1. Mensagem do nosso camarada Francisco Henriques da Silva (ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, Có, Mansabá e Olossato, 1968/70), ex-embaixador na Guiné-Bissau nos anos de 1997 a 1999, com data de 9 de Setembro de 2012:
Meus amigos,
Após aturadas e quase sempre frustrantes buscas nas livrarias e na Internet à procura de obras, artigos ou simples referências sobre a guerra civil na Guiné-Bissau, deparei com esta dissertação de mestrado, intitulada “O Conflito Político-militar na Guiné-Bissau (1998-1999)”, que Guilherme Jorge Rodrigues Zeverino publicou através do Instituto Português de Apoio ao Desenvolvimento (IPAD).
A obra tem alguns méritos, mas, como não há bela sem senão, também tem defeitos e registam-se algumas omissões importantes. No fundo, estamos sempre à espera de mais, em particular atendendo a que no caso em apreço se trata de um trabalho de investigação universitário.
Efectuei uma análise crítica dividida em duas partes de que remeto a primeira.
Com os meus cumprimentos cordiais e amigos
Francisco Henriques da Silva
(ex-alf. mil. de infantaria
CCAÇ 2402)
O conflito político-militar na Guiné-Bissau (1/2)
As dissertações académicas – teses de licenciatura, de mestrado ou de doutoramento - não sendo propriamente obras de divulgação e não estando, em regra, acessíveis ao grande público, possuem, via de regra, uma relevante mais-valia em relação às obras do chamado circuito comercial, porquanto se trata do resultado de uma investigação exaustiva, de uma abordagem científica e rigorosa de certos temas, da respectiva análise especializada e, bem entendido, das propostas apresentadas. Tudo depende, obviamente, do produto final. No fundo, as dissertações permitem que outros, alicerçados e confortados com a seriedade do trabalho feito, possam, em momento posterior, difundir de uma forma aberta os pontos de vista expressos ou então contrariar fundamentadamente os resultados aduzidos.
Sob o título algo ambíguo “O Conflito Político-militar na Guiné-Bissau (1998-1999)”, Guilherme Jorge Rodrigues Zeverino publicou no Instituto Português de Apoio ao Desenvolvimento (IPAD), Lisboa, 2005, a sua dissertação de mestrado em Gestão do Desenvolvimento e Cooperação Internacional, apresentada anteriormente, ou seja em Outubro de 2003. Mencionámos que se tratava de um título algo ambíguo, não porque seja enganoso, antes pelo contrário, mas, a nosso ver, não reflecte totalmente a realidade crua e dura que foi uma guerra civil e que carece de adjectivação adicional, apesar de ter sido uma confrontação dita de baixa intensidade. Cremos que o autor, por uma questão de prudência e para evitar eventuais controvérsias, sobretudo a nível universitário – uma vez que a poeira ainda não assentou completamente -, terá preferido a expressão conflito político-militar, que, aliás, utiliza sempre, nesta formulação, ou, mais abreviadamente, o “conflito”. Eu também a emprego, muito embora a considere, como disse, de certo modo redutora. São opções. Respeito-as.
No seu trabalho, Guilherme Zeverino define “hipóteses no âmbito político, económico e social, nomeadamente:
• No âmbito político
- a instauração do regime multipartidário na Guiné-Bissau não contribuiu para a resolução dos conflitos internos no seio do partido no poder, antes pelo contrário, criou as condições para a sua exacerbação;
- No entanto, a instauração do regime multipartidário deu lugar a um reforço da sociedade civil;
- A interdependência entre a crise interna do PAIGC e a crise nas Forças Armadas constitui-se como uma das causas principais do conflito 1998-1999;
- A rivalidade cultural manifestada pelas políticas de cooperação seguidas por Portugal e pela França explicam em grande medida os diferentes posicionamentos que estes países adoptaram durante o conflito, simpatizando e apoiando naturalmente lados opostos.
• No âmbito económico
- A aproximação da Guiné-Bissau à França e à Francofonia mais especificamente com a adesão ao franco CFA (Comunidade Financeira Africana), em Maio de 1997, teve um impacto negativo a nível económico, porque não foi acompanhada de medidas macro-económicas capazes de sustentar o desenvolvimento, criando condições para o aumento da pressão externa, nomeadamente dos Estados francófonos.
• No âmbito social
- A intervenção de tropas estrangeiras (Senegal e Guiné-Conakry) com apoio francês ao lado do Presidente da Guiné-Bissau, e contra a auto-intitulada Junta Militar provocou a adesão em massa da população guineense aos militares revoltosos, associando desta forma a defesa da soberania da Guiné-Bissau ao descontentamento geral relativamente ao estado de sub-desenvolvimento do país.” (pp. 18 e 19).
Todas estas hipóteses de trabalho têm de ser sopesadas. Em nosso entender , algumas constituem pistas seguras ou chaves para a compreensão da guerra civil bissau-guineense, outras, muito embora não atinjam tal desiderato, em nosso entender, não devem ser totalmente descartadas, pois contém elementos de ponderação válidos. Por outro lado, detectam-se omissões no que às causas respeitam. Mas já lá iremos.
Para além de uma introdução, na qual se incluem as hipóteses a desenvolver acima transcritas, o autor inicia a obra traçando uma panorâmica histórica recente da Guiné-Bissau colocando o acento tónico na conflitualidade, desde a luta de libertação nacional à actualidade, o que acaba por ser uma constante da vida colectiva da Guiné-Bissau – e, por maioria de razão, nos dias que correm.
Concentra-se em seguida nas causas internas e externas do conflito político-militar para passar à questão de Casamansa (ou seja, a causa próxima da guerra), ao início da conflagração propriamente dita, à mediação internacional e ao fim do regime de “Nino” Vieira. Dedica um capítulo inteiro ao processo eleitoral e ao restabelecimento da legalidade democrática (serão as consequências mais imediatas e visíveis do conflito; resta saber se estamos perante um restabelecimento genuíno e duradouro da “legalidade democrática” e estamos em crer que não, como os factos supervenientes parecem ter amplamente demonstrado). Termina com um capítulo final (conclusão) em que dá por demonstradas as hipóteses de trabalho anunciadas no início da obra. Neste particular é de salientar, como sublinha, a justo título, Guilherme Zeverino, “que o Estado de Direito e as instituições democráticas na Guiné-Bissau, embora existam formalmente, funcionam com dificuldade e estão em ameaça constante, quer das Forças Armadas quer dos movimentos políticos” (p. 131). E um pouco mais adiante, remata : “podemos considerar a Guiné-Bissau como um país “frágil”, onde os conflitos militares e político-sociais são uma constante, dilacerando e destruindo a estrutura da sociedade guineense” (p. 133). A linguagem é quase eufemística e peca por timidez. Podíamos, sem dúvida, ir um pouco mais longe. Mas respeitamos a posição do autor.
(continua)
____________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 18 de Setembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10398: Notas de leitura (405): "Les Héros de la Guinée-Bissau: La Fin D'Une Légende", de Lourenço da Silva (2) (Francisco Henriques da Silva)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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14 comentários:
-"A rivalidade cultural manifestada pelas políticas de cooperação seguidas por Portugal e pela França"
Não conheço o autor, mas também eu já insinuei neste blog estas "coisas".
Parte das guerras intestinas em África têm esta origem.
Inglaterra/França (Belgica)/Inglaterra e a francofonia versus anglofonia já fizeram muita guerra com as des(colonizações) africanas.
Mas os africanos, no caso concreto aqui os políticos guineenses, usam essa "luta" franco/lusa, para tentar "mamar" dos dois lados.
Mas estas porras, que posso explicar noutros ambientes, só eu é que posso falar porque já perdi a vergonha há muitíssimos anos.
Ainda há três dias coloquei um comentário com afirmações do historiador francês René Pélissier que tem tantos amigos no blogue, camaradas da Guiné sempre dispostos a dar um beijo na boca do francês. Como ninguém comentou mais, a não ser o honesto, já nada ingénuo e sempre atento António Rosinha, repito a citação do francês René Pelissier:
"Para a história colonial portuguesa basta consultar os autores de língua inglesa. Há séculos que a maior parte a denuncia como negreira, arcaica, brutal e incapaz: a quinta essência do ultracolonialismo sob os trópicos".
René Pélissier disse, em entrevista a Lena Figueiredo, publicada no jornal Diário de Notícias, Artes de 02.04.07.
Associem esta afirmação aos apetites senegaleses e da Guiné-Conacry sobre o território da Guiné
Bissau, associem à acusação de que Portugal estaria por detrás do golpe de 1998.
Bem haja, embaixador Francisco Henriques da Silva e nosso camarada de armas, pelas suas recensões, pelo que dizem, pelo que nos obrigam a pensar.
Abraço,
António Graça de Abreu
Também já insinuei aqui os francesismos 'ocultos' e a sua cobertura distraída mas os amores são cegos e os serviços gratuitos.
O qu'é q's'há-de fazer?
SNogueira
Quem denunciou estas tentativas de "invasão" da sua terra foi Samora Machel, e queixou-se a Ramalho Eanes, numa visita presidencial a Ramalho Eanes.
E ele foi avisado por Tatcher.
Mas ele não teve cuidado, lixou-se
É possível que num ou noutro aspecto, ponto de vista, opinião, conceito de vida, etc., eu tenha diferentes posições do nosso 'mais velho' Rosinha mas não deixo de reconhecer a honestidade intrínseca das suas intervenções, da forma calma, serena, como são apresentadas ou expostas e por isso tenho grande respeito e consideração pelo que ele apresenta.
No que diz respeito ao texto de FHSilva parece tratar-se de uma reflexão também igualmente serena, aparentando grande conhecimento de causa e deixando 'pistas' para uma melhor compreensão da evolução dos acontecimentos naquele país que 'mexe' com os nossos sentimentos.
E não se poderá dizer que configura qualquer tipo de 'ingerência' na política interna, trata-se apenas de interpretar os sinais e os acontecimentos.
Está muito bom.
Abraços
Hélder S.
Caros amigos,
A julgar pela presente recensão, parece que o livro em questão não acrescenta nada de novo ao que ja se sabia.
Quanto a entrada da Guiné-Bissau na UEMOA e a consequente introdução do Franco CFA, diga-se o que se disser, deve ser das poucas coisas sensatas que o PAIGC e seus governos fizeram no país desde a independencia, caso contrário, a situação económica e social do país seria insustentável, pior do que está hoje.
Sempre que se levanta uma voz para pedir responsabilidades a Portugal sobre a forma como a descolonização foi feita, a resposta é sempre a mesma: As condições (...) do momento não permitiram fazer melhor. Então, tudo bem, mas se não foi possivel fazer melhor, decerto que foi feito pior e quanto a isso, os resultados estão a vista.
Já li aqui neste blogue que, pressionado pela rebeliao (sim a revolução também é uma rebelião para todos os efeitos) O Dr. M. Caetano disse que só entregava o poder nas mãos do Gen. Spinola.
- E Porquê? Porque, apesar das dissensões reais ou aparentes entre os dois, reconhecia nele um homem capaz de
dirigir o país e, provávelmente, dar-lhe o rumo certo (???).
O que é que Portugal fez com as suas colónias? Entregou-as aqueles que designava de bandidos e cujos dirigentes vivam em Conakri, Boké ou Ziguinchor emplumados com badalaicas e com sotaque francês.
Dos outros países não vou falar aqui, mas no caso da Guiné, não foi preciso muito tempo para confirmar-se o epíteto.
Por exemplo, em Setembro de 1974, a minha mãe sofreu uma intoxicação ao meter na boca um pedaço de pão já apodrecido que se encontrava dentro do armário, oferta de um soldado português, condutor-auto (já aqui relatado).
Levamo-la ao quartel para pedir ajuda, os guerrilheiros que já ocupavam o quartel disseram-nos que não havia nada, nem enfermeiro nem medicamentos. O meu pai, que era um homem sensato, exasperado, exclamou em voz alta para toda a gente ouvir:
- Mas, meus irmãos, se vocês não têm nem enfermeiro nem medicamentos para nos ajudar, então o que irão fazer com essa nossa independência?
Foi uma pergunta sem resposta, os guerrilheiros fugiram de vergonha e a multidão de medo, foi o Alferes do pelotão restante da tropa portuguesa que tentou ajudar sugerindo fazê-la ingerir uma boa quantidade de leite fresco, e leite era o que mais abundava em nossa casa de fulas pastores.
Eu concordo com o R. Pélissier e penso que os adjectivos que ele usa para caracterizar Portugal, já tinham sido utilizados por A. Cabral a quem ninguém poderia acusar de desrespeito para com Portugal e o seu povo, além disso a história, quando é vista de um angulo só, pode ser agradável para alguns mas será uma história muito pobre.
O regime de Portugal, novo ou antigo, sabia quem eram os homens do PAIGC e sabia quem eram contra o PAIGC ou contra a guerra, mas preferiu entregar aos primeiros.
- Seria uma armadilha colocada para este tropeçar e com isso demonstrar a incapacidade dos africanos em se auto-governarem?
As questões são muitas e as expeculações também, por isso vou ficar por aqui.
Um abraço amigo,
Cherno Baldé
Caros amigos,
A julgar pela presente recensão, parece que o livro em questão não acrescenta nada de novo ao que ja se sabia.
Quanto a entrada da Guiné-Bissau na UEMOA e a consequente introdução do Franco CFA, diga-se o que se disser, deve ser das poucas coisas sensatas que o PAIGC e seus governos fizeram no país desde a independencia, caso contrário, a situação económica e social do país seria insustentável, pior do que está hoje.
Sempre que se levanta uma voz para pedir responsabilidades a Portugal sobre a forma como a descolonização foi feita, a resposta é sempre a mesma: As condições (...) do momento não permitiram fazer melhor. Então, tudo bem, mas se não foi possivel fazer melhor, decerto que foi feito pior e quanto a isso, os resultados estão a vista.
Já li aqui neste blogue que, pressionado pela rebeliao (sim a revolução também é uma rebelião para todos os efeitos) O Dr. M. Caetano disse que só entregava o poder nas mãos do Gen. Spinola.
- E Porquê? Porque, apesar das dissensões reais ou aparentes entre os dois, reconhecia nele um homem capaz de
dirigir o país e, provávelmente, dar-lhe o rumo certo (???).
O que é que Portugal fez com as suas colónias? Entregou-as aqueles que designava de bandidos e cujos dirigentes vivam em Conakri, Boké ou Ziguinchor emplumados com badalaicas e com sotaque francês.
Dos outros países não vou falar aqui, mas no caso da Guiné, não foi preciso muito tempo para confirmar-se o epíteto.
Por exemplo, em Setembro de 1974, a minha mãe sofreu uma intoxicação ao meter na boca um pedaço de pão já apodrecido que se encontrava dentro do armário, oferta de um soldado português, condutor-auto (já aqui relatado).
Levamo-la ao quartel para pedir ajuda, os guerrilheiros que já ocupavam o quartel disseram-nos que não havia nada, nem enfermeiro nem medicamentos. O meu pai, que era um homem sensato, exasperado, exclamou em voz alta para toda a gente ouvir:
- Mas, meus irmãos, se vocês não têm nem enfermeiro nem medicamentos para nos ajudar, então o que irão fazer com essa nossa independência?
Foi uma pergunta sem resposta, os guerrilheiros fugiram de vergonha e a multidão de medo, foi o Alferes do pelotão restante da tropa portuguesa que tentou ajudar sugerindo fazê-la ingerir uma boa quantidade de leite fresco, e leite era o que mais abundava em nossa casa de fulas pastores.
Eu concordo com o R. Pélissier e penso que os adjectivos que ele usa para caracterizar Portugal, já tinham sido utilizados por A. Cabral a quem ninguém poderia acusar de desrespeito para com Portugal e o seu povo, além disso a história, quando é vista de um angulo só, pode ser agradável para alguns mas será uma história muito pobre.
O regime de Portugal, novo ou antigo, sabia quem eram os homens do PAIGC e sabia quem eram contra o PAIGC ou contra a guerra, mas preferiu entregar aos primeiros.
- Seria uma armadilha colocada para este tropeçar e com isso demonstrar a incapacidade dos africanos em se auto-governarem?
As questões são muitas e as expeculações também, por isso vou ficar por aqui.
Um abraço amigo,
Cherno Baldé
PS:
Para fechar só duas referencias sobre a história da Guiné:
1807 - Inglaterra decreta a abolição do tráfico de escravos.
1869 - Fim da escravatura em todos os territorios dominados pela coroa portuguesa.
Fonte: Américo Campos 2012: História da Guiné em datas.
Cherno
Cherno, a Inglaterra acabou com o tráfico não com a escravatura, e 1807 foi quando já não precisava porque já se tinham dado as independências no Canadá e EUA.
A Inglaterra, que eu admiro, tem uns timings muito próprios.
Um dia lá sairão do Afeganistão.
E quando falas na data de 1860 como o fim da escravatura nas colónias portuguesas, tambem é uma coisa levada a reboque, sabes que foi nessa data que começou a guerra de secessão nos EUA (E Tudo o Vento Levou e a Cabana do Pai Tomaz).
Sobre Portugal entregar ou não a independência a uns ou a outros, ninguém estava preparado e sabemos que já estava tudo nas mãos das potências mundiais.
Sabes o que diziam em Angola, meses antes da independência, os da geração dos teus pais e avós, muitos com quem trabalhei e alguns até na tropa andaram comigo?
"Vamos matar-nos uns aos outros"
As populações podiam ser atrazadas, iletradas, mas conheciam o que se passava na cabeça desses "doutores" africanos e não só.
Sabiam que o povo para eles era a última coisa em que pensavam.
Já sabiam o que se passava nos Congos,na Nigéria, no Ruanda e que com eles ia ser o mesmo.
Cherno, o que dizem os Pelissier, Suecos, Ingleses, etc., para denegrir a colonização por(tuga), chegava ao ponto de Na África do Sul e Namíbia e Zimbabué (Rodésia)e Congos, à volta de Angola, que eu vivi, antes das independências, faziam a apologia subreptícia do apartheid, comparando com as virtudes da separação tribal.
Até muitos de nós concordavam com a lógica do separatismo.
Cherno, em 1966 a selecção portuguesa de futebol era a maioria de africanos, era a isso que alguma europa chamava de "colonização negreira".
Hoje toda a europa copia Portugal.
Cherno, eu não estou a fazer a apologia da colonização portuguesa, mas faço o que digo sempre, condeno tudo o que a europa fez em África, inclusivé as independências no modo e no tempo como foram feitas.
E condeno o que a Europa e as grandes potências continuam a fazer em África, e actos eu que eu próprio participei na Guiné, ao lado de muitos estrangeiros.
Só para não extravasar este blog é que me inibo em divulgar "excentricidades" a que assisti e participei.
Mas claro que cá na tuga ainda tive tempo de participar e assistir tambem em cada aberração!
Mas isto digo eu que sou reaccionário!
Cumprimentos.
Metendo a foice a eito mas sem ofensa, caro Cherno e caro Rosinha,
lembro que nada implica nem legitima que em África -vastíssima- vivam só africanos -ditos pretos-e que a sua nacionalidade -por contracção de um propalado conceito de 'africanidade'- seja reconhecida no âmbito e por força de fronteiras desenhadas
pelo(!) 'colono'.
A ser assim, a questão da responsabilidade aqui levantada é desfocada e a ser assim, a defesa de posições a que eram afectos os actores de então -1961 a 1975- só deveria ter em conta aquelas posições, pelo que essa mesma defesa, hoje, configuraria a defesa de interesses de hoje eventualmente homólogos dos de então.
SNogueira
Caro SNogueira,
Permite-me que apresente dúvidas sobre a questão da "responsabilidade" nos termos do ùltimo período do comentário.
De facto, o Cherno referiu o sentimento de frustração dos guineenses na época, face ao modelo de transição para a independência. Sabemos, por outro lado, que a maioria da população não hostilizou os portugueses, apesar de a acção colonizadora não ter contribuído para o progresso económico-social. Na Guiné a população seria de cerca de 400.000 pessoas, que foram ignoradas, melhor, desprezadas pela nação portuguesa na transição para a independência. Igualmente em Angola e Moçambique, mas nestas "provincias", sobretudo em Angola, com a "insignificante" situação dos movimentos, que já quase não davam sinais de si, enquanto os territórios revelavam desenvolvimento (ainda não recuperado) e notório progresso social.
Hoje sabemos claramente quem foram os responsáveis: o MFA ("por razões que ainda não foram devidamente assumidas" - Brandão Ferreira), o PS e o PC, para além dos grupos de extrema-esquerda. Era branco, era colono, não se teve em conta as gerações que ali nasceram, nem o contributo irrefutável dos brancos para o desenvolvimento da economia e, até, da harmonização, nos antípodas do apartheid. Se não fosse assim, acha provável que, para além da acção militar, os movimentos estivessem em banho-maria?
Nem se teve em conta que a transição independentista provocaria (obrigatoriamente) o confronto local da guerra fria - blocos de leste e ocidental. Eram capitães, não sabiam tudo, só falta a assunção das "razões".
Hoje, penso eu, já não são comparáveis as situações vividas com as que se vivem, e a manipulação da história prossegue com a força das instituições.
Abraços fraternos
JD
Meu caro Cherno
Tenho por ti todo o respeito do mundo e as diferenças de opinião fazem parte do que somos e enriquecem naturalmente a nossa vida.
Dizes que concordas com a afirmação do Réne Pélissier que volto a citar:
"Para a história colonial portuguesa basta consultar os autores de língua inglesa. Há séculos que a maior parte a denuncia como negreira, arcaica, brutal e incapaz: a quinta essência do ultracolonialismo sob os trópicos".
Isto é uma opinião, ou arrumar de vez com a história colonial portuguesa "quinta essência do ultra colonialismo sob os trópicos?" Isto é uma afirmação de quase ódio a Portugal e aos portugueses. Claro que não fomos santos, mas esta não é a nossa História,
tanta vez mal contada.
E aqui não estamos no reino das opiniões.
Sabes como funcionava no século XIX muito do recrutamento(chamemos-lhe assim!)
de escravos africanos que embarcavam pela força nos navios negreiros, de bandeira norte-americana, inglesa e francesa (havia navios negreiros portugueses?) rumo ao Brasil, às Caraíbas, à América do Norte?
É ou não verdade que muitos desses infelizes negros, que morriam às centenas em cada viagem transatlântica, eram entregues, vendidos aos capitães negreiros brancos
pelos chefes tribais negros dos territórios que se estendem do Senegal até Angola e eram resultado
de infindáveis lutas fratricidas entre diferentes etnias. Quem vencia capturava os seus escravos e depois vendia-os aos negreiros ingleses, franceses e norte-americanos.
Estarei a inventar?
Não ponho em causa o colonialismo português. Existiu, com certeza, cometeram-se muitos crimes contra os povos das colónias.E os povos africanos não cometiam constantemente crimes entre si?
Estamos em 2012. Os tempos são outros, os povos africanos conseguiram a sua tortuosa independência.
Pós independência quase todos os novos dirigentes africanos cometeram outros incontáveis atentados e crimes contra os seus povos.Vê só as lutas tribais no Congo, com milhões de mortos.
Também sei que o neocolonialismo existiu e existe. Mas será o responsável, por exemplo, por quase trinta anos de guerra civil em Angola?
Hoje, cinquenta anos após tanta independência, continuar a acusar os colonialistas portugueses de serem "a quinta essência do ultracolonialismo sob os trópicos", não fica bem a quem o faz, ainda por cima um francês que passa uma esponja encharcada mas limpinha sobre o colonialismo da França.
Os africanos, tal como os brasileiros -- ou até os cubanos, com Fidel de Castro em Havana diante de João Paulo II, há anos atrás, a acusar o colonialismo espanhol das desgraças de Cuba, cem anos após a independência da ilha - , os africanos, dizia eu, têm tudo a ganhar em se libertaram do complexo
anticolonialista.
É fácil acusar os colonialistas que deus (ou o diabo!) tenha.
Muito mais difícil é construir um país e lutar por uma vida melhor para os seus povos.
Abraço,
António Graça de Abreu
Este é o "meu" Graça de Abreu.
Para além do poeta, sensível, apreciador das belezas, e do 'jovem António', registador de impressões e sentimentos 'em cima da hora', não sujeitos às 'correcções dos tempos', temos aqui um Graça de Abreu assertivo, mas sereno, argumentador, didáctico, não-provocador.
Com boa argumentação e bons exemplos, gostei.
Abraços
Hélder S.
Caros amigos,
Como devem ter notado, com este interregno de tres dias seguidos, nao consegui acompanhar e reagir, em tempo util, no debate a volta da historia e dos conflitos na Guiné.
Por isso, resta-me so agradecer a todos os participantes pela frontalidade e sinceridade das opinioes, em especial ao AGA, a quem, em jeito de conclusao, gostaria de sossegar dizendo-lhe que, em boa verdade, existe na pessoa do R. Pélissier uma profunda contradicao entre o discurso e a pratica, pois quem leu as suas obras, sabe que, as suas principais fontes de referencia e pesquisa historica sobre as ex-colonias, sao portuguesas (arquivo hsitorico).
Da mesma forma que nem sempre concordei com a sua linguagem arrogante e de desprezo para com os portugueses e seus aliados.
Mas, factos sao factos e sobre isso nao adianta tentar tapar o sol com as maos.
Um abraco amigo para todos,
Cherno Baldé
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