1. Segunda parte da publicação da História (resumida) da CCAÇ 2403/BCAÇ 2851, Nova Lamego, Piche, Fá Mandinga, Olossato e Mansabá, 1968/70), envida pelo seu Comandante, ex-Cap Mil Hilário Peixeiro*, actualmente Coronel na situação de Reforma.
História (resumida) da CCaç 2403 – Guiné 1968/70 (2)
Actividade da CCAÇ 2403 e participação na Operação Mabecos Bravios
Na sua missão de intervenção a Companhia foi ocupar o quartel de Canjadude para libertar as Companhias locais para uma Operação na respectiva zona de acção. Imediatamente a seguir ao regresso marchou para Piche para, juntamente com a CCav local, efectuar uma Operação junto ao rio Corubal, que ali fazia a fronteira com a República da Guiné, onde dias antes 2 GComb dessa Companhia tinham sido fortemente atacados e forçados a retroceder para o quartel.
A CCav participava com 3 GComb e a CCaç 2403 com os seus 4. Em termos de Oficiais deviam estar presentes 4 da CCav e 5 da CCaç: 2 Capitães e 7 Alferes. Ia ser, quase de certeza, o baptismo de fogo da CCaç. A CCav não tinha o Capitão por problemas de saúde e só levava 2 Alferes, o Tiago Mouzinho e o Ramos; a CCaç tinha o Capitão e o Alferes Tavares porque ainda não tinha recebido os substitutos dos que faltaram ao embarque e o Alferes Brandão manifestou-se psicologicamente incapaz de comandar o seu GComb.
Ao atingir o local, onde dias antes tinha sido o contacto com o IN, a CCav sofreu uma emboscada que lhe provocou 1 morto no primeiro tiro disparado com RPG. Imediatamente a seguir entraram em acção os morteiros 82, cujas saídas das granadas eram perfeitamente audíveis. A CCaç 2403, que pela primeira e última vez se fez acompanhar de um morteiro 81, abriu fogo sobre a posição bem referenciada dos do IN, o que, segundo informação do Aferes Mouzinho, acabou com o ataque dos morteiros IN. No entanto o combate com armas ligeiras ainda se manteve por bastante tempo. Apesar da utilidade do morteiro 81 nesta acção, revelou-se impraticável sobrecarregar o pessoal com esta arma quando já estava bem carregado com a sua arma, mais munições, água, ração de combate e as granadas para as bazucas e morteiro 60. Foi o maior contacto da Companhia com o IN.
O Comando-Chefe resolveu repetir novamente a Operação no mesmo local, uma semana depois, com a CCaç 2403, a CCaç 2401, a CCaç de Cabuca e a CCav (esta em protecção do Pel Artª de Piche instalado a distância apropriada para apoiar a Operação. Para comandante da Operação ( “Relâmpago”) foi nomeado o Major Fabião, de todos conhecido, que se deslocou junto da 2403.
A CCaç 2401 foi atacada por armas pesadas localizadas na República da Guiné sofrendo 2 mortos. A aviação (T6) atacou a zona de actuação do IN e a Artilharia disparou dezenas de granadas de apoio às Companhias e sobre as posições do IN no outro lado da fronteira, causando, segundo informações posteriores da população, grande numero de baixas quer de guerrilheiros quer de civis da Guiné Conacry. A Companhia participou com os mesmos 2 oficiais, pelos mesmos motivos.
O Cmdt da Companhia com três Alferes, da direita para a esquerda: Amaral e Caria (acabados de chegar) e Tavares
Após regresso a Nova Lamego apresentaram-se os 2 Alferes em falta, o Amaral e o Caria, o primeiro muito alto e o segundo baixote. Mais tarde, o Fur Mil Enfº Viriato, requisitado para o Hospital Militar de Bissau, foi substituído pelo Fur Mil Enfº Diamantino, natural da Guiné.
O Capitão recebeu ordem para se deslocar para Piche para coordenar a actividade operacional da CCav, mantendo-se a 2403 em Nova Lamego. Nessa situação, apesar de ter sido promovido apenas 4 meses antes e estar na sua primeira comissão, ficou com cerca de 600 homens sob o seu comando: as 2 Companhias, 1 Pel Art, 1 Pel Rec Fox, 1 Sec de Mort Med, 1 Sec Can S/R e dois Pelotões de Milicias.
Como estava em Piche e a Companhia estava em Nova Lamego, tinha que se deslocar 2/3 vezes por semana entre as duas localidades. Num dos regressos a Piche a coluna, composta por uma dúzia de viaturas, escoltada pelo Pel Fox (1 Auto Met Daimler (Fur Mil Caldas), 1 GMC com 1 Sec de Atir e 1 Auto Metr Fox) comandado pelo Alf Mil Gordo, sofreu a primeira emboscada montada naquele itinerário. A Fox que seguia na frente, foi incendiada por uma granada de RPG7 morrendo os dois elementos da guarnição que iam no seu interior. O Alf Mil Gordo que ia na torre, no exterior, caiu no capim que lhe deu cobertura para não ser encontrado pelos guerrilheiros.
Dias depois o Cap. e alguns Furriéis entraram de licença e quando regressaram, nas vésperas de Natal, já a CCav de Piche tinha sido rendida por um BArt, recém-chegado. O Natal foi passado em Nova Lamego com toda a Companhia reunida. No dia 25 um grupo de “homens grandes” das tabancas vizinhas, foi desejar um bom Natal à Companhia, tocando o Hino Nacional com os seus instrumentos, em que se destacava a Cora.
Natal de 1968 em Nova Lamego (Gabú)
Durante o mês de Janeiro tiveram lugar os preparativos e reconhecimentos na zona do Boé, com vista à Operação de evacuação de Madina do Boé, denominada “Mabecos Bravios”. Para além da CCaç 1790, local, comandada pelo Cap Aparício participaram na operação outras 6 Companhias. A 2 de Fevereiro a CCaç 2403, com 3 GComb (o do Alf Mil Brandão não participou por decisão do Cmdt do Batalhão de Nova Lamego a quem pediu para não interromper os trabalhos de reordenamento em que estava empenhado), deslocou-se para Canjadude e depois para o Cheche onde chegou já no final do dia, transportada nas viaturas destinadas ao transporte, no regresso, dos materiais da CCaç 1790 e da população de Madina. Desta vez todos os GComb eram comandados pelos respectivos Alferes.
Em Canjadude onde as tropas se reuniram para o início, propriamente dito, da Operação. À esquerda os pilotos da FAP Cap. Nico (filmando) e o Sarg. Honório e o Cmdt da Operação Cor Felgas.
Juntamente com a CCaç 2405, do Cap Jerónimo, atravessou o Corubal numa das jangadas, recém-construídas para o efeito, indo cada uma ocupar as colinas que flanqueavam a estrada para Madina, á esquerda e á direita. Quando as Companhias se separaram, já noite fechada, o IN lançou 2 granadas de morteiro sobre a estrada, sem consequências o que, 15/20 minutos antes, poderia ter tido resultados bem diferentes. Na manhã seguinte as Companhias seguiram, apeadas, rumo a Madina, sempre sobrevoadas por 1 T6 ou 1 DO até ao final do dia.
Com o Sarg. Honório (cabo-verdiano) sempre presente
A meio da manhã houve um reabastecimento de água, planeado e, mais à frente, não planeado, um fortíssimo ataque de abelhas à CCaç 2405 que deu origem à evacuação de alguns homens no heli do Comandante da Operação, Cor Felgas, que aterrara entretanto.
A evacuação com protecção do Heli-canhão
Este contratempo provocou grande atraso na coluna e a certa altura o efeito do calor e das abelhas fez-se sentir mais acentuadamente sobre a CCaç 2405, tendo a CCaç 2403, que ia na retaguarda, passado para a frente com o intuito de pedir a Madina reabastecimento de água para o pessoal mais atrasado que estivesse em dificuldades. Quando, cerca de 10 minutos depois, um GComb se preparava para sair do quartel, chegou a outra Companhia.
Reparação de GMC (rebocada) e sem paragem da coluna
Viaturas destruídas por minas ou em emboscadas, encontradas durante o deslocamento
Enquanto o pessoal foi instalado os Capitães receberam do Comandante a missão para o dia seguinte que consistia na ocupação dos morros que se estendiam a sul de Madina entre esta e a República da Guiné.
Quando se fez dia o pessoal ficou surpreendido com o cabeço a que Madina estava encostada e os que a rodeavam. Eram autênticas “montanhas” na Guiné, onde tudo era plano. As Companhias ocuparam as elevações que lhes foram indicadas e aí permaneceram nesse dia enquanto as viaturas chegaram e no dia seguinte enquanto se procedeu ao seu carregamento com os materiais da guarnição e da população civil que ia ser deslocada para Nova Lamego. No dia 6, logo que se fez dia, deslocaram-se para a coluna que já se encontrava em movimento a caminho do Cheche, assumindo a segurança dos flancos e retaguarda. Antes de atingir o rio Corubal a coluna ainda foi alvo de mais um feroz ataque de abelhas que só provocou, como vítimas, a morte de dois cães da população.
As viaturas e pessoal foram atravessando o rio até só restarem as 2 Companhias e parte da CCaç 1790 de Madina. Comandava a Operação de carregamento da jangada o Cap. Aparício. Na penúltima travessia foram transportadas a CCaç 2403 e parte da CCaç 2405, tendo a primeira recebido imediatamente ordem do Cor Felgas para montar a segurança do flanco esquerdo da coluna que partiria, logo que pronta, rumo a Canjadude.
Imagens das jangadas com a CCaç 2403 a embarcar para a última travessia antes da tragédia
Para a última travessia, seria embarcado o pessoal que restava das CCaç 2405 e CCaç 1790, muito menos de 100 homens. Enquanto se aguardava a chegada do pessoal que faltava para a coluna se pôr em marcha foram disparadas 1 ou 2 granadas das armas pesadas do Destacamento do Cheche. Pouco depois surgiu um soldado a correr em direcção ao rio, a chorar, dizendo que a jangada se havia virado e que muita gente tinha caído à água no meio do rio. Através do rádio do Capitão foi ouvido o Cor Felgas em comunicação com o General Spínola, que não esteve no local, dizendo que havia muitos homens desaparecidos no rio. Com grande atraso em relação à hora prevista, a coluna iniciou o deslocamento para Canjadude onde pernoitou.
No dia seguinte chegou a Nova Lamego, onde o Comandante-Chefe falou às tropas participantes na Operação.
(Continua)
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Nota de CV:
Vd. primeiro poste da série de 14 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8273: História da CCAÇ 2403 (Hilário Peixeiro) (1): Deslocação para a Guiné e chegada a Nova Lamego
4 comentários:
caro camarigo Hilário Peixoto
Continuo a ler interessado os teus relatos.
Embora não tenha tido uma actividade 'operacional' no sentido de intervenção em patrulhas, assaltos, golpes-de-mão, etc., estive em Piche e em Nova Lamego pelo que o que é relatado do que se passou nesses locais é seguido com atenção.
Relativamente à actividade operacional desenvolvida a partir de Piche é curioso verificar como em Fevereiro de 71 houve uma outra operação que se pretendia de grande envergadura a que chamaram "Mabecos" (apenas) e que também não correu grande coisa.
~
Abraço
Hélder S.
Não estando, directamente, envolvido na operação Bravios, foi ela que. indelevelmente, marcou a minha comissão.
Já esqueci muitas datas, mas a de 6 de Fevereiro de 1969, nunca foi esquecida.
Foi a minha CCAÇ 5 (Gatos Pretos) juntamente com a CART 2338, que levou as canoas para construção das jangadas do Cheche.
Estava em Canjadude quando passaram para sul e fui eu que recolhi o nome dos que tinham ficado no Corubal.
Errata:
Onde se lê BRAVIOS, deverá ler-se
MABECOS BRAVIOS.
Caro Hilário Peixeiro
A operação "Mabecos Bravios" já foi aqui relatada.
Levantou vários comentários o que é natural.
Aparecem aqui dois pontos que penso serem importantes.
Espero pela continuação e depois escrevo.
Ab, T.
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