Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 7763 (1965/66) > Estrada Cufar-Catió> Segurança montada enquanto se levantam as minas A/C.
Foto: © Mário Fitas (2007). Direitos reservados.
1. Mensagem do Mário Fitas, ex-Fur Mil Op Esp, CCAÇ 763, Cufar 1965/66, e autor dos dois romances sobre a guerra da Guiné (1):
Animado com a presença e conhecimento pessoal dos camaradas tertulianos da Tabanca Grande, foi, com grande curiosidade e algum nervosismo, que esperei pelo início do filme "As duas faces da Guerra", de Diana Andringa e Flora Gomes (2).
Fiquei estupefacto quando, ao entrar no hall da Culturgest, nos vimos relegados para uma fase lateral - a esposa do Briote, ele próprio, eu, e amigos da ADFA - pois a parte central estava completamente cheia e, para alegria minha e concerteza de todos, com muita gente jovem (em fisionomia, pois nós em mente, ainda estamos aqui prás curvas, desde que não sejam muito apertadas). O que é certo é que com seiscentos e tal lugares, o grande auditório ficou praticamente lotado.
E começou o filme. Voltei à Guerra e revisitei Cufar de outros tempos e chafurdei nos pântanos, bolanhas e rios de maré. Praticamente sem me aperceber, o filme tinha terminado.
Gostei!...Óptimo testemunho histórico!
O filme estará um pouco próximo do espírito da nossa Tertúlia, a sã convivência e lúcida reflexão do que se passou há quatro dezenas de anos.
A linha do filme está proximamente direccionada da nossa palavra de ordem "Não deixes que sejam os outros a contar a tua história", só que pobre da Diana e do Flora, se tivessem de falar com todos os milhões de homens e mulheres que viveram esta Guerra, [nunca mais fariam mais nada na vida!].
O que foi feito, a meu ver, está bem feito! Repito!... um bom documento histórico! "E longa a caminhada, e muito teremos de falar e tentar compreender". Tanto do lado do PAIGC como do Português, há ainda muitas coisas por desvendar.
Um pouco "ainda a quente", volto a frisar que é uma obra de mérito, honesta e sincera. Portanto as minhas felicitações à Diana Andringa e ao Flora Gomes! Continuem a vossa obra.
É claro que terei de rever o filme e dissecá-lo. Não tanto pela realização em si, mas mais pelo conteúdo dos testemunhos efectuados.
Que me desculpe o pessoal da Tabanca, mas nós, entre nós, temos de debater determinados tabus, ou seja varrer todas as teias de aranha. Há muitas coisas de efeitos e causas diferentes.
Reafirmando, "ainda a quente" dos testemunhos efectuados, algumas coisas me ficaram bailando na mente.
Como homem de Operações Especiais e vivendo a Guerra como vivi, terei forçosamente de saber alguma coisa sobre Guerrilha e Contraguerrilha. Assim com responsabilidade posso referir:
(i) Abandono de Guileje: estou cem por cento de acordo! Só quem pisava lama da Guiné e se encontrava no terreno, tinha de ter "tomates", falando portuguêsmente, independentemente do resultado disciplinar, e saber ensinar aos senhores da bota alta engraxada que, se numa guerra convencional há avanços e recuos, na contraguerrilha tudo isso mais acontece.
(ii) Ainda sobre Guiledge, palavras do comandante Pedro Pires (3): Guerra é Guerra... Julgo que foi uma expressão pouco feliz de um homem com as suas responsabilidades.
Desculpem-me todos os camaradas, principalmente o chefe da Tabanca Grande, mas para ficar aliviado, eu teria retorquido ao comandante Pedro Pires:
- Precisamente por Guerra ser Guerra, a CCAÇ 763 em seis meses varreu o seu sector na margem direita do Cumbijã, e saltou para a margem esquerda, Flaque Injã, Cadique, Caboxanque, etc....etc.... agora digo: MERDA DE GUERRA!!!.
(iii) Infelizmente há outras coisas! Um "D" que não foi tocado, a situação dos militares brancos e negros que serviram o Exército Português e cujos problemas se mantêm pior que há quarenta anos.
Desculpem camaradas, mas por vezes teremos de espirrar.
Terminando, pois a Diana não tem culpa destas coisas, por esse motivo lhe peço desculpa.À Diana agradecia que transmitisse ao Flora os parabéns pela obra que realizastes.
Um Abraço
Mário Fitas
___________
Notas dos editores:
(1) Vd. posts de:
12 de Agosto de 2007 > Guiné 63/74 - P2043: Bibliografia de uma guerra (23): Putos, Gandulos e Guerra, de Mário Vicente, aliás Mário Fitas (CCAÇ 763, Cufar)
5 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1926: Bibliografia de uma guerra (21): Pami Na Dondo ajuda-nos à reconciliação com a guerrilha (Virgínio Briote / Carlos Vinhal)
2 de Julho de 2007 > Guiné 63/74 - P1911: Bibliografia de uma guerra (19): Pami Na Dondo, guerrilheira do PAIGC, o último livro de Mário Vicente (A. Marques Lopes)
27 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1893: Notícias de Cadique (Mário Fitas, CCAÇ 763, Cufar, 1965/66)
26 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1884: Tabanca Grande (16): Mário Fitas, ex-Fur Mil da CCAÇ 763 (Cufar, 1965/66)
(2) Vd. post de 22 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2200: A nossa Tabanca e As Duas Faces da Guerra (7): Comentário de Inácio Silva, da CART 2732, Mansabá, 1970/72
(3) Comandante Pedro Pires (n. 1934): De seu nome completo, Pedro Verona Rodrigues Pires, nasceu em São Filipe, Fogo, Cabo Verde, em 29 de abril de 1934.
Estudou na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Foi aqui que encontrou os futuros líderes dos movimentos de libertação que lutaram pela independência das colónias portuguesas. Foi também alferes miliciano da Força Aérea Portuguesa.
Com o início da luta armada em Angola em 1961, saiu de Portugal no meio de uma leva de estudantes africanos que foi a salto para França (entre eles, estavam os angolanos Iko Carreira, Gentil Viana e Daniel Chipenda e os moçambicanos Joaquim Chissano e Pascoal Mocumbi).
De França seguiu para Marrocos, onde colaborou com o dirigente da Frelimo, o moçambicano Marcelino dos Santos, na Conferência das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas. Em 1963, Pedro Pires já estava em Dacar, Senegal, de onde transitaria depois para Conacri, antes de seguir para Cuba e para a URSS, onde frequentou cursos de guerrilha.
O sucesso da luta do PAIGC, na Guiné, liderada por Amílcar Cabral e Osvaldo Vieira (frente Leste), Luís Cabral e Francisco Mendes (Norte) e ristides Pereira e Nino Vieira (Sul), levou o partido a admitir a hipótese de criar um foco de guerrilha em Cabo Verde, que seria comandado por Pedro Pires, tendo Honório Chantre como adjunto. As ilhas de Santiago e de Santo Antão eram os palcos escolhidos para a actuação da guerrilha, com o apoio de Cuba. A morte de Che Guevara, na Bolívia, em 1968, terá levado Havana (e o PAIGC) a recuar...
Em Janeiro de 1973, é surpreendido, pelo assassínio de Amílcar. Na sequência deste trágico acontecimento, foi um dos protagonistas do II Congresso do PAIGC, que criou uma Comissão Nacional para Cabo Verde. Devido à popularidade que já desfrutava entre os combatentes, foi-lhe atribuída a presidência dessa comissão.
Foi depois escolhido para comissário adjunto (secretário de Estado) das Forças Armadas, quando o PAIGC proclamou a independência da Guiné-Bissau, em 24 de Setembro de 1973. Nessa altura, Pires aparecia como n.º 2 de Nino Vieira, que acumulava as funções de comissário (ministro) com as de presidente da Assembleia Nacional Popular.
Depois da Declaração de Independência de Cabo Verde em 5 de julho de 1975, foi designado ministro-presidente, cargo que ocupou até 1991, quando — como resultado de sua iniciativa junto com outros — o sistema multipartidário foi introduzido no país e o MpD - Movimento pela Democracia, de Carlos Veiga, conseguiu a maioria.
Com o advento da democracia e do multipartidarismo, em 1991, o Comandante Pedro Pires substituiu Aristides na liderança do partido (já designado por PAICV após a cisão de Nino), antes de empreender uma longa travessia do deserto durante a governação do MpD.
Em 2001, apresentou-se finalmente como candidato presidencial contra Carlos Veiga e venceu as eleições com apenas 17 votos de diferença. Em 22 de Março de 2001 foi empossado como sucessor de António Mascarenhas Monteiro.
Fontes consultadas:
Wikipédia
Diário de Notícias
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
segunda-feira, 22 de outubro de 2007
Guiné 63/74 - P2202: A nossa Tabanca Grande e As Duas Faces da Guerra (8): Voltei a Cufar e a chafurdar nas bolanhas e rios de maré (Mário Fitas)
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