Texto do Leopoldo Amado, historiador e membro da nossa tertúlia:
Caro Marques,
Fico contente em saber que estiveste em Empada e que mantens relações com população local. Empada foi o torrão onde nasci, apesar de ter crescido em Bolama e depois Bissau. O meu avô, Victor Vaz Martins, pai da minha mãe, era ali agricultor e comerciante, tendo mesmo chegado a desempenhar as funções de chefe do posto administrativo local.
Certamente deves ter ouvido falar dele, pois era uma figura muito conhecida não só em Empada, mas igualmente em Cubisseco, Dar-es-salam e outras localidades circunvizinhas de Empada. Porém, Victor Martins morreu em 1962, após ter sido preso e acusado pelas NT de prestar apoio e colaboração ao PAIGC. Soube-se mais tarde que fora fuzilado e enterrado numa vala comum, com muitos outros guineenses, todos acusados de subversão. Mas isso é uma outra história…
Eu próprio já escrevi sobre Empada, numa tentativa literária de evocação desse passado meio verídico e meio mítico em que o meu avô é referenciado como o verdadeiro patriarca da família e em que Empada prestou-se como cenário de uma quase epopeica dimensão da partilha, protagonizada na época pelo Gã Martins. (Gã significa em crioulo família, no sentido alargado).
Prometo partilhar contigo esse texto ficcionado que escrevi há já uns anos, onde procurei ficcionar várias estórias entrecruzadas sobre Empada, as quais foram-me contadas e reproduzidas pela minha mãe e tios, mas também onde paradoxalmente narro a minha própria tentativa de reconciliação com Empada, afinal, terra que me viu nascer e que, por capricho do destino, só fui conhecer 29 nove anos após o meu nascimento.
Assim, caro Marques, agradeço de antemão qualquer outra arremetida textual ou iconográfica sobre Empada, qualquer coisa suplementar que possas saber ou ter guardado (fotos, p.e.) e que queiras partilhar, pois ainda vivo com a sensação algo curiosa de estar em divída com a terra que me viu nascer e em que cetamente os Gã Martins conheceram o auge dos tempos idos e a grandeza da terra.
Um abraço amigo
Leopoldo Amado
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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