terça-feira, 15 de outubro de 2019

Guiné 61/74 - P20241: Dignidade e Ignomínia (Episódios do Meu Serviço Militar) (Fernando de Sousa Ribeiro, CCAÇ 3535, Angola, 1972/74) - Parte VI: Não aos crimes de guerra: os bravos não são cruéis e os cruéis não são bravos



Foto nº 2 > Angola > CCAÇ 3535  (1972/74) >  O grupo de combate do alf mil  Fernando de Sousa Ribeiro no decurso  da operação que levou à conquista e destruição da base de Catoca, da UPA / FNLA. Foto do álbum do  fur mil  Luís Macedo.






Crachá da Companhia de Caçadores 3535, baseado no suposto brasão pretensamente pessoal do capitão miliciano Lamas da Silva. Eu nunca andava com este crachá ao peito. A Idade Média acabou há séculos. Eu
não tinha nada que trazer ao peito o presumido brasão alegadamente do Lamas, como se o Lamas fosse meu senhor feudal. Se ele quisesse brincar aos fdalgos, que brincasse sozinho. Por outro lado, e o que era muito mais grave, eu não podia aceitar um lema tão repugnante como o que se encontrava no crachá. 


lema, "A cada um a sua própria morte", foi cirurgicamente retirado de uns versos do Livro das Horas de Rainer Maria Rilke, de tal forma que o seu sentido fcou completamente adulterado. Os versos dizem o seguinte: Senhor, dá a cada um a sua própria morte. / Morrer que venha dessa vida / durante a qual amou, sentido encontrou, teve má sorte. O que era uma frase que fazia parte de uma oração a Deus foi transformado num lema que é um incitamento ao homicídio! Se dúvidas eu tivesse a propósito do verdadeiro significado do lema, elas dissiparam-se quando foram distribuídos, pelo pessoal da companhia, lenços de cor preta, para proteger a cara do pó da picada durante as colunas auto. 

Tal como o lema, a cor preta dos lenços não foi escolhida por acaso. Com um tal lema assassino e com tais fúnebres lenços pretos, quiseram fazer de nós emissários da morte. Porém, nós agimos de modo precisamente contrário




Foto nº 1 > Na picada que subia da Ponte do Rio Dange para norte, havia esta placa de trânsito, de cimento, indicativa de um desvio para o Mucondo, que ficava a poucas centenas de metros de distância. Amarrada a esta placa, estava uma tabuleta de madeira que dizia "AQUI COMEÇA O INFERNO". Esta tabuleta é a haste horizontal da mancha negra em forma de cruz que se vê acima da placa de cimento.


Fotos (e legendas): © Fernando de Sousa Ribeiro (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Fernando de Sousa Ribeiro:


(i) ex-alf mil at inf, CCAÇ 3535 / BCAÇ 3880 ( Zemba e Ponte do Zádi, Angola, 1972/74);

(ii) é membro da Tabanca Grande desde 11 de novembro de 2018, com o nº 780;

(iii) licenciado em Engenharia Electrotécnica pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto;

(iv) está reformado, e 
vive no Porto, mas também tem boas recordações de Lisboa onde viveu e trabalhou;

(v) tem página no Facebook;

(vi) a CCAÇ 3535 foi mobilizada pelo RI 16, partiu para Angola em 13/6/1972 e regressou em 28/8/1974; esteve em Zemba, P. R. Zádi. Comandantes: cap mil inf José Manuel de Morais Lamas Mendonça e Silva, e cap mil inf José António Pouille Nobre Antunes.

(vii) pertencia ao BCAÇ 3880, sediado em Zemba e Maquela e comandado pelo ten cor inf Armando Duarte de Azevedo; as outras duas subunidades eram a CCAÇ 3536 (Cambamba, Fazenda Costa) e a CCAÇ 3537 (Mucondo, Béu);

(viii) o ficheiro, em formato pdf, que estamos a publicar, tem 165 pp, imagens incluídas.


Dignidade e Ignomínia 

(Episódios do Meu Serviço Militar)

 > Crimes de guerra 
(pp. 49-63)(*)


por Fernando de Sousa Ribeiro



Pouco tempo antes da nossa partida para Angola, quando ainda estávamos em Santa Margarida aguardando o dia da partida, os aspirantes das companhias operacionais do BCaç 3880 fizeram uma espécie de juramento. Digo «uma espécie», porque não foi um juramento formal, mas sim um compromisso que os aspirantes tomaram uns perante os outros. Se não todos, pelo menos quase todos (eu incluído), levaram esse compromisso a sério, como se de um verdadeiro juramento se tratasse.

Foi num dia ao imm da tarde que esse compromisso teve lugar, enquanto tomávamos banho e nos arranjávamos para irmos jantar à messe de oficiais do Campo Militar de Santa Margarida. Alguns de nós preparavam-se para tomar banho, completamente nus e prontos para entrar no chuveiro. Outros tinham acabado de tomar banho e
saíam do chuveiro, igualmente nus. Outros ainda, incluindo eu próprio, estavam a fazer a barba, com uma toalha à cintura. Sem que ninguém o fizesse prever, um dos aspirantes presentes no local chamou a atenção dos restantes, dizendo:

— Ó malta, vamos assumir um compromisso!

Não me lembro de quem foi que falou, mas tenho a vaga ideia de ter sido o falecido aspirante Leite, que viria a ser alferes miliciano da CCaç 3537.

Nós interrompemos o que estávamos a fazer, para ouvirmos o que ele tinha para nos dizer. E ele disse, muito aproximadamente, o seguinte:

— Nós não sabemos o que nos espera na guerra. Não sabemos que perigos é que iremos enfrentar, nem que horrores é que iremos testemunhar. Nem sequer sabemos se vamos estar no lado certo ou no lado errado da guerra. Só quando chegarmos a Angola é que viremos a saber. Mas independentemente de estarmos no lado certo ou no lado errado da guerra, independentemente de tudo o que nos vier a acontecer, havemos de agir sempre de acordo com o que a nossa consciência nos determinar. Não sabemos se tal será possível no meio de uma guerra.

E continuou:


— Poderemos enfrentar situações que nos levem a cometer atos que em condições normais nunca cometeríamos. Não sabemos. Mas mesmo assim e
independentemente de tudo, procuraremos agir sempre de acordo com a nossa consciência, custe o que custar.

E, quando já todos nos manifestávamos a favor do compromisso, assumindo-o, ele repetiu, martelando as palavras:

— CUS...TE... O... QUE... CUS...TAR!

— Custe o que custar — repetimos.

Apesar de terem sido ditas numa circunstância e num lugar pouco apropriados a um juramento solene, estas palavras valeram como tal. Os aspirantes das companhias operacionais do BCaç 3880 comprometeram-se assim, uns perante os outros, a seguir os ditames da sua consciência na sua conduta durante a guerra. Foi com esta
disposição que eles partiram para Angola.

Após uma curta estada no quartel do Grafanil, nos arredores de Luanda, onde ficou assim que chegou a Angola, a minha companhia viajou para Zemba, o seu destino na guerra. Não houve quaisquer incidentes durante a viagem, felizmente. 


De entre as paragens que se fizeram durante a deslocação, destaca-se uma que se fez no Mucondo. Esta paragem durou cerca de meia hora, talvez, antes da partida para Santa Eulália e Zemba, já ao fim da tarde. Enquanto permanecemos no Mucondo, eu estive na messe de oficiais a descansar. Sem que nada o fizesse prever, os oficiais da companhia local, que ainda não tinha sido rendida pela CCaç. 3537, começaram a gabar-se perante nós, "maçaricos", dizendo:

— Nós somos os "Assassinos do Mucondo"! Nós não fazemos prisioneiros. Tudo o que encontrarmos na mata a mexer-se é turra, é para abater, seja homem, mulher, criança, cão ou galinha. Somos os "Assassinos do Mucondo". Não perdoamos a ninguém. Nunca fazemos prisioneiros. Atiramos primeiro e perguntamos depois. Somos implacáveis. Somos os "Assassinos do Mucondo"!

Eu achei graça àquilo, pensando que eles estavam a tentar impressionar-nos, novatos que nós éramos, cheios de medo a caminho da guerra. Não levei aquelas palavras a sério, de maneira nenhuma.


Na picada que subia da Ponte 

do Rio Dange para norte, havia esta placa de trânsito, de cimento, indicativa de um desvio para o Mucondo, que ficava a poucas centenas de metros de distância. Amarrada a esta placa, estava uma tabuleta de madeira que dizia "AQUI COMEÇA O INFERNO". Esta tabuleta é a haste horizontal da mancha negra em forma de cruz que se vê acima da placa de cimento 

[Foto nº 1, acima; e em pequeno reduzido à direita]


Quando chegamos a Zemba já era de noite. Logo a seguir ao jantar, fui para o quarto, juntamente com os restantes alferes da 3535, arrumar as minhas coisas.

Nessa altura, os alferes da companhia que fomos render (a CCaç 3346, do BCaç 3840), também foram ao nosso quarto, mas para falar connosco com toda a seriedade. O que eles nos disseram foi o seguinte:

— Nós temos uma revelação para vos fazer, que é muito constrangedora para nós. Mas é preferível que vocês saibam da nossa boca do que por terceiros. A revelação é: a nossa companhia cometeu um massacre.

Perante a nossa surpresa, exclamaram logo a seguir:

— Por amor de Deus, não nos interpretem mal! Nós condenamos o que se passou, tanto como vocês. A sério! Mas a verdade é que houve um massacre cometido por militares da nossa companhia. Infelizmente houve. Nós condenamos, mas houve.

Passaram então a contar o que se passou:

— Uma vez, no Zemba "Turra", um alferes mandou fuzilar 21 prisioneiros que tinham acabado de ser capturados. Ele confessou que estava aterrorizado por se encontrar num sítio tão perigoso como era o Zemba "Turra". Mandou alinhar os prisioneiros e ordenou aos soldados que os fuzilassem. E assim aconteceu. O alferes já não está cá.

Foi castigado por causa disso e transferido, embora o texto da punição não faça referência ao massacre.

E os alferes da 3346 repetiram e voltaram a repetir:

— Vocês não pensem que nós costumávamos agir desta forma. De maneira
nenhuma! Nós condenamos o massacre tanto como vocês. Mas a verdade é que aconteceu. Foi o único massacre que houve na nossa companhia, por culpa de um cobarde. Ele mesmo confessou que estava aterrorizado e já não está cá. Por amor de Deus não pensem mal de nós! Nós também condenamos o massacre. Acreditem que é verdade! Nós sempre procuramos respeitar as vidas humanas. Aquele cobarde é que não respeitou.

Depois de terem contado o episódio do massacre, envergonhados, os alferes da 3346 saíram, para nos deixar ficar a arrumar as nossas tralhas no quarto. O alferes Arrifana, da minha companhia, saiu também de imediato e dirigiu-se diretamente para a caserna do seu grupo de combate. Reuniu os seus soldados e cabos e contou-lhes o que tinha acabado de saber. Por fm, acrescentou:

— Vocês livrem-se de cometer atos semelhantes a este! Se algum de vocês matar um só inocente que seja, vai ter que se haver comigo! Juro que lhe faço a vida num inferno! Se há coisa que eu não admito no meu grupo de combate é cobardes. Se algum de vocês for cobarde e assassino, garanto que me vai ter à perna. Nunca mais terá sossego comigo!

No dia seguinte de manhã, quando entrei na caserna do meu próprio grupo de combate, ouvi os meus homens comentarem o sucedido uns com os outros. O "sermão" do Arrifana também tinha chegado ao conhecimento deles. Diziam os meus cabos e soldados:

— Um homem que é homem não dispara contra quem não se pode defender. Se o outro estiver armado, pode disparar, pois nesse caso estarão de igual para igual; se ele não disparar, o outro disparará primeiro. Mas atirar contra uma pessoa desarmada é cobardia.

E diziam uma frase que ouvi repetida por eles várias vezes ao longo dos dias que se seguiram:

— Só quem tem medo de tudo e de todos é que está disposto a matar tudo e todos. É um cobarde.

Perante tais palavras, achei que não valia a pena eu fazer também um "sermão" aos meus homens. O do Arrifana chegou.

Passaram-se vários meses. Quantos? Não me lembro. Só me lembro de que um dia ouvi o comandante do batalhão fazer referência aos "Assassinos do Mucondo". Não me lembro das circunstâncias em que ouvi tal referência, nem tenho a certeza de que ele tenha pronunciado textualmente as palavras «Assassinos do Mucondo». Só
me lembro de ouvir o tenente-coronel lamentar o facto de a CCaç 3537 não se comportar como a companhia que a antecedeu, que varria tudo à sua frente. Achava ele que o terror espalhado pela companhia anterior deveria ser continuado pela CCaç 3537, mas «infelizmente» não era. «Aquilo é que era uma companhia que impunha respeito», disse ele sobre a companhia anterior. Quase só lhe faltou chamar
mole e piegas à 3537.


Eu ouvi as palavras do tenente-coronel Azevedo com um certo espanto. «Será que no princípio da comissão os autodenominados 'Assassinos do Mucondo' tinham-nos mesmo falado verdade?», interroguei-me. «Até o comandante se refere a eles! Como foi que ele soube?» Instalou-se a dúvida no meu espírito a respeito dessa companhia.

Algum tempo mais tarde realizou-se uma operação ao Catoca, na qual o papel principal foi desempenhado pelo meu próprio grupo de combate. O grupo não foi comandado por mim, mas sim pelo valente furriel Macedo, porque eu estava em gozo de licença anual. 

Além da conquista e destruição da base do Catoca propriamente dita, o resultado final dessa operação ultrapassou em muito tudo quanto se tinha esperado dela: a UPA/FNLA abandonou, pura e simplesmente, toda a zona do Catoca! Os guerrilheiros fugiram para o Mufuque, que era a base principal do movimento na região do Mil e Vinte (assim chamada por nela haver três montes com a mesma altitude de 1020 metros), e deixaram entregue à sua sorte a população nos acampamentos que tinham controlado na zona do Catoca.

 
Foto nº 2 (acima; em formato 
reduzido, à direita) Fotografia feita pelo furriel Luis Macedo na zona do Catoca


Em Zemba, ninguém se tinha dado ainda conta do das verdadeiras consequências da operação, com o abandono do Catoca por parte da UPA/FNLA, até ao momento em que chegou um SITREP, que era um relatório semanal distribuído pelos batalhões dando conta da evolução da guerra em Angola. 

Neste relatório em concreto, o batalhão de Vista Alegre dava conta da apresentação, naquela localidade, de numerosos elementos da população e, até, de guerrilheiros armados, oriundos da zona do Catoca. O batalhão de Vista Alegre congratulava-se vivamente com o facto, que atribuía à ação psicológica por si mesmo desenvolvida.

O comandante do nosso batalhão, assim que leu o SITREP em questão, foi a correr ao posto de rádio, para comunicar ao brigadeiro de Santa Eulália que as apresentações registadas em Vista Alegre não se deviam a ação psicológica nenhuma, mas sim à ação militar empreendida pelo Batalhão de Caçadores 3880, que conquistou o Catoca. O brigadeiro respondeu-lhe, do outro lado, que já sabia,
porque também se estavam a verificar apresentações em Santa Eulália de pessoas vindas do Catoca. O brigadeiro aproveitou a oportunidade para dar os parabéns ao tenente-coronel pelo êxito militar.

As apresentações de pessoas vindas do Catoca só se verificaram em Vista Alegre e Santa Eulália. Significativamente, ninguém se apresentou no Mucondo. Absolutamente ninguém. Quando o brigadeiro perguntou aos que se apresentaram em Santa Eulália porque motivo percorreram tantos quilómetros até lá chegarem, em vez de se apresentarem no Mucondo, que ficava muito mais perto do Catoca, recebeu a seguinte resposta:

— A tropa do Mucondo mata.

É claro que não era a Companhia de Caçadores 3537 que matava, mas sim a sua antecessora, a companhia dos "Assassinos do Mucondo", cuja fama permaneceu depois da sua saída.

De um momento para o outro, o tenente-coronel deixou de elogiar os "Assassinos do Mucondo", que tinha apresentado como exemplo a seguir, para passar acondená-los:

— Se não fossem aqueles sacanas, — dizia — teria havido apresentações no Mucondo. Esse seria mais um ponto a nosso favor.

Cerca de meio ano depois, estive em Luanda mais ou menos durante um mês. Ao longo desse tempo, dei alguns passeios pela região envolvente à capital angolana.

Num desses passeios fui até à barragem das Mabubas. Para meu espanto, encontrei aquartelada nas Mabubas, junto à barragem, a companhia dos "Assassinos do Mucondo"! Reconheci logo o capitão, que aliás era do quadro permanente. Não falei com ninguém da companhia. Falei apenas com o médico militar que lá se encontrava e que eu conhecia de vista do Porto.

O médico falou longamente de uma epidemia de cólera que se iniciou muito perto dali, na Barra do Dande, e que já se estava a espalhar por Angola inteira, tendo já causado dezenas de mortos. Ele estava indignadíssimo com o comportamento das autoridades sanitárias coloniais, as quais, em vez de tomarem medidas para combater a epidemia, tudo fizeram para escondê-la, «para que o inimigo não saiba e não a aproveite para fazer propaganda». Resultado: a doença espalhou-se para lá do que era possível esconder e O MUNDO INTEIRO, e não só o "inimigo", ficou a saber que havia uma epidemia de cólera em Angola!

A certa altura da conversa, e sem que eu lhe fizesse qualquer pergunta a respeito da companhia que estava colocada lá nas Mabubas, o médico começou a falar dela, comentando que nem parecia uma companhia veterana, já em fim de comissão.

Acrescentou, por sua própria iniciativa, que os militares da companhia se chamavam a si mesmos "Assassinos do Mucondo". O médico nunca tinha estado no Mucondo, mas sabia que aquela companhia era dos "Assassinos do Mucondo"!

— Se eles foram ou não assassinos lá no Mucondo, não sei, mas que se chamam a si próprios assassinos, chamam, e eu acredito que tenham sido, — disse o médico — porque são uma tropa muito fraca.

A corroborar a falta de qualidades militares da companhia, o médico passou a relatar um episódio passado algum tempo atrás, lá mesmo nas Mabubas:

— Certa noite, um soldado sentiu necessidade de defecar. Ou porque estava aflito com diarreia ou por outro motivo qualquer, em vez de se dirigir aos sanitários, resolveu fazer o "serviço" no meio do capim, no escuro, do lado de fora do quartel.

Passou para o exterior do arame farpado e, a uma certa distância do quartel, começou a "arriar o calhau". Um sentinela viu um vulto na escuridão e começou a disparar sobre ele. O pobre soldado, vendo-se alvejado, pôs-se a gritar para não dispararem, porque era ele, Fulano, que estava ali. Mas quanto mais ele gritava, mais
o sentinela disparava. De um momento para o outro, toda a companhia desatou a disparar para todos os lados, numa barulheira infernal! 


Era suposto esta companhia ser constituída por veteranos, que já tinham feito uma guerra no Mucondo, e não por "maçaricos" cheios de medo, acabados de chegar do "Puto". Pois foi como "maçaricos" que estes veteranos se comportaram. 

No fim, quando o tiroteio acabou, o soldado que tinha estado na origem desta confusão saiu do capim, branco como a cal da parede, mas incólume. Gastaram-se muitas centenas ou mesmo milhares de
munições em poucos minutos e nem uma só acertou no homem… Felizmente! 

Uma semana depois, dizia-se em Luanda que as Mabubas tinham sido atacadas!

Como se vê, os indícios de que a companhia aut
odenominada "Assassinos do Mucondo" cometeu crimes de guerra,  foram-se acumulando no meu espírito à medida que o tempo passava. Só o facto de os militares dessa companhia terem escolhido chamar-se "assassinos" é, só por si, muito preocupante. 

A palavra "assassino" tem uma carga negativa fortíssima. Ninguém gosta de ser chamado "assassino". No entanto, foi este nome, e não outro, que eles escolheram para si próprios. Era deste nome que eles se orgulhavam, como eu próprio testemunhei. Por algum motivo o terão feito. Mesmo que tenham provocado uma só morte de um inocente, esta morte já é de mais. 

É verdade que eu não tenho provas concretas, factuais, de que algum crime tenha sido cometido por elementos dessa companhia. Tenho apenas as suspeitas que acabo de expor, mais o que passo a expor a seguir.

Muito recentemente, soube através da internet,  que um antigo militar que tinha estado no Mucondo tinha publicado um livro. Fiquei cheio de curiosidade. O antigo militar em causa chama-se Rogério Pires de Carvalho, foi furriel miliciano e o seu livro tem como título "Alenterra". Um título destes pode sugerir tudo menos a guerra colonial ou a tropa em geral, mas enfm, quer tenha sido bem ou mal escolhido, foi este o título que o autor deu ao livro. Encomendei um exemplar, recebi-o e li-o.

Pouco tempo depois, descobri que este antigo militar tinha pertencido à companhia dos "Assassinos do Mucondo". Voltei a pegar no livro e reli-o, agora sob uma nova perspetiva. Tudo se encaixou.

O livro "Alenterra", de Rogério Pires de Carvalho, é uma pequena obra autobiográfca de 91 páginas, que aborda, sobretudo, a experiência militar do seu autor. 

É um livro muito bem escrito, que revela um escritor de primeira água. Embora seja autobiográfco, o livro é tudo menos monótono e linear, graças aos numerosos saltos no tempo que contém, para a frente e para trás, que são dados sem aviso. Por isso, este livro exige do leitor um certo cuidado, para não se perder relativamente à época a que o autor se refere a cada momento.

Eu não vou fazer aqui um resumo do livro. Vou apenas respigar uma ou outra passagem que possa esclarecer o pensamento e, sobretudo, a ação do autor, assim como da companhia a que pertenceu. Comecemos então.


(...) «Há coisas que nem nos segredos se devem aflorar. Coisas de nada, mas também outras coisas, densas, plúmbeas, excessivas. Como o remorso, o reverso do acto irreversível.

«Ou a dor, que mesmo descrita, não passa de retórica aos ouvidos dos outros. Sente-se na carne, nos ossos, na pele, nas unhas, mas dela nada se pode dizer, porque ela existe para ser sentida nas entranhas. A palavra não a redime, nem a dissolve.» (Rogério Pires de Carvalho, "
Alenterra"!, 2010, Prólogo, pág. 13)

(...) «Como o soldado que se vangloriava de... olhe, não sei se lhe conte, porque não são coisas fáceis de escutar. Histórias de gente que se mata à bala e à faca, gente que sangra outra gente, é sempre gente sofredora. Gente é gente, desde que nasce até que morre, e gente que se mata mal acaba de nascer também é gente, ou poderia tê-lo sido. E é dessas histórias que me recuso a contar-lhe, porque tenho vergonha. Apesar deste tempo todo, ainda tenho vergonha, do que fiz e do que não fiz, do que vi fazer e do que ouvi contar. E por isso não lhe conto, porque não precisa de sofrer o que os outros já sofreram. Ponto final.» (Ibid., pág. 43)

(...) «Aqui e além, disfarçadas na vegetação que começava a revelar-se mais densa, vislumbrámos as primeiras cubatas feitas de paus e palha grossa. Alguns vultos andrajosos voltavam na nossa direção o inexpressivo rosto da hostilidade. Bastava aquele aparente alheamento em relação à nossa presença, para percebermos que não éramos bem-vindos. Nós éramos homens de guerra e era a guerra que carregávamos connosco, embora restasse em nós alguma reserva de inocência. A inocência dos que ainda não tinham trilhado os caminhos da infâmia.» (Ibid., pág. 56)

(...) «O sofrimento cicatriza as emoções. Cobre-as com uma casca rija, casca grossa onde a crueldade se instala. A guerra promove esta neurose, alimenta-se dela, porque só sobrevivem os mais coriáceos. É preciso pôr a humanidade de lado para fazer nascer a verdadeira natureza humana: feroz, assassina e impiedosa. O homem finalmente despido de todas as roupas civilizadas e morais, deixando à solta a sua natureza instintiva e primária, é isto que a guerra autoriza.» (Ibid., pág. 85)

(...) «Ao fim de quatro dias de combates, fomos recolhidos pelos helicópteros, e tivemos a recepção que só é concedida aos heróis. Mas todos estávamos vazios, ocos por dentro, como um saco roto. Não havia nada em nós, nem emoções, nem sentimentos, nem um traço de humanidade. Nada. Um deserto interior feito de apatia e desinteresse por tudo e por todos.

«De uma vez por todas, tinha conseguido atingir o objectivo supremo: já não ia sofrer mais com os males dos outros ou com os meus próprios, porque uma parte de mim tinha deixado de existir. A batalha deixara sobreviver uma legião de fantasmas, articulados por
fora como bonecos, mas mortos por dentro.

«No sítio da alma havia um buraco negro.» (Ibid., pág. 87)

Como se vê, ele emprega palavras como «remorso», «infâmia», «vergonha», «crueldade», etc. Todas estas palavras apontam no mesmo sentido, o da confirmação de que existiram atos que foram, no mínimo, reprováveis e de que há um arrependimento por parte do autor do livro. Existe, contudo, uma passagem, em que ele talvez procure uma desculpabilização e que eu não posso deixar passar em claro.

Nesta outra passagem, o autor ofende quem agiu de modo diferente. A passagem é a que se segue:

(...) «E aquele ser sem eira nem beira lá ia de camarada com os restantes, todos feitos da mesma massa, todos ruminando pensares que iam e vinham, desatinados. Sôfregos de atenção, sôfregos de estima, que quem ali ia não ia para ser estimado, mas para ser odiado. E temido, claro, temido como só os bravos o sabem ser. Os bravos ou os cruéis, ou ambos, porque ambos são a mesma coisa.» (Ibid., pág. 61)

É inacreditável esta frase: «Os bravos ou os cruéis, ou ambos, porque ambos são a mesma coisa.» Esta frase é um insulto aos meus maravilhosos camaradas de armas que, apesar de todos os perigos e de todas as provações por que passaram (que em nada ficaram a dever às que foram vividas pelo autor do livro), se comportaram SEMPRE como valentes seres humanos, abnegados e generosos, mesmo nas circunstâncias mais extremas. 


Ao contrário do que Rogério Pires de Carvalho afrma, os bravos não são cruéis e os cruéis não são bravos. DE MANEIRA NENHUMA! Agora sou eu que digo: «Ponto final».







Capa do livro Alenterra, de Rogério Pires de Carvalho, "Alenterra", edições Alfarroba, 2010, 96 pp.


Excerto de notícia do jornal 'on line' TInta Fresca, sobre o lançamento do livro, em Torres Novas, em 24/5/2012:

(...) O autor, nascido em Zibreira [, Torres Novas,]  nos idos de 1948 e residente em Castelo Branco, é professor, licenciado em História pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em literatura e cultura portuguesa pela Universidade Nova. Trabalhou na Segurança Social e foi arqueólogo no IPPAR. Alenterra constitui-se como um romance autobiográfico, centrado na Guerra Colonial, onde o trauma e a culpa definem as coordenadas da narrativa. (...)

Mais dados biobliográficos sobre o autor:

(...) encontra­‑se aposentado do ensino secundário. Entre os anos de 1969 e 1973 cumpriu o serviço militar obrigatório, tendo sido mobilizado para a região dos Dembos, em Angola.

Publicou:

- As três guerras do Mucondo (2001), Roma Editora; 

- Os funerais de dona Soledade; (2003), Roma Editora; 
- Alenterra (2010), Alfarroba Editora; 
- Histórias Parvas (2013), Fonte da Palavra Editora. (...)


35 comentários:

Unknown disse...

"...Reconheci logo o capitão, que aliás era do quadro permanente"
Ao autor deste post sugiro que consulte as fontes oficiais para confirmar/infirmar o comando da CCaç 3346.
Morais Silva

jose martins disse...

O CMDT da CCAC 3346/Bcac 3840 foi o capitao miliciano Antonio Manuel Ferreira de Carvalho.

Fernandes Martins

Anónimo disse...

O Autor pode obter informação em https://bcac3840.blogspot.com sobre o comando do BCaç3480 e subunidades subordinadas.
Sugiro ainda que a fobia do "QP" seja tratada porque já fede.
Morais Silva
Coronel do Quadro Permanente (QP) ex-cmdt compª em Angola e Guiné

Fernando Ribeiro disse...

A companhia em questão NÃO era a CCAÇ 3346.

Fernando de Sousa Ribeiro

Anónimo disse...

Todas as Companhias do Bcac 3840 foram comandadas por capitaes milicianos.

Este e um assunto muito serio que nao pode ser tratado de animo leve

Fernandes Martins

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Obrigado, Zé Martins, Morais Silva e Fernando de Sousa Ribeiro

É preciso ler as coisas com calma... Estive a reler o texto do Fernando... e a verdade é que ele não identifica a companhia dos autodenominados "Assassinos de Mucondo" (, que raio de nome!)...

O BCAÇ 3840, a que pertenciam as CCAÇ 33446, 3347 e 3348, esteve em Zemba e na Fazenda Tentativa: o comando e a CCS... Comdts: ten cort António Fernandes da Graça e ten cor inf João Maria Antunes.

Esta unidade, mobilizada pelo RI 16, partiu para o TO de Angola em 16/5/1971, incluindo as companhias de quadrícula. E regressou a 16/5/1973, perfazendo os 24 meses de comissão de serviço. [As companhias regressaram nesse dia (a CCAÇ 3347) ou dias seguintes: a 18 (a CCAÇ 3348) e a 19 (a CCAÇ 3346)}.

A CCAÇ 3346 esteve em Zemba e na Fazenda Tábi. Comandante: Cap Mil António M. F. Carvalho (a confirmar).

A CCAÇ 3347 esteve em Mucondo e Mabubas. Cmdt: Cap grad Manuel Câmara Rodrigues

A CCAÇ 3348 esteve em Cambamba e Fazenda Tentativa. Cmdt: cap grad Manuel Ambrósio de Morais Freitas.

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Quem pertenceu à CCAÇ 3347 e esteve em Zemba (, pelo menos, em 1971) foi o nosso grã-tabanqueiro Rui Pedro Silva.

Ex-ten mil, BCAÇ 3840 (Angola, 1971/72), foi depois cap mil, CCAV 8352 (Caboxanque, região de Tombali, sul da Guiné, 1972/74).

Vd. aqui foto dos seus Natais de 1971 (em Angola, Zemaba), 1972 e 1973 (Guiné, Caboxanque e Cadique, respetivamente)

25 DE DEZEMBRO DE 2014
Guiné 63/74 - P14080: O meu Natal no mato (42): 1971, em Zemba (Angola); 1972, em Caboxanque; 1973, em Cadique (Rui Pedro Silva, ex- cap mil, CCAV 8352, Cantanhez, 1972/74)

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Fernando, a propósito do lema da tua companhia, a CCAÇ 3535, "A cada um a sua morte", quer aqui recordar que não é caso único... São formulações literárias de mau gosto ou "infelizes"... Na Guiné, tens por exemplo o caso do Pel Caç Nat 52, os "Gaviões", cujo lema era "Matar ou Morrer"...

Mas. na paranóia da guerra, tudo é possível... Pergunto: alguém supervisonava, na metrópole, estas estas coisas, crachás, guiões, lemas... ? Talvez o Zé Martins, que sabe tudo da tropa, me possa responder no seu "consultório militar"...

Bom resto de tarde. Luís

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Aop fim destes anos todos (mais de quinze!), a blogar, com "seriedade", sem "má mafé", sem "picardias"... , não é necessário lembrar um das nossas regras editoriais básicas:

(...) "As opiniões aqui expressas, sob a forma de postes ou de comentários, são da única e exclusiva responsabilidade dos seus autores, não podendo vincular o fundador, proprietário e editor do blogue, Luís Graça, bem como a sua equipa de co-editores e demais colaboradores permanentes." (...)

É legítimo perguntar-se entretanto como é que um batalhão, mobilizado pelo RI 16 (Évora), e que parte para a Angola, em maio de 1971, tem pelo menos dois "capitães graduados" ?!... Será que a Máfrica já não dava vazão à formação de capitães, QP e milicianos ?... O que se terá passado com estas companhias do BCAÇ 3840 (Angola 1971/72) ?

Anónimo disse...

BCaç 3840 RI 16 1971/05/15 1973/05/16 Zemba, Fazenda Tentativa TCor Inf António Fernandes da Graça,
TCor Inf João Maria Antunes
CCaç 3346, 3347 e 3348

CCaç 3346 RI 16 1971/05/15 1973/05/19 Zemba, Fazenda Tábi Cap Mil António M. F. Carvalho BCaç 3840


CCaç 3347 RI 16 1971/05/15 1973/05/16 Mucondo, Mabubas Cap Grad Manuel Câmara Rodrigues BCaç 3840


CCaç 3348 RI 16 1971/05/15 1973/05/18 Cambamba, Fazenda Tentativa Cap Grad Manuel Ambrósio de Morais Freitas BCaç 3840

"Num desses passeios fui até à barragem das Mabubas. Para meu espanto, encontrei aquartelada nas Mabubas, junto à barragem, a companhia dos "Assassinos do Mucondo"!"

A companhia é então a CCaç3347...

Morais Silva

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Há 12 anos atrás escrevi o seguinte neste blogue, a propósito de um "grafito", uma inscrição num mural, com várias "leituras"... Eu inclinava-me para a fanfarronada, a bravata, o exorcismo, próprios dos "ritos de passagem" que são as praxes (académicas, militares, institucionais, grupais)... O "grafito provavelmente era usado nas praxes de receção aos checas, em Moçambique, e rezava assim "Em Mueda, os cordeiros que chegam, são lobos que saem"... É uma variante do clássico provérbio "O homem é o lobo do homem", popularizado pelo filósofo inglês Thomas Hobbes, do séc. XVII.

Comentei eu:

(...) "É um pensamento que é válido para todas as situações de guerra. Os jovens, quase imberbes, os meninos de sua mãe (como escreveu o grande Pessoa), que chegam à frente de batalha, ainda são cordeiros, inocentes, virgens, imaculados... O horror, a violência da guerra, o matadouro, irão transformá-los em lobos, em duros, em violentos, em conspurcados... Não necessariamente predadores, assassinos, criminosos... (que é o estereótipo que o ser humano ainda guarda do pobre do lobo mau... do Capuchinho Vermelho!).

Mas há, seguramente, uma perda de inocência: nenhum de nós foi para a Guiné e veio de lá impunemente, igual... Os nossos amigos e familiares deram conta disso: já não éramos os mesmos, nunca mais fomos os mesmos...

Acho que é isto que o inspirado autor do mural quis dizer. É claro que há também aqui a dose habitual de bravata e de fanfarronice: é uma frase para intimidar os checas, os piras, os maçaricos, os novatos...

Também os militares, profissão de risco, têm a sua ideologia defensiva, as suas crenças, os seus talismãs, os seus mesinhos (usavam-nos os guerrilheiros na Guiné, em Angola, em Moçambique, não obstante a sua formação racionalista, marxista-leninista, dita revolucionária)... A bravata e a fanfarronice, além das praxes e do álcool, ajudavam-nos, a todos nós, a lidar com o medo, as situações-limite, a morte, o sofrimento, físico e moral, a impotência, o desespero"...

Fernando: sem pôr a causa a tua versão do alegado "fuzilamento dos 21 prisioneiros", no Zemba 'Turra', de que te falaram os "alferes" da CCAÇ 3346, à vossa chegada... Vamos imaginar que vocês, "maçaricos", cairam numa patranha da praxe, sem darem conta, já que vinham muito "open-minded" em relação ao tema dos "crimes de guerra"... É bom recordar que estamos em 1972 e não em 1961.. Um "massacre" com esta dimensão não poderia ficar no "segredo dos deuses" (neste caso, dos 4 alferes da CCAÇ 3346)...

Em 1972 tinhas os "holofotes" da imprensa internacional e das Nações Unidas, em cima de ti, em cima de nós, isto é, em cima da Guiné (a invasão de Conacri tinha sido em 22 de novembro de 1970...), de Angola e de Moçambique (e ainda estava por acontecer Wiriamu, em 22 de dezembro de 1972)...

No blogue, que é público, estamos sujeitos ao contraditório... E temos que admitir que essas "notícias" poderiam bem ser o que chamaríamos, hoje, "fake news"... Neste caso, uma brincadeira de mau gosto, de péssimo gosto, para pôr os "maçaricos" borrados de medo... Mas, como aconselha a sabedoria popular, nunca se deve brincar com o fogo e outras coisas sérias, como por exemplo, a vida de seres humanos...

Na Guiné, nas praxes, gostávamos mais de "simular ataques"...aos aquartelamentos e destavamentos: Mas a função é a mesma: exorcisar os fantasmas da guerra, espantar os medos de cada um, reforçar o espírito de corpo, aumentar a produção de adrenalina... O recado era evidente_: Rapazes, acabou a tropa (o recreio), começou a guerra (o trabalho)...

Boa noite, um abraço. Luís


7 DE JULHO DE 2007
Guiné 63/74 - P1933: Questões politicamente (in)correctas (30): os cordeiros e os lobos de Mueda ou a adrenalina da guerra (Luís Graça)

antonio graça de abreu disse...

Tenentes coronéis que exigiam a morte das tropas que comandavam, o ódio aos militares do Quadro Permanente, massacres ignóbeis, assassinos cruéis, criminosos de guerra, epidemias de cólera,às escondidas da população, um militar à noite a cagar no capim sobre o qual foram disparadas centenas ou milhares de balas, e nenhuma lhe acertou,(só em Angola é que as Nossas Tropas eram tão incompetentes!) enfim, a escrita surreal, delirante, pantagruelicamente falsa deste alferes Fernando Ribeiro que em Luanda bem precisou de tratamento psiquiátrico.
Coisas sérias deste blogue com o qual estou sempre a aprender.
Abraço,

António Graça de Abreu

Fernando Ribeiro disse...

Luís Graça, quando os alferes (sem aspas) nos falaram sobre o massacre (sem aspas) ocorrido em Zemba, as praxes já tinham acabado (naquele dia). Nós chegámos a Zemba de noite, fomos recebidos com as mais diversas palhaçadas, partidas e brincadeiras pelo pessoal da CCAÇ 3346, jantámos tarde e a más horas (mas sempre com praxes e brincadeiras à mistura) e foi só depois de a situação ter acalmado, que os alferes (sem aspas) da CCAÇ 3346 nos fizeram a revelação do massacre (sem aspas).

Dizes tu que os "holofotes" da imprensa internacional estavam em cima de nós... Em Zemba?!!! Não fazes ideia do que era Zemba.

Zemba era um lugar inexistente para qualquer tipo de imprensa, um lugar onde Judas perdeu as botas. Era o fim da picada, no sentido mais literal do termo. Quando a picada acabava e não havia mais picada, estávamos em Zemba. Zemba era o fim. Não tinha comerciantes, nem fazendas, nem missões, nem aldeias (a não ser no próprio Zemba, com uma mísera centena de habitantes), nem nada de nada. Só tinha serras e densíssimas florestas equatoriais, onde se escondia a população local em acampamentos controlados pela UPA/FNLA. O que quer que se passasse em Zemba, não interessava a ninguém, porque ninguém sabia sequer que Zemba existia. Toda a gente sabia da existência de Nambuangongo, Mucondo, Santa Eulália, Onzo, Zala, Quipedro, Quitexe, Mucaba e algumas localidades mais... mas agora Zemba?!!!

Zemba foi a última localidade a ser ocupada pela tropa portuguesa em toda a guerra do norte de Angola, já decorria o ano de 1962. O primeiro batalhão que lá entrou não encontrou qualquer oposição ou qualquer obstáculo à sua progressão, que se fez a partir de Cambamba. Zemba foi tomada sem combates e sem resistência de qualquer espécie. Tanto assim foi, que Zemba foi escolhida para vir a ser um centro de instrução de uma nova forma de tropa contra-insurrecional: os Comandos, embora ainda não se chamassem assim. Zemba tinha florestas virgens, tinha serras, enfim, tinha aquilo que parecia ser o lugar ideal para se tornar num centro de instrução antiguerrilha, e parecia não ter guerrilheiros (em 1962, repito). Mas os guerrilheiros (da UPA, neste caso) cedo se manifestaram em Zemba e o centro de instrução de Comandos teve de ser transferido para a Quibala Norte, primeiro, e para os arredores de Luanda, depois. E nunca mais ninguém falou em Zemba, onde os batalhões se sucediam uns aos outros sem que ninguém se interessasse por aquilo. Zemba era o nada.

Então fazemos assim: a publicação dos meus textos termina aqui. Estou farto. Estou cansadíssimo de polémicas e discussões (como esta), que me fazem perder um tempo preciosíssimo. Sempre que publicas mais um capítulo meu aqui no blog, sou assediado pela mais diversas reações, desde as mais civilizadas até às mais agressivas e insultuosas, como a do "guerreiro" do ar condicionado António Graça de Abreu, que não sabe do que fala, mas acha que é catedrático. Tenho mais que fazer. Não tenho tempo para estas brincadeiras. Não tenho mesmo. Ainda por cima, este blog é sobre a Guiné e não sobre Angola.

Acabou.


Fernando de Sousa Ribeiro, ex-alferes miliciano da CCAÇ 3535, BCAÇ 3880, Angola 1972-74

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Camaradas: usar a ida a uma "consulta psiquiátrica" como "arma de arremesso" contra outro camarada, na caixa de comentários (que é livre e pública), é "feio"... Psiquiatria e "sanidade mental" são coisas distintas... Pessoalmente sou muito sensível à discriminição com base do estigma "psiquiátrico"... Ajudei, também, como sociólogo da saúdem a formar alguns dos nossos melhores especialistas em psiquiatria da região de Lisboa, hoje na casa dos 50, tenho amigos psiquiatras, tenho dois filhos "psis"... e costumo dizer: "Qualquer um de nós pode, um dia destes, ter um surto psicótico e ir parar, dois meses no mínimo, ao departamento de psiquiatria de um hospital do SNS"...

Por favor, não usemos o "assassínio de carácter" neste nosso blogue, que é "único" e corre o risco de, por estas e por outras, de entrar no "buraco negro" da espiral dos insultos e desaparecer de vez...

Em 15 anos de blogue, temos-nos portado bem, com uma picardia ou outra, com algumas polémicas mais ou menos acesas, mas sem utilizar os golpes baixos... Ninguém, entre nós, está mandatado para "defender a honra e a glória do convento"... A verdade, sim, essa é que temos de respeitar, acima de todas as coisas...

Temos regras editoriais a respeitar... Só espero que ninguém insulte ninguém nem responda a insultos... Por favor, poupem-me, a mim e aos restantes pobres editores!... Não entrem nos insultos e na espiral de insultos!... Exerçam o vosso direito à livre crítica, mas com elevação moral e intelectual...

Mantenhas, Luís Graça

Anónimo disse...

“Acabou”
Depois de análise do tempo de Cadete em Mafra,difícil de ser reconhecida por quem também por lá passou,surgem generalizações demasiado fáceis quanto a um muito “subjectivado” tipo de militares profissionais e,fomos deslizando para algumas descrições da guerra (daquela época !) em Angola quase em sintonia com as divagações de Lobo Antunes no livro em que aparentemente confunde ações de guerra no leste angolano,(mais uma vez...daquela época),com um posterior dia a dia nas matas da Guiné.
As mitomanias de um escritor de renome mundial não se devem confundir com as...nossas.

Mas,acabou.
E,a bem da verdade,não creio que existia ar condicionado na secretaria do comando do Batalhão em que o Sr.Alferes Graça de Abreu batalhou na Guiné.

Grande e sincero abraço ,desde a Laponia Sueca ,do J.Belo.
(Literalmente rodeado de renas ...amigas)

antonio graça de abreu disse...

O insulto gratuito a oficiais do QP não partiu de mim. O tratamento psiquiátrico de que o alferes Fernando Ribeiro necessitou provém da informação que o próprio deu nos seus textos. Quanto à minha guerra no "ar condidicionado" não mando o Fernando para um sítio feio porque não devo. Estive num Comando de Operações como oficial da pequena logística, na Guiné,1972/74, Teixeira Pinto, Mansoa e Cufar (onze meses finais nestes buraco no sul da Guiné). Tenho imenso respeito por todos os camaradas que passaram e sofreram e morrerram nessa guerra. Recomendo ao alferes Ribeiro a leitura do meu livro Diário da Guiné, 1972/72.
Abraço,
António Graça de Abreu

Antº Rosinha disse...

A principal diferença da guerra da Guiné para a guerra de Angola, é que na Guiné havia pouco tempo, e em Angola sobrava tempo.

E o difícil era saber como «matar o tempo».

Por exemplo, um modo bom de matar o tempo era escrever, como fazia Lobo Antunes, e quem tinha muitas madrinhas de guerra, escreviam bate-estradas.

A guerra de Angola era mais complicada porque havia muita gente em movimento e entrou numa rotina que para os dirigentes e muita gente do QP aquilo já se tinha tornado viciante.

Era uma droga que já não se passava sem ela.

Pior foi quem caíu nessa, como os retornados que ficámos a dormir na forma...e nos trombicámos.

António J. P. Costa disse...

Olá Camaradas

Segundo julgo saber o Pel Caç Nat 52, os "Gaviões", não chegou a ter como lema "Matar ou Morrer"... Foi uma proposta (talvez do Ziky Sayeg(?)) que o Beja Santos não aceitou. Qual ela a veio a ser não sei. Efectivamente na metrópole ninguém fiscalizava esta questão dos: crachás, guiões, lemas, nomes de guerra, etc.... A antecessora da DDHM (Direcção de Documentação e História Militar) não tinha capacidade de resposta par estas questões, por falta de pessoal e até de interesse. Assim, estes elementos identificativos da Unidades ficavam ao gosto e iniciativa do respectivo pessoal e aceitação ou não do respectivo comando. Muitas vezes as unidade chegavam ao TO sem terem nenhum daqueles elementos. Creio que as normas sobre heráldica militar foram emitidas em 1972.
Criou-se assim uma simbologia militar de carácter popular - por isso mais autêntica - que frequentemente violava as normas de heráldica. Era um procedimento que vinha de trás como se pode ver pelo brasão do ex-RC n.º 4. Às vezes as sub-unidades faziam os seus distintivos com base no das U/E/O mobilizadoras. Podem ver alguns exemplos na "Minha Guerra a Petróleo". Julgo que o Museu Militar tem um número muito considerável destes "emblemas" e há mesmo coleccionadores.

Um Ab.
António J. P. Costa
Bom resto de tarde. Luís

Anónimo disse...

Sem dúvida quanto à possível falta de pessoal qualificado para tais funções.
Mas quanto ao “até interesse “?

Quando as hierarquias de uma instituição fortemente enraizada em símbolos representativos perde o interesse por estes “detalhes” lá ecoa pelos corredores regimentais a frase/propaganda da ditadura:
-O Exército é o espelho da Nação.
E,os “bandos armados”,referidos com desdenhos vários por alguns respeitados profissionais,lá espreitavam entre as penumbras.

Um abraço do J.Belo

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Tó Zé:

Já em tempos, há coisa de dois anos, troquei uns emails com o nosso José Martins (com conhecimento ao Valdemar Queiroz), tão "rato de biblioteca" como tu, sobre a "bicharada" que inspirou muitos "nomes de guerra" das nossas unidades e subunidades...



02/06/2017, 15:17


Zé: recebeste este comentário (meu)... Deves ter uma lista muito mais completa com as "alcunhas" ou "nomes de guerras" das nossas subunidades"

(..:) "O Pechincha era mais artista mas tu tiveste a melhor ideia... No bestiário da Guiné, temos todos e mais alguns nomes da bicharada da arca de Noé, dos Tigres (de Cumbijã), aos Gaviões, dos Leões Negros (CCAÇ 13, se não erro) aos Gatos Pretos (CCAÇ 5)... O Lacrau também é criatura de Deus e é temido... Parabéns... LG" (...)

Não sei se alguém já teve a ideia de fazer um apanhado da bicharada... Lembro-me dos Répteis de Contuboel (CCAÇ 3547)... Jagudis, também havia (CCAÇ 3 ?)...

Vê se lembras de mais... Será que havia cães, ratos... ? Ninguém gosta de ratos...E símbolos de paz, como os pombos ? Não deveria haver...

CCAÇ 2796 - Gaviões de Gadamael...



02/06/2017, 15:35



Luís Graça
02/06/2017, 15:35


Ah!, e os Lassas (abelhas), da CCAÇ 747, do Mário Fitas... Cufar, 1965/67...

E as "Onças Negras de Bedanda", CCAÇ 6...

O Pel Caç Nat 52 é que era os "Gaviões" (Matar ou morrer!)...

A minha CCAÇ 12... não me lembro! Será que tinha ?...

Luís

Tabanca Grande Luís Graça disse...

Tó Zé: és um dos poucos de nós que tem mostrado interesse fazer um banco de dados so re crachás e guiões das unidades/subunidades que passaram pelo TO da Guiné entre 1961 e 1974... e que foram à volta de um milhar...

Encontrei este teu poste e reproduzo um excerto com a tua ideia e o teu apelo (que, de facto, até agora não teve seguimento). Fiquei a saber, por ti, que havia uma "Comissão de Heráldica", a qual terá sido completamente ultrapassada pela "avalanche" de acontecimentos... Afinal, e como diz o provérbio, "em tempo de guerra não se limpam armas"...

27 DE DEZEMBRO DE 2010
Guiné 63/74 - P7513: Os nossos seres, saberes e lazeres (28): Banco de Crachás e Guiões (António Costa)


(...) Creio que temos estado a perder uma coisa importantíssima para a memória "futura" (...) e que são os emblemas de peito (crachás) e de braço que usávamos e que hoje poderão constituir algo que se possa juntar aos números das Unidades como algo indelével e que orgulha os seus possuidores.

Temos também os guiões que, nem sempre, são iguais aos emblemas. Julgo que por si só já são um bocado da História e muito faladores, como acontece aos brasões, que são "falantes".

Poder-se-ia criar no blogue um "Banco de Crachás e Guiões" onde seriam inseridos os que se encontrassem, acompanhados de uma resenha acerca da sua feitura: quem deu a ideia, quem desenhou, como foi aprovado, o quem significa, formato, etc. etc. etc.

Sabendo-se quais e quantas as Unidades que passaram pela Guiné, rapidamente atingiríamos o pleno e poderíamos expô-los à consideração dos curiosos e outros frequentadores. Nenhum deles foi aprovado pela Comissão de Heráldica, mas isso também não interessa. São distintivos populares (aos gosto dos "soldados"), como os dos clubes desportivos, de que se aprende a gostar.

Se calhar era um bom início para uma "História das Unidades" (...)

António J. P. Costa disse...

olá Camaradas
Lembro-me de uns que tinham como lema "Deixós poisar"!
Mas havia mais: Os Metralhas (de Jumbemebem), Os Diplomatas de Empada, a CCaç 12 (Mansoa) que tinha um emblema de peito enorme (uma estrela de 8 pontas) e um lema curioso: Ták Tchife (agarra à mão).
Estamos perante uma heráldica popular com as regras mais variadas e ao gosto do utente e os Gringos e os Piratas de Guileje...
Sei lá quantos...
Um Ab.
António J. P. Costa

Hélder Valério disse...

Um breve comentário, no âmbito das auto-designações das Companhias, para referir que um camarada do pelotão de instrução do 1º Ciclo do CSM em Santarém, chamado A. Figueiredo me enviou um aerograma de Moçambique dizendo que tinham (não sei exactamente quem) colocado a sigla à sua Companhia de "C.Andando".
Dado o pouco empenhamento na briosa defesa de integridade territorial da Pátria, deduzi (pouco patrioticamente, aceito) que deveria ser "cagando e andando" mas esclareceram-me que para o Comando foi explicado tratar-se duma manifestação da vontade de seguir "combatendo e andando".
Coisas!

Hélder Sousa

Anónimo disse...

Bom,já que estamos numa de nomes históricos da nossa História Militar nas Áfricas....

Os "Quilhöes Negros".
Nome do 2 Pelotäo da C.C.2381 no Destacamento de Mampatá, cruzamento da estrada Buba-Aldeia Formosa-Gandembel.
Colocado na passadeira do ombro esquerdo do camuflado.
Numa das suas inesperadas visitas ao Destacamento, o General Spínola observando o bem visível emblema amarelo comentou (entre dentes) enquanto olhava em redor para os soldados milícias da Tabanca :
-Os vossos ou os deles?

E...o tempo passa.

J.Belo

Valdemar Silva disse...

Já expliquei a razão d'OS LACRAUS' da minha CART.11, sendo o lema e o desenho do crachá da minha autoria (vê-se a falta de jeito pró desenho)e não me lembro do procedimento ou pedido de aprovação ao nosso Capitão. Sei que vim de férias e os crachás foram feitos no Freire Gravador, em Lisboa, paguei a encomenda 100? unidades, depois de regresso a Nova Lamego recebi o dinheiro na Secretaria da Companhia que ficou com os crachás para serem vendidos ou oferecidos não me lembro. Mas, quando chegamos sendo a CART.2479 'POUCOS QUANTOS FORTES' o respectivo crachá tinha sido feito (Penafiel ou Espinho?) oficialmente pelo BART.2866 do qual fizemos parte.
Quando chegamos a Bissau em Fev/1969 havia uma rapaziada com uns crachás que davam nas vistas: uns com um crachá '... Madina do Boé' , isto é malta de Madina do Boé dizíamos nós, outros '....Os Mata Turras' ou '.... Os Mata Pretos', não tenho a certeza absoluta, que nos deixavam admirados. De ambos os casos não sei dizer a que Companhias pertenciam.
Como o Luís refere, se o desenho do ex-fur.mil. Victor Pechincha tivesse sido o preferido a CART.11 teria sido a 'POP CART' e não me lembro qual teria sido o desenho.

Valdemar Queiroz

Anónimo disse...

NÃO HOUVE QUALQUER MASSACRE. NÃO HOUVE NENHUM ALFERES ASSASSINO PUNIDO E TRANSFERIDO DO BATALHÃO POR TAL MOTIVO.
Tenho comigo declarações de pessoal do Batalhão e, mais, de um graduado da Secção de Informações do mesmo que repudia a “estória” que aqui veio ler, a meu pedido, acrescentando aquilo que todos os combatentes conhecem: na recepção aos periquitos, maçaricos e checas sempre houve uns brincalhões que contavam “estórias” de estarrecer sem outro intuito que não fosse “acagaçar” os recém-chegados.
Por aqui me fico
Morais Silva

MANUEL CONCEIÇÃO COSTA disse...

MANUEL CONCEIÇÃO COSTA disse...

Li e reli o artigo do Fernando Ribeiro sobre os "assassinos do Mucondo, que defino como abominável. O próprio faz confusão, entre Zemba, Mucondo a C.Cac. 3346 e 3347. Em Zemba esteve a 3346 e no Mucondo a 3347. Fui o furriel de Informação do Batalhão e mantenho comigo a História da Unidade, e fiz um levantamento de todas as operações da 3347 (Mucondo) onde relatam mortos do IN e em nenhuma circunstancia se aproxima dos numeros apontados. Estavamos em guerra e o objectivo era "mato ou morro" tivemos 2 mortos em combate, mais cerca de duas dezenas de feridos.
O autor tem que se retratar já que no Batalhão de Caçadores 3840 não houve assassinos. Na 3347 não houve nenhum alferes punido.
Manuel Costa
(antigo Combatente do Ultramar)

joaquim disse...

Boa tarde
Não me pronuncio sobre o conteúdo do post que já não tenho pachorra para isso.
Quanto ao meu querido Pel Caç Nat 52 passados uns meses de lá estar perguntei se tinham um emblema e apresentaram-me um que tinha realmente esse "lema" - "Matar ou morrer".
Não gostei mas percebi que era melhor não mudar a coisa e assim, e para criar um espírito de corpo que o Pelotão estava a precisar mandei fazer a expensas minhas uns quantos crachás que distribuí pelos militares que ficaram muito agradados com tal.
A Tabanca Grande há-de ter no seu acervo enviado por mim uma fotografia desse crachá, bem como da C. Caç. 15 cujo lema era "Taque Tchife" que em Balanta significa "Agarra à mão" e da Cart 3492.
Tinha também um estandarte pequeno da C Caç 12 mas não faço ideia onde pára.
Já agora o lema "Deixós poisar" era salvo o erro de uma companhia de Fajonquito comandada pelo Capitão Patrocínio, que depois foi para C Caç 15 onde foi punido se não me engano e eu fui substituir pois quando cheguei era o Alferes mais antigo.

Abraços para todos
Joaquim Mexia Alves

Fernando Ribeiro disse...

Eu tinha jurado que não mais responderia e já estou a quebrar o juramento. Mas em vista da intervenção do camarada Manuel Conceição Costa, e estando em causa a minha integridade mental(!), sinto-me na obrigação de responder.

Em parte nenhuma do meu texto eu faço referência explícita à C.Caç. 3347. Podem procurar à vontade, que não encontram. A única companhia que nomeio é a C.Caç. 3346, que foi a que a minha companhia rendeu em Zemba. Por isso, não me podem acusar de confundir uma companhia com a outra, porque só nomeio uma: a C.Caç. 3346.

Diz o camarada Manuel Conceição Costa que «na 3347 não houve nenhum alferes punido.» Pois não. E eu não disse o contrário. O que eu disse foi que o alferes punido era da 3346. Acabei agora mesmo de visitar a página do Batalhão de Caçadores 3840 na internet e verifiquei que houve, não um, mas DOIS alferes da CCaç. 3346 que foram punidos. Passo a transcrever o que consta na referida página sobre este assunto e que terá sido reproduzido da História da Unidade:

BAIXAS SOFRIDAS, PUNIÇÕES, LOUVORES E CONDECORAÇÕES

A – PERÍODO DE 24MAI71 A 31JUL71

(...)

2- PUNIÇÕES

- Alferes Miliciano nº (tantos) – (fulano de tal), da C.Caç. 3346, repreensão agravada, pelo Comandante do B.Caç. 3840, em 18JUN71

- Alferes Miliciano nº (o mesmo) – (o mesmo), da C.Caç. 3346, 5 dias de prisão disciplinar, pelo B.Caç. 3840, em 6JUL71

(...)

F – PERÍODO DE 01 A 31DEZ71

(...)

2 . PUNIÇÕES

- Alferes Miliciano Atirador nº (outro) – (sicrano de tal), da C.Caç.3346 8 dias de prisão disciplinar pelo Comandante do COM/AM1, em 6DEZT71

(...)


Temos, portanto, que um dos alferes foi punido duas vezes pelo comandante do seu batalhão, enquanto o outro foi punido pelo comandante da AM1 (Área Militar N.º 1, anterior Setor Dembos, sediada em Santa Eulália), com uma pena mais pesada.

Eu compreendo a atitude do camarada Manuel Conceição Costa, de sair em defesa da honra do seu batalhão. Eu no seu lugar faria o mesmo. Tenho mesmo que agradecer ao camarada Manuel Conceição Costa o facto de ter publicado na internet a História da Unidade do seu batalhão (pelo menos em parte), o que me possibilitou comprovar agora que os alferes da CCaç. 3346 não nos mentiram naquela noite da nossa chegada para os render. Pelo menos, não nos mentiram completamente. É verdade que o facto de ter havido dois alferes punidos não prova que qualquer deles tenha ordenado a execução sumária de prisioneiros. De maneira nenhuma. Só prova que algo de punível eles cometeram. Seja como for, uma coisa posso garantir: não inventei, nem delirei.


Fernando de Sousa Ribeiro, ex-alferes miliciano da C.Caç. 3535, do B.Caç. 3880, Angola 1972-74

Anónimo disse...

Manuel Costa ex-Furriel da Sec Info do BCaç 3480 diz-nos:

"Li e reli o artigo do Fernando Ribeiro sobre os "assassinos do Mucondo, que defino como abominável. "

"O autor tem que se retratar já que no Batalhão de Caçadores 3840 não houve assassinos."

Não chega para Sousa Ribeiro parar e pensar?! Que interessa o nº da companhia ou o nº de Alferes punidos? NADA.

O que nos interessa é ficarmos a saber que o MASSACRE descrito não existou e a Sousa Ribeiro só resta, mais uma vez, pedir desculpa e lamentar-se pela falta de senso ao publicar uma enormidade que afecta centenas de camaradas combatentes sem ter o cuidado prévio de consultar várias fontes para garantir a veracidade do seu relato.
Não o fez e provocou uma "tempestade". "Não inventou nem delirou" mas.... ERROU.

Morais Silva

MANUEL CONCEIÇÃO COSTA disse...

O Camarada Fernando Ribeiro não citou a companhia 3347, mas sempre afirmou que foram os "Assassinos do Mucondo", e a companhia das Mabubas, que foi sempre a 3347. Os alferes de Zemba que foram punidos, foram por motivos que se passaram no quartel (os dois pelo mesmo motivo) e nada que se passasse na mata.
Depois há a história de apanhar o soldado de calças na mão. Quero dizer-lhe que a companhia que estava na barragem tinha como missão fazer a protecção da barragem. A segurança fazia por ronda à volta da rede que cercava todo o perínetro. A sede da companhia situava-se no aldeamento contiguo, onde viviam os tecnicos da barragem e as famílias, bem como as familias e dois ou três comerciantes, em casas que tinham quintais onde cultivavam alguns legumes e criavam galinhas e coelhos, que ocasionalmente eram surripiados para tainadas dos "tropas". Hora o camarada que foi ao capim, tendo de andar bastantes centenas de metros, mais perto ficaria para satisfazer as suas necessidades. Mais uma vez o sr alferes foi levado na letra de um "velhinho"!

Valdemar Silva disse...

Não percebo a razão do Manuel Conceição Costa se assinar como 'antigo Combatente do Ultramar'.
Ó Manuel da Costa, todos nós fomos antigos combatentes no ultramar, não precisamos de óbvios e desnecessários cognomes.
No nosso país, infelizmente, quase todos os homens que nasceram entre 1940 e 1953 estiveram na guerra na Guiné, Angola e Moçambique por isso foram todos combatentes.
Julgo que a 'assinatura' não será uma gabarolice dos tiveram que dar tiros e, por isso, são os únicos combatentes, ou seja aqueles que fazem parte de uma luta entre adversários armados ou entre exércitos.

Valdemar Queiroz

MANUEL CONCEIÇÃO COSTA disse...

Meu Caro Valdemar Queiroz,
Eu fui acusado de pertencer a um Batalhão de assassinos e pretendo esclarecer que, só, que fui um dos antigos combatentes e estes não eram assassinos. Cumpriam o dever que juraram à sua Bandeira e defenderam a Pátria.

Valdemar Silva disse...

Mau caro Manuel Costa.
Que eu saiba, nenhum de nós foi mercenário, embora tivesse havido umas milícias do Jardim que não sabiam pra que Pátria estavam a combater.

Abraço e saúde da boa
Valdemar Queiroz