Capa do último livro de Manuel António Bernardo (1)
1. Texto do co-editor vb:
Teve lugar ontem, no Palácio da Independência em Lisboa, a apresentação oficial do livro Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros, Guiné 1970/1980, do Coronel Manuel António Bernardo.
Presentes na mesa, o Presidente da Associação de Comandos, Dr. Lobo do Amaral, o Dr. Nuno de Carvalho, representante da Editora Prefácio, o General Ricardo Durão e o Sargento Monteiro, do Exército Português, natural da Guiné. Na assistência, entre muitos outras figuras conhecidas, encontrava-se o Coronel Raul Folques, que foi Comandante do Batalhão de Comandos Africanos.
O Capitão Folques, até então 2º Comandante do Batalhão de Comandos, a receber das mãos de Spinola os galões de Major do Almeida Bruno. Uma cerimónia original. Foto do livro acima. Com a devida vénia aos Coroneis Bernardo e Raul Folques e ao General Almeida Bruno.
Abriu a sessão o Presidente da Associação de Comandos que aludiu ao simbolismo da sessão se efectuar no Palácio da Independência. O representante da Prefácio falou do trabalho que a Editora tem vindo a desenvolver na escrita da História Militar.
O General Ricardo Durão, em breves palavras, falou do seu conhecimento da Guiné, resultante de duas comissões militares. Destacou a importância do actual debate sobre a Guerra do Ultramar, porque, disse, a Guerra nos territórios ultramarinos faz parte da História de Portugal.
Abordou alguns aspectos relacionados sobre a acção que se desenvolveu em Teixeira Pinto, no chão Manjaco. Uma história ainda com sombras.
Começou por referir a velha questão de fundo entre os militantes do PAIGC. Que muitos guineenses militantes do PAIGC diziam serem eles os soldados e os cabo-verdianos os comandantes. E que esta controvérsia se manteve até ao golpe militar de Nino Vieira que destituiu Luís Cabral.
O "caso do chão Manjaco", como veio a ser conhecido, disse o General Ricardo Durão, começou por uma iniciativa pessoal do Major Pereira da Silva, o responsável da Acção Psicológica do CAOP, então comandado pelo Coronel Alcínio Ribeiro.
Diz o General que o CAOP, sob o ponto de vista militar, estava na ofensiva e a controlar com eficácia as acções armadas da guerrilha. Que vários guerrilheiros tinham sido aprisionados e que foi através deles que o Major Pereira da Silva deu início a esta história. Das conversas que com eles foi mantendo, o Major Pereira da Silva ficou com um importante conhecimento de como o PAIGC estava organizado na zona.
Daqui até ao primeiro contacto com um bi-grupo da guerrilha não passou muito tempo. Este episódio, segundo o General Durão, contou com a participação de um soldado que, a remos, o transportou para a outra margem do rio.
- Esperas aqui, o máximo 2 horas. Se eu não aparecer vai-te embora.
A estratégia passava por convencer os interlocutores que a guerra não tinha fim, ninguém iria ganhar ou perder, iria prolongar-se por anos e anos, com grandes sofrimentos para todos e, especialmente para o Povo Guineense. Viu alguma receptividade da parte dos interlocutores e decidiu prosseguir.
Ao longo de todo o "caso do chão Manjaco" efectuaram-se 13 ou 14 reuniões com os elementos do PAIGC. Com avanços e recuos, promessas foram adiantadas, como os guerrilheiros virem a ser integrados nas Forças Armadas e até um desfile conjunto em Bissau chegou a ser falado, com uma mal disfarçada satisfação dos guerrilheiros.
- Tudo bem, mas os senhores militares são majores e Lisboa, o que diz?
- Lisboa aceita o que for decidido entre todos - responderam.
E para reforçar o peso das negociações, o General Spínola apareceu numa dessas reuniões, para surpresa dos guerrilheiros, que o cumprimentaram militarmente, tratando-o por meu General.
Entretanto a guerra no chão Manjaco estava parada, uma espécie de tréguas estava tacitamente aceite por ambas as partes. As patrulhas, de um lado e do outro, eram feitas sem carácter ofensivo. E que esse aspecto mereceu algumas reflexões, não só das nossas chefias militares como da direcção do PAIGC.
Spínola reuniu em Bissau todos os Comandantes do Batalhão, expondo-lhes a situação e os progressos que estavam a ocorrer na zona de Teixeira Pinto. A paragem das hostilidades estava a facilitar o reagrupamento das famílias e prosseguiam, com mais entusiasmo ainda, os esforços para melhorar as infra-estruturas locais.
Spínola não parava. Deslocou-se a Cap Skiring para um encontro com Shengor. Nessa reunião foi ventilada a hipótese de Amílcar Cabral estar presente numa próxima reunião. Um mês depois de Cap Skiring, Amílcar Cabral foi assassinado. Os executores foram logo a correr ter com Sékou Touré, a dar conta do sucedido. Foram executados a seguir e o resto da história já é bem conhecida, remata este assunto o General Ricardo Durão.
Da parte do PAIGC, a questão que se estava a viver no chão Manjaco teve um seguimento diferente. Luís Cabral estava muito surpreendido com a evolução dos acontecimentos. Não havendo relato de actividades operacionais desencadeadas pela guerrilha, foi enviado para o local um Comissário Político do PAIGC, para se inteirar do que se estava a passar.
Na altura em que o Comissário Político do PAIGC se deslocou para a zona estava agendada a 13ª ou 14ª reunião entre os majores e os elementos da guerrilha. Na véspera desse encontro, Passos Ramos jantou em Bissau, em casa de Ricardo Durão. Entusiasmado, a certa altura manifestou a esperança de assistir brevemente em Bissau a um grande desfile com os guerrilheiros integrados.
O Comissário Político esteve presente nesse encontro, mas André Gomes, o Chefe da Região Militar não apareceu (será fuzilado, mais tarde, pelo PAIGC).
Foi nesse encontro que os majores, o alferes e os acompanhantes guineense foram assassinados.
- Porquê ?- pergunta Ricardo Durão. - Não seria um ronco muito maior se os tivessem aprisionado?
Perguntas que, quase 40 anos depois, continuam à espera de resposta.
__________
Nota de vb:
(1) Vd. post de, 28 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2308: Notas de leitura (3): Guerra, Paz e Fuzilamento dos Guerreiros: Guiné, de Manuel Amaro Bernardo (Jorge Santos)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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