quinta-feira, 4 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4461: O segredo de... (5): Luís Cabral, os comandos africanos, o blogue Tantas Vidas... (Virgínio Briote)

Guiné > Brá > 1965 > O Alf Mil Briote, à esquerda, ladeado de dois dos primeiros comandos africanos, o Jamanca e o Joaquim. Esta era a 1ª equipa do seu grupo de comandos, os Diabólicos. Em vésperas da Op Atraca.

O Jamanca será mais tarde ofical da 1ª Companhia de Comandos Africanos, participará na Op Mar Verde (invasão da Guiné-Conacri, em 22 de Novembro de 1970) e comandará, em 1973, a CCAÇ 21, da qual farão parte antigos graduados africanos da minha CCAÇ 12.

Enquanto a CCAÇ 12, provavelmente refrescada, foi colocada no Xime, de meados de 1973 até ao final da guerra, a CCAÇ 21, comandada pelo Cap Cmd Graduado Jamanca [lê-se Djamanca], ficará em Bambadinca como unidade de intervenção. O Comandante da CCAÇ 21, Jamanca, será fuzilado, juntamente alguns dos seus homens (o antigo soldado da CCAÇ 12, Abibo Jau, por exemplo) em Madina Colhido, perto do Xime, depois da saída dos portugueses. (LG)
Foto: © Virgínio Briote (2007). Direitos reservados.

1. Das nossas lides bloguísticas eu sabia, talvez há mais de dois anos, que o meu amigo e camarada Virgínio Briote acalentava a secreta esperança de um dia poder entrevistar (ou ter uma conversa franca com) o Luís Cabral... Fez várias tentativas. Em vão. Até que a morte do histórico dirigente do PAIGC, ocorrida há dias em Lisboa, veio fechar-lhe a última porta...

Por outro lado, ele acaba de me confidenciar que vai encerrar a sua actividade bloguística, o seu Tantas Vidas (cujo acesso ele já 'blindou', com password):

Caro Luís,

Estou a proceder a correcções e acertos no meu blogue. Depois de terminar o trabalho vou imprimi-lo em edição de autor e oferecê-lo aos Camaradas que me têm acompanhado nesta aventura internauta. Depois apago o Tantas Vidas. Entretanto, para o caso de te interessar a pw é (...).

Um abraço,vb


2. Um primeiro comentário, de resposta:

VB: Fazer uma edição de autor, tudo bem... É um grande generosidade da tua parte ...mas apagar o registo da Net ? Não te precipites...Além disso, temos que fazer uma FESTA!... Tu mereces, nós merecemos!!!... Obrigado pela pw (...)


3. Mensagem do vb, de anteontem:

Para ti, Caro Luís,

Espero que não leves a mal a ousadia: alterei o teu poste (*), incluí um comentário que, penso, ajuda a clarificar o que realmente me levou a apresentar os meus respeitos ao Luís Cabral.

É certo que o contactei. Depois de várias tentativas consegui falar com ele ao telefone. Talvez me tenha faltado a capacidade de um jornalista. À pergunta de LC, quem é o senhor, respondi que era um antigo comando europeu e que... Ao que ele, pronta e educadamente respondeu que sobre os comandos africanos não tinha nada de importante a acrescentar. Que me deveria dirigir-me a outras entidades, que certamente teriam informações mais precisas. Ponto final, não consegui recuperar a iniciativa da conversa. E fiquei com pena, com a ideia que teria sido capaz de o ter frente a frente, não fora o deslize de me ter identificado logo no início.

Um abraço,
vb


Guiné > Brá > Outubro de 1965 > 1ª equipa de comandos Vampiros > Ao centro, o alf mil Vilaça e â sua rsquerda, o Jamanca e o Justo, futuros comandos africanos.
Foto: © Virgínio Briote (2007). Direitos reservados.








4. Nova mensagem do vb, de ontem:


Caro Luís,

Enquanto espero o Amadu, depois de uma estadia de quase duas semanas em Londres, onde aproveitou para visitar os filhos e a neta e consultar um cardiologista, vou responder-te:

(i) Luís Cabral:

Na breve conversa telefónica com ele, como te disse, fiquei com a impressão que cometi um erro grave. É obrigatório preparar a entrada. Mas eu já não estava à espera de falar com ele, já tinha feito quase mais dúzia de tentativas.

Subitamente reconheci-lhe a voz (vim a saber por ele que estava sozinho em casa) e, talvez, por não contar, esqueci a apresentação que tinha preparado. E foi aqui que falhei, quando me apresentei como um ex-combatente, comando.


A partir desse momento a conversa perdeu interesse para ele. Pela voz apercebi-me que o assunto lhe trazia incómodo e cansaço. Que o assunto era complicado, que não queria eximir-se nem incriminar ninguém, que já tinha dito tudo o que podia dizer, que lamentava o que tinha acontecido, que talvez houvesse pessoas mais indicadas para falar do assunto, que a saúde dele não estava famosa.

Não consegui dar a volta, não insisti.


(ii) Tantas Vidas:

É mesmo para apagar. Depois de arrumar os assuntos e eliminar os que não dizem respeito à minha comissão, vou aproveitar a oferta e o engenho do meu filho, que se prontificou para editar os textos. Vou mandar fazer uma ou duas centenas de exemplares e distribuí-los por alguns Camaradas.


(iii) Blogue:

O blogue da Guiné é o do Luís Graça & Camaradas da Guiné. É único. Pela vastidão e interesse de testemunhos presenciais, de soldados a coronéis e generais, por alguns trabalhos de investigação, pelo período todo da guerra. Está lá a alma da gente lusitana, ou melhor, da gente portuguesa. O sofrimento até ao limite, o desenrascanço, a capacidade de se adaptar, o viver tu cá tu lá com fulas, manjacos, mandingas, felupes, balantas, com outras culturas. É um documento inestimável, como se comprova diariamente pelas citações em livros e blogues. Não pode morrer.
Se vires interesse em alguns textos do Tantas Vidas podes publicá-los. Para mim, como compreendes, é uma honra (**).

Um abraço, vb

5. Comentário (final) de L.G.:

Sáo muitas emoções para um dia só... É uma prova extraordinária de amizade e camaradagem por parte do meu/nosso co-editor Virgínio Briote que eu sinto, cada vez mais, com vontade e necessidade de encerrar, na sua vida, ou na sua base de dados neuronal, o "capítulo da Guiné". Ou da guerra, como quiserem. Se calhar isso vai acontecer com todos nós, mais cedo ou mais tarde.

Vou respeitar a sua decisão final, qualquer que ela seja... mas reservo-me o direito de manter afixado, e bem alto, o seu "brazão de armas" à porta da nossa caserna... No entanto, ainda é muito cedo para despedidas... Venha de lá esse livro (aliás, dois, com o do Amadu Djaló) e o ronco que a gente vai fazer!... LG

__________

Notas de L.G.:


(*) Vd. postes de :

1 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4447: PAIGC - Quem foi quem (7): Luís Cabral (1931/2009) (Virgínio Briote)

1 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4449: In Memoriam (23): Luís Cabral ou o respeito por um homem que lutou por um ideal (Virgínio Briote)

(**) O último poste, de 1 de Junho de 2009, reza assim:

Guiné, Ir e voltar, 1965 a 1967.

Histórias de factos que aconteceram, vistas por um certo olhar. Outras vistas por esse olhar e que mais ninguém viu.

Os factos aqui descritos, uns foram vistos pelos olhos do editor, outros por quem os viveu, outros ainda foram recolhidos em fontes diversas: relatos de combatentes de ambas as partes, Arquivos Históricos e na literatura disponível sobre a Guerra travada pelas tropas portuguesas na Guiné. Apesar de continuamente actualizados, confrontados e corrigidos, não pode o editor garantir que os factos aqui relatados tenham ocorrido exactamente da forma como estão escritos.

Escrito por Gil [alter ego do VB]

5 comentários:

Dos Santos Oliveira disse...

Briote

Sinto que é malhar em ferro frio.
A quente, digo-o frontalmente: NÃO FECHES O TANTAS VIDAS!
Não era nem fui "interventor", tu o sabes, por não ser Comando.Achava aquele lugar como se fora Sagrado. Isso sempre me inibiu de intervir, não de devorar, sentir, reviver....
Tantas Vidas que se vão perder assim, Amigo?
Se a decisão do Homem é essa, seja respeitada, embora com a maior tristeza para mim e para uma maioria que se vai acabar por manifestar.
Afinal somos irmãos "qualquer coisa".Se isso não te comove...
Lamento e lamenta a minha Alma.
Sê feliz

Santos Oliveira

Antonio Graça de Abreu disse...

Virgínio Briote, caríssimo
Não nos chegámos a conhecer como devíamos, embora gente do mesmo coração que habita Cascais, o blogue e o mundo! Ainda vamos a tempo.
Um abraço, meu caro.
Só nos reformamos de tudo quanto à nossa Guiné diz respeito na hora amarga, ou doce, de fecharmos os olhos e o entendimento para vida.
Depois levamos a Guiné connosco, para o Céu.
Toda a admiração e amizade do
António Graça de Abreu

Anónimo disse...

Virginio Briote,

houve muitos de nós que acreditaram que havia muitos guineenses, angolanos e moçambicanos que não acreditaram nas promessas que vinham do outro lado,
como tal, ficaram ao nosso lado, e muitos de arma na mão.

Creio que foi em nome desses africanos que terás passado parte da tua vida, numa outra guerra, uma guerra íntima.

Se fôr esse o caso, há muita gente que te acompanha na trincheira.

Anónimo disse...

Caro Briote,

Não nos conhecemos pessoalmente, talvez isso aconteça dia 20, mas isso não podia ser impeditivo de comentar a decisão de encerramento de espaço com interesse o que é sempre de lamentar.

Fui apenas um pequeno curioso desse espaço, não consegui ser um fiel seguidor, aguardava melhores dias, vejo que foi ou vai ser impossível, lamento-o.

São espaços como esse que ajudam a preservar ou a resguardar a memória das gentes, o seu desaparecimento é parte da vida que desaparece, fica a esperança de ficar salvaguardado em papel, esperemos que perdure.

Um abraço
BSardinha

Anónimo disse...

Caros Fernando (Santos Oliveira), António Graça de Abreu e Belarmino,

O propósito é não dispersar esforços, concentrar no nosso Luís Graça e Camaradas da Guiné tudo o que interessar sobre os tempos que lá passámos e os reflexos nas nossas vidas.
Mas fico sensibilizado com as vossas palavras,claro, e até um pouco vaidoso com a vossa generosidade.
vbriote