quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Guiné 63/74 - P7673: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (49): Na Kontra Ka Kontra: 13.º episódio




1. Décimo terceiro episódio da estória Na Kontra Ka Kontra, de Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70), enviado em mensagem do dia 25 de Janeiro de 2011:


NA KONTRA
KA KONTRA


13º EPISÓDIO

E quando todos se apressavam a molhar os bocados de bolacha no delicioso molho feito pelo “legionário”, o Alferes abre o seu jogo:

- Rapazes, embora eu não coma pão às refeições, também tenho sentido a sua falta, mas mais por vós, resolvi que vai haver pão. Hoje mesmo vou falar com o João Sanhá sobre isso.

- F… meu Alferes, como é que o João vai arranjar pão?

- Calma, muita calma, Dionildo. Vou pedir-lhe que me arranje barro. Nas palhotas é sempre aplicado muito barro e portanto deve haver muito por aí.

- F… pão, barro, o João, o meu Alferes deve estar a ficar apanhado pelo clima, e muito…

- Se houver barro, amanhã tu e mais dois camaradas amassam uma porção e eu próprio irei fazer um forno. Com este clima e se tudo correr bem, no dia seguinte deve estar seco e passa-se a fazer pão.

Acabado o jantar, os homens um tanto incrédulos com a estória do forno, mantêm-se à mesa a conversar uns com os outros sonhando com a possibilidade de virem a ter pão fresco todos os dias. O nosso Alferes dirige-se rapidamente até ao ponto de encontro do pessoal, no “bentem” debaixo do mangueiro, onde já estava o João e alguns milícias.

- Boa noite.

- Boa noite, responderam todos ao mesmo tempo.

Não havia pressa em abordar o assunto do barro, desde que o João não quisesse ir deitar-se. Assim, ainda conversaram sobre o som de timbre metálico, como de uma campainha, que vinha de cima do mangueiro. Tratava-se, como o João explicou, do som produzido pelos machos dos morcegos frutívoros, que o produziam para atrair as fêmeas. O Alferes, que à noite andava sempre com uma lanterna, facilmente iluminou um dos morcegos pendurado num ramo, de cabeça para baixo, vendo-se perfeitamente o mexer dos seus lábios ao produzir o tal som estridente.

Mas antes que o João se fosse deitar o nosso Alferes vai direito ao assunto principal dessa noite:

- João, pretendo fazer um forno para cozer pão. Para isso preciso de barro. Consegue-se arranjar?

Perante a admiração do Alferes o João apressou-se a dizer:

- Há barro em qualquer sítio da tabanca. É só escolher o local e com uma pequena escavação consegue-se o que se quiser e amassa-se logo aí.

- Certo João, já tenho alguns camaradas para tratarem do barro. A construção do forno será comigo. Amanhã cedo tornamos a falar.

Depois de uma noite bem passada, não deixando de sonhar, pelo menos acordado, com a sua Asmau, apressa-se a que o “legionário” lhe sirva o café com leite que, apesar de ser em pó dava uma bebida muito aceitável, naquele cu de Judas.

O João apareceu e, juntamente com os homens encarregados de preparar o barro, foram escolher o local. Teria que ser um pouco afastado de qualquer morança para as fogueiras que se iriam fazer não as porem em perigo.

Ficou-se a saber que em qualquer local onde se escavasse dava barro. Escolheu-se o sítio e, em pouco tempo, estavam os homens a pisar o barro. Os aguadeiros iam providenciando que não faltasse água para o amassar. Todas as pequenas pedras que eram pressentidas com os pés eram retiradas pois, sendo de um material diferente, podiam vir a contribuir para o aparecimento de fissuras quando da secagem da obra.

O Alferes Magalhães tinha alguns conhecimentos destas construções, ligados ao curso de Arquitectura que tinha interrompido. Por isso, e porque em criança tinha feito pequenos fornos de barro para brincar, pensa moldar todo o forno nesse material. O João e também outros milícias tinham-se juntado para assistir ao acontecimento. Sugerem que se façam primeiro uns tijolos para os utilizar depois de secos ao sol. Esse processo iria atrasar a construção mas foi logo aceite pelo Alferes. Ao fim da manhã já estavam umas dúzias de tijolos a secar ao sol e feita a base do forno.

Depois da sesta o Alferes verificou que os tijolos já tinham a consistência necessária para o trabalho, pelo que rapidamente iniciou a construção. Com cerca de um metro de diâmetro pelo interior, ao fim da tarde estava pronto. Foi capeado e alisado à mão com uma aguada de barro o que lhe deu um ar de construção profissional.

O forno para fazer pão.

Começa a anoitecer pelo que o nosso Alferes, dado o esforço desenvolvido, sente necessidade de ir tomar um banho à fonte. Vai à sua morança, pega na toalha e na caixa do sabonete e vai carreiro abaixo. Ao sair do “arame” vê um vulto caminhar em sentido contrário. Cansado como estava só se apercebe de quem é, quando se cruzam.

Fim deste episódio
Até ao próximo camaradas.
(Fernando Gouveia)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 25 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7667: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (48): Na Kontra Ka Kontra: 12.º episódio

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