quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Guiné 61/74 - P21473: Agenda cultural (759): Apresentação do livro “Nunca digas adeus às armas (Os primeiros anos da Guerra da Guiné)”, por António dos Santos Alberto Andrade e Mário Beja Santos, Edições Húmus, dia 26 de Novembro de 2020, pelas 18h00, no Salão Nobre do Palácio da Independência, Largo de S. Domingos, Lisboa (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Outubro de 2020:

Queridos amigos, 

As Edições Húmus acabam de publicar "Nunca Digas Adeus às Armas (Os Primeiros Anos da Guerra da Guiné)" de que são autores António dos Santos Alberto Andrade e eu próprio. 

Anexa-se capa da obra e dois textos provavelmente elucidativos da substância do trabalho. Os autores tudo farão para que haja apresentação pública, mas estamos naturalmente atentos à aspereza deste ciclo da pandemia que recomenda as maiores cautelas em participações como seja a apresentação de um livro, haverá que cuidar da segurança de todos. 

Peço-vos a amabilidade de ajudarem os autores na divulgação da obra, tudo começa com um poema popular, a história em verso do Batalhão de Cavalaria n.º 490 de que um dos co-autores foi militar, o outro co-autor descobriu o poema e pôs muita gente na sala de conversa, deliciado, e procurou desvelar as estratégias militares utilizadas pelos Altos Comandos durante este frenético período de ofensiva da guerrilha. 

Tivemos a grata anuência do Sr. General Alípio Tomé Pinto para fazer apresentação da obra, vamos ver o que nos reserva a pandemia. 

Falta analisar em profundidade o período de 1966 a 1968, que se saiba não há trabalhos universitários neste domínio, restam os importantes documentos das campanhas de África da responsabilidade do Estado-Maior do Exército, que se revelam a única documentação rigorosa do lado português. Mas como tem sido insistentemente dito, o aclaramento da verdade sobre os acontecimentos iniciados em 1961 (e mesmo um pouco antes) carecem da consulta minuciosa dos arquivos dos ministérios da Defesa e do Ultramar, empreitada a que, tanto quanto se sabe, ninguém se afoitou.

Um abraço do
Mário

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Texto da badana da contracapa:

Um acaso feliz, ter chegado à "Missão Cumprida"[1]

Vasculhar em lugares de venda de livros usados é uma operação que requer curiosidade, paciência e determinação: amar os papéis, sejam livros, revistas ou folhetos, a ponto tal que a paixão não tem limites nem faz férias; saber que há horas de sorte e sair dos estabelecimentos ou das vendas ao ar livre sem nenhum amargo de boca se acaso não se encontrou naquele dia e naquela hora nada do que se procurava; e não ceder descaradamente às grandes tentações de exceder as compras fora do que se procura, sob pena de uma dispersão exaustiva.

Naquele dia e naquela hora, nos baixos do Palácio da Independência, despertou-me a atenção um livrinho de poesia que nem referia a Guiné na capa, houve mesmo que folhear até se perceber que ao autor tinham sido oferecidas grandes aventuras, incluindo a famosa Operação Tridente, em 1964, quando as forças portuguesas procuraram desalojar a guerrilha do PAIGC na Ilha do Como. Houve desalojamento, sol de pouca dura, faz parte das regras do jogo em guerrilha que se bate e foge, e muitas vezes foge-se para de novo bater.

Lido e relido à exaustão o testemunho do bardo, singelo, um rico veio de poesia popular, deu-se uma tormenta que inspirou pôr toda esta poesia numa ampla sala de conversa, Santos Andrade, sem se ter havido nem achado foi posto em confronto com inúmera gente que fez recruta e especialidade, que sofreu emboscadas e flagelações, que padeceu pelos seus mortos e feridos. 

Creio, sem vaidade nem lisonja, que o deixei feliz no produto final desta tormenta; e que o leitor, entusiasmado por estas peripécias que ocorreram entre 1963 e 1965, os primeiros anos da guerra da Guiné, saboreará com tanta gente a perorar numa imensa sala de espelhos, ouvir-se-ão tiros e suspiros de saudade até ao resgate final, quando se perceber que a missão fora cumprida, ainda não se sabendo que haveria, até ao último dia das suas vidas, memória daquela camaradagem, lembrança de naquelas terras todos ali se terem feito homens.

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Texto da contracapa:

Guerra da Guiné: não é falsificação, é danoso esquecimento

A historiografia da guerra da Guiné é geralmente omissa (ou estranhamente parcimoniosa) na resposta dada pelas forças portuguesas, na eclosão da guerrilha, logo no início de 1963. Estão identificadas as etapas do levantamento do nacionalismo guineense, os seus atores principais e secundários, a organização do PAIGC na clandestinidade e a metódica preparação que Amílcar Cabral imprimiu aos jovens responsáveis que mandou preparar na China e noutras paragens. Metódica e eficaz, tão avassaladora que deixou estupefactos os comandos militares, tanto na Guiné como em Lisboa. 

Em escassos meses, o PAIGC instalou-se na região Sul, infiltrou-se nas matas densas do Oio/Morés, atravessou o Corubal, de ano para ano passou do armamento incipiente para mais temível, a usar minas anticarro, bazucas e morteiros, não lhe foi indiferente a artilharia antiaérea. 

Era uma guerrilha de gente motivada, que não recuou a intimidar e a aterrorizar os guineenses hesitantes. Em 1964, dera-se uma clara separação das águas, mesmo ao nível das etnias guineenses. A historiografia apresenta por vezes os dois primeiros oficiais-generais (Louro de Sousa e Arnaldo Schulz) como maus condutores da resposta, líderes impreparados para aquela experiência de guerra de guerrilhas face a um inimigo que somava mais vitórias que derrotas. Falamos numa historiografia que reduz a escassos parágrafos o modo como combatemos entre 1963 e 1968, insinua-se mesmo que só se cometeram asneiras.

Os documentos ao nosso dispor revelam que é tudo falso, ou quase. Sabe-se que a mitologia em torno do oficial-general “salvador”, chegado em 1968, assentou numa clara reprovação da condução da guerra até então. Ninguém fala nos meios que foram oferecidos a Louro de Sousa e Arnaldo Schulz que, está historicamente comprovado, informaram rigorosamente Lisboa de tudo quanto se estava a fazer, que pediam muito mais condições para contrariar a avalanche intimidadora da guerrilha. 

De algum modo, aqui se procura, a pretexto de uma genuína poesia popular para contar a história do Batalhão de Cavalaria N.º 490, evidenciar a natureza da resposta e não é difícil concluir que houve sagacidade e lucidez na aplicação dos meios existentes, modestos, postos naquele teatro de operações. Ocupou-se território, ajudou-se as populações, houve um esforço desenvolvimentista dentro de uma economia caótica, nunca se escondeu que de ano para ano a guerra era cada vez mais difícil, e que naqueles primeiros anos se vinha muito impreparado, era tudo um mundo desconhecido, hostil, sem instalações, combatendo com armas antigas.

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