1. Mensagem de José Manuel Matos Dinis* (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), com data de 24 de Maio de 2011:
Carlos,
Este comentário é capaz de ser grande para exigir duas remessas. Assim, se não te importas, envio-o para colocação no blogue.
Um grande abraço
JD
Mais uma vez, vem o Mário fazer a apresentação de um livro, desta feita "Porque Perdemos a Guerra", da autoria do Almirante Pereira Crespo. E como é costume, suscita comentários que, entre o espírito de contradição ou a colagem política, estão a criar-lhe uma confusa ideia de rejeição ou cansaço. Há alguns leitores que a advogam, mas não prescindem dessas leituras, quiçá, atrevo-me a referir, ainda colhem muita informação com as iniciativas do recensor.
Dos comentários em presença ressaltam três ideias principais: a de que não se extrai matéria condizente com o título; que o livro contém contradições, e não fomos derrotados na guerra colonial.
O Mário terá incidido a atenção, pelo menos por ora, nos tão proclamados ensejos do General Spínola para chegar a um acordo de paz na Guiné. Foi exaustiva a exploração dessa matéria aqui no blogue e, de um modo geral, chegou-se à conclusão de que a solução para a guerra seria política (mas sem a conclusão de que sem uma forte acção armada, não seria possível alcançar uma solução política vitoriosa).
Para dar aconchego ao título, o que implica um reconhecimento de derrota, o Autor também fez considerações pertinentes e, tratando-se de pessoa que desempenhou cargos de grande responsabilidade, fê-lo com a competência e dose de conhecimento privilegiado, que o projectaram ao respeito dos seus pares.
Assim, refere que nas três frentes de África, o inimigo evitava o contacto que o dizimasse, tendo em conta o baixo número e dispersão de guerrilheiros, e preferia acolher-se nos países vizinhos, de onde penetrava em territórios nacionais para acções de guerrilha, para onde regressava em seguida, dificultava a nossa acção de represália, e recomeçava a luta quando lhe fosse mais favorável. Os portugueses sempre ponderaram as circunstâncias, pois para o destruir, seria necessária a invasão dos países vizinhos. Acrescenta o Almirante:
"Se assim procedermos, a guerra subversiva que nos era movida poderia evoluir para uma guerra internacional de tipo convencional e, da circunstância, resultariam consequências militares e diplomáticas de quase impossível previsão.
Não tínhamos, portanto, solução militar para vencer a guerra.
O inimigo também não podia alcançar a vitória por meios militares, enquanto actuasse no âmbito da guerra subversiva".
E mais adiante:
"O inimigo também não podia vencer por meios diplomáticos".
E prossegue:
"...tínhamos que adoptar uma solução política, baseada na guerra de desgaste de longa duração, que levasse o inimigo, pela fadiga, pelas divisões internas e pela descrença na vitória, a afastar-se das potências que o apoiavam e a procurar, de novo, integrar-se nas estruturas portuguesas.
O nosso conceito estratégico pode assim definir-se:
a) Mostrar uma vontade firme de resistir e de vencer. O inimigo teria de acreditar que a luta em que estávamos empenhados era para nós vital e de que nunca desistiríamos por fadiga ou por traição;
b) Acelerar o desenvolvimento económico e social dos territórios ultramarinos, aumentando os portugueses de raça negra na administração dos negócios públicos. O inimigo teria de optar entre os sacrifícios de uma luta de guerrilha e a sua integração numa sociedade em pleno desenvolvimento, na qual poderia participar;
c) Receber, como irmãos e sem qualquer preconceito, aqueles que, tendo lutado contra nós, desistissem de tal luta"(Pg.53).
Noutro passo, o Autor refere em síntese citada por Eduardo F. Costa, se uma guerra, arrastando-se por largos anos, se transforma numa guerra de desgaste, só pode haver solução militar quando um dos adversários, "num dado momento e por qualquer razão, alcança a superioridade militar. Quando tal solução não se verifica, será derrotado aquele que primeiro desistir de lutar".
Ora, a superioridade militar não se reflecte pelo número de efectivos ou equipamentos, mas pelo uso que deles se possa fazer. Quanto ao conceito estratégico anunciado, parecia aplicar-se com perfeição no caso angolano (e talvez no moçambicano), mas não tinha comparação com o que se passava na Guiné, onde praticamente não havia assalariados. E sobre a "desistência" estamos conversados, apesar das grandes confusões que persistem na maioria dos porugueses. Quero ainda referir que não tive qualquer conhecimento de que as autoridades alguma vez tivessem adoptado o conceito estratégico do senhor Almirante.
Por agora, ficam os críticos mais esclarecidos sobre o livro e a capacidade do Autor.
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Notas de CV:
(*) Vd. ultimo poste de 23 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8312: Convívios (336): Encontro do pessoal da CCAÇ 2679 e Pel Caç Nat 65, dia 29 de Maio de 2011 no Fundão (José Manuel M. Dinis)
Vd. último poste da série de 13 de Maio de 2011 > Guiné 63/74 - P8269: (Ex)citações (138): Ainda o caso das fotografias das bajudas (Joaquim Mexia Alves)
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
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