sábado, 16 de maio de 2009

Guiné 63/74 - P4359: Tabanca Grande (143): Amadu Bailo Djaló, Alferes Comando Graduado, incorporado no Exército Português em 1962 (Virgínio Briote)

Amadu Djaló, Alferes Comando Graduado, incorporado no Exército Português em 1962 e Comando desde 1964. 

Este novo membro da nossa Tabanca Grande, veio até nós trazido por Virgínio Briote, que o tem apoiado na feitura do seu livro de memórias, que mais não é que a própria história da guerra colonial na Guiné. 


  1. Em 23 de Abril de 2009, Luís Graça dirigia esta mensagem ao nosso camarada Virgínio Briote: 

  VB: (...) Acho que o Amadu Djaló já faz parte, por direito próprio, da nossa Tabanca Grande... Faz-lhe o convite formal... Fala-lhe do nosso blogue e da ideia de 'Tabanca Grande' onde deveríamos caber todos, portugueses e guineenses, amigos e inimigos de ontem... Vê o que ele te diz... Gostaria que o nome dele figurassse ao lado dos nossos. Luís 

2. Mensagem do nosso camarada Virgínio Briote, com data de 7 de Maio de 2009, em resposta a Luís Graça: 

 Falei ao Amadu (*), mostrei-lhe o blogue (**), viu mapas e fotos. Quando viu as imagens de Bafatá, as lágrimas correram. Ele teve, há uns tempos, um AVC, ligeiro, a voz não é muito perceptível, diz que a língua se enrola, o braço direito já não tem ligeireza para escrever, quanto mais para dar ao gatilho. O Amadu tem sido a minha companhia, de manhã à noite. Falámos da guerra e da Guiné de hoje, da familia, da casa, dos terrenos dele. E nunca se esquece de falar das duas filhas e das netas que vivem com ele na Amadora e das saudades e do desejo enorme que tem de regressar à terra dele. Tem amigos aqui, quase todos guineenses, um ou outro europeu. De alguns destes fala com alegria, de outros com tristeza, especialmente do esquecimento. E das dificuldades que tem em conseguir a nacionalidade portuguesa para as duas filhas. Agora, quando vi a tua mensagem, telefonei-lhe, formalizei o teu convite. Que tem muito gosto em fazer parte da Tabanca Grande, mas que não sabe como fazer. Ofereci-me para fazer a apresentação por ele. - Mano Briote, estás à vontade, manda as fotos que te dei e escreve o que quiseres, confio em ti. E é isto, caro Luís, que tenho para responder ao teu convite. O Amadu é um poço de memória. Hoje, ao fim de mais um dia de trabalho, já à saída, dei-lhe o trabalho de casa: - Amadu, 2.ª feira vamos falar dos princípios da guerra, ainda antes de começarem os tiros. Em 60, 61 e 62, o ano da tua incorporação, nunca ouviste contar nada, do que se estava a passar? - Sim, mano! Ainda não estava na tropa, quando o meu primo Ussumane me pediu pare eu ir a Catió, comparar máscaras, aquelas máscaras que os nalús e os biafadas faziam e fazem, ouvi lá falar de um tal Nino Vieira, que tinha fugido de... e que... O resto, Luís, fica para depois. Mando-te em anexo, uma breve apresentação do Amadu, que está ainda por completar. Espero levá-lo ao nosso encontro. Um abraço vb 

  3. Virgínio Briote fala de Amadu Djaló Amadu Bailo Djaló Um livro ainda sem título Este é um relato dos anos da guerra travados na Guiné, vistos pelos olhos e pelas memórias do Amadu Bailo Djaló. São descrições das caminhadas em trilhos e carreiros calcorreados pelos seus pés. E dos combates travados pelos contendores. Amadu Djaló é hoje um dos raros sobreviventes que pode falar de todos os anos que durou a guerra. Incorporado em 1962, percorreu quase todo o território da então província portuguesa. Futa-Fula, natural de Bafatá, oriundo de famílias da Guiné-Conackry, Amadu escolheu um dos lados, combateu no Exército Português, ao lado de milhares de africanos. Pouco depois da incorporação, em 1964, ingressou nos Comandos do CTIG e fez parte de um dos primeiros grupos de comandos então formados em Brá, perto de Bissau. Numa das primeiras operações que fez com grupo, viveu em Gobige, na estrada entre Madina do Boé e Aldeia Formosa, um das tardes mais dramáticos da guerra desses anos. Uma mina anticarro reduziu o grupo “Fantasmas” quase a metade. Uma tarde inteira, na estrada, a ver morrer um, outro e outro, até contar oito, que o nono só conseguiu morrer em Lisboa. Dias depois, com o grupo desfalcado, foi um dos doze homens que se propôs atravessar o Oio, de Cutia a Bissorã. De noite andavam, emboscavam-se durante o dia. Na última operação que fez com o grupo, em Catunco, na zona de Cameconde, foi um dos dez feridos pelo rebentamento de uma granada de bazuca que só deixou incólume um elemento do grupo. Na altura, os meios para as evacuações eram ainda muito reduzidos e tiveram que se deslocar pelos próprios meios, cerca de quatro quilómetros, arrastando-se e trazendo um morto, o furriel Morais, numa padiola improvisada. Com a extinção do grupo regressou à unidade de origem, a CCS do QG e teve sorte, foi aumentado 150 escudos mensais por ter a especialidade de condutor. Mas não usufruiu muitos meses desse aumento, voltou para os comandos, para outro grupo recém-formado, os “Centuriões”. Voltou a Catunco e, desta vez, foi melhor sucedido. Depois, seguiram-se operações em Jabadá, Cuntima e Bigene, entre outras. Grupo acabado, recolheu novamente à CCS do QG, a sua casa-mãe, e dali seguiu para Bafatá, a sua cidade natal. A Guiné mudou de governador e de políticas. Criados os comandos africanos, ingressou na 1ª CCmds Africanos, comandada pelo seu amigo, capitão graduado João Bacar Djaló, então um nome mítico da guerra. Fardou-se e equipou-se de guerrilheiro do PAIGC para ir a Conackry, ajudar a libertar os prisioneiros portugueses que lá se encontravam. Depois foi a formação do Batalhão de Comandos Africanos, a ida ao Senegal, a Kumbamory, no agrupamento do capitão Matos Gomes, para uma acção que se veio a tornar decisiva para as povoações e aquartelamentos fronteiriços de Guidage, Binta e Bigene. São os anos todos da guerra, de 1962 até ao fim. Em 25 de Abril de 1974 andava atrás da guerrilha, na zona de Piche, quando teve conhecimento pelo rádio de um milícia que tinha havido um golpe militar em Lisboa. Depois, aquela guerra acabou e começou outra, a luta pela sobrevivência na Guiné-Bissau. Preso mais que uma vez, foi escapando sempre até que, em 1986, veio para Lisboa. Depois…

Amadu Bailo Djaló em 1966 Amadu Djaló - CICA BAC - Bissau - 1962 Amadu Djaló e Ana Djaló > Dacar - 1998 Amadu Djaló, mais recentemente, junto à lápide dos nossos Camaradas mortos nas três frentes da Guerra.


4. Comentário de CV Duas linhas para te dizer camarada Amadu, o quanto nos honra que tenhas aceitado o convite do nosso editor Luís Graça para fazeres parte da nossa Tabanca Grande. Vai também ser manga de ronco a tua presença junto de nós, no IV Encontro da Tertúlia em Monte Real. Vamos todos ter a oportunidade de te conhecer e abraçar, velho camarada de armas guineense. És dos poucos que escaparam ao ajuste de contas do pós-guerra. Muito nos alegramos por isso. Ficamos ansiosos pelo teu livro e por histórias tuas que poderás fazer chegar até nós pelo nosso comum amigo Virgínio Briote. Pessoalmente, espero o dia 20 de Junho para um abraço. Para já fica este abraço virtual em nome de toda a tertúlia, com votos de muita saúde. Carlos Vinhal 5. Em mensagem de 14 do corrente, o VB informou-nos do seguinte: Caro Luís, Carlos e Eduardo, Escrevo-vos para vos comunicar que o Presidente da Associação de Comandos, Dr Lobo da Amaral, me telefonou hoje a dizer que vários camaradas lhe têm telefonado para saber quando vai estar à venda o livro do Amadu. Que têm tido conhecimento através do nosso blogue... Um abraço, vb 

__________ 


 Notas de CV: (*) Sobre o ex-Alf Cmd Graduado Amadu Djaló, vd. postes de: 22 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4067: Os nossos camaradas guineenses (3): Amadu Djaló, Fula de Bafatá, comando da 1ª CCA, preso, exilado... (Virgínio Briote) 25 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4076: Os nossos camaradas guineenses (4): Amadu Djaló, com marcas no corpo e na alma (Virgínio Briote) 27 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4086: Os nossos camaradas guineenses (5): O making of do livro do Amadu Djaló, as memórias de um comando africano (Virginio Briote) 29 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4102: Os nossos camaradas guineenses (6): Amadu Djaló, as memórias de um comando africano (Virginio Briote) 21 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4229: Os nossos camaradas guineenses (7): Amadu Djaló, as memórias do Comando Africano continuam (Virgínio Briote) (**) Vd. poste de 22 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4234 (Ex)citações (23): A grandezas humana de um comando africano (Virgínio Briote / Luís Graça) Vd. último poste da série de 16 de Maio de 2009: Guiné 63/74 - P4354: Tabanca Grande (142): Joaquim Macau, camarada do último morto em emboscada do PAIGC (2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616, Xitole, 1973)

3 comentários:

Anónimo disse...

Bem vindo Camarada. Já eras dos nossos. Vai contando as tuas memórias ao nosso Camarada V. Briote.
São bocados da verdadeira história da guerra na Guiné.
Boa Saúde e dois abraços fortes um para o Amadu outro para o Virginio e, claro está a todos os homens (as mulheres estão incluídas claro)desta enorme Tertúlia. Ab do Torcato

Anónimo disse...

Não sei como se presta homenagem a um camarada guineense que se perfilou nas fileiras a nosso lado, mas sei que lhe devo um reconhecimento e o agradecimento de nos ter dado o benefício da dúvida ao acreditar em nós.

Que ele possa representar o espírito de todos aqueles que lutaram ao nosso lado e foram depois selvaticamente abatidos.

A ele o meu obrigado.

Ao virgínio Briote que tanto tem apostado em levar por diante a árdua tarefa de preparar a edição em livro, quero igualmente agradecer e dizer-lhe que estou à espera para saber mais deste homem que por seu intermédio tenho já o prazer de conhecer pelas narrativas publicadas neste blogue.

Não posso terminar sem lembrar que madrasta é a pátria que não reconhece e aceita os filhos dos seus heróis.

Um abraço para ambos.
BSardinha

Pedro disse...

Como Português tenho que agradecer a este grande Português amadu djalo pelos serviços prestados ao pais. Precisavamos de muitos amadus djalos em Portugal.

Do que não precisamos é de mario soares, e restantes traidores que abandonaram estes homens à sua sorte de pois do 25 de abril, tendo muitos sido fuzilados.

A minha homenagem a todos eles.