1. Mensagem do editor do blogue enviada ao João (c/c aos restantes camaradas e amigos da Tabanca Grande):
Não me levarás a mal que eu, em texto antológico da tua lavra (ou melhor, da tua pena, ou melhor do teu teclado), tenha posto - abusivamente - na tua boca essa enormidade, esse anacronismo, de pedir desculpas à Cilinha & Companhia (1) pelas ordinarices que tu, eu e todos nós (ou muitos de nós, ou alguns de nós, não sei quantificar...) lhe terão dito, com ou sem razão, entre 1961 e 1974... Tu, reconhecidamente, à beira Tejo, em Maio de 1969 e depois no Pelundo, no Natal de 1969... Ou se não disseram, pensaram dizer...
Tu, que és um exemplo de oficial e cavalheiro, vens de algum modo tentar reparar o irreparável, trinta e tal anos depois, com as tuas palavras de fino recorte literário que às vezes são espada acerada... Olha, a senhora está viva, calada, biografada e até se orgulha de um estilhaço de mina que apanhou na Guiné... Espero que ela não se lembre de nos pedir guarida na Tabanca Grande... E faço votos que o editor não seja tão oficial e cavalheiro quanto tu...
A propósito vi o teu blogue Bota Acima citado no livro da nossa Cecilía Supico Pinto, escrita pela Sílvia Espírito Santo... Há também um excerto teu (mutilado, censurado), na página 143... Enfim, és o único blogue que é citado no livro, espero que não te sintas mal com a honra...
O trabalho da Sílvia, sem ser genial, parece-me honesto, numa primeira leitura... Já o tinha folheado numa livraria no Porto... Para os restantes camaradas quero aqui recordar que a Cilinha foi quem inventou, além do aerograma, a figura da Madrinha de Guerra (em 1963)...
E a propósito vou lançar uma sondagem para saber quantas madrinhas de guerra é que o pessoal tinha na Guiné... Há muitos mitos, a este respeito: havia tipos que se vangloriavam de ter meia dúzia ou mais... Eu confesso que nunca tive nenhuma...
Um bom resto de sábado para ti e restante pessoal da Tabanca Grande.... Luís
2. Resposta do João:
Caro Luís,
O que está publicamente escrito, escrito está. Se é público é publicável. Sobre a guerra, sobre as minhas dores da guerra, não sei se já te disse isto, devo-te muito a ti e ao blogue, no exacto sentido em que me acalmei com as feridas em combate porque, pela catarse do cruzamento de experiências e vivências, tudo se vai relativizando e, assim, vai-se perdendo o cheiro a sangue e nervo frescos.
Também, porque é justo dizê-lo, a tua liderança fraterna e paciente tem sabido navegar com o afecto e a calma necessárias para que a chama das nossas recordações não se apague nem se transforme num churrasco. E assisto, comovido, a esse amadurecer colectivo, quando a maioria de nós nem se conhece pessoalmente, da parte da maioria dos tertulianos, numa fruição mais serena, menos radical e embutida, mais sábia na distância, nos vários textos que, comparativamente com os iniciais, agora se consultam no blogue.
O que só me confirma uma velha convicção de que és mesmo homem de saúde pública e que o Estado acertou muito mais quando esse mister te vestiu que quando te fardou e te ordenou que namorasses com uma G3 nos jardins afrodisíacos do cheiro a guerra entre bolanhas da Guiné.
O certo é que, falando agora do texto transcrito, não escrevo sobre a guerra, porque assim já não sinto a guerra, antes do blogue e agora. A camaradagem do nosso blogue sarou-me a maioria das feridas. Mas nós somos nós e o nosso passado. E, no meu passado, está a guerra e a prolongada revolta por lá ter estado. Mais esta calma nova que me diz: sim, estive lá. Porreiro, pá!
Quanto a madrinhas, não as tive. Nem as quis por perto. Ora bem, casadinho de fresco, para que queria uma madrinha? Como dizia o velho Paul Newman sobre a sua vetusta esposa: quem sai de casa para comer um hamburguer se tem entrecôte em casa?
Abraço do
João Tunes
___________
Nota de L.G.:
(1) Vd. poste de 10 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2516: Blogue-fora-nada: O melhor de...(4): Pedido de desculpas às Senhoras do MNF muitos anos depois (João Tunes, oficial e cavalheiro)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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