Douglas C54 Skymaster, da Força Aérea dos EUA. Desenvolvido pela Douglas Aircraft Company, teve o seu primeiro voo em 1938, Produziram-se cerca de 1200 unidades entre 1942 e 1947. Deixou de estar operacional em 1975. [A nossa FAP recebeu 17 aviões, C-5r4 e EDC Skymaster entre 1947 e 1974, segundo informação de António Luís, um dos editores da página Pássaro de Ferro . Crónica da Aviação, onde também colaboração o nosso grã-tabanqueiro José Matos]
Foto: Cortesia de Wikipedia.
1. Há uns anos atrás éramos todos mais novos e tínhamos histórias para contar... Do tempo em que fizemos a guerra pensando em, com ela, ganhar a paz... na Guiné, entre 1961 e 1974...
Hoje estamos todos (ou quase todos) a lamber as feridas da guerra e da vida... O tempo é inexorável e não perdoa. O nosso blogue fez, em 23/4/2021, dezassete anos de vida... O que é muito, na Net, nas redes sociais... E é muito na vida de um homem, neste pobre planeta que queremos deixar saudável e seguro para os nossos netos e bisnetos...
A partir daqui, o nosso blogue está a prazo (, aliás, sempre esteve, como cada um de nós): um dia destes morre de ataque cardíaco, ou de AVC, ou de Civid-19, ou de Alzheimer ou de cancro no pâncreas... Ou passado a ferro na passagem de peões. Os blogues também morrem, tal como os que o fazem e os leem... É triste mas é verdade...
E tudo isto vem a propósito do nosso saudoso camarada Alcídio Marinho que foi para a cova sem contar (por escrito) tudo o que viu, viveu e sofreu na Guiné, como fur mil da CCAÇ 412 (Bafatá, 1963/65).
Em sua homenagem (e em louvor do nosso blogue, que está a comemorar em 2021 dezassete anos de vida), voltamos a reproduzir uma deliciosa história do Alcídio Marinho, publicada na série "O nosso querido mês de férias" (*)
2. O nosso querido mês de férias > Como ganhei o "Prémio Governador da Guiné" e tive direito a uma viagem, atribulada, no "Se-Cais-Morres" (Sky Master), da FAP, em 1964, até Lisboa, via aeroporto do Sal, Cabo Verde
por Abílio Marinho (1940-2021)
A minha vinda de férias à metrópole teve uma estória curiosa.
Até meio do ano 1964, creio que ninguém era autorizado a vir de férias à Metropole, quem queria gozar férias e tinha direito, ia para Bissau.
Ora, como o 3.º pelotão da CCAÇ 412 fora destacado para o Enxalé, de 28 de outubro de 1963 a 25 de janeiro de 1964, então comecei a montar armadilhas todos os dias, por carolice e necessidade, e, como não tinha curso, fui agraciado com um louvor pelo Comandante da Companhia, o Capitão Braga (de alcunha o "Lambreta", pois com os lábios fazia um barulho que se assemelhava a uma lambreta) [de seu nome completo, Manuel Joaquim Gonçalves Braga, cap inf].
Quando já estava em Cantacunda (de junho de 1964 a fevereiro de 1965), perto de Fajonquito, durante o mês de outubro, tivemos conhecimento que o sr. Brigadeiro Schulz [, um ano depois promovido a general,] , havia instituído um prémio, o "Prémio Governador da Guiné", para agraciar os combatentes que se notabilizasse na efectivação de baixas ao inimigo ou outros feitos em combate.
Qual foi o meu espanto, quando recebi a informação do sr. Capitão Braga que me havia sido atribuído o referido prémio e que podia ir gozar um mês de férias onde desejasse. Assim marquei a minha vinda a casa.
Como já não se passava na estrada, Bafatá - Banjara - Mansabá - Mansoa - Bissau, tive que ir para Bissau de barco. À época os barcos iam até ao Capé e Contuboel. Tomei o barco em Bafatá e rumei a Bissau, no dia 30 de outubro de 1964.
Aí comemos lagosta a todas as refeições, eles já enjoavam a lagosta. Éramos todos conhecidos pois como nós também pertenciam ao BC 10, Chaves, e os sargentos éramos todos do mesmo curso, o de 1961.
Passei essas Férias em Amarante, Chaves, Verin (Espanha), (onde tinha uma namorada espanhola) e Porto.
Até meio do ano 1964, creio que ninguém era autorizado a vir de férias à Metropole, quem queria gozar férias e tinha direito, ia para Bissau.
Ora, como o 3.º pelotão da CCAÇ 412 fora destacado para o Enxalé, de 28 de outubro de 1963 a 25 de janeiro de 1964, então comecei a montar armadilhas todos os dias, por carolice e necessidade, e, como não tinha curso, fui agraciado com um louvor pelo Comandante da Companhia, o Capitão Braga (de alcunha o "Lambreta", pois com os lábios fazia um barulho que se assemelhava a uma lambreta) [de seu nome completo, Manuel Joaquim Gonçalves Braga, cap inf].
Quando já estava em Cantacunda (de junho de 1964 a fevereiro de 1965), perto de Fajonquito, durante o mês de outubro, tivemos conhecimento que o sr. Brigadeiro Schulz [, um ano depois promovido a general,] , havia instituído um prémio, o "Prémio Governador da Guiné", para agraciar os combatentes que se notabilizasse na efectivação de baixas ao inimigo ou outros feitos em combate.
Qual foi o meu espanto, quando recebi a informação do sr. Capitão Braga que me havia sido atribuído o referido prémio e que podia ir gozar um mês de férias onde desejasse. Assim marquei a minha vinda a casa.
Como já não se passava na estrada, Bafatá - Banjara - Mansabá - Mansoa - Bissau, tive que ir para Bissau de barco. À época os barcos iam até ao Capé e Contuboel. Tomei o barco em Bafatá e rumei a Bissau, no dia 30 de outubro de 1964.
Embarquei em 31 de outubro de 1964, em Bissalanca, num avião da Força Aérea (Dakota-Skymaster ou "Se-Cais-Morres"), rumo ao Sal, Cabo Verde, com passagem pelo aeroporto militar dos Gambos, nas Canárias, mas quando chegámos a Lisboa, estava uma tempestade enormíssima, pois que todos os aeroportos da Península Ibérica estavam encerrados. Quando estava a amanhecer, olhamos pelas janelas e só víamos mar e depois depois uma ilha, era a ilha do Sal, outra vez.
No avião vinha, no meio, um motor de um F-86 (!) e um paraquedista, de maca, acompanhado de uma enfermeira, e outros militares.
Desembarcámos e fomos comer às instalações da CCaç 413 que havia ido connosco para
a Guiné, com destino a Mansoa, tendo a meio da comissão sido deslocada para a ilha do Sal, Cabo Verde.
No avião vinha, no meio, um motor de um F-86 (!) e um paraquedista, de maca, acompanhado de uma enfermeira, e outros militares.
Desembarcámos e fomos comer às instalações da CCaç 413 que havia ido connosco para
a Guiné, com destino a Mansoa, tendo a meio da comissão sido deslocada para a ilha do Sal, Cabo Verde.
Aí comemos lagosta a todas as refeições, eles já enjoavam a lagosta. Éramos todos conhecidos pois como nós também pertenciam ao BC 10, Chaves, e os sargentos éramos todos do mesmo curso, o de 1961.
O Aeroporto do Sal só tinha uma pista e no final da mesma havia a torre de controle.
Na tarde desse dia, tornamos a embarcar e, quando arrancámos para levantar, ouvimos um estrondo, provocado pela da rebentação de um pneu e só parámos a cerca de 5 ou 6 metros da torre.
Como não havia pneu suplente, ficámos três dias no Sal até chegar um pneu, no avião da TAP. No dia 3 de novembro de 1964, reembarcámos para Lisboa onde chegamos no dia 4.
Na tarde desse dia, tornamos a embarcar e, quando arrancámos para levantar, ouvimos um estrondo, provocado pela da rebentação de um pneu e só parámos a cerca de 5 ou 6 metros da torre.
Como não havia pneu suplente, ficámos três dias no Sal até chegar um pneu, no avião da TAP. No dia 3 de novembro de 1964, reembarcámos para Lisboa onde chegamos no dia 4.
Passei essas Férias em Amarante, Chaves, Verin (Espanha), (onde tinha uma namorada espanhola) e Porto.
Passados os trinta dias apresentei-me nos Adidos, em Lisboa, mas não havia alojamento, fui instalar-me numa Pensão na Rua Rodrigo da Fonseca, a aguardar passagem aérea para Bissau, o que veio a suceder só no dia 6 de dezembro de 1963.
Chegado a Bissau apanhei um barco civil, para Bafatá, seguindo de novo até Cantacunda.
Nas Canárias comprei um relógio por 500 escudos e uma máquina fotográfica Konica também por 500 escudos.
Do outro pessoal da CCAÇ 412, apenas um alferes veio de férias, no entanto, três alferes tiveram as esposas em Bafatá
Alcidio Marinho
Porto, 22 de setembro de 2015 às 13:18
Nas Canárias comprei um relógio por 500 escudos e uma máquina fotográfica Konica também por 500 escudos.
Do outro pessoal da CCAÇ 412, apenas um alferes veio de férias, no entanto, três alferes tiveram as esposas em Bafatá
Alcidio Marinho
Porto, 22 de setembro de 2015 às 13:18
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Notas do editor:
(*) Vd. poste de 28 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15168: O nosso querido mês de férias (8): Ganhei o "Prémio Governador da Guiné", embarquei em 31/10/1964 num Dakota Skymaster ("se cais, morres"), tive uma viagem atribulada... Do outro pessoal da CCAÇ 412 apenas um alferes veio de férias, no entanto, três alferes tiveram as esposas em Bafatá (Alcídio Marinho, ex-fur mil inf, CCAÇ 412, 1963/65)
Restantes postes da série:
7 de outubro de 2015 > Guiné 63/74 - P15211: O nosso querido mês de férias (17): Vim a casa uma vez, em agosto de 1965, na TAP, num Super Constellation, como simples passageiro... e estava longe de imaginar que cinco anos depois estaria aos comandos de um Caravelle, como piloto da mesma, saudosa, companhia... (João Sacôto, ex-alf mil, CCAÇ 617 / BCAÇ 619, Catió, Ilha do Como e Cachil, 1964/66)
6 de outubro de 2015 > Guiné 63/73 - P15209: O nosso querido mês de férias (16): Férias em Bissau para tirar a carta de condução de pesados (Abel Santos)
6 de Outubro de 2015 > Guiné 63/73 - P15205: O nosso querido mês de férias (15): em agosto de 1971, entre a praia da Nazaré e as tertúlias de Vila Franca de Xira... enquanto em Lisboa, tudo na mesma, isto é, a vida corria... (Hélder Sousa)
5 de outubro de 2015 > Guiné 63/73 - P15204: O nosso querido mês de férias (14): À procura de aconchego, e de amor temperado com algumas paródias, que um mês, naquele tempo, passava muito depressa (José Manuel Matos Dinis)
1 de outubro de 2015 > Guiné 63/73 - P15185: O nosso querido mês de férias (13): Os soldados não se podiam dar o luxo de ter férias (José Manuel Cancela, ex-sold ap metr, CCAÇ 2382, 1968/70) / Proporcionei a alguns soldados do meu grupo de combate umas modestas férias em Bolama (António Murta, ex-alf mil inf., 2.ª CCAÇ / BCAÇ 4513, 1973/74)
30 de setembro de 2015 > Guiné 63/73 - P15183: O nosso querido mês de férias (12): Era para entrar de Licença em Agosto, mas fui vítima de uma injustiça, acabando por a gozar de 22 de Setembro a 26 de Outubro (Mário Vitorino Gaspar)
30 de Setembro de 2015 > Guiné 63/73 - P15178: O nosso querido mês de férias (11): vim duas vezes... e na segunda casei-me (Hélder Sousa); vim duas vezes... e na segunda já não regressei (António Murta)
29 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15173: O nosso querido mês de férias (10): Eu fui um dos que nunca teve férias...Razão: por ser o "eterno comandante interino"... No máximo, passei oito dias em Bissau a tratar de assuntos oficiais... e a descansar não ficar de todo "apanhado do clima"! (Manuel Vaz, ex-alf mil, CCAÇ 798,Gadamael Porto, 1965/67)
29 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15173: O nosso querido mês de férias (10): Eu fui um dos que nunca teve férias...Razão: por ser o "eterno comandante interino"... No máximo, passei oito dias em Bissau a tratar de assuntos oficiais... e a descansar não ficar de todo "apanhado do clima"! (Manuel Vaz, ex-alf mil, CCAÇ 798,Gadamael Porto, 1965/67)
27 de setembro de 2015 >Guiné 63/74 - P15165: O nosso querido mês de férias (7): Entre 15 de Fevereiro e 21 de Março de 1971, a ilusão de estar longe da guerra (Carlos Vinhal)
27 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15164: O nosso querido mês de férias (6): Vim duas vezes a casa... Da primeira vez, regressei a 18/12/1968, para passar obrigatoriamente o Natal em Bambadinca... Apanhei uma boleia no DO 27 do meu amigo Honório (Ismael Augusto, ex-alf mil, CCS/BCAÇ 2852, 1968/70)
27 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15163: O nosso querido mês de férias (5): vim uma vez a casa, a Vila Nogueira de Azeitão, em 18/9/1965, mas o Super Constellation da TAP, por avaria, só partiu a 22... A viagem custou-me 6160$70 (António Bastos, ex-1º cabo, Pel Caç 953, Cacheu, Bissau, Farim, Canjambari e Jumbembem,
26 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15160: O nosso querido mês de férias (4): Vim duas vezes à metrópole: na 2ª vez, beneficiei de mais 5 dias de licença, por ter tido um louvor em combate... (E, mais tarde, beneficiei da isenção do pagamento de propinas dos meus filhos quando entraram na universidade) [José Augusto Miranda Ribeiro, ex-fur mil da CART 566 (Cabo Verde, Ilha do Sal, 1963/64, e Guiné, Olossato, 1964/65)]
26 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15159: O nosso querido mês de férias (3): 10 de março de 1970: eu a partir e o ministro do ultramar, Silva Cunha, a chegar, no mesmo Boeing 707, da TAP
22 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15143: O nosso querido mês de férias (2): os testemunhos de Henrique Cerqueira ("Em Bissau, dormia com o bilhete dentro da fronha do travesseiro"), José Carlos Gabriel ("A minha filha, de 5 meses, teve um choque muito grande ao ver-me no aeroporto, de bigode") e João Silva ("Foi ótimo vir no inverno, a saudade era do frio")
22 de setembro de 2015 > Guiné 63/74 - P15138: O nosso querido mês de férias (1): Maio de 1969: nessa altura o bilhete de ida e volta, na TAP, custava 4 mil escudos (Paulo Raposo, ex-alf mil Inf, MA, CCAÇ 2405 / BCAÇ 2852, Galomaro e Dulombi, 1968/70)
5 comentários:
Quando nos "encontrarmos", o Alcídio, (Abílio?), vai explicar à rapaziada como chegavam e onde paravam, em 1964, os barcos em Contuboel.
Sentidos pêsames
Valdemar Queiroz
Até Bafatá, ainda vá lá, a "serpente" do rio Geba ainda seria navegável, nos anos 50... Vinham barcos, de pequeno calado, carregados de mancarra para Bambadinca ou até Bissau, E há fotos, com barcos no porto fluvial de Bafatá... Mas Contuboel ? Não me parece, nunca vi, não me lembro... O rio ia estreitando... E as voltas eram tantas, no rio Geba Estreito, que dava para dormir muitas sestas... Mantenhas. Luis
Agoar, essa do "Se-Cais-Morres" (Skymaster), acho uma maravilha!... A riqueza linguística da rapaziada... Tenho que põr esta no nosso Pequeno Dicionário da Tabanca Grande...
Lendo estas narrativas ficamos a conhecer coisas impensáveis: A minha c. caç 557 rendeu a 412 em Bafatá com 11 meses em 1964 passados no "forte Apache" do Cachil na Ilha do Como Nós chegamos a Bissau a 03/11/1963 e em 1964 todos os que marcaram férias puderam vir a Portugal. Inclúsivel o capitão comandante da C.caç 557 As coisas tinham que mudar O Marinho já não faz parte dos vivos mas ainda bém que nos deixou estas narrativas como eram as leis no princípio da Guerra:Obrigado alcino Marinho.
Onde se lê Alcino deve-se ler Alcídio.
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