Malta,
Fiquei suspenso pela leitura do texto do casal Cabral.
Até imaginei o que teria acontecido se as autoridades portuguesas lhe tivessem reconhecido o mérito, o talento e a capacidade de preparar a Guiné para outros rumos, na hora própria.
O devaneio é meu, a desgraça é de dois povos.
Um abraço do
Mário
Aquela Guiné dos anos 50
Beja Santos
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Segundo o casal Cabral, Portugal tinha contraído o compromisso de levar a efeito o recenseamento agrícola em todas as parcelas ultramarinas, em finais de 1947, em instâncias internacionais. Com esse recenseamento procurar-se-ia apurar: superfícies cultivadas e superfícies consagradas às diferentes culturas; número e características da população; importância do gado; dados sobre a produção das principais culturas. O casal de engenheiros enuncia o rol de dificuldades que obstaculizaram um trabalho rigoroso: nada havia de previamente lançado, tudo teve que ser improvisado em cima da hora. Com o trabalho de campo conheceram-se as culturas principais, a variedade de explorações agrícolas de “chão” para “chão”, apurando-se que a terra era um bem colectivo e que a propriedade privada incidia sobre os produtos obtidos pela agricultura praticada pelos elementos constituintes da família. Mas que não houvesse ilusões, o limite deste recenseamento era de uma mera estimativa. Recorrera-se ao método de amostragem, tendo-se escolhido povoações que, pelas características da sua agricultura, se podiam considerar representativas de uma dada região. Procurara-se igualmente efectuar um estudo detalhado dessas povoações nos aspectos social, económico e cultural. Para o casal Cabral havia que destacar as seguintes características deste recenseamento: cada povo tinha estrutura agrária constante; a presença de um povo numa região prendia-se aos imperativos da estrutura agrária; a exploração da terra era sempre feita em regime familiar; a extensão das terras cultivadas dependia principalmente do número de unidades de trabalho da família.
Foi reconhecido este recenseamento como obra modelar. O comportamento de Cabral, no entanto, já lançava suspeitas, ele foi transferido para Angola. Verdade ou não, ficara a conhecer todo o território por cuja causa veio a dar a vida.
O que impressiona, quando se lê este texto preparado para informação numa revista de âmbito local é a qualidade do português, o esforço de síntese, a boa comunicação de coisas herméticas de uma forma tão simples. Parece que é um dom daqueles que estão convencidos do que sabem e do que fazem.
O Boletim Cultural tinha sempre uma secção de imagens intitulada “Aspectos e tipos da Guiné Portuguesa”. Junta-se um felupe de Sucujaque, é pena que a máquina da Sociedade de Geografia de Lisboa não permita realçar o esplendor de quem parece ter um trono atrás de si.
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Notas de CV:
(*) Vd. poste de 14 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5104: Notas de leitura (29): Um Amor em Tempos de Guerra, de Júlio Magalhães (Beja Santos)
Vd. último poste da série de 7 de Outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5069: Historiografia da presença portuguesa (22): África, da Vida e do Amor na Selva, Edições Momentos, 1936 (Beja Santos)
1 comentário:
Ao Camarada Beja Santos,
pelo grande amor que ganhou àquela Guiné e que o faz "devorar" tudo o que se publicou sobre aquelas Gentes e suas terras, mais uma vez nos surpreende com este "relatório", dos muitos que naturalmente o Ilustre Engenheiro Agrónomo e sua primeira mulher, igualmente Agrónoma e Transmontana escreveram.
Trabalhavam na MEAU, como todos aqueles agrónomos que então trabalhavam para as Províncias Ultramarinas, antes de lá se fixarem ou mesmo que não desejassem esse vincúlo permanente.
Faziam o chamado trabalho de campo nas épocas secas, nas zonas onde existem as duas épocas, e vinham para a sede em Lisboa fazer o trabalho de gabinete ou laboratório.
Já agora aproveito para sugerir uma correcção no P4883 de Beja Santos, que acabei de ler há 2 ou 3 dias, sobre o legado teórico de A. Cabral.
No 3.º parágrafo, ultima linha está escrito "convidado para assistente do Instituto Superior de Economia". julgo que é uma gralha, pois ele foi convidado para assistente do ISAgronomia, dada a elevada classificação obtida na obtenção do título de Eng.º Agrón.º
Para esclarecimento de quem não sabe, o título de Eng.º Agrón.º não se obtinha terminado o 5.º ano de estudos académicos. Só era concedido depois do estágio e defesa pública perante júri, dum Relatório Final.
Abraços
Jorge Picado
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