatente. Ler Armor Pires Mota, Álvaro Guerra, José Martins Garcia, Álamo Oliveira, Cristóvão de Aguiar, José Brás, Luís Rosa, é perceber como estes homens falam de um tempo, de lugares, de situações distintas, como distintas foram as perceções que eles registaram da guerra que viveram. E o mesmo se pode dizer de escritores como João de Melo ou António Lobo Antunes, em Angola, ou Carlos Vale Ferraz ou António Brito, em Moçambique.

E o fenómeno literário também é irradiante, pois abarca romance e conto, memórias, ensaio, poesia, reportagem, história e diários. Atenda-se que um significativo número de escritores faz uma só “viagem”, memórias ou romance, escreve-se uma vez e não se regressa. Há os reincidentes, caso de Armor Pires Mota e Manuel Barão da Cunha. Curiosamente, ambos escreveram na fase de arranque, sob a forma de epopeia, de gesta, da glorificação da obra do soldado, da exultação da camaradagem e do destemor de gente humilde que apanhou o início das guerras.

Manuel Barão da Cunha 

Manuel Barão da Cunha tem vasta obra, todo começou com um livro memorial, Aquelas Longas Horas, 1968, edição da Mocidade Portuguesa. Combateu em Angola, ali estava em 1961, conheceu ásperos tempos, irá intervir em regiões cruciais, como Nambuangongo, participou na operação Viriato. Estará na Guiné, anos depois, na intervenção direta, fazendo operações em santuários do PAIGC e depois na quadrícula, no Leste, no regulado de Pachana. Em 1972, reciclou o que escrevera, com novos averbamentos, e publicou Tempo Africano. Escreverá posteriormente A Flor e a Guerra, em 1974, na Parceria António Maria Pereira. É um registo distinto, tem pouco de épico ou glorificador, ressalta uma visão amargada, é um homem doente, ferido, seguramente a desiludir-se, se tivermos em conta o que escreveu.

Depois, como um alquimista, passou a torcer, a retorcer e a distorcer as diferentes narrativas de guerra. O essencial das suas memórias tem a ver com a Angola de 1960 a 1962 e a Guiné de 1964 a 1966. Foi um pioneiro desta escrita, faça-se-lhe justiça. Já uma vez escrevi como ele fala dos seus soldados, das obras que deixarão em vários pontos de Angola e da Guiné, segundo um princípio axial: “A obra ficava, o homem partia. A obra ficava para outros homens e o homem partia para outras obras”. Fazendo e refazendo o Tempo Africano foi tratado como farinha espoada, a narrativa passou a compartimentar-se em andamentos, e onde o autor se distanciava de tudo quanto contava, foi-se gerando uma aproximação autobiográfica, com o recurso a um alter-ego, Pedro Cid, que vai dialogando com um jovem, em variadíssimas situações que metem repastos e encontros com outros veteranos de guerra. O jovem, Francisco Adão, pergunta, Pedro Cid responde, ao sabor da cronologia. Tudo começa em Angola, estamos em janeiro de 1960, Pedro é um “dragão”, um jovem alferes que comanda mancebos naturais ou residentes em Angola. E assim chegamos aos acontecimentos de fevereiro de 1961, com os ataques a Luanda e musseques periféricos. Pedro é um observador privilegiado, cabe-lhe ir a Nambuangongo com os seus “dragões”, seguir-se-ão outras dolorosas missões, e mesmo autobiográfico retoma-se a atmosfera de Aquelas longas horas, dando ênfase aos comportamentos militares de exceção. Gente que aparece agora a depor, entre muitíssimos outros depoimentos na obra mais recente de Manuel Barão da Cunha, "Longas Horas do Tempo Africano", 10.ª edição, revista e reestruturada, Oeiras Valley, Município de Oeiras, 2019.

Pedro regressa a Portugal, estará em Lamego nas Operações Especiais. E em 1964, parte para a Guiné, na CCAV 704. No início, faz parte das forças de intervenção, vai ao Sul e depois ao Morés, volta agora a falar nesta operação Tornado que durou cerca de 80 horas. E depois passa para a quadrícula, estará no Leste, fala em Bajocunda e Copá, vive em Amedalai, sede do regulado da Pachana, deixarão obra. Pedro Cid regressará a Angola entre 1969 e 1971.

O seu novo livro recolhe depoimentos de amigos, de companheiros de estrada, de camaradas que o admiram, alguns deles foram seus militares: o escritor João Aguiar, o General Rocha Vieira, o Engenheiro Anacoreta Correia, o Professor Henrique Coutinho Gouveia, entre tantos outros. A edição é ricamente ilustrada com desenhos do pintor Neves e Sousa. Uma autobiografia num livro de consagração do escritor. Fala-se da sua preparação, o Colégio Militar é uma referência. É meticuloso nas suas referências. Quando fala da operação Viriato, anota: “Durante 36 dias e 36 noites e ao longo de 1419 km deparámo-nos com mais de 20 ações de combate, incluindo emboscadas, muitas das quais não foram registadas por terem sido atingidos militares de outras unidades, num total de 3 mortos e 38 feridos; mais de duas centenas de obstáculos, alguns constituídos por 4 e 5 árvores empilhadas ou embondeiros gigantes, fazendas destruídas, incluindo casas e viaturas; abrigos próximos da picada, para facilitar a emboscada".

Livro de uma vida militar, nele acorreu um conclave de diferentes protagonistas de todo este itinerário que depois se prolongou pela vida civil, um trabalho proficiente na Livraria Verney, onde começaram as afamadas tertúlias Fim do Império, que hoje se derramam por diferentes espaços, acolhendo apresentação de obras de múltiplos olhares, tal e tanto é o incansável dever de memória a que Manuel Barão da Cunha se entrega.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 31 de Janeiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20610: Notas de leitura (1260): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (43) (Mário Beja Santos)

domingo, 2 de fevereiro de 2020

Guiné 61/74 - P20618: Lembrete (34): Estão todos convidados: sessão de apresentação do último livro do José Saúde, "Um ranger na guerra colonial": Lisboa, Casa do Alentejo, sábado, dia 8 de fevereiro, a partir das 15h00: com animação musical: (i) Rancho de Cantadores da Aldeia Nova de São Bento; e (ii) Grupo Musical 'Os Alentejanos' de Serpa.


Cartaz do evento, Casa do Alentejo, sábado, 8 de fevereiro de 2020, 15h00


1. Mensagem do nosso companheiro e escritor José Saúde, que vive em Beja, é natural de Vila Nova de São Bento, Serpa, e é autor de 9 livros, o último dos quais vai ser apresentado, agora em Lisboa, na Casa do Alentejo:

[O José Saúde, foto à esquerda, foi Fur Mil Op Esp/Ranger da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu, 1973/74). Tem cerca de 180 referências no nosso blogue. O livro, "Um ranger na guerra colonial" já teve uma primeira apresentação em Beja, no passado dia 10 de dezembro.]


Data: sexta, 31/01/2020 à(s) 21:38

Assunto: Cartaz "Um Ranger na Guerra Colonial, Guiné-Bissau, 1973/74"
Luís,

Segue o cartaz para o lançamento do meu nono livro "Um Ranger na Guerra Colonial, Guiné-Bissau 1973/74, Memórias de Gabu", na Casa do Alentejo em Lisboa, sábado, 8 de fevereiro, 15h00. (*)

Agradeço que divulgues, uma vez mais, o evento. Tanto mais que a Tarde Cultural promete. Presentes irão estar o Rancho de Cantadores de Aldeia Nova de São Bento, a terra que me viu nascer, e o Grupo Musical "Os Alentejanos" de Serpa.

Conto com a presença de camaradas que suportaram as agruras de uma guerra para a qual fomos atirados. Estão todos... convidados! (**)

Um abraço e até sábado, amigo.

Zé Saúde 

2. A Casa do Alentejo fica aqui, em plena Baixa de Lisboa, na Rua das Portas de Santo Antão, 58 1150-268 Lisboa. 

Há muitos camaradas que nunca lá foram. É também uma excelente oportunidade para conhecer um dos mais interessantes (e surpreendentes) edifícios da cidade de Lisboa.


___________

Notas do editor:

(*) Vd. postes de:


Guiné 61/74 - P20617: Blogues da nossa blogosfera (120): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (35): Palavras e poesia


Blogue Jardim das Delícias, do Dr. Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887, (Canquelifá e Bigene, 1966/68), com a devida vénia, reproduzimos esta publicação da sua autoria.

NA PALMA DA MÃO

ADÃO CRUZ

© ADÃO CRUZ


Na palma da mão tenho sonhos de liberdade e silêncio
para enfrentar a morte.
A música treme na palma da mão
como incerteza de futuro e paisagem.
Quem dera adivinhar a cor desta canção cinzenta
que se dissolve no ar que respiro.
Neste verão diferente do outro
eu quero vestir a primavera
sem medo dos tiranos e da moral burguesa.
Quero escolher as palavras do poema
que faz chorar os olhos azuis
e abrir o sonho à luz do meio-dia.
Quero renascer dos versos
que dentro de mim acendem as estrelas
e clamam por outros seres e outros mundos.
Quero seguir quem me chama para outros mares
onde o sol sempre nasce e ilumina.
Creio que a terra ainda é minha
e de espirais de estrelas o meu regresso.
O sol arde nas nuvens
e o mar verde leva-me para habitar contigo
onde quer que estejas.
Não sei aprender a morrer
fora das linhas desta mão incerta
onde as flores de verão deixaram raízes no inverno
que hão-de desabrochar na manhã de sol em que partirei.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 26 de Janeiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20596: Blogues da nossa blogosfera (118): Jardim das Delícias, blogue do nosso camarada Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 (34): Palavras e poesia

Guiné 61/74 - P20616: Blogpoesia (658): "Falta-me o tema", "Amigo total e fiel" e "Assustado. Não aflito...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados, entre outros, ao nosso blogue durante a semana, que continuamos a publicar com prazer:


Falta-me o tema

Abeiro-me do seixo de pedra, com martelo e cinzel.
Olho-o à tona.
Perscruto-lhe o seio e fico às cegas.
Parece sem alma aquele pedaço de pedra.
Cerro meus olhos e medito.
Pode ser que as duas almas, a minha e a dele, se entendam.
Sim, ele tem alma.
A fé arrasa montanhas.
Sabía-o bem o inexcedível Miguel Ângelo à procura da de David.
Uma chispa ardente saltita à primeira pancada.
Salta uma lasca redonda no chão.
Brotam as letras com laivos de luz.
Iluminam-se ideias que pairavam à solta.
Surge a forma com alma.
Dá-se o milagre.
Um ser animado se levanta do chão.
E fala e canta suave na arte da escrita
como se fosse um artista...

Berlim, 28 de Janeiro de 2020
17h12m
Jlmg

********************

Amigo total e fiel

Não há velhote,
Sentado à porta,
Que não tenha a seu lado,
Alapado no chão,
Um cão dedicado.
Paulatinas correm as horas e dias de sol.
Ele revê seu passado.
O outro, apenas presente.
Passam vizinhos e outros iguais.
Dizem bom dia.
E, o cão dorminhoco,
Respaldado a seus pés,
Acompanha a vida que passa.
Atento e indiferente.
Ninguém se atreva a maltratar o seu dono.
De anjo seráfico se vira um demónio.
Mandíbulas de ferro.
Adora canelas…

Berlim, 31 de Janeiro de 2020
19h17m
Jlmg

********************

Assustado. Não aflito…

Ressoam toadas surdas de silêncio.
De fúria, brame e brame o mar irado.
Sigo na minha praia, pisado o chão.
Olho o céu. Fito ao longe.
Pode ser que venha uma vaga lá do fundo.
Rebente o gelo.
Deste silêncio cru.
Quente, meu peito arfa, de cansaço avesso.
Retino as cordas do meu estro sarapantado.
Uma aragem suave vem. Me anuncia breve.
Como sabe bem o reencontro.
Rever o céu azul e cantar o louvor dum clarim.
Apagar a sede na fonte perene da calmaria.
É certo e inesgotável quem a alimenta…

Ouvindo Hélène Grimaud tocando Brahms
Berlim, 30 de Janeiro de 2020
11h25m
Jlmg
____________

Nota do editor

Último poste da série de 26 de Janeiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20595: Blogpoesia (657): "O chão da minha aldeia", "Suavidade benfazeja..." e "O talento brota do chão", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 728

Guiné 61/74 - P20615: Parabéns a você (1751): Germano Santos, ex-1.º Cabo Op Cripto da CCAÇ 3305 (Guiné, 1970/73)

____________

Nota do editor

Último poste da série de 29 de Janeiro de 2020 > Guiné 61/74 - P20603: Parabéns a você (1750): Luís Graça, ex-Fur Mil Armas Pesadas Inf da CCAÇ 12 (Guiné, 1969/71), fundador e editor deste Blogue, e Virgílio Teixeira, ex-Alf Mil SAM do BCAÇ 1933 (Guiné, 1967/69)